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Musk e Zuckerberg, os ‘bastiões da liberdade’ da extrema direita

Big Techs querem seu filão na nova era Trump, pactuam com extremistas e ameaçam a soberania de países.

Nesta terça-feira (7), o criador e dono da Meta (empresa que controla Facebook, Instagram e Threads) Mark Zuckerberg, publicou um vídeo dizendo que sempre foi um defensor da liberdade de expressão e que, depois da eleição de Trump, decidiu “se livrar” dos checadores de informação das suas redes e substituí-los por notas da comunidade, como faz o X de Elon Musk.

Ele alega que a mídia é tendenciosa e censura cada vez mais conteúdos e que a eleição de Trump mostra um indicativo de que as pessoas querem mais liberdade de expressão.

Zuckerberg também declarou que vai mexer nas políticas de filtragem sobre temas como imigração e gênero e que vai mudar a empresa da Califórnia para o Texas, um lugar onde teria menos “gente tendenciosa” em seus times.

Por fim, disse que quer trabalhar com Trump para pressionar outros países pelo “fim da censura” e mencionou que a América Latina teria “cortes secretas” que podem derrubar plataformas.

O vídeo de pouco mais de 5 minutos parece ter saído do livro de receitas da ultra direita — cita cada tema, cada palavra símbolo que são repetidas nos encontros internacionais e nos discursos inflamados dos extremistas: gênero, migração, liberdade de expressão, censura, mídia tendenciosa.

A mudança para o Texas seria mais um afago aos bolsos republicanos, seguindo o exemplo de Elon Musk que também tirou suas empresas do Vale do Silício na Califórnia, berço das big techs, para o Texas, um estado historicamente conservador.

Parece que, vendo como o apoio ao Trump içou Elon Musk ao status de autoridade, alguém que fala com presidentes, influencia politicamente e colhe privilégios dessa parceria, Zuckerberg também quer seu filão.

Não que a conexão entre as big techs e a extrema direita seja exatamente uma novidade — basta lembrarmos do escândalo Facebook–Cambridge Analytica, que recolheu informações pessoais de até 87 milhões de usuários, dados que foram utilizados por políticos ultraconservadores para influenciar a opinião de eleitores em vários países. Mas era um pouco mais velada.

O que Musk e Zuckerberg estão fazendo é ainda mais grave — além de declarar apoio à extrema direita, facilitar e endossar narrativas de ódio para milhões de pessoas de todo o mundo em suas plataformas, eles têm ameaçado a soberania dos países quando falam em pressionar e “derrubar a censura” de governos progressistas.

Zuckerberg ainda fala em “cortes secretas” da América Latina, se referindo claramente às medidas tomadas pelo STF com relação ao X.

A extrema direita, por sua vez, está nadando de braçada. Nos últimos congressos ultraconservadores que me infiltrei, muito se celebrou esse casamento Musk — Trump. “Finalmente alguém vai lutar por nossa liberdade de expressão, contra a cultura do cancelamento e contra a ditadura da imprensa” diria um parlamentar durante o último encontro da nata ultraconservadora do mundo em Madrid.

Para dar um exemplo nacional dessa parceria, neste mesmo congresso em Madrid, o senador do Novo Eduardo Girão fez uma fala longa sobre como figuras de direita estão sendo perseguidas, censuradas e presas no que ele chamou de uma “juristocracia” brasileira. Falou em arbitrariedades com relação ao X, violações de direitos humanos e sinalizou que o país vive sob um governo autoritário, com uma imprensa tendenciosa.

No fim do ano passado, Girão e mais 4 parlamentares do Novo, representados pela organização ultraconservadora ADF International, solicitaram perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos que “condene a censura brasileira e defenda a liberdade de expressão”.

O site da ADF diz: “À luz da atual crise de censura estatal no Brasil, cinco legisladores brasileiros, incluindo o senador Eduardo Girão e os membros da Câmara dos Deputados Marcel Van Hattem, Adriana Ventura, Gilson Marques e Ricardo Salles, estão contestando as violações de seus direitos de liberdade de expressão perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, representada pela ADF International. A Comissão tem jurisdição sobre o Brasil como um Estado Parte da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Convenção Americana protege fortemente a liberdade de expressão, incluindo proibições de restrição prévia (censura de expressão antes que ela ocorra) e proteções especiais para discurso político (…) Os legisladores alegam violações de seus direitos sob a Convenção, incluindo sua liberdade de expressão e a proteção igualitária da lei, como resultado da crescente censura estatal, que remonta a 2019, e que recentemente atingiu o auge com a proibição do X (anteriormente conhecido como “Twitter”). Em sua contestação legal agora apresentada à Comissão, os legisladores observam que a censura patrocinada pelo estado, incluindo a proibição de X por 39 dias, é ‘desproporcional e de base legal duvidosa’ e ‘afetou os direitos convencionais das Vítimas de forma direta, particular e séria”.

O vídeo de Mark Zuckerberg, que segue os passos de Elon Musk, é um afago aos bolsos republicanos, um abraço apertado na extrema direita internacional e uma ameaça clara à soberania de países e suas legislações sobre as big techs.

*Andrea Dip/ICL