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Empresa de software espião Pegasus abandona licitação do governo

A fornecedora do sofisticado sistema de espionagem israelense Pegasus abandonou a licitação do Ministério da Justiça e Segurança Pública para a contratação de um aparelho espião. A saída da empresa ocorreu após reportagem do UOL mostrar o envolvimento do vereador carioca Carlos Bolsonaro (Republicanos) na negociação.

A atuação do filho “02” do presidente da República, Jair Bolsonaro, gerou insatisfação por parte de militares que integram o GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e a Abin (Agência Nacional de Inteligência), já que os órgão ficaram de fora das tratativas.

Segundo fontes ouvidas pelo UOL sob a condição de não terem seus nomes e cargos revelados, o político carioca tenta usar as estruturas do Ministério da Justiça e da PF (Polícia Federal) para expandir uma “Abin paralela”, na qual tenha grande influência.

Iniciado na quarta-feira (19) passada, o pregão eletrônico de nº 3/21 do ministério tem como critério de julgamento o menor preço. As empresas tiveram até uma hora antes do início do pregão para cadastrar as propostas. Mas, para contenção de danos, a empresa brasileira responsável por comercializar o Pegasus, a M.C.F da Silva, se retirou do processo licitatório.

A empresa leva as siglas do dono, Marcelo Comité Ferreira, responsável por chefiar o escritório da israelense NSO Group no Brasil e pela comercialização do sistema espião no país. Antes de sair, ela havia apresentado uma proposta de R$ 60,9 milhões.

Ligação com a NSO

A ligação de Comité com a NSO é evidenciada pelo próprio empresário que, ao apresentar a oferta no momento de instrução, que está sob sigilo no Ministério da Justiça, precisou expor informações da empresa. Nos dados apresentados, porém, uma possível falha, já que do e-mail cadastrado consta a referência “@nsogroup.com”.

Sem informar que trabalha diretamente para a NSO, a conta de Marcelo Comité na rede social Linkedin também traz um “tracing” (rastreamento de contatos) em torno de Israel e da NSO. Fontes ouvidas pela reportagem também reforçam que o único produto da empresa israelense comercializado pelo empresário é o Pegasus.

O UOL procurou Comité por e-mail na manhã de segunda-feira (24), mas ele não respondeu até a publicação desta reportagem. Se enviar posicionamento, será incluído neste texto.

O programa já foi usado para espionar celulares e computadores de jornalistas, ativistas e críticos de governos ao redor do mundo. Em setembro de 2018, o projeto de Direitos Humanos do Citizen Lab, vinculado à Universidade de Toronto, no Canadá, demonstrou que o Pegasus já chegou a coletar dados de cidadãos de 45 países, incluindo de brasileiros.

A entidade afirma também que o polêmico sistema já foi “abusivamente usado” para espionar civis em países como México, Marrocos, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, entre outros.

Inconsistências

Com a saída da empresa responsável pelo sistema Pegasus do certame, oito participantes foram finalistas do processo, sendo a empresa Harpia Tecnologia Eireli quem obteve a melhor colocação, com uma proposta de R$ 22 milhões.

A empresa, porém, apresentou algumas inconsistências, sendo a principal delas verificada na produção da proposta. Segundo documentos obtidos pela reportagem, o responsável pelo pregão notou que a Harpia não informou que produto seria oferecido, “tanto na proposta eletrônica, quanto na proposta anexada”. Ou seja: a empresa ganhou o pregão sem dizer qual ferramenta estava oferecendo.

*Com informações do Uol

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Carlos Bolsonaro intervém em compra de aparelho espião e cria crise militar

Segundo matéria do Uol, uma licitação para a aquisição de uma ferramenta de espionagem expôs a disputa entre o alto comando militar e o vereador carioca Carlos Bolsonaro (Republicanos), o filho “02” do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido).

Diferentemente de editais semelhantes ocorridos em outras ocasiões, desta vez órgãos oficiais de investigação que seriam beneficiados diretamente pela ferramenta, como o GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e a Abin (Agência Brasileira de Informações), não estão envolvidos nas tratativas.

O edital de licitação em questão é o de nº 03/21, do Ministério da Justiça, no valor de R$ 25,4 milhões, previsto para acontecer nesta quarta-feira (19). O objetivo é contratar o avançado (e polêmico) programa de espionagem Pegasus, desenvolvido pela empresa israelense NSO Group.

O Pegasus já foi usado para espionar celulares e computadores de jornalistas e críticos de governos ao redor do mundo. Em junho de 2017, por exemplo, o jornal The New York Times revelou que o software estava sendo usado pelo governo do México, ainda sob a gestão de Enrique Peña Nieto, para espionar ativistas contrários à sua gestão. Segundo informações do veículo norte-americano, o governo daquele país chegou a gastar cerca de US$ 80 milhões para o uso da ferramenta desde 2011.

“Abin paralela”

Segundo fontes ouvidas pelo UOL sob a condição de não terem seus nomes e cargos revelados, o político carioca tenta diminuir o poder dos militares na área de inteligência. Para tanto, articulou junto ao novo ministro da Justiça, Anderson Torres, para excluir o GSI da licitação. O órgão, que é responsável pela Abin, é chefiado pelo general Augusto Heleno e tem muitos militares em seu quadro.

De acordo com as mesmas fontes, o objetivo final de Carlos Bolsonaro é usar as estruturas do Ministério da Justiça e da PF (Polícia Federal) para expandir uma “Abin paralela”, na qual tenha grande influência.

O UOL procurou o gabinete do vereador Carlos Bolsonaro, mas não obteve resposta até o momento desta publicação. Se houver resposta, ela será incluída.

Em nota, o Ministério da Justiça e Segurança Pública disse que o processo de licitação visa a “aquisição de ferramenta de busca e consulta de dados em fontes abertas para ser usado, pelo ministério e órgãos de segurança pública, nos trabalhos de enfrentamento ao crime organizado”. A pasta afirmou ainda que “a referida licitação não tem nenhuma relação com o sistema Pegasus”.

Pegasus

A reportagem teve acesso, com exclusividade, às propostas, ainda sob sigilo, de todos os concorrentes do pregão eletrônico. Fontes que integram o Sisbin (Sistema Brasileiro de Inteligência) enfatizaram a participação da NSO Group, dona do Pegasus, no pregão por meio de um revendedor brasileiro, que fez uma proposta ao edital de R$ 60,9 milhões. O valor, porém, ainda poderá ser reajustado para se enquadrar à quantia estabelecida para a aquisição por 12 meses da nova ferramenta.

As propostas com valores muito superiores ao previsto pelo edital, como é o caso da empresa Synchronet Telecomunicações Ltda., que fez uma oferta de R$ 1,25 bilhão para o fornecimento do serviço, já foram descartadas de antemão.

Há o entendimento na ala militar de que o Pegasus possibilita a invasão de celulares e computadores sem indicar o responsável pelo acesso —a facilidade é tamanha que um dispositivo pode ser acessado sem precisar ser ativado pelo usuário, o que membros da inteligência chamam de “zero cliques”.

Fontes ouvidas pelo UOL afirmam que o maior problema é que, se adquirido, o Pegasus permitirá o monitoramento de pessoas e empresas sem decisão judicial. Ou seja: o uso da ferramenta dependerá apenas do senso ético de quem controlará o sistema.

Outro ponto de discórdia entre os militares e Carlos Bolsonaro está no fato de que Anderson Torres não se opõe ao armazenamento de dados e informações por estrangeiros, em especial de empresas com sede na Alemanha ou em Israel.

Alegando questões de segurança nacional, equipes do GSI e da Abin, porém, não abrem mão de que informações oriundas de investigações, enriquecidas com os dados de cidadãos e de empresas nacionais, devam ser exclusivamente armazenadas e processadas no Brasil.

O poder de Torres

A aquisição da nova “solução de inteligência em fontes abertas, mídias sociais, Deep e Dark Web”, como é descrita no edital, também distorce o equilíbrio entre os órgãos de inteligência do governo, dando muito poder ao ministro Anderson Torres.

O software funciona por meio de licenças, que são como direitos individuais de acesso. Das 249 licenças ao novo programa previstas no contrato, Torres terá sob sua influência 155, que também deverão ser compartilhadas com Carlos Bolsonaro, segundo as fontes ouvidas pela reportagem.

As autorizações restantes serão disponibilizadas ao BC (Banco Central), ao MPF (Ministério Público Federal) e a órgãos de 13 Estados.

Sobre o número de acessos adquiridos pelos órgãos, o Ministério da Justiça disse que este não sofre ingerência do ministro Anderson Torres. “Vale frisar que quem custeia e contrata essas licenças são os próprios órgãos participantes da ata”, disse a pasta.

*Lucas Valença/Uol

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