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Lula envia o recado certo no Egito. No Brasil, problemas o esperam

Na COP, presidente eleito acerta ao dizer que não medirá esforços para combater o desmatamento. Na volta, vai enfrentar xadrez na montagem do ministério e delírios golpistas.

O presidente eleito Lula demonstrou no forte discurso na COP27 que amadureceu sua compreensão sobre o tema. Ele já havia sido um bom governante no combate ao desmatamento, mas desta vez chegou falando em “emergência climática”, em como o clima passou a ser central. Lula disse que não medirá esforços para combater o desmatamento, defendeu indígenas, propôs aliança mundial contra a fome, uma parceria com o agronegócio, fez cobranças aos países ricos, convidou a COP para vir para o Brasil e indicou que pode vir a criar uma coordenação “do mais alto perfil” para o tema, referindo-se talvez à Autoridade Climática.

— Em dez minutos de discurso fez mais pelo meio ambiente do que Bolsonaro em toda a vida. Falou de forma direta, sem rodeios, ao ponto. Falou o que interessava na questão interna, e também foi direto ao ponto ao se dirigir aos países ricos. Ele cobrou promessa dos outros, mas fez suas próprias promessas — afirmou Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima.

Aqui dentro problemas o aguardam. Ainda não se sabe como será a tramitação da PEC da Transição. O vice-presidente eleito Geraldo Alckmin entregou ontem ao Congresso um anteprojeto que coloca fora do teto o Bolsa Família, um percentual das receitas extras e doações. Por quanto tempo? Não há prazo no texto, mas o que se quer é quatro anos. O detalhamento do que fazer com o dinheiro aberto no orçamento foi enviado à parte. Trabalhou-se nisso até no feriado no CCBB, escritório de transição. O mercado andou em queda de novo. Os analistas entendem que será preciso explicar melhor como será o caminho do equilíbrio fiscal.

Lula falou na COP um dia depois do feriado da República, quando manifestantes bolsonaristas fizeram grandes atos em frente aos quartéis pedindo golpe de estado, no meio de comunicações ambíguas de Forças Armadas, de lideranças militares e diante do silêncio do presidente da República. Entrevistei ontem, no meu programa na Globonews, a senadora Simone Tebet e perguntei como esse golpismo pode ser enfrentado.

— Tolerância zero. Meu lado jurista, meu lado democrata, foi uma das razões pelas quais eu anunciei meu apoio ao presidente Lula, sem nunca ter sido do PT. Tenho convicção de que as urnas não levaram dois democratas para o segundo turno, apenas um. Nesse aspecto temos que cumprir a Constituição. É melhor o rigor da lei do que a ditadura de um homem. A gente já viu esse filme antes. A Constituição é muito clara. A gente não pode estimular um ato que seja atentatório à democracia. Temos que punir os financiadores, sabemos quem são muitos deles. Temos que apoiar a Justiça nas suas decisões. Esse capítulo precisa ser definitivamente encerrado. Ele não pode vir daqui a quatro anos mais fortalecido do que está agora. Por isso, fiz tanta campanha no segundo turno. Nós não suportaríamos oito anos de governo Bolsonaro, que lamentavelmente estava mudando a alma e o caráter do povo brasileiro. Há uma parcela pequena da população que está em transe.

Quando o auditório no qual Lula falava em Sharm el-Sheikh, no Egito, cantou em coro “O Brasil voltou” eram brasileiros, mas inúmeros estrangeiros estavam ali em torno comemorando exatamente isso. O Brasil retornou à mesa da diplomacia climática, na qual o país sempre fez diferença. E chega, como o próprio Lula, mais maduro e assertivo. No discurso mais breve que fez pela manhã, no estande dos governadores amazônicos, Lula acertou, segundo destaque de Tasso Azevedo, ao defender o amplo diálogo com todos.

– O presidente da República tem a obrigação de conversar com todos, inclusive os adversários, porque após as eleições não são mais adversários. Sem conversa não tem solução — disse Lula.

Na volta, enfrentará um país que ainda não curou suas fraturas. No dia 15, um longo tuíte do general Villas Bôas se referiu aos manifestantes que pedem ditadura como pessoas que “protestam contra os atentados à democracia”. É uma completa inversão. Uma fonte do meio militar me disse que ele pode estar sendo usado “para passar recados que, eu creio, em perfeita consciência, ele não daria”. Villas Bôas está há muitos anos com uma doença incapacitante.

O sumiço deliberado do presidente da República alimenta a ideia de que a derrota eleitoral pode ser revertida. Além desses delírios, Lula terá que enfrentar nas próximas semanas o xadrez da montagem do ministério e da definição dos rumos econômicos do país.

*Miriam Leitão/O Globo

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Lula presidente

Lula “é esperado como estrela” na COP, segundo jornal francês; Bolsonaro nunca foi ao evento

Presidente eleito fará pronunciamento em área da ONU destinada a negociações.

Brasil de Fato – O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) terá agenda de chefe de Executivo durante sua participação na Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP 27) no Egito, nesta semana. O jornal francês Les Echos afirmou que o petista “é esperado como estrela no Egito”, em matéria publicada nesta segunda-feira (14).

Lula tem encontros confirmados com o secretário-geral da ONU, António Guterres, o presidente do país anfitrião, o general Abdel Fattah El-Sisi, e com lideranças de outros países interessados em auxiliar no combate ao desmatamento.

Na quarta-feira (16), Lula participa do evento “Carta da Amazônia – uma agenda comum para a transição climática”, na qual tamvém estão presentes os governadores Waldez Góes (PDT-AP), Gladson Cameli (PP-AC), Mauro Mendes (União Brasil-MT), Helder Barbalho (MDB-PA), Wanderlei Barbosa (Republicanos-TO) e Coronel Marcos Rocha (União Brasil-RO).

O grupo de governadores deve entregar um planejamento com ações de controle do desmatamento, como parte de um movimento para conseguir financiamento e realinhamento internacional após a derrota de Jair Bolsonaro (PL). Helder Barbalho foi o responsável pelo convite feito a Lula para participar da COP.

No mesmo dia, Lula fará um pronunciamento na Zona AzuL, que é uma área administrada pela Organização das Nações Unidas (ONU), onde ocorrem negociações entre lideranças dos países. No local, todos os participantes devem ser credenciados pelo Secretariado da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima.

“Este ano, serão 156 pavilhões dentro da Zona Azul, o dobro do que em Glasgow [que sediou a COP de 2021]. Muitas agências da ONU, países e regiões estarão representados, e também haverá pela primeira vez um pavilhão da Juventude e um Pavilhão Agroalimentar”, divulgou o escritório da ONU no Brasil em seu site.

No dia seguinte, Lula tem um encontro com representantes da sociedade civil brasileira, no Brazil Climate Action Hub – trata-se de um espaço criado em 2019, durante a COP25, realizada em Madri, na Espanha, com o objetivo de dar visibilidade à ação climática brasileira. Mais tarde, ainda no mesmo dia, o presidente eleito tem um encontro com o Fórum Internacional dos Povos Indígenas para Mudanças do Clima.

Presença de Lula contrasta com ausência de Bolsonaro

A expectativa em torno da presença de Lula na COP27 contrasta com a ausência de Jair Bolsonaro, que segue na Presidência da República até 31 de dezembro. Em seu lugar, o atual mandatário mandou para o evento o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, que chega ao Egito nesta terça-feira (15).

No segundo dia de evento, em 9 de novembro, Leite participou de um painel online no qual afirmou que a agricultura brasileira “é a maior agricultura regenerativa do mundo por uma característica da nossa agricultura tropical, que protege o solo, que melhora o solo, que fixa carbono no solo e ao mesmo tempo cuida de florestas nas áreas de reserva legal, de preservação permanente, cuida de suas nascentes, cuida do seu solo em relação à erosão”.

O ministro ignorou, entretanto, o desmonte das agências de fiscalização do meio ambiente no governo Bolsonaro. Dados do relatório “O financiamento da gestão ambiental no Brasil: uma avaliação a partir do orçamento público federal”, publicado em agosto pelo Instituto Socioambiental (ISA) e pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mostram que, enquanto o orçamento para políticas ambientais atingiu o pico de R$ 13,3 bilhões em 2014, durante o governo Dilma Rousseff (PT); o valor diminuiu para R$ 3,7 bilhões, em 2021, no governo Bolsonaro. O valor representa um tombo de 71%.

O governo também já recebeu do Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe) o dado anual do desmatamento na Amazônia, mas deve divulgá-lo somente após a COP27, segundo apuração da Folha de S. Paulo.

O deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) repercutiu a notícia em seu perfil no Twitter. “Bolsonaro já recebeu do INPE o dado anual de desmatamento da Amazônia, mas só vai divulgar depois da COP27 porque a destruição é recorde. É por isso que Lula será recebido na COP como chefe de Estado e Bolsonaro continuará em seu cantinho, calado e insignificante”, publicou.

Não é a primeira vez que Bolsonaro decide publicar os dados do Inpe após a realização do evento, indo contra uma tradição que vinha se estabelecendo desde 2005, no primeiro governo Lula. No ano passado, os dados só vieram a público após o fim da COP26, que ocorreu na Escócia. Embora a informação sobre o desmatamento na Amazônia estivesse disponível desde 27 de outubro de 2021, o governo Bolsonaro divulgou os dados somente em novembro.

Bolsonaro nunca foi à COP

Bolsonaro também não foi à COP26 e enviou o ministro Joaquim Leite. Na ocasião, o presidente enviou um vídeo para o evento, no qual afirma que “o combate à mudança do clima, sempre fomos parte da solução, não do problema”.

O presidente também não deu as caras na COP25, em 2019, em Madri, na Espanha. Mais do que isso, Bolsonaro defendeu que o evento não fosse realizado no Brasil. “Eu não aceitei, eu que decidi. Estariam fazendo um carnaval aqui no Brasil. Eu quero saber: alguma resolução para a Europa começar a ser reflorestada? Alguma decisão ou só ficam perturbando o Brasil? É um jogo comercial”, afirmou Bolsonaro à imprensa na ocasião.

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