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Intolerância

Terreiros de umbanda e candomblé marcham contra intolerância religiosa no entorno do DF

Terreiros de umbanda e candomblé na região de Águas Lindas de Goiás, cidade que fica no entorno do Distrito Federal, realizaram um protesto, nesta segunda-feira (2), contra episódios recentes de intolerância religiosa ocorridos no município. O ato foi chamado de I Marcha do Povo de Axé de Águas Lindas e reuniu centenas de pessoas com faixas e cartazes.

Terreiros de umbanda e candomblé na região de Águas Lindas de Goiás, cidade que fica no entorno do Distrito Federal, realizaram um protesto, nesta segunda-feira (2), contra episódios recentes de intolerância religiosa ocorridos no município. O ato foi chamado de I Marcha do Povo de Axé de Águas Lindas e reuniu centenas de pessoas com faixas e cartazes.

“Esse ano a gente passou por duas situações muito sérias, a primeira ficou nacionalmente conhecida, que foi a invasão de um terreiro, durante a perseguição ao Lázaro. E, no mês passado, a gente teve a destruição de uma loja de artigos religiosos. Então, a gente está aqui pra exigir respeito, exigir que a gente possa professar nossa religião em paz e coexistir com as demais”, firmou Rubens Bias, conselheiro de saúde do DF e filho de santo do terreiro Sol do Oriente.

O ato percorreu algumas das principais ruas do centro de Águas Lindas. A cidade fica a 50 km de Brasília.

Racismo religioso

O caso mais recente de intolerância contra religiões afro na cidade ocorreu no dia 21 de março deste ano, quando a loja Iansã Ilê, de materiais religiosos, foi invadida e depredada por uma pessoa que se dizia “cristã”. Imagens de orixás e outros materiais próprios do culto das religiões afrobrasileiras também foram quebrados.

O segundo caso foi a abordagem violenta ao terreiro de Pai André, ocorrido em 15 de junho de 2021, localizado na região de chácaras do município. Policiais motivados pela busca de Lázaro Barbosa, então procurado pelo assassinato de uma família na Ceilândia (DF), adentraram o espaço religioso, bateram no caseiro da chácara e quebraram objetos religiosos.

Ao menos dez terreiros da região sofreram alguma abordagem considerada violenta durante a força tarefa empreendida para a prisão de Lázaro. “A nossa religião é a única que a gente sempre fala de intolerância. Até quando nós vamos falar de intolerância religiosa?”, afirmou Mãe Beth de Iansã, yalorixá do Terreiro Sol do Oriente.

Casos semelhantes também têm ocorrido no Distrito Federal. No dia 23 de março, um homem armado com um facão invadiu o terreiro Ilê Axé Omò Orã Xaxará de Prata/Ofa de Prata, situado na zona rural de Planaltina, e destruiu diversas esculturas de orixás que ficavam expostas no local.

Só no ano passado, foram registradas 22 ocorrências de discriminação religiosa em todo o DF, de acordo com a Secretaria da Segurança Pública. A grande maioria contra terreiros e religiões de matriz africana.

Segundo a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (MMFDH), no ano passado foram registradas 571 denúncias de violação à liberdade de crença, mais do que o dobro (243) das denúncias registradas em 2020.

Reivindicações

Entre as reivindicações da I Marcha do Povo de Axé de Águas Lindas estão a realização de um mapeamento dos terreiros existentes no município, a instalação de uma delegacia de crimes raciais, nos moldes da que já existe no DF, a instalação de uma ouvidoria para casos de crimes religiosos, além da criação de um espaço público municipal e um dia de celebração direcionado à cultura afro-brasileira.

Os terreiros também solicitam a participação da cultura afro-brasileira na Feira Cultural de Águas Lindas do Goiás, a criação de um Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial, tal como a garantia da voz dos afro religiosos nas instâncias governamentais que discutem políticas públicas.

*Com Brasil de Fato

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Cotidiano

Manifesto repudia invasão da polícia a terreiros nas buscas por Lázaro

Representantes de religiões de matriz africana publicaram nota de repúdio às ações da polícia nos terreiros da região de Águas Lindas, Girassol e Edilândia.

As autoridades afro tradicionais de religiões de matriz africanas publicaram, neste sábado (19/6), uma nota de repúdio contra as ações que a força-tarefa realiza nas buscas por Lázaro Barbosa. Segundo os relatos obtidos pelo Correio, algumas casas de candomblé foram visitadas diversas vezes ao longo dos 12 dias de buscas por Lázaro, que continua foragido. Nessas operações, alguns agentes chegaram a agredir um caseiro, amassar portas e quebrar cercas.

Confira na íntegra o manifesto:

As autoridades afro tradicionais e organizações representativas dos povos tradicionais de Matriz Africana, abaixo assinadas, vêm a público manifestar seu repúdio aos violentos ataques racistas praticados contra as casas de matrizes africanas na Região de Águas Lindas, Girassol, Cocalzinho e Edilândia em Goiás, na tentativa de nos vincular ao foragido conhecido como Lázaro e aos crimes a ele atribuído.

Consideramos intoleráveis as invasões e abordagens policiais truculentas injustificadas, bem como a campanha difamatória propagada por diversos veículos de comunicação.

Afirmamos veementemente que nossas tradições não têm relação com atos criminosos, e, mesmo que fossem praticados por alguma pessoa que pertencesse a uma tradição afro, não nos vincularia de maneira coletiva a atos e ações criminosas e desumanas. Estes atos devem ser sempre atribuídos pela lei à pessoa civil.
Entretanto, estamos sendo atacados de maneira vil e racista sob o falso pretexto de estarmos servindo de abrigo ao foragido.

São graves os relatos de depredação dos nossos territórios mediante intimidação e agressões físicas.
As imagens dos alegados “rituais satânicos” que estão sendo divulgados pela mídia foram produzidas pela própria polícia durante uma invasão e quebra das portas de uma de nossas casas.

O que de fato estas imagens retratam são elementos sagrados de nossas divindades, especificamente ligadas ao culto ao Orixá Exu e aos exus guardiões de Umbanda. Estes apetrechos nunca pertenceram ao procurado e nem tampouco guardam relação com o satanismo, referência que não faz parte da cosmogonia e mitologia afro.

Trata-se de um vilipêndio ao nosso culto e aos nossos valores civilizatórios, sendo, inclusive registrado o Boletim de Ocorrência nº 19925673, Estado de Goiás, Secretaria de Segurança Pública, em 18/06/2021.

Quando uma de nossas comunidades é atacada todas se sentem igualmente agredidas. Nossa visão de mundo, nossos princípios e valores civilizatórios merecem respeito.
Tamanha violência só se torna possível fundamentada no racismo estrutural presente em nossa sociedade. E por razão deste todos os nossos símbolos e vivencias continuam sendo alvo de diversas violações.

Exigimos que o assédio e violação dos nossos espaços cessem imediatamente com a apuração e responsabilização das forças policiais pelas agressões a nós impostas.

Exigimos que o Estado Brasileiro, laico em sua constituição, garanta a liberdade e integridade dos nossos territórios tradicionais, liturgias e referenciais de mundo afro centradas.

Exigimos também que os meios de comunicação de massa param de vincular ideias negativas e criminosas a nossas casas e tradições, inclusive com a divulgação deste manifesto.

Apoiamos o esforço policial em consonância com os ditames legais na garantia da segurança de toda sociedade, respeitando toda nossa diversidade, no efetivo cumprimento do dever que lhe é imposto.

Por fim, nos solidarizamos com as vítimas e familiares dos acontecimentos brutais tão amplamente divulgados e nos colocamos à disposição para quaisquer esclarecimentos e apoio à toda sociedade.

Que seja feita justiça! Reparação já

Águas Lindas de Goiás, 19 de junho de 2021.

Assinam este manifesto as lideranças, organizações e unidades tradicionais abaixo:

Tata Ngunzetala – Tumba Nzo Mona Nzambi
Pai André de Yemanjá – Terreiro Estrada da Vida
Babá Eduardo Fomo de Omolu, Ilê Asé Esin Fadaká
Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de matriz Africana – FONSANPOTMA
Babá Dídio de Ogum – Axé Imùná
Ilê Axé Odé Erinlé – Pai Ricardo César de Oxóssi
Baba Obalajô – Ilê Asé Egbé Alááfin Oyo
Mãe Abadia de Ogum – Axé Ogum Onilè Dubo
Iya Monna Janaina – Ilê Axé Morada
Iyalorisá Ana Paula Ti Osún – Centro de Cultura e Arte Axé da Casa Amarela- Aladé Osún
Mãe Bel do Ilé Axé Olona
Dirigente Ruan Frederic Neves Ribas – Tenda de Umbanda São Gerônimo e Santa Bárbara, Mãe Fátima – Aldeia dos Encantados

*Com informações do Correio Braziliense

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Cultura

Sobre João Gilberto e o povo brasileiro

O comentário fundamental de tantos que eu li sobre João Gilberto, num festival de paspalhices conceituais, não veio, não foi colocado na cena. Muito se falou do imponderável, mas nada se falou do essencial, daquilo que traduz a alma de um artista. No caso de João Gilberto, a essência de sua batida, de sua harmonia e de toda a estética que o cercava era pelo simples fato de ser um brasileiro e, como tal, captar do cosmos nativo aquilo que era precisou para consagrar sua obra.

No Brasil, sobretudo depois de 1960, exalta-se demais coisas importantes, mas sem qualquer importância na obra de um artista, como é o caso do jazz. Isso é uma espécie de grilagem cultural. Um artista do peso de João Gilberto seria inadmissível se não fosse essencialmente brasileiro, porque este é o fato indivisível, a obra e o meio. O artista retira o novo do que o povo concebe como novo. Não tem como um artista exilar-se do seu meio, pois, sem ele, um conjunto de qualidades e expressões cria-lhe uma alma de pedra, sem lhe dar o verdadeiro mérito que é carregar consigo a força misteriosa de um observador que traduz em sua arte o sentido criativo do seu povo.

Então, fere-se com redondilhas retóricas o caráter essencial de uma cultura. João Gilberto empregou em sua obra toda a escala melódica que caracteriza a obra brasileira. Na realidade, João Gilberto representa a verdadeira vitória daquilo que dá a tônica da música brasileira, não importando ser bossa nova, samba, choro, frevo e tantas linguagens musicais deste Brasil macunaímico que não se impõe por uma característica, mas por uma livre e aguda emancipação de qualquer caráter definitivo.

Há na essência da obra de João Gilberto os terreiros, as bandas de coreto, as orquestras, o maior e mais completo conjunto de sons de geografia genérica. Não interessa se o João Gilberto era baiano, carioca, capixaba, gaúcho e etc., isso é uma leitura que, ao invés de buscar a razão da riqueza de sua obra, busca nomenclaturas.

Ora, em João há a batida do coco, da chula raiada, do partido alto, do jongo, do congo, maracatu, do tambor de mina, de crioula, enfim, há tudo o que está na essência do Choro, naqueles vários formatos de samba que traduzem a natureza de nossa música com um estupendo caráter libertário.

 

*Por Carlos Henrique Machado Freitas