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Governo alemão diz que não vai tolerar mentiras de Bolsonaro, alerta embaixador

Resultado de uma coalizão entre social-democratas, verdes e liberais, com Olaf Scholz como sucessor da chanceler Angela Merkel, o novo governo da Alemanha vai intensificar as medidas contra o aquecimento do planeta e aposta no fortalecimento da União Europeia. Em entrevista ao Globo, o embaixador alemão em Brasília, Heiko Thoms, explica que os dirigentes europeus seguem as vontades políticas de seus eleitores, os consumidores. Uma das consequências da mudança de governo será o aumento das pressões sobre o Brasil para que o desmatamento tenha fim. Segundo o diplomata, um grupo pequeno de pessoas que descumpre a legislação nacional prejudica os interesses dos produtores brasileiros. Ele revelou que especialistas do governo lhe disseram que o índice de desmatamento ia cair, quando na verdade aumentou, segundo a medição do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais divulgada no dia 18 de novembro.

O que o senhor destacaria no novo governo alemão?

Temas como desmatamento, clima e sustentabilidade vão crescer muito mais, tanto na Alemanha como na União Europeia. O governo anterior já se interessava bastante por essa questão, mas o novo governo vai se interessar ainda mais, porque nós temos agora o partido Os Verdes, os social-democratas e os liberais, que têm uma forte agenda verde. Existe um consenso na Alemanha e é importante compreender que esses temas não são da esquerda ou de uma direção política em especial, mas sim de todos os partidos, à exceção da extrema direita. E mesmo os conservadores e os da direita falam da necessidade de proteger a criação divina. O clima vai ser um tema prioritário para todos os ministérios, em todas as áreas, tanto na política externa como na construção de prédios e no tráfego.

As pressões sobre o Brasil vão continuar?

Dentro do contexto da União Europeia, a Alemanha é obrigada por lei a implementar as metas do bloco e as metas do Acordo de Paris, como o governo brasileiro. Nós não exigimos mais do Brasil do que nós exigimos de nós mesmos. E temos grandes desafios. Por exemplo, decidimos que vamos parar de utilizar o carvão em 2030, ao invés de 2038. E também vamos parar de usar o gás metano em 2040. É um desafio muito grande.

Existe um projeto de lei apresentado pela União Europeia ao Parlamento que proíbe a importação de alguns produtos que forem extraídos de áreas desmatadas. Os brasileiros têm razão de estarem preocupados?

Estou convicto de que os brasileiros deviam se preocupar, porque é uma questão muito séria, e vamos conseguir [aprovar a matéria no Parlamento]. Esse projeto, neste momento, está sendo discutido em nível muito claro pela União Europeia e essa direção não vai mudar.

Governo e exportadores brasileiros argumentam que há produtos que não são mais extraídos de locais desmatados. E afirmam que está havendo confusão por parte dos europeus.

Há um mal-entendido no sentido de que os investidores e os consumidores de fora do Brasil sabem diferenciar entre Amazônia, Pantanal e Mata Atlântica. Ele não sabe se a carne, por exemplo, vem de uma área desmatada, porque as cadeias produtivas não são muito claras, são sempre obscuras. O Brasil poderia trabalhar com a UE em cadeias produtivas mais transparentes.

O Brasil deveria adotar metas mais ambiciosas, para conter o aquecimento global?

Nós não exigimos que o Brasil mude a sua posição, mas que a legislação brasileira, que proíbe o desmatamento ilegal, seja cumprida. O Código Florestal do Brasil é muito avançado, muito bom. Quem agride a soberania nacional é aquele que não cumpre a lei brasileira.

Na semana passada, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais informou que houve um crescimento de 22% da área desmatada na Amazônia entre agosto de 2020 e julho de 2021. O que achou desse resultado?

O desmatamento existe, e é alto. Um crescimento de 22% é significativo. E, antes da publicação, nós ouvimos — não oficialmente, mas falamos muito com os especialistas do governo — que haveria uma queda de 5%. E nós acreditamos nisso. E, de repente, ficamos sabendo que houve um crescimento de 22%. Essa foi uma grande surpresa negativa.

Governo e empresários brasileiros afirmam que a União Europeia pratica o protecionismo comercial disfarçado de preocupação ambiental…

Não existe protecionismo ambiental. Essa é uma reação da União Europeia às vontades políticas dos consumidores, que também são eleitores. O Brasil deveria mostrar que tem recursos, pessoal e orçamento para cumprir os compromissos feitos na COP26.

Como as autoridades alemãs e europeias veem os produtores do agronegócio brasileiro?

Percebemos que, neste momento, no Brasil há muito greenwashing [quando empresas e marcas criam uma falsa aparência de sustentabilidade, sem praticá-la]. Mas eu queria enfatizar que a maioria dos produtores brasileiros é muito séria, muito transparente e não está envolvida no desmatamento, de jeito nenhum. Nós sabemos disso.

Mas, para o consumidor, é muito importante ver a diferença. Nos supermercados, você não sabe se determinado produto teve um elemento de desmatamento. Essa é uma realidade política. Nós temos os fatos, e os fatos são sempre muito importantes, mas as percepções políticas também são importantes. E, em nossa opinião, um grupo relativamente pequeno de pessoas que desmatam prejudica os interesses dos outros produtores no Brasil. E nós queremos trabalhar com os atores brasileiros sérios, com o governo, com os estados, para remover esse obstáculo.

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