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Juízes têm 36% da remuneração em extras salariais e estão fora da reforma administrativa

Levantamento em 871 mil contracheques aponta gasto de R$ 12 bi em verbas que não compõem salário.

Poupados até agora da reforma administrativa, que visa cortar benefícios e penduricalhos na remuneração do funcionalismo público, os juízes brasileiros têm 36% de seus ganhos compostos por extras salariais de diversas naturezas.

Levantamento da Folha em 871,2 mil contracheques de magistrados, remetidos ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) por tribunais do país de setembro de 2017 a agosto deste ano, mostra que, de R$ 35,2 bilhões brutos desembolsados pelas cortes, R$ 12,6 bilhões cobriram “indenizações, direitos pessoais e eventuais”.

Nessas três cestas, pagas para além dos salários, estão benefícios como o terço de férias e o 13º salário, mas também uma gama de auxílios, como de alimentação, saúde, pré-escola e natalidade (para despesas iniciais com filhos); ajudas de custo; indenizações por até centenas de dias de férias acumulados; gratificações por substituição, exercício de magistério e cargos de presidência e representação.

Entram ainda jetons e diferentes outras verbas, não raro pagas retroativamente. O valor dos adicionais dá uma ideia da economia para os cofres públicos caso o país decidisse lipoaspirar não só a folha de pagamentos de servidores dos três Poderes, mas também a dos julgadores.

Em setembro, o governo Jair Bolsonaro encaminhou ao Congresso uma proposta de emenda à Constituição (PEC) com mudanças para, em meio à crise fiscal, supostamente racionalizar o serviço público e reduzir gastos com pessoal.

O texto atinge servidores do Executivo, do Legislativo e do Judiciário, mas não alcança o alto escalão desses Poderes (magistrados, parlamentares, promotores e procuradores do Ministério Público).

O Ministério da Economia alega que, por limitação constitucional, o governo não pode propor novas regras para essas carreiras, o que, como mostrou a Folha em outras reportagens, é contestado por parte dos juristas.

Um dos focos da PEC é o corte de extras. O texto proíbe adicionais por tempo de serviço e substituição, aumentos de remuneração ou de parcelas indenizatórias com efeitos retroativos, progressões ou promoções vinculadas ao tempo no cargo, indenizações sem previsão de requisitos em lei, além da incorporação de valores pagos pelo exercício de cargos em comissão e funções de confiança.

Também veda a aposentadoria compulsória como modalidade de punição, assegurada à magistratura.

Os dados levantados pela Folha são os informados pelos tribunais ao CNJ por força de uma resolução que os obriga a reportar as remunerações desde setembro de 2017.

As tabelas têm os pagamentos feitos desde então a juízes da ativa, aposentados e pensionistas das esferas de Justiça Estadual, Federal, Trabalhista, Militar e Eleitoral. Incluem conselhos (CNJ e CJF) e cortes superiores (STM, STJ, TSE e TST) —exceto o Supremo Tribunal Federal, que não se submete ao controle do CNJ.

Embora magistrados estejam, em teoria, sujeitos ao cumprimento do teto de remuneração do funcionalismo, equivalente ao subsídio (como é chamado o salário do juiz) dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), hoje em R$ 39,2 mil mensais, pressões da própria magistratura sobre seus órgãos de controle e sobre o Legislativo, bem como o vácuo legal sobre o tema, criam ambiente para que os tribunais, principalmente nos estados, instituam benesses e autorizem pagamentos de atrasados por conta própria.

A maioria dos extras não é considerada para o cálculo do limite. Os descontos para o cumprimento desse parâmetro da lei representam 0,8% do total de rendimentos e 2,2% dos adicionais.

Os holerites informados ao CNJ são mensais e têm embutidos o 13º e o terço de férias. Ou seja, em alguns meses, os valores são mais altos que o padrão com esses pagamentos.

Quase um quarto deles (203 mil) registra ganhos mensais entre R$ 50 mil e 100 mil; outro 1,6% (14 mil), entre R$ 100 mil e R$ 200 mil. Houve ainda 659 beneficiários de valores entre R$ 200 mil e R$ 500 mil; e 27 que ganharam mais de R$ 500 mil em algum mês.

Os três tribunais militares nos estados têm, em média, a remuneração mais alta do país: R$ 51,8 mil por contracheque —nas cortes de Minas Gerais e São Paulo, esse valor é de R$ 54 mil.

 

*Com informações da Folha