Madeireiro e dono de embarcações, Rosário Galate é, segundo líderes da região, autor de frases como “índio bom é índio morto”; ele também é amigo do atual prefeito, Denis Paiva (União-AM), e aliado do senador Eduardo Braga (MDB-AM).
“Esse Galate, quando ele era prefeito, ele dizia: índio bom é índio morto”, contou Djanin Kanamari, cacique da aldeia Massapê, a maior do Vale do Javari (AM), região conflituosa onde o indigenista Bruno da Cunha Araújo Pereira e o jornalista Dom Phillips desapareceram, no dia 05.
O líder dos autodenominados Tüküna se referia ao madeireiro Rosário Conte Galate, ex-prefeito e pai do atual vice-prefeito de Atalaia do Norte (AM), Giuliano Galate (PP-AM). Ambos são, além de aliados, amigos de Denis Linder Roges de Paiva (União-AM), que desde 2020 chefia o Executivo municipal, e do senador Eduardo Braga (MDB-AM).
“Esse cidadão não pode fazer isso, ele vai matar nós, ele tá matando lá a gente”. O depoimento foi feito em língua própria, durante uma audiência com o Ministério Público Federal (MPF), em 2018, e posteriormente traduzido. A tese de Doutorado de Danielle Moreira Brasileiro, apresentada no programa de pós-graduação em Sociedade e Cultura na Amazônia da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), cita esses e outros trechos para ilustrar a situação vivida pelos povos isolados daquela localidade e por quem, como Pereira, dedicou a vida a protegê-los.
Admirado e respeitado pelos moradores, o indigenista foi um dos entrevistados para o trabalho. Segundo ele, a maior preocupação à época era o atendimento de saúde dos autônomos e recém-contatados, dada a vulnerabilidade epidemiológica daquelas populações. Basta uma gripe ou um resfriado para colocá-las em risco. Situações de violência foram relatadas por diferentes fontes.
Elas contam que, à revelia dos Kanamari, Rosário Galate comandava a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), ligada à Fundação Nacional do Índio (Funai). “Ele era anti-indígena, ele não respeitava nossos parentes”, afirmou Djanin. A Sesai e a Funai foram citadas por Korá, outro líder Kanamari, como propagadoras de preconceitos, despreparo e qualificação no atendimento. Hoje, quem trabalha no órgão é Giuliano Galate Junior, filho do vice-prefeito.
Silvio Cavuscens e João Lino de Oliveira Neves destacaram em um artigo, mencionado na mesma tese, que várias serrarias se instalaram na região na década de 80; cinco delas, anos depois, ainda se encontravam lá, abastecidas com madeira proveniente da Terra Indígena (TI) Javari, a segunda maior do país e a maior do planeta em número de isolados. Os proprietários seriam Vitor Magalhães, Floriano Graça, Francisco Carvalho de Oliveira, Rosário Conte Galate e Walter Paiva. Este último é pai de Denis, o prefeito.
Os Galate também são donos de uma empresa de locação de embarcações, com sede em Benjamin Constant (AM), município vizinho a Atalaia. A unidade está, desde 2015, autorizada a operar na prestação de serviços de transporte na Região Hidrográfica Amazônica, nos trechos interestaduais de competência da União e em rotas internacionais para Peru e Colômbia.
INDIGENISTA PARTICIPOU DE OPERAÇÃO QUE DESTRUIU BALSAS ILEGAIS
Bruno Pereira havia deixado a coordenação regional da fundação e assumido o setor de isolados e recém-contatados. Acabou exonerado do último cargo em outubro de 2019, por pressão de ruralistas ligados ao governo de Jair Bolsonaro (PL-RJ), depois de coordenar uma operação que expulsou centenas de garimpeiros da TI Yanomami, em Roraima.
No mesmo período, ajudou a elaborar o plano conjunto com a Polícia Federal (PF) que flagrou sessenta embarcações ilegais explorando minérios no Javari. A Operação Korubo, como ficou conhecida, motivou a abertura de um procedimento por parte do MPF para identificar e punir os garimpeiros. O órgão alertou sobre a necessidade de um monitoramento constante na região.
Três dias depois da deflagração da Korubo, um grupo de parlamentares e representantes de garimpeiros foi recebido no Palácio do Planalto pelo ministro Onyx Lorenzoni, chefe da Casa Civil, para reclamar da destruição de retroescavadeiras, o que motivara o bloqueio da rodovia como protesto contra a fiscalização. O encontro foi noticiado pela Agência Pública.
Pereira estava licenciado, como fez questão de frisar o presidente da Funai, Marcelo Xavier, ao se esquivar da responsabilidade pela tragédia, e atuando como colaborador da União das Organizações Indígenas do Vale do Javari (Univaja). Conforme o jornal Brasil de Fato, em 2019 o indigenista denunciou o desmonte da Funai sob a gestão de Bolsonaro. “Servidores de carreira são retirados de cargos estratégicos”, alertou. A Funai está sendo tomada por interesses que não são dos índios”.
Coincidência ou não, o último post de Pereira no Twitter foi retuitando um caso de perseguição e assédio contra funcionários públicos, mas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Igualmente crítico ao governo, o agente Roberto Cabral Borges foi transferido do setor de operações da sede do órgão para a área administrativa.
Os protestos exigindo comprometimento do governo brasileiro nas investigações são tema do programa De Olho na Resistência:
PROCURADORES DO MUNICÍPIO DEFENDERAM “PRINCIPAL SUSPEITO”
Os procuradores municipais de Atalaia do Norte, Ronaldo Caldas da Silva Maricau, e de Benjamin Constant, Davi Barbosa de Oliveira, chegaram a atuar como advogados de defesa de Amarildo da Costa de Oliveira, de 41 anos, conhecido como Pelado. O homem foi detido na semana passada, em uma abordagem por posse de drogas e munição. Ele é apontado como suspeito de envolvimento no desaparecimento de Bruno Pereira e Dom Phillips.
Seguidores questionam prefeito nas redes sociais. (Foto: Reprodução)
Denis Paiva, cuja capa no Facebook é uma montagem dele estendendo as mãos para Rosário Galate, foi cobrado nas redes sociais. Diante da repercussão negativa, os dois deixaram o caso. Antes, porém, a Prefeitura de Atalaia publicou nota informando que Maricaua foi procurado pela família de Amarildo para atuar como advogado particular.
*Matéria publicada no De Olho de Ruralistas
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