Na semana em que Jair Bolsonaro xingou a mãe de um ministro do Supremo e ameaçou dar golpe para escapar da Justiça, dois personagens se destacaram pela omissão: o procurador-geral da República, Augusto Aras, e o presidente da Câmara, Arthur Lira. Ambos chegaram aonde estão com ajuda do presidente. Agora agem como cúmplices da escalada autoritária.
A Constituição afirma que cabe ao Ministério Público defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais. Aras ignora esses deveres para proteger quem o nomeou. Sua incúria expõe o Judiciário a desgastes e começa a gerar um clima de insurreição na PGR.
Na sexta-feira, 27 subprocuradores-gerais divulgaram uma carta pública de protesto. O texto afirma que o chefe da instituição não pode “assistir passivamente” aos “estarrecedores ataques” de Bolsonaro.
Aras transformou a PGR num peso morto em Brasília. Em vez de investigar, blinda o presidente contra investigações. Em vez de denunciar, acoberta crimes contra a saúde pública e a democracia.
Sua inércia era atribuída à ambição de alcançar uma vaga no Supremo. Ele foi preterido, mas parece ter se conformado com a recondução ao cargo que ocupa. A indicação já foi enviada ao Senado e deve ser aprovada sem percalços.
Na Câmara, Lira continua a segurar mais de uma centena de pedidos de impeachment. Sua omissão impede que o presidente seja julgado por múltiplos crimes de responsabilidade. E vale como incentivo para que continue a delinquir.
O deputado pilota o trator do atraso legislativo. Em sua gestão, a Câmara tem favorecido desmatadores e grileiros com o desmonte da legislação ambiental. A agenda econômica também virou uma janela para grandes negócios. A venda da Eletrobrás foi aprovada com jabutis que orgulhariam o ex-deputado Eduardo Cunha. Agora o Centrão esfrega as mãos diante da privatização dos Correios.
Lira cobra caro pelo silêncio diante dos desmandos presidenciais. Hoje ele comanda a distribuição de cerca de R$ 11 bilhões em emendas parlamentares. É o chefão do orçamento secreto, que lubrifica as votações de interesse do governo.
Na sexta, o deputado fez mais uma concessão ao extremismo. Anunciou que a emenda do voto impresso, derrotada em comissão especial, será votada de novo no plenário. A manobra dá sobrevida ao discurso golpista de Bolsonaro. E mantém o balcão aberto para negociações com o Planalto.
*Bernardo Mello Franco/O Globo
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