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Al-Shifa será o estigma de Israel

A palavra ‘genocídio’ já é lugar comum e as medidas formais de denúncia por crimes de guerra se multiplicam.

Por Carol Proner e Helena Pontes

Quem do Brasil acompanha as notícias na Faixa de Gaza sabe que, ao acordar, já acumulamos cinco horas de atraso em relação a tudo que aconteceu no território ocupado e massacrado. A cada manhã nos atualizamos das desgraças da madrugada e dos planos de extermínio do dia que, por lá, já vai pela metade.

A novidade da última jornada foi a invasão do Hospital Al-Shifa.

Atacar um hospital é evidentemente proibido pelo direito internacional. As Convenções de Genebra, que limitam o direito da guerra, proíbem ataques contra pessoal religioso, médico e hospitalar e são taxativas quanto a hospitais certificados e identificados como tal. Esse é o caso de Al-Shifa, o maior entre todos e o único com habilidade para tratamento de câncer. Esse é também o caso de outros 11 centros de saúde bombardeados desde o 7 de outubro em mais de 137 ataques registrados pela OMS. Al-Shifa, portanto, não é um caso isolado, embora certamente o mais abominável.

Para justificar as atrocidades proibidas pelas leis humanitárias em hospitais, o comando militar israelense argumenta serem lugares profanados por servirem a propósitos militares ilícitos. Dá para imaginar o quão tentador pode ser, como disfarce militar, o uso enganoso de um espaço protegido, seja um hospital, uma escola ou um templo. E esse raciocínio hipotético e fantasioso aquece os debates já polarizados entre Hamas e Israel, ofuscando a percepção do fim último das normas humanitárias. Ora, para desabonar regras de proteção consideradas de máxima observação (normas imperativas), a parte que decide desrespeitar precisa, como mínimo, provar o uso manifestamente impostor da mesma (do lugar protegido) e, como se viu, além de uma mochila com armas e outras ilações, nada foi provado.

Al-Shifa sensibilizou a comunidade internacional desde que Israel decidiu decretar a evacuação forçada urgente e sem qualquer planejamento. As imagens de médicos e pacientes em pânico diante do perverso ultimato provocaram revolta e questionamentos. Obviamente uma regra tão auto evidente como a de proteger hospitais não teria sido convencionada sem as garantias laterais de proteção à vida de civis já vulneráveis (hospitalizados).

Para que uma tal acusação, como a perfídia em lugares protegidos, pudesse legitimar a invasão armada ou mesmo um ataque, as mesmas Convenções de Genebra obrigam ao dever de proteger os civis que, no caso do hospital, implica correlato dever de evacuar pessoas com os cuidados devidos, de transferir pacientes ligados a máquinas vitais, de acolher enfermos terminais, de transportar pessoas com dificuldades de deslocamento e, especificamente no caso de Al-Shifa, de garantir a continuidade da vida dos recém-nascidos forçosamente desligados das incubadoras.

*Opera Mundi