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Centrão usa verbas da Codevasf para abastecer prefeituras contrárias a Lula

Doações de equipamentos pela Codevasf para associações turbinam aliados de deputados do Centrão que disputarão as eleições municipais de 2024. As entregas têm clima festivo e incluem faixas, cartazes, balões e até carreatas, segundo a Folha.

Em geral, as doações com esse perfil driblam o caminho tradicional de entregas de máquinas para prefeituras e alimentam a chamada “banda B” da política municipal –grupos liderados por políticos de oposição, ex-prefeitos e vereadores com pretensões de voos mais altos.

No povoado Palmeira, na zona rural de Amargosa (242 km de Salvador), é possível ver um sobrado de ar bucólico com janelas largas e sombreiros no jardim. Esta fazenda, com produção de cacau e bois em seus extensos pastos, sedia uma das associações que receberam como doação da estatal federal Codevasf em 2023 uma retroescavadeira e kits para irrigação.

A entidade beneficiada é presidida pelo suplente de vereador Renato Bastos, 38, aliado do deputado federal Dal Barreto, do União Brasil. Natural de Amargosa, Dal Barreto é empresário, deputado em primeiro mandato, exerce forte influência na política municipal e lidera a oposição ao prefeito local, Júlio Pinheiro, do PT, cuja gestão não recebeu nenhum equipamento do órgão federal.

O padrão se repete em outras cidades de pequeno e médio porte.

A Codevasf foi criada há 50 anos para projetos de irrigação no semiárido, mas o governo Bolsonaro (PL) a transformou em “loja de políticos”, pela qual congressistas usam emendas para comprar máquinas, veículos, equipamentos e obras de pavimentação e direcionam produtos para seus redutos eleitorais.

O modelo de mudança na vocação histórica da Codevasf tomou corpo na gestão de Bolsonaro, que entregou a estatal ao centrão em troca de apoio político, mas se mantém da mesma forma no governo Lula, ainda em de busca criar uma base de sustentação no Congresso.

A CGU (Controladoria-Geral da União) e o TCU (Tribunal de Contas da União) já mostraram que a escolha dos beneficiados pelos deputados não segue qualquer critério técnico ou programas de governo e depende da caneta do político autor da emenda.

O diferencial sob a gestão Lula é a maior proporção de doações a entidades privadas e menor a prefeituras, aumentando assim o risco de irregularidades. No geral, as entidades representam 361 de 604 doações feitas pela Codevasf neste ano. As beneficiadas vão desde filantrópicas religiosas até associações de garimpeiros.

Em Amargosa, a retroescavadeira de R$ 340 mil foi doada pela Codevasf para a Associação Comunitária dos Produtores Rurais da Palmeira, Água Branca e Adjacências, entidade fundada em 2019 por Renato Bastos, aliado do deputado Dal Barreto.

Renato mora na zona urbana, mas aproveitou a sede da fazenda que pertence ao seu avô, em Palmeira, para abrigar a sede da associação. Lá ficam guardados a retroescavadeira e um trator com arado recebido em 2022.

A Folha esteve na sede da associação na quarta-feira (7). Renato não estava nem as máquinas. Por telefone, disse que a retroescavadeira estava sendo usada no povoado Córrego, mas não revelou a localização exata nem o nome de quem estava com o equipamento.

Renato diz ser aliado de Dal Barreto, elogia o deputado pelas emendas, mas nega uso eleitoral das máquinas: “A intenção da associação não é política. Mas claro que qualquer tipo de benefício para a população fortalece quem está levando. Mostra quem tem compromisso”, diz.

Na Palmeira, são poucos os agricultores que já usaram o equipamento, caso de Virgílio Jesus Santos, 50. Ele pagou R$ 124 por duas horas de uso do trator. A terra que arou para plantar mandioca não é dele – pertence a uma empresária que mora na cidade e terá parte dos lucros.

A poucos metros, um grupo de agricultores descascava, triturava, prensava e torrava a mandioca para transformar em farinha usando equipamentos comprados com recursos próprios. Eles não fazem parte da associação de Palmeira e dizem só ver os políticos nas eleições. Um deles diz que eles só aparecem de quatro em quatro anos. Nos outros dias, afirma um lavrador, “a gente só vê passar de helicóptero”.

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