Em 2016, TCU proibiu que presidentes armazenassem itens do acervo, motivo pelo qual ordenou a devolução de bens.
Segundo O Globo, cinco anos antes da Receita Federal apreender um conjunto de joias avaliado em R$ 16,5 milhões como um presente do governo da Arábia Saudita à então primeira-dama, Michelle Bolsonaro, o Tribunal de Contas da União (TCU) proibiu que ex-presidentes ou entidades armazenassem itens do acervo presidencial. A medida, decretada em 2016 em meio a operação Lava-Jato, resultou na devolução de 472 presentes que estavam nos acervos particulares de Lula (PT) e Dilma Rousseff (PT). Apenas os itens de consumo próprio foram excluídos desta conta. Na época, os dois já não estavam mais no posto.
A norma do TCU sobre todos itens recebidos pelos presidentes da República nas cerimônias e encontros com outros chefes de Estados. Apenas os itens de natureza pessoalíssima, como medalhas personalizadas, ou de consumo direto (bonés, camisetas, gravatas) foram excluídos desta conta. Neste sentido, a atitude de Jair Bolsonaro (PL) contraria este princípio legal já que, de acordo com o TCU, os presentes não pertencem ao presidente em exercício, mas ao Estado brasileiro.
À princípio, à época, o TCU identificou 568 bens recebidos por Lula e 144, por Dilma que deveriam ser devolvidos. Em seguida, a Presidência da República criou uma comissão especial, integrada por nove servidores, que se dedicou a vasculhar relações de bens no Sistema de Gestão de Acervos Privados da Presidência da República. A partir dessa busca, a comissão constatou que o número correto de objetos levados por Lula e Dilma, que deveriam ser devolvidos à União, era de 434, para Lula, e de 117, para Dilma. Em maio de 2017, os representantes fizeram o resgate dos bens.
No caso de Lula, apenas 360 dos 434 objetos foram encontrados, restando 74 presentes perdidos, com valor calculado em R$ 199.436,04. Já Dilma devolveu 111 dos 117 e informou que os seis faltantes estavam nas dependências da Presidência. Apesar das baixas, os ministros do TCU consideraram os trabalhos cumpridos e o processo que apurava o caso foi arquivado em outubro de 2020 pelo Ministério Público Federal (MPF).
A reformulação na lei
Antes da definição do acórdão do TCU, a lei 8.394/1991, do governo Fernando Collor de Mello, era usada para legislar sobre a preservação dos acervos documentais privados dos presidentes da República.
“Os documentos que constituem o acervo presidencial privado são, na sua origem, de propriedade do presidente da República, inclusive para fins de herança, doação ou venda”, dizia trecho.
Sem ter outra previsão legal para tratar especificamente dos presentes, o artigo foi usado, por anos, como uma forma de incorporar o patrimônio público aos bens do mandatário, com exceção dos itens recebidos nas solenidades de troca de presente.
Foi apenas em 2016 que a legislação foi reformulada pelo acórdão do TCU de número 2255/2016, que trazia como base o princípio constitucional de moralidade. No julgamento, os ministros abordaram a falta de previsão legal ou regras para o recebimento de presentes.
O relator do caso, o ministro Wallton Alencar, argumentou, nos autos, que os presentes dados a outros chefes de Estado são pagos pela União. Logo, os itens recebidos também deveriam ser públicos.
“Imagine-se a situação de um chefe de governo presentear o presidente da República do Brasil com uma grande esmeralda de valor inestimável, ou um quadro valioso. Não é razoável pretender que possam incorporar-se ao patrimônio privado do presidente da República, uma vez que ele os recebe nesta pública qualidade”, diz Alencar em trecho.
Pela lei, qualquer bem com valor superior a US$ 1.000 precisa ser declarado à Receita Federal ao entrar no país. Por se tratar, segundo alegou Bento Albuquerque, de um presente oficial, o conjunto de diamantes poderia ser liberado do pagamento do imposto de importação, mas nesse caso seria declarado patrimônio da União — e não um bem de Michelle Bolsonaro.
Todos os presentes recebidos de chefes de Estado são catalogados pela Diretoria de Documentação Histórica da Presidência da República, que fica encarregada de preservar o acervo durante o mandato do chefe do Executivo federal que recebeu os itens. Depois de deixar a Presidência, o ex-mandatário passa a ser responsável pela conservação de tudo, recebendo o apoio do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para isso.
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