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Estatal pune empregado que criticou, “atitudes loucas deste desgoverno”

O Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados), empresa estatal vinculada ao Ministério da Economia, puniu com dez dias de suspensão e descontos salariais um empregado público que fez uma crítica ao governo federal em um e-mail interno que não circulou em redes sociais. Ele escreveu aos seus colegas “que somente a resistência pode barrar as atitudes loucas deste desgoverno”.

A punição manchou a longa folha de serviços prestados à estatal durante 41 anos pelo analista de sistemas Fernando Sergio Gomes, 63. “Isso serviu como um sinal, um aviso para aquelas pessoas [da estatal] que são um pouco receosas. Uma pessoa com 41 anos de Serpro como eu, sem nada desabonador, não fui nem advertido, fui direto para uma suspensão”, disse Gomes à coluna.

O advogado Aderson Bussinger Carvalho, que defende o analista, disse que vai ajuizar uma ação na Justiça do Trabalho para pedir a anulação da punição, que foi já cumprida em agosto passado.

Procurada pela coluna para esclarecer o conteúdo do processo em agosto, a estatal disse que não poderia comentar o caso: “Para preservar o sigilo do procedimento correcional e a intimidade de seus empregados, o Serpro se isenta de se manifestar publicamente sobre eventuais aplicações de sanções disciplinares”.

O professor e doutor em Direito Administrativo pela PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio de Janeiro, Manoel Peixinho, discordou que a mensagem possa ensejar uma punição. “É verdade que o e-mail corporativo deve ser usado para assuntos relacionados ao trabalho. Nesse caso [o empregado público] usou um e-mail fechado para um grupo determinado. Ele não levou a público, não maculou a imagem do Serpro. Mas mesmo que fosse aberto, eu também não veria problema. Ele está protegido pela liberdade de expressão.”

Para o professor, pode ser feito um paralelo com o caso da jogadora de vôlei de praia Carol Solberg, que foi denunciada em setembro ao STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) por ter gritado “Fora Bolsonaro” após uma partida. Em novembro, ela foi absolvida pelo tribunal.

“O ato dele pode ter sido no máximo um inconveniente, mas não ilegal nem passível de punição. No caso de Carol, ela disse publicamente e mesmo assim foi absolvida porque foi consagrada a liberdade de expressão”

A mensagem que gerou a punição no Serpro foi enviada por Fernando Gomes no último dia 21 de fevereiro. Segundo o analista, o e-mail chegou a apenas 200 empregados públicos que faziam parte de um grupo criado para trocar informações a respeito do teletrabalho, modalidade de trabalho à distância já utilizada pelo Serpro muitos anos antes da pandemia do novo coronavírus.

Segundo Gomes, o grupo foi criado depois que o Serpro anunciou que iria encerrar a modalidade do teletrabalho que, segundo ele, existe desde 1986 e envolve cerca de 300 funcionários.

Gomes escreveu no e-mail: “Pessoal, muitos aqui estão nos grupos de resistência contra as privatizações, o Serpro não está fora da lista, recentemente houve mudança no tempo do acontecer. O grupo RJ Conectado abraça vários colegas que entenderam que somente a resistência pode barrar as atitudes loucas deste desgoverno. 493 trabalhadores da Dataprev estavam prestes a ir para o olho da rua, mas vários grupos se organizaram, tanto WhatsApp como Telegram, e conseguimos suspender a tragédia. Portanto entendam que nossa luta para manter o TT [Teletrabalho] é apenas uma parte de um todo”.

“Há 41 anos nunca vi um procedimento tão faca no pescoço. Eu fui escrever alguma coisa de resistência em relação à privatização. O conteúdo não é ofensivo a ninguém”, disse o analista.

‘Nunca vi um procedimento tão faca no pescoço’, afirma servidor

Gomes afirmou que, com a pandemia, parte dos empregados em teletrabalho continuou em “home office”, mas a estatal teria avisado que a modalidade do teletrabalho seria encerrada.

“Isso mexeu com várias pessoas que organizaram sua vida durante anos no teletrabalho. Tem empregados com problemas cardíacos, com diabetes. Foi uma pancada. Isso afeta realmente a cabeça e o sistema nervoso da pessoa. Quase todos ficaram revoltados, com muitos lamentos. Eu sugeri que a gente se organizasse em um grupo de internet para fazer essa luta e tentar reverter a decisão. Além disso, tem a questão da privatização. A gente faria a discussão sobre como organizar a resistência. Aí eu escrevi ‘desgoverno’.”

 

*Com informações de Rubens Valente/Uol

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