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Há 13 anos no topo da lista, Brasil continua sendo o país que mais mata pessoas trans no mundo

Segurança pública no país continua com cegueira de gênero e 11 estados brasileiros não tem dados sobre homofobia e trans.

Apesar de a transfobia ser crime no Brasil desde 2019, o país é ainda o que mais mata pessoas trans e travestis em todo o mundo pelo 13° ano consecutivo.

O número de assassinatos de mulheres trans e travestis é o maior desde 2008 — ano em que o dado começou a ser registrado.

Conforme o relatório de 2021 da Transgender Europe (TGEU), que monitora dados globalmente levantados por instituições trans e LGBTQIA+, 70% de todos os assassinatos registrados aconteceram na América do Sul e Central, sendo 33% no Brasil, seguido pelo México, com 65 mortes, e pelos Estados Unidos, com 53.

Os dados apontam também que, nos últimos 13 anos, pelo menos 4.042 pessoas trans e de gêneros diversos foram assassinadas entre janeiro de 2008 e setembro de 2021.

Entre outubro de 2020 e setembro de 2021 foram registrados 375 assassinatos no mundo, o que representa um aumento de 7% em relação ao ano anterior.

O relatório mostra que o Brasil teve 125 mortes. Por outro lado, só no ano de 2020, Associação Nacional de Travestis e Transexuais reportou 175 transfeminicídios e mapeou 80 mortes no primeiro semestre de 2021.

As maiores vítimas de transfeminicídio são mulheres. De acordo com o documento da Transgender Europe, 96% das pessoas assassinadas em todo o mundo eram mulheres trans ou pessoas transfeminadas; 58% das pessoas trans assassinadas eram profissionais do sexo; a idade média das pessoas assassinadas é de 30 anos; 36% dos homicídios ocorreram na rua e 24% na própria residência.

Os dados da organização (TGEU) são obtidos por movimentos trans e organizações da sociedade civil que realizam alguma categoria de monitoramento profissional em seus países. Mas, esses números não representam a transfobia no Brasil.

Segundo o relatório, ainda há que considerar os casos não reportados e as mortes não registradas com motivação transfóbica pelos sistemas governamentais de segurança pública, que no Brasil são gritantes.

Para Kaio de Souza Lemos, homem trans, coordenador da Revista Estudos Transviades e do Instituto Brasileiro Transmasculinidades (IBRAT), a falta de boletins de ocorrência transforma a transfobia em um crime invisível, dificultando o mapeamento de políticas públicas.

Segundo ele, a escalada da violência contra as pessoas transgênero tem se confundido com o ambiente político, “marcada por um fundamentalismo da heteronormatividade e que reflete na falta de dados sobre a violência contra essa população”.

A jornalista e produtora de conteúdo trans, Helena Vieira, analisa que no Brasil ainda não se reconhece a categoria de violência contra pessoas trans.

“Precisamos falar de genocídio, pois a forma de funcionamento da violência no Brasil contra pessoas trans é, ao mesmo tempo, explicita por seus números e escondida, como se houvesse um acordo tácito de silenciar frente a essas mortes.”

Direito de existir e viver

O estudo LGBTIfobia no Brasil: barreiras para o reconhecimento institucional da criminalização publicado em 2021, pesquisa organizada pela All Out e coordenada pelo Instituto Matizes, aponta que, passados dois anos da decisão do STF, a criminalização da LGBTIfobia ainda não é uma realidade no país.

“As dificuldades de efetivar as denúncias se somam à resistência das forças de segurança pública e do sistema judicial em reconhecer e aplicar a decisão”.

O levantamento aponta 34 barreiras para o reconhecimento da criminalização contra essa população. A ausência de padronização dos sistemas estaduais de registro das ocorrências e o não reconhecimento do nome social de travestis e pessoas trans nos procedimentos de denúncia estão entre as barreiras sobre procedimentos institucionais apontadas pelo estudo.

A inexistência dos campos de orientação sexual e identidade de gênero nos sistemas de preenchimento de boletins de ocorrência (BO) é apontada como uma das barreiras sobre falta de transparência e opacidade do Estado.

Outros obstáculos são o baixo índice de preenchimento dos campos de orientação sexual e identidade de gênero, quando existem, e o preenchimento inexpressivo dos campos de motivação de crimes LGBTIfóbicos nos BOs.

Em outubro de 2021, o Jornal Hoje da Rede Globo, investigou o número de casos de homofobia e transfobia registrados nas delegacias a partir de um requerimento a todos os estados brasileiros, por meio das secretarias estaduais de segurança pública, via Lei de Acesso à Informação (LAI).

Apenas 15 estados e o Distrito Federal informaram os números, 10 estados disseram que seus sistemas que não permitem saber as próprias estatísticas em relação a esses crimes e o estado de Santa Catarina deu uma resposta inconclusiva.

Dos números informados à reportagem do jornal entre junho de 2020 e junho de 2021, foram contabilizados 135 crimes de homofobia e transfobia. Por outro lado, os dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) — citados no início dessa matéria — que tratam apenas dos crimes de transfeminicídio, são maiores que todos os dados de homofobia registrados no Brasil.

São 175 assassinatos cometidos contra travestis e mulheres trans só em 2020. No primeiro semestre de 2021 foram mortas 89 pessoas trans, segundo a associação: 80 assassinatos e 9 suicídios. A Antra registrou ainda nesse período 33 tentativas de assassinato e 27 violações de direitos humanos contra essa população.

A reportagem do Jornal Hoje também solicitou às secretarias estaduais de segurança pública os números de outros crimes contra a população LGBT+.

Nove estados não souberam responder, entre eles AM, RJ e MG. Dos estados que responderam à solicitação, foram contabilizados pela reportagem 1.726 registros de crimes com motivação homofóbica, um aumento de 21% em relação a 2019.

Desse total, foram registradas 813 ofensas (injúrias, difamações e calúnias), 335 ameaças e 237 agressões.

*Publicado no Brasil de Fato

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Por Celeste Silveira

Produtora cultural

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