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Temor de nova crise fez Alto-Comando apoiar decisão de isentar Pazuello

Comandante Paulo Sérgio considerava que punir ex-ministro obrigaria sua renúncia.

A decisão do Exército de isentar o general Eduardo Pazuello de punição por participar de ato político com o presidente Jair Bolsonaro foi tomada em conjunto entre o comandante e o Alto-Comando, composto por 15 oficiais de quatro estrelas, topo da hierarquia.

Foi, nas palavras de um dos integrantes do colegiado, uma “escolha de Sofia” —referência ao filme de 1982 no qual uma mãe judia tinha de decidir qual filho seria mandado para a câmara de gás.

Após ser confrontado com o pedido de Jair Bolsonaro para livrar Pazuello da punição, apresentado como a Folha revelou em viagem de ambos à Amazônia na semana passada, o comandante Paulo Sérgio Nogueira tinha duas decisões à frente.

Uma seria confrontar o chefe, como o Alto-Comando havia sugerido em sua maioria, punindo o ex-ministro da Saúde. Muitos defenderam a cadeia de 30 dias ou uma suspensão ao general, enquanto outros sugeriram penas mais brandas como advertência por escrito ou verbal.

Nesse caso, disseram conhecidos de Paulo Sérgio, a renúncia do comandante seria inevitável. Ou Bolsonaro anularia seu ato ou tornaria sua presença desconfortável, levando à segunda troca de comando na Força em dois meses.

A segunda opção, o salvo-conduto ao transgressor, ao aceitar os argumento inconvincentes apresentados por ele para estar no ato com Bolsonaro no Rio no dia 23 passado, seria péssima para a instituição, mas evitaria uma nova crise com o Planalto.

Assim, quando o Alto-Comando e Paulo Sérgio se reuniram virtualmente na quarta (2), a decisão já estava tomada desde domingo (30). O fato de que o ministro da Defesa, general da reserva Walter Braga Netto, ter secundado a posição de Bolsonaro teve peso central no desfecho.

Alguns generais ponderam o efeito cascata em questão, como indicam sinais de insubordinação de tropas de polícias militares para fazer valer a visão de Bolsonaro país afora.

De todo modo, o apaziguamento da questão foi colocado como prioritário, assim como a ideia de que será necessária dupla vigilância contra quaisquer movimentos políticos envolvendo militares da ativa.

Isso não significa que, apesar do apoio a Paulo Sérgio, o veredicto tenha sido bem digerido. Na tarde desta quinta (3), diversos oficiais-generais da três Forças lamentavam o desfecho do caso, dizendo que a hierarquia do Exército havia sido desafiada e derrotada.

Na mão contrária, havia o grupo restrito de militares que orbitam o Palácio do Planalto, mais precisamente a Casa Civil do general da reserva Luiz Eduardo Ramos.

Visto amplamente como o artífice da queda do seu ex-chefe Fernando Azevedo da Defesa em abril, Ramos tem questionado internamente as críticas a Pazuello feitas pelo vice-presidente Hamilton Mourão, um general de quatro estrelas da reserva como ele.

Para eles, a desculpa apresentada pelo ex-ministro da Saúde é suficiente para colocar fim à crise. A maioria dos militares ouvidos pela reportagem, mesmo simpáticos a Bolsonaro, discorda.

Ramos tem sido criticado no serviço ativo, que o vê como uma espécie de Raspútin de Bolsonaro, em alusão ao monge místico que influenciava de forma nefasta as decisões do último czar, Nicolau 2º. Outros apontam para o fato talvez mais óbvio, de que tudo é uma escolha do presidente.

No ano passado, o presidente chegou a cogitar a ida do auxiliar, seu mais antigo amigo da caserna, para o comando do Exército. Ramos teve de negar o episódio, tamanha foi a irritação que a sugestão criou, como a Folha mostrou à época.

Com a decisão, Paulo Sérgio considera estar ganhando tempo com o chefe, segundo aliados. Mas o episódio deixará marcas internas, para não falar no risco efetivo de anarquização da hierarquia que ele implica.

Ele chegou ao comando na esteira da crise militar de abril, que viu derrubados Azevedo e toda a cúpula das três Forças, devido à vontade rejeitada de Bolsonaro de angariar apoio fardado às suas ideias contra medidas restritivas à circulação do novo coronavírus.

Dias antes de sua escolha, por antiguidade, ele havia contrariado Bolsonaro e Ramos ao defender políticas de contenção à Covid-19 numa entrevista, na mão contrária do preconizado pelo presidente.

As reações iniciais em outras Forças foi contida, assim como entre parlamentares. A ideia geral no mundo político é de, à exceção dos elementos mais oposicionistas, tentar buscar abafar a crise, tal a gravidade dos fios desencapados.

Outros observadores consideram que o estrago está feito, apesar da tentativa conciliatória de Paulo Sérgio. Notam que seu antecessor, Edson Leal Pujol, levou até o fim suas convicções que o separavam de Bolsonaro.

Um almirante, observando o caso a uma distância mediana, considera que ao fim, nesta versão tupiniquim do filme Sofia teve de entregar os dois filhos para a morte, e não apenas a menina Eva.

*Mônica Bergamo/Folha

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