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Ministério da Saúde planejou dispensar garantia na compra da Covaxin antes de aceitar fiança irregular

Manobra foi registrada em termo de referência que balizou confecção de contrato para compra da vacina indiana.

Segundo matéria de Vinicius Sassine, Folha, o Ministério da Saúde chegou a prever, em documento que balizou o contrato para compra da vacina indiana Covaxin, a dispensa da necessidade de garantia por parte das empresas contratadas.

Depois, a pasta do governo de Jair Bolsonaro aceitou uma garantia irregular apresentada pela intermediadora do negócio, a Precisa Medicamentos, como revelou a Folha na última quarta-feira (14).

O termo de referência para as negociações sobre a Covaxin, elaborado por dois servidores do ministério em 17 de fevereiro, estabelecia que não haveria “garantia contratual da execução”.

A dispensa contrariava exigência prevista em MP (medida provisória) editada em janeiro para a compra de vacinas e também pontos da lei de licitações e contratos públicos.

Assinam o termo de referência o assessor técnico Thiago Fernandes da Costa e o diretor do Departamento de Imunização, Lauricio Monteiro Cruz.

Costa é réu em processo na Justiça Federal em Brasília aberto em razão de calote de R$ 20 milhões dado ao ministério pela Global Gestão em Saúde, dos mesmos donos da Precisa.

Ex-ministro da Saúde e líder do governo Bolsonaro na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR) também é réu. O servidor diz que assinou papéis que seguem diretrizes da cúpula da pasta.

Monteiro Cruz, por sua vez, foi demitido do cargo no último dia 8 em razão de uma suposta participação no mercado paralelo de vacinas, investigado pela CPI da Covid no Senado. Ele teria dado aval para que um reverendo negociasse doses inexistentes da AstraZeneca em nome do governo.

Após reuniões internas na pasta, a dispensa da garantia foi detectada e eliminada do termo de referência. Documentos sobre essa mudança indicam que a dispensa se estenderia à compra da vacina russa Sputnik V, negociada com o governo pela União Química.

O termo passou a prever, então, a necessidade de uma garantia no valor de 5% do total contratado —R$ 80,7 milhões de R$ 1,61 bilhão destinados à compra da Covaxin.

Conforme o termo de referência, essa garantia deveria ser dada num prazo de dez dias após a assinatura do contrato, por meio de uma de três modalidades possíveis: caução em dinheiro ou em títulos da dívida pública, seguro-garantia ou fiança bancária. Essa previsão foi transferida para o contrato, assinado em 25 de fevereiro.

ao ministério uma “carta de fiança” emitida pela empresa FIB Bank Garantias S.A., sediada em Barueri (SP). A carta afiança o valor de R$ 80,7 milhões. A Precisa aparece como “afiançada”. O “beneficiário”, conforme o documento, é o Ministério da Saúde, por meio do Departamento de Logística em Saúde da Secretaria-Executiva.

Naquele momento, o diretor do departamento era Roberto Ferreira Dias e o secretário-executivo, coronel Elcio Franco, a quem cabia a negociação de vacinas.

O primeiro foi demitido após entrevista à Folha de um vendedor de vacinas na qual o acusou de cobrança de propina no mercado paralelo de imunizantes. O segundo é alvo central da CPI da Covid e tem hoje um cargo de confiança na Casa Civil da Presidência.

A própria FIB Bank descreve o documento entregue ao ministério como uma “fiança fidejussória”. O site da empresa também afirma que o serviço prestado é o de “garantia fidejussória”, que consiste em uma “garantia pessoal, seja ela de pessoa física ou jurídica”.

O contrato entre Ministério da Saúde e Bharat Biotech, assinado pela Precisa Medicamentos no papel de representante, não prevê garantia do tipo pessoal.

A Precisa também descumpriu o prazo para apresentação da garantia, o que foi aceito pelo ministério sem contestação. A “carta de fiança” da FIB Bank foi emitida e assinada em 17 de março, dez dias depois do prazo contratual. O vencimento estipulado foi 17 de março de 2022, também distinto do especificado pelo ministério.

ocumentos da contratação mostram ainda que a área do diretor Roberto Dias tratou uma garantia fidejussória, bem mais frágil do que as modalidades previstas em contrato, como um seguro-garantia.

“Encaminhamos a apólice de seguro-garantia para a guarda da coordenação-geral de execução orçamentária e financeira”, cita um despacho de 22 de março, cinco dias após a assinatura da “fiança”.

A “carta fiança”, então, foi registrada no Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira) do governo federal, tendo como favorecida a Precisa Medicamentos.

À Folha a FIB Bank confirmou que não está cadastrada no Banco Central e que não é uma instituição financeira, tampouco uma empresa seguradora. Trata-se de um “fundo garantidor de crédito, que atua com a oferta de garantias fidejussórias”, afirmou em nota à reportagem.

“A companhia está devidamente constituída, conforme previsto em lei, e tem regular registro perante os órgãos de administração pública”, disse a FIB Bank. “O patrimônio da companhia está lastreado em bens imóveis integralizados em seu capital social, assim como bens e direitos e moeda corrente.”

O Ministério da Saúde e a Precisa Medicamentos não responderam aos questionamentos da reportagem sobre a garantia dada no negócio.

O contrato da Covaxin está suspenso desde o último dia 28, por determinação da Corregedoria-Geral da União, que funciona no âmbito da CGU (Controladoria-Geral da União).

Na CPI, durante o depoimento prestado na última quarta-feira, a diretora-técnica da Precisa, Emanuela Medrades, foi questionada pelos senadores sobre a existência de garantia no negócio, como prevê o contrato. Ela respondeu que existe, mas sem fornecer detalhes a respeito da garantia dada.

A garantia fidejussória é como se fosse um aval pessoal, sendo bem mais frágil do que as outras garantias especificadas no contrato para a compra da Covaxin, conforme especialistas ouvidos pela reportagem.

A própria expressão usada pela FIB Bank, “fiança fidejussória”, causa estranheza, segundo esses especialistas. A garantia dada deve ser acionada em caso de descumprimento de cláusulas pela Precisa. O objetivo é garantir a “operação financeira e logística” do contrato.

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Servidor da Saúde, réu com Ricardo Barros, atuou em compra da Covaxin pelo governo Bolsonaro

Fernandes da Costa afirma que desconhecia relação entre empresas Global e Precisa; CPI da Covid avalia ouvir servidor.

Mateus Vargas, Folha – Réu em ação de improbidade ao lado do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e da Global Gestão em Saúde, o servidor Thiago Fernandes da Costa (Ministério da Saúde) atuou na compra da vacina indiana Covaxin.

O servidor Fernandes da Costa assina papéis como o termo de referência, documento que baliza a elaboração do contrato para a compra do imunizante indiano. A negociação do governo de Jair Bolsonaro para a compra da Covaxin é alvo de apurações da CPI da Covid no Senado e da Procuradoria.

A existência de denúncias de irregularidades em torno da compra da Covaxin foi revelada pela Folha no dia 18, com a divulgação do depoimento sigiloso do servidor Luis Ricardo Miranda (Ministério da Saúde) ao Ministério Público Federal. Desde então, o caso virou prioridade da CPI da Covid.

Esse mesmo servidor e seu irmão, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), disseram à comissão do Senado que alertaram Bolsonaro sobre as supostas irregularidades. Sobre isso, o presidente diz apenas que não tem como saber o que acontece nos ministérios.

Sobre o servidor Fernandes da Costa, ele é réu em um caso relacionado à compra de medicamentos de doenças raras. Ele respondeu com a Global Gestão em Saúde em uma ação que também atinge Barros, atual líder do governo Bolsonaro na Câmara.

Barros era ministro da Saúde em 2017, quando a sócia da Precisa recebeu antecipadamente R$ 20 milhões por medicamentos de doenças raras que nunca foram entregues. A Global é sócia da Precisa Medicamentos, empresa que fechou contrato para a venda da Covaxin, fabricada pela Bharat Biotech.

Sócio-administrador da Precisa e representante da empresa nas negociações com o governo, Francisco Emerson Maximiano é o presidente da Global. Ele deve ser ouvido pela CPI nesta semana. O fato de Fernandes da Costa ser réu na ação civil que envolve a Global também está no radar da comissão.

Em nota enviada à Folha, Fernandes da Costa afirmou que desconhecia a relação entre a Global e a Precisa. Disse ainda que não atua em atos decisórios da pasta e que apenas assinou papéis que seguem diretrizes da cúpula do ministério e da coordenação do PNI (Programa Nacional de Imunizações).

Senadores da CPI querem ouvir Fernandes da Costa. Isso porque ele foi um dos contatos enviados ao servidor Ricardo Miranda por superiores que pediam celeridade na importação da vacina.

Barros ainda está no centro da apuração sobre a Covaxin. Segundo o deputado Miranda, o presidente ligou o líder do governo às supostas irregularidades.

“Esse pessoal, meu irmão, tá foda. Não consigo resolver esse negócio. Mais uma desse cara, não aguento mais”, teria dito Bolsonaro ao receber as suspeitas, segundo o deputado relatou à Folha.

No caso da Global, o MPF apontou em denúncia que Fernandes da Costa não cumpriu uma ordem para desclassificar empresa de um certame.

“Referidos atos atrasaram sobremaneira a desclassificação da Global e a aplicação de penalidades à licitante, além da cobrança dos valores que lhes foram antecipados indevidamente, resultando em claro prejuízo ao erário”, afirmou a Procuradoria.

Em nota, Fernandes da Costa disse que tem função operacional e administrativa no DEIDT (Departamento de Imunização de Doenças Transmissíveis), “formalizando os instrumentos necessários para aquisição, com base nos pareceres técnicos das coordenações do departamento”.

Ele afirmou que não conhecia a relação entre a Global e a Precisa.

Segundo o servidor, os documentos que tratam da compra da Covaxin foram formalizados com base em diretrizes da Secretaria-Executiva da pasta e em nota da CGPNI (Coordenação-Geral do Programa Nacional de Imunização).

“Ressalta-se que a instrução do processo seguiu o mesmo padrão utilizado na contratação do Instituto Butantan, a quem também nos foi incumbida a sua formalização em dezembro de 2020”, afirmou ele, que é concursado há mais de 12 anos.

Fernandes da Costa disse também que as suas atividades não tratam de “ato decisório” para a compra. Ele não participou das discussões sobre a compra firmada com a Global, em 2017.

“Cheguei ao DLOG (Departamento de Logística em Saúde) dois meses após o ocorrido. Menos de um mês após minha chegada, instrui novos processos para o abastecimento de todos os pacientes que estavam com seu medicamento em atraso por conta dessa situação”, disse ele.

O servidor também afirmou que recebeu com surpresa a notícia de que foi denunciado pelo MPF por causa da compra do governo com a Global, a sócia da Precisa. “Mas tenho certeza que tudo ficará esclarecido no decorrer do processo judicial”, declarou.​

Em 25 de fevereiro a Precisa fechou contrato de R$ 1,6 bilhão para venda de 20 milhões de doses da Covaxin ao Brasil. Cada dose foi negociada por US$ 15, maior valor entre as vacinas contratadas pelo governo.

Barros divulgou uma nota neste domingo (27) para rebater suspeitas apresentadas na CPI da Covid. Apesar de o líder do governo na Câmara ter entrado no centro da investigação da CPI da Covid, integrantes do Palácio do Planalto afirmam que, por enquanto, ele deve permanecer no cargo.

Em reunião da CPI, o servidor Ricardo Miranda disse aos senadores que havia erros na documentação apresentada pela Precisa ao Ministério da Saúde.

Segundo o servidor, a invoice (fatura) exigida pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para liberar a importação estava no nome da Madison, uma empresa de Singapura, ligada à Bharat, que não é citada no contrato da Covaxin.

O documento ainda citava pagamento antecipado de US$ 45 milhões pelas doses, que estariam próximas do fim da validade. Estes dados eram diferentes do que havia sido registrado no contrato do governo com a Precisa, disse o servidor.

O documento com supostas falhas foi levada ao presidente Bolsonaro no dia 20 de março, segundo os depoentes. Entre 23 e 24 de março, o papel foi retificado duas vezes pela Precisa, a pedido dos técnicos do ministério, e passou a registrar que o desembolso só ocorreria após a chegada das doses.

O servidor Ricardo Miranda disse que mesmo assim não quis assinar os papéis exigidos para importação. O documento ainda estava no nome da Madison e apresentava erro no volume de doses que embarcaria, segundo ele.

Ricardo Miranda disse que o pedido de importação, que seria negado, só prosseguiu após o aval fiscal do contrato Regina Célia Silva Oliveira, servidora da Saúde que deve ser chamada à CPI.

O embarque das doses só foi liberado no último dia 4, sob restrições. As doses, porém, ainda não chegaram, e o governo avalia anular o contrato da Covaxin.​

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