Sob os escombros de Gaza, a ONU e sua utopia.
Existe ainda 50% de chance de que seja uma criança. Apenas nas últimas 24 horas foram 756 vítimas que morreram, transformando hospitais em necrotérios onde faltam até sacos para embrulhar os mortos. Os dados do Ministério da Saúde em Gaza fazem parte do informe diário da ONU (Organização das Nações Unidas). Leia o informe completo aqui em inglês.
E, enquanto isso, a comunidade internacional assiste à destruição incapaz de reagir.
Sob os escombros de Gaza não estão apenas 1.600 corpos ainda não identificados. Soterrada está a ONU, incapaz de se reformar, impotente diante dos interesses das potências, silenciada diante de um mundo profundamente fraturado.
Em salões luxuosos em Nova York, Cairo ou Genebra, ministros e embaixadores das principais potências promovem uma triste cena de hipocrisia, cada qual usando a destruição ou o desespero de famílias de reféns para reposicionar seu país conforme interesses domésticos, eleitoreiros ou estratégicos.
Nesta quarta-feira, resoluções de americanos e russos foram mutuamente vetadas, enquanto um cerco medieval asfixia recém nascidos em incubadoras e escreve novas definições de crueldade nos dicionários do século 21.
Olho por olho, num espelho de uma era de vingança, não de Justiça. Assim, já diria Gandhi, ficaremos todos cegos. Pelo menos aqueles que ainda enxergam.
Nesta semana, famílias inteiras foram dizimadas, uma perda irreversível para a Humanidade. Crianças escrevem seus nomes nos próprios braços, na esperança de que, depois de uma vida de abandono, sejam pelo menos identificados na morte.
Como uma mancha no consciente coletivo, Gaza se soma a uma longa e insuportável lista de locais pelo mundo que, ao longo de décadas, foram desumanizados.
Presa sob seus escombros está a utopia de um mundo onde guerras poderiam ter leis e onde a humanidade poderia prosperar com base num ordenamento jurídico mínimo.
Os escombros de Gaza são os espelhos de um fracasso e um certificado de óbito de instituições criadas para garantir a vida.
*Jamil Chade/Uol