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Um líder incompetente lidera gente mais incompetente do que ele. É o caso de Bolsonaro e Heleno

Mais que mentiras, Bolsonaro, em seu discurso na ONU, deu ao mundo provas de sobra de sua incompetência.

Mas um líder incompetente, não é incompetente sozinho. Para ser 100% incompetente como neste caso, precisa liderar gente mais incompetente que ele, porque a incompetência gera a insegurança e esta gera a mentira.

Por isso nenhuma pasta do governo Bolsonaro funciona. São quase dois anos sem que nenhum de seus liderados apresentasse um mínimo de benefício ao país.

Assim, a mentira, a falsa polêmica e a agressividade são as únicas armas que os incompetentes têm. E não é isso que se vê transbordar nesse governo liderado por um incompetente.

Bolsonaro não quer ministros, quer bajuladores. E o general Augusto Heleno é um, o pior, o mais bajulador entre os bajuladores de um governo cravejado de inúteis, de ministros nulos que desprezam o conhecimento e a ciência porque os consideram inimigos da sua falta de conhecimento.

Na verdade, Bolsonaro chegou ao poder por incompetência da direita em derrotar o PT e Bolsonaro foi o enterro dos ossos da sobra de incompetentes que governaram o país e o jogaram num abismo, como foi o caso de FHC, Collor e Sarney, os três que, de maneira direta ou indireta, participaram do golpe contra Dilma.

O ódio e o rancor promovido pela direita em parceria com a mídia também é fruto dessa mesma incompetência e, por isso foram derrotados seguidamente, porque não têm projeto de país. E não têm projeto de país por não ter competência para isso, para entender o país e buscar soluções.

O método oficial da direita sempre foi contraproducente para a população, é só pegar o histórico dos governos de direita, civil ou militar, o resultado sempre foi trágico e não será diferente com um governo que tem um sujeito de baixíssimo nível como principal guru de um inútil, um nulo como Bolsonaro.

E por que aqui se chama a atenção para isso? Porque o próprio ombudsman da Folha chama a atenção para algo que não está limitado ao jornal, mas de todos os brasileiros que acaba por achar normal os absurdos, as mentiras e o resultado trágico de um governo que não tem a mínima compreensão de como administrar a máquina pública que fará colocá-la a serviço da sociedade.

Nós brasileiros estamos entorpecidos pela acomodação de acreditar que o famoso “novo normal” é a estupidez estatutária, é o limite protocolar que, na verdade, é o limite de um governo, porque é o máximo que as instituições cobram desse pensionato de generais da reserva que são comandados pelo supremo engodo chamado Augusto Heleno, o homem de confiança de Bolsonaro.

É difícil imaginar uma atitude tão infantil, fuleira de alguém de quem se espera, no mínimo, uma atitude menos primitiva.

O twitter do general é um festival de baixarias que mostra de que tipo de pobreza intelectual é nutrido esse ambiente de magnífica estupidez que governa o país.

Segue abaixo um tira-gosto do nível dessa gente, o que explica a barafunda em que o Brasil está enfiado, a quantidade de vítimas mortais da Covid-19, a vista grossa dos militares para os crimes do clã e os incêndios recordes na Amazônia e no Pantanal que formam um pacote de delinquência que assombra o planeta.

Essa postagem feita pelo general Heleno diz tudo sobre quem governa o Brasil. E é dessa gente que partiu o discurso proferido por Bolsonaro na ONU.

 

*Carlos Henrique Machado Freitas

 

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Política

Janio de Freitas: Governo Bolsonaro deve ser principal processado por política de devastação no Pantanal

Da decisão do presidente vieram cortes de verbas, redução dos quadros técnicos e científicos e nomeações de dirigentes inabilitados.

O governo Bolsonaro deve ser o primeiro e principal processado pelo crime de devastação incendiária do Pantanal. As leis de proteção ambiental e numerosos acordos internacionais de que o Brasil é signatário, assim como a própria Constituição, foram e continuam transgredidos na meticulosa desmontagem do sistema de vigilância, prevenção e combate às agressões ao patrimônio natural. Esta é, notoriamente, uma rara política de governo em um governo sem políticas.

É notória, aqui e no mundo, a responsabilidade pessoal e direta de Bolsonaro. Da sua decisão vieram os cortes de verbas, a redução dos quadros técnicos e científicos, e as nomeações de dirigentes inabilitados em setores como Ibama, Funai, ICMBio, INPE, e os outros de importância vital para a Amazônia, o Pantanal e os povos indígenas.

Queimadas no Pantanal continuam

“Amazônia tem 2º pior agosto de desmate, atrás só de 2019” (já governo Bolsonaro). “Em 14 dias, Amazônia queimou mais que em setembro de 2019.” Títulos como estes recentes, da Folha, sucederam-se desde a posse de Bolsonaro. E, por consequência, a do executor do projeto de desmonte da proteção ambiental, Ricardo Salles —já condenado por improbidade na secretaria do Meio Ambiente de um governo paulista de Geraldo Alckmin.

A indiferença de Bolsonaro ao clamor interno e internacional, a cada pesquisa de desmatamento e queimadas, só não foi completa por suas provocações e represálias administrativas. Entre elas, a demissão escandalosa do cientista Ricardo Galvão, conceituado presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais que divulgou, como de hábito e do seu dever, o crescimento alarmante da devastação amazônica no então novo governo.

Brasil em chamas

Constatado que o fogo no Pantanal tornava-se incontrolável, a explicação foi imediata: não era tanto pelo fogo, mas pela falta de equipes habilitadas para combatê-lo. Explicação complementar: a verba deste ano para combatentes a queimadas, em comparação com a de 2019, foi cortada em mais de metade. A dimensão da tragédia pantaneira não estava prevista, mas o fogaréu na Amazônia já exigia maior investimento, e não perda de verba.

Acima das necessidades está a política contra a Amazônia e a riqueza ambiental. Com mais provas oferecidas pelo próprio governo. O Orçamento para 2021 mandado por Bolsonaro ao Congresso, por exemplo, corta ainda mais os recursos dos setores de monitoramento, defesa e pesquisa visados pela destruição programada.

Essa política transgride a legislação. É criminosa. Proporciona a apropriação de terras do patrimônio da União, o desmatamento e o contrabando de madeira valiosa. Protege o garimpo ilegal e se incorpora a toda essa criminalidade. Bolsonaro e seu governo são passíveis de processo criminal — e o merecem.

Voz séria

A esquerda brasileira está chamada a refletir sobre o apoio incondicional a Nicolás Maduro e ao regime venezuelano. O mais recente relatório a pedir “investigações imediatas” do governo Maduro, sobre torturas e execuções extrajudiciais, saiu sob a responsabilidade de Michelle Bachelet. Alta comissária do Conselho de Direitos Humanos da ONU, a ex-presidente do Chile não se confunde com instrumentos da guerra de propaganda e outras guerras dos Estados Unidos contra o governo Maduro.

Conquistas proporcionadas à maioria desde sempre desvalida, mantidas ou mesmo ampliadas por Maduro, não se confundem com criminalidade política.

Em cena

Durante alguns dias, as notícias foram inflando: a equipe econômica quer congelar aposentadoria por dois anos, governo quer cortar R$ 10 bilhões do auxílio a idosos e pobres com deficiências, senador bolsonarista (Márcio Bittar, MDB-AC) quer congelar salário mínimo. Então Bolsonaro saca a espada e salva os ameaçados. Com a TV devidamente preparada para o ato. Quem de nada desconfiou tem, ainda, uma chance. O que Abraham Weintraub fez para receber cargo precioso, quando deveria ser excluído do governo pelos insultos vagabundos ao Supremo e seus ministros? Nada. A menos que alguém lhe devesse uma compensação, por se dar mal em um gesto, como diziam, a pedidos.

 

*Janio de Freitas/Folha

 

 

 

 

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O Pantanal antes – O Pantanal no governo Bolsonaro

Os incêndios criminosos no Pantanal, que já atingem quase metade das terras indígenas na região, são mais um marco da política genocida de Bolsonaro com o aval dos militares de seu governo submisso aos interesses privados.

Bolsonaro, assim como faz com a gravidade da pandemia que já matou quase 140 mil brasileiros, minimiza as queimadas no Pantanal e da Amazônia que também arde em chamas.

O compromisso de seu governo é com os criminosos, sejam eles das milícias cariocas ou dos gananciosos que destroem florestas públicas para lucro privado.

As terras indígenas do Xingu ardem em chamas, mas Bolsonaro parece se divertir com a destruição, com a tragédia e com o caos.

A perversidade de Bolsonaro também é marketing para agradar os loucos como ele.

Causador de sofrimento, de infelicidade e de tragédia, Bolsonaro mistura crueldade com estratégia eleitoral, recorrendo à barbárie como campanhas publicitárias de seu governo.

Esse composto tóxico, ao que tudo indica, será sua grande aposta para a manutenção de seu governo ancorado nos interesses do conjunto dessas atividades criminosas.

 

*Carlos Henrique Machado Freitas

 

 

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Política

Vídeo: Incêndios já tomam quase metade das terras indígenas no Pantanal

Dados indicam que parte das queimadas começou em terras privadas; indígenas relatam que “fogo veio de fora” e “destruiu tudo”.

No Mato Grosso, focos começaram em áreas de reserva legal próximas a terra indígena.
Servidor denuncia que governo previu aumento de queimadas, mas demorou a agir.
Indígenas são maioria dos brigadistas do Ibama no Mato Grosso, que pedem mais recursos.

Apenas em setembro, 164 focos de incêndio avançaram sobre terras indígenas (TIs) no Pantanal. Mais de 200 em agosto. Quase metade das áreas indígenas regularizadas na região já enfrenta queimadas – que têm cercado aldeias, destruído casas e plantações e levado a internações por problemas respiratórios.

As conclusões são resultado de um levantamento da Agência Pública a partir de dados de satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A apuração, que analisou todos os focos de incêndio registrados no Pantanal em 2020, revelou que o número começou a aumentar no final de julho, mas explodiu em agosto e setembro – 72% dos focos do ano ocorreram apenas nesses meses.

Os dados de satélite revelam também que, em alguns dos locais que mais sofreram com as queimadas, os focos de incêndio surgiram e se multiplicaram primeiro em propriedades privadas para depois tomar as TIs. Além disso, parte do fogo teve início em áreas de reserva legal e de mata nativa de donos de terra, que são protegidas por lei e devem ser preservadas.

“O fogo entrou de uma hora para outra”, “tudo está acabando”, dizem indígenas

“O fogo se iniciou de fora da terra indígena. Quando veio, veio com tudo, entrou de uma hora para outra”, relata à reportagem o educador indígena Estêvão Bororo, conhecido como Estevinho. A Pública procurou Estevinho depois de ter verificado, nas imagens de satélite, que a TI Tereza Cristina, do povo Bororo, estava tomada por focos de incêndio. O território, que fica numa área de transição do Cerrado para o Pantanal no município de Santo Antônio do Leverger, registrou 86 focos de incêndio, 81 deles apenas nas duas primeiras semanas de setembro.

“A terra é cortada pelo rio São Lourenço: a margem esquerda do rio pegou fogo, cercou duas aldeias, queimou uma ponte. Depois, o fogo avançou em direção à aldeia Córrego Grande, que foi a mais impactada. Veio com tudo, cercou até mesmo as residências. Apesar de não ter pego fogo nas casas, nosso líder precisou ir para Rondonópolis porque inalou muita fumaça. Temos idosos, gestantes, puérperas [mulheres que pariram recentemente], crianças”, relata Estevinho.

Segundo o indígena, as queimadas haviam começado primeiro fora do Pantanal, na área de Cerrado da TI Tadarimana, que fica no município vizinho de Rondonópolis – região de plantações de soja, algodão e milho. Estevinho conta que, em julho, incêndios tomaram 60% da Tadarimana. Já agora em setembro, com a migração das queimadas para a área da Tereza Cristina e de outras terras dos Bororo no Pantanal, indígenas precisaram sair de suas casas e se refugiar justamente na Tadarimana, que enfrentou as queimadas antes.

Indígenas relataram que, terra Tadarimana, próximo a Rondonópolis e fora do Pantanal, sofreu antes com as queimadas. Pessoas precisaram ir para lá quando as queimadas passaram à terra Tereza Cristina, em agosto e setembro.

A situação é crítica também na Baía dos Guató, terra do povo Guató, no município de Barão de Melgaço, vizinho de Santo Antônio do Leverger. Os dados de satélite do Inpe registram 57 focos de incêndio na área em setembro e 85 em agosto. Quase toda a extensão da terra foi tomada por focos.

“As queimadas destruíram roças, queimaram casas. O fogo destruiu uma parte bem grande do nosso território, destruindo muitas árvores, animais, aves, prejudicando nossa fauna e flora e a nossa segurança alimentar, porque destruiu nossas roças. Estamos muito preocupado com as nossas matas porque é delas que retiramos o nosso sustento, as nossas medicações tradicionais. Com a queimada, tudo isso está comprometido. Não encontramos mais muitas ervas que usamos para tratar das enfermidades e também a palmeira acuri, que utilizamos para fazer cobertura das casas tradicionais e alguns utensílios, e pra fazer a chicha, uma bebida tradicional. Tudo está acabando”, desabafa Alessandra Guató.

 

A terra dos Guató fica próxima ao Parque Estadual Encontro das Águas, que também foi tomado por focos de incêndio: foram 456 apenas em agosto e setembro. Segundo reportagem do G1, 85% da área do parque foi destruída pelas queimadas.

O território dos Guató é um exemplo de como focos de incêndio podem proliferar em propriedades privadas para depois atingir TIs e unidades de conservação. No início de agosto, quase não havia focos de incêndio ao norte da terra dos Guató. Com o passar dos dias, eles passaram a ser registrados em áreas de reserva legal e mata nativa dentro de propriedades privadas ao norte da área indígena. Em seguida, surgiram incêndios dentro da TI. Ao final do mês de agosto, já havia focos em quase todo o território indígena, e 36 foram registrados em apenas um dia.

Cinco TIs registram incêndios; três parques estaduais e federais também

Ao todo, a Pública encontrou focos de incêndio em cinco TIs regularizadas nos municípios do Pantanal: cerca de metade das 11 da região. A área indígena com mais focos é também a maior, a TI Kadiwéu, dos Terena e Kadiwéu, no Mato Grosso do Sul. Foram 176 focos desde maio deste ano, a maior parte deles em agosto.

A reportagem procurou a Funai, questionando sobre a situação das terras e qual apoio os indígenas têm recebido, mas não obtivemos resposta.

Além disso, em todo o Pantanal há focos de incêndio em três parques estaduais, em um nacional, em uma área de proteção ambiental, em duas reservas particulares e em uma estação ecológica.

Todos os municípios do Pantanal registraram focos de incêndio entre julho e setembro. Poconé e Barão de Melgaço, no Mato Grosso, foram os com maior número – o Parque Estadual Encontro das Águas está localizado nesses dois municípios.

Aumento de queimadas era previsto, mas governo demorou a agir, denuncia servidor.

A Pública conversou com um agente do PrevFogo, do Sistema Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais, que não quis se identificar por medo de represálias. Segundo o servidor, os monitoramentos meteorológicos já apontavam a intensificação das queimadas em 2020, com as temperaturas acima da média e as chuvas abaixo. De acordo com ele, o planejamento estratégico do órgão contava com a antecipação da contratação de brigadistas para trabalhar na prevenção das queimadas.

Contudo, o edital de contratação, que costuma ser publicado em meados de abril, só foi aberto em 23 de junho. O edital abriu 60 vagas para brigadistas indígenas no Mato Grosso do Sul, nas aldeias Taunay Ipegue, Limão Verde, São João e Alves de Barros, nos municípios de Aquidauana e Porto Murtinho, além de 29 brigadistas não indígenas em Corumbá, município recordista das queimadas no Brasil. Já no Mato Grosso, 46 vagas foram abertas para as brigadas nos municípios de Cotriguaçu e Serra Nova Dourada. Nenhuma em território indígena.

Para o servidor, o atraso na contratação prejudicou as ações de prevenção do órgão. “A gente acredita que isso prejudicou bastante o nosso trabalho. A nossa previsão era trabalhar a prevenção no mês de junho, para que a gente tivesse uma temporada um pouco menos pior do que estamos tendo”, relata.

A reportagem questionou o Ibama sobre a demora na contratação de brigadistas e sobre as ações que o órgão está tomando para combater as queimadas. O órgão não respondeu até a publicação da reportagem.

Em 20 de agosto, o presidente Jair Bolsonaro admitiu em uma live que a situação do bioma é grave, mas alegou que as dificuldades impostas pelo tamanho da região e “questões ideológicas”, como a proibição da criação de gado solto, pioraram o quadro. “A gente faz o possível, mas a oposição vai continuar botando a culpa em mim do fogo da Amazônia, do fogo do Pantanal, mas vamos tocar o barco. Como se nunca tivesse pegado fogo nessa região.” No dia 15 de setembro, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou que o fogo no Pantanal “tomou proporções gigantescas”.

Maioria dos brigadistas no Mato Grosso são indígenas, que pedem mais recursos

Além de serem afetados pelo fogo que avança pelo Pantanal, os indígenas são uma parte da força que tenta impedir a destruição de seus territórios. Segundo o último edital do Ibama para brigadistas no Mato Grosso do Sul, das cinco brigadas existentes no estado, quatro são indígenas. A reportagem questionou o órgão sobre a quantidade de brigadas indígenas no Mato Grosso, mas não obteve resposta.

Para Eliane Bakairi, da Federação dos Povos Indígenas do Mato Grosso (Fepoimt), o número de brigadas é insuficiente, principalmente em territórios mais afetados, como a Baía dos Guató e a TI Perigara, em Barão de Melgaço. “Conversando com o cacique Roberto, ele disse que o fogo passou por lá na aldeia Perigara. E o fogo queimou tudo, queimou toda a TI. Conversando com o pessoal dos Guató, também a situação é bem complicada lá. As brigadas são insuficientes, o PrevFogo sofreu cortes orçamentários e isso está sendo sentido nas brigadas, mas o Pantanal continua queimando”, critica.

As brigadas fazem parte do Programa Brigadas Federais do PrevFogo, do Ibama, que deve realizar o controle, a prevenção e o combate a incêndios florestais. Contudo, segundo reportagem da Deutsche Welle, entre 2019 e 2020 o governo federal reduziu em 58% a verba destinada ao centro, um corte de R$ 13,79 milhões, que impactou a contratação de brigadistas para prevenção e o controle de incêndios florestais.

Para Eliane Bakairi, é necessário expandir as brigadas além de fortalecer as já existentes, “o Pantanal está queimando, por que não aumenta o contingente de pessoas? Por que não investe em mais carro, mais material de combate? Se não tivesse o recurso, mas tem. Sempre há cortes, mas nesse governo a gente tem sentido mais os cortes, cortes de pessoal, cortes de investimento no combate ao fogo, no combate ao desmatamento. Nos outros também aconteciam, mas não com essa intensidade”, questiona.

A crítica de Estêvão Bororo é parecida: “É imprescindível que as terras indígenas tenham equipes de brigadistas”, diz. “Aprendemos a lição: dizem que não podemos montar brigada porque tem corpo de bombeiros próximo. A terra Tereza Cristina está a 120 quilômetros de Rondonópolis, distante 200 quilômetros da sede do município de Santo Antônio de Leverger, longe de Cuiabá. Se tivéssemos apoio para manter a brigada, teríamos equipes de vigias, grupos de guarda à noite, equipe para fazer os aceiros [quando se retira vegetação para impedir avanço do fogo]. Teríamos poder de prevenção mais consolidado”, avalia.

Para ele, as brigadas indígenas devem ser apoiadas institucionalmente pelos governos federal e estaduais, que devem ter responsabilidade de custear as equipes, mas também de oferecer treinamento e atuar junto às organizações dos próprios indígenas.

As brigadas indígenas se queixam, além do corte de investimento, da pandemia. Um agente do PrevFogo, que conversou anonimamente com a reportagem, explicou que o órgão optou por isolar as brigadas indígenas para evitar o contágio dos brigadistas. O receio é que indígenas se infectem e levem o vírus para as suas comunidades.

O programa de brigadas indígenas foi criado em 2013 por um acordo entre a Funai e o Ibama. Os brigadistas indígenas são contratados temporariamente durante seis meses, recebendo um salário mínimo. De acordo com a Funai, atualmente existem 39 brigadas indígenas atuando em todo o Brasil.

Assim como na Amazônia, Ibama multa cada vez menos no Pantanal

Com o governo Bolsonaro, o Ibama tem aplicado menos multas em todo o Brasil – e a situação se repete no Pantanal. Segundo dados coletados pela Pública, no primeiro ano de mandato do presidente houve redução de 71% na quantidade de multas relacionadas à flora no Pantanal, em comparação ao ano anterior. Multas nessa categoria incluem infrações decorrentes de desmatamento e queimadas ilegais, por exemplo.

A diminuição se manteve em 2020. Até o final de agosto, foram registradas 21 multas nos municípios do Pantanal, menor número de multas da década, comparando-se os mesmos meses. No ano anterior, esse número foi mais que o dobro, com 54 multas aplicadas na região entre janeiro e agosto de 2019.

Dos 16 municípios que fazem parte do Pantanal, dez tiveram queda na aplicação de multas em 2019 em relação a 2018. Entre eles está Corumbá, cidade com o maior número de focos de incêndio registrados nesta temporada e onde se investiga um possível início criminoso das queimadas no Mato Grosso do Sul.

“As pessoas acabam se sentindo livres para poderem cometer crimes ambientais, e isso vem sendo reforçado pelo próprio presidente”, diz à reportagem um brigadista do Ibama, em condição de anonimato. Segundo ele, o órgão tem encontrado dificuldades para embargar propriedades e destruir o maquinário utilizado nas infrações ambientais, o que compromete a fiscalização.

A reportagem procurou o Ibama, sobre a razão da diminuição das multas e se isso poderia incentivar crimes ambientes. O órgão não respondeu.

Em agosto, a Pública revelou situação parecida na Amazônia, onde as multas caíram em regiões com aumento de desmatamento. Na última terça-feira (15), a Polícia Federal deflagrou a Operação Tokens, que investiga fraudes no sistema de multas do Ibama em territórios da Amazônia Legal. Criminosos tinham acesso ao sistema de infrações, tirando o embargo de áreas multadas.

O fogo se espalha – e a desinformação também

Apesar de integrarem brigadas que combatem as queimadas, indígenas e brigadistas têm sido acusados nas redes sociais como responsáveis por elas no Pantanal. Em mensagens em grupos no WhatsApp, um grupo de indígenas é apontado por incendiar a vegetação. Contudo, de acordo com Eliane, trata-se de indígenas que, contratados pelo próprio Ibama, utilizam técnicas de queimada controlada, antes do período dos incêndios, justamente para evitar que estes se espalhem descontroladamente.

Conteúdos falsos compartilhados em redes sociais acusam indígenas e brigadistas de provocarem queimadas. Técnicos utilizam fogo controlado para retirar parte da vegetação, impedindo que incêndios se espalhem ainda mais

“Alguns fazendeiros em grupos de WhatsApp acusaram de serem os indígenas que tinham iniciado o fogo lá, e não é bem isso. Pelo contrário, a gente sabe que é o meio de queima de roça, que faz foco de fogo por causa disso”, conta Eliane Bakairi, da Federação dos Povos Indígenas do Mato Grosso.

De acordo com a Eliane, os indígenas são alvo também de acusações sobre a chegada do coronavírus na região. “Até o próprio Covid, somos acusados de levar o Covid. E não é verdade. Quem que trouxe pra gente? Como sempre, é o não indígena, e é o não indígena que tem dinheiro que traz as coisas ruins. Que vai passando pra todo mundo até chegar nos povos tradicionais”, desabafa.

Vídeos de brigadistas fazendo o manejo controlado do fogo foram utilizados para culpá-los pelos incêndios no Pantanal. O conteúdo falso afirmava que os funcionários do ICMBio tinham a intenção de prejudicar a imagem do presidente. “Existe todo um estudo técnico e científico para prescrever esse uso do fogo. E era isso que estava sendo feito naquele vídeo que circulou. Esse tipo de informação falsa que corre desconstrói todo um trabalho de anos que a instituição vem fazendo justamente para impedir que os incêndios florestais ocorram”, diz Luciano Pereira, morador de Cáceres e integrante do Conselho Internacional dos Monumentos e Sítios (Icomos).

Metodologia da análise de dados:

1) Download dos dados abertos de multas aplicadas pelo Ibama. Foram exportadas, no dia 31 de agosto, as planilhas dos estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.

2) Limpeza das planilhas

– Unimos as planilhas do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.

– Filtramos os municípios que fazem parte do Pantanal (Aquidauana, Barão de Melgaço, Bodoquena, Cáceres, Corumbá, Coxim, Itiquira, Ladário, Lambari d’Oeste, Miranda, Nossa Senhora do Livramento, Poconé, Porto Murtinho, Rio Verde de Mato Grosso, Santo Antônio do Leverger e Sonora) e removemos as outras cidades da planilha.

– Filtramos as entradas de multas aplicadas no período de janeiro de 2011 a agosto de 2020 e removemos os registros de 1985 a 2010.

– Os registros duplicados foram removidos, totalizando 911 multas para análise, que podem ser vistas nesta planilha.

3) Download e limpeza dos dados de queimadas: a partir de dados do satélite de referência (AQUA-MT), fizemos a exportação dos dados espaciais de focos de queimadas no Pantanal em todo o ano de 2020.

4) Cruzamento entre os dados de geolocalização das áreas queimadas, áreas de conservação e TIs no Pantanal com os dados de Cadastro Ambiental Rural, para identificar se os primeiros focos de incêndio ocorreram em imóveis privados. O resultado pode ser conferido aqui.

 

*Bianca Muniz, Bruno Fonseca, Raphaela Ribeiro/Agência Pública

 

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Aluga-se o Brasil: Bolsonaro quer alugar o Pantanal, Forte de Copacabana e mais 200 pontos turísticos do Brasil

Jair Bolsonaro está colocando em marcha um plano imenso para transformar áreas públicas, praias, cachoeiras, lagoas e zonas de preservação ambiental em empreendimentos turísticos privados. Tive acesso a documentos internos do Ministério do Turismo que mostram como isso está se desenvolvendo de maneira acelerada no governo de Bolsonaro — um entusiasta da criação de “Cancúns” brasileiras.

Um dos documentos é uma planilha produzida no primeiro semestre deste ano que lista 222 propriedades da União espalhadas por 17 estados e Distrito Federal, que o governo quer passar para a iniciativa privada explorar (clique aqui para ver a lista completa). São indicações feitas pelos governos estaduais a pedido do governo federal. Há desde prédios históricos e terrenos em locais privilegiados a parques nacionais e ilhas. Até mesmo um parque no Pantanal está entre os alvos do governo — com 135 mil hectares, quase o tamanho da cidade de São Paulo, o Parque do Pantanal Matogrossense hoje não tem infraestrutura turística alguma.

A lista será consideravelmente maior. Os outros 9 estados, entre eles São Paulo, ainda não haviam respondido ao pedido do Ministério do Turismo por áreas da União em seus territórios que seriam de interesse turístico para uma eventual concessão à iniciativa privada.

Claro que essas áreas não serão todas concedidas ao mesmo tempo, e haverá modelos diferentes de concessão e destinação. Mas o projeto, que o governo deverá anunciar ainda neste ano, segue as bases de um programa iniciado há três anos pelo governo de Portugal.

O Revive, como será chamado também no Brasil, concede construções históricas sem uso e/ou em estado deteriorado para empresas privadas, com vistas ao turismo. Isso não envolve simplesmente um trabalho de restauração. Somente neste ano, nove patrimônios históricos portugueses foram colocados à disposição, entre conventos, mosteiros e até um castelo. Todos eles irão virar hotéis, com 50 anos de concessão à empresa vencedora da licitação (há um concurso para cada local). Neste momento, o governo português está recebendo propostas de grupos hoteleiros e outros interessados em transformar o Mosteiro de Travanca, em Amarante, uma joia beneditina colocada de pé quatro séculos antes de Pedro Álvares Cabral chegar ao Brasil.

A presença hoteleira no programa é gritante, embora não conste da propaganda pública do governo português a informação de que o Revive é, na prática, um esforço de fortalecimento da rede de leitos no país. Não houve ainda nenhum caso bem-sucedido de licitação de imóvel do governo português para outra finalidade que não a transformação em hotel (embora em alguns casos, como mosteiros, as capelas sejam mantidas para a visitação pública).

Um dos herdeiros do grupo Pestana, o maior representante da indústria hoteleira de Portugal, preside a estatal portuguesa Instituto Turismo de Portugal, responsável pela execução do programa Revive, desde a seleção das áreas até os procedimentos de definição das empresas que irão obter a concessão para exploração comercial dessas áreas. Luís Inácio Garcia Pestana Araújo, 49 anos, não é um mero herdeiro. Ele já foi responsável pelo avanço do grupo Pestana na América do Sul e pelo desenvolvimento de novos projetos no continente. Até 2005, foi ainda vice-presidente do grupo no continente, chefiando as operações do Pestana no Brasil.

Turismo para português ver

O governo brasileiro já conheceu o programa de perto. Em junho, quatro funcionários do Ministério do Turismo passaram uma semana em Portugal visitando o Revive. O mais bem ranqueado nessa comitiva foi o assessor especial do ministro Marcelo Álvaro Antônio, Mateus von Rondon Martins – menos de um mês depois ele foi preso temporariamente suspeito de envolvimento no esquema das candidaturas laranjas do PSL em Minas Gerais.

A implantação do Revive no Brasil virou prioridade no Ministério do Turismo. Depois de reuniões internas, mais de duas semanas depois do retorno da comitiva, Marcelo Álvaro Antônio mandou um ofício para Babington dos Santos, secretário de Integração Interinstitucional, demandando que, em um mês, fosse elaborada “uma proposta de um programa similar a ser implementado no Brasil”. Em outro documento interno, uma funcionária do Ministério do Turismo pontua que “as concessões no turismo (…) poderiam reposicionar a relevância do ministério na esplanada”.

Dito e feito. Em exatamente 30 dias, no dia 24 de julho, uma apresentação de PowerPoint com 13 slides para uma proposta preliminar estava pronta. No início de setembro, um plano de trabalho completo foi finalizado, prevendo a implementação do programa neste ano, mas com uma série de passos ainda a serem tomados ao longo de 2020 até que a licitação do projeto-piloto seja executada.

Nessa discussão interna, um ponto importante foi a definição de que o Ministério do Turismo abriria mão da mera inspiração portuguesa para andar de mãos dadas, oficialmente, com o Instituto Turismo de Portugal na reprodução do Revive no Brasil. Quem deu a direção internamente foi o assessor Mateus Martins. Ele indicou, segundo ata da reunião que obtive, que “seria mais estratégico seguir com o modelo implementado em Portugal, que já dispunha de metodologia e processos pré-definidos, além da possibilidade de orientação por parte da equipe do Turismo de Portugal, o que facilitaria a implementação do programa no Brasil”, argumento repetido pelo Ministério do Turismo quando os questionei sobre o modelo de parceria.

A decisão coloca poder nas mãos dos portugueses — do setor público e privado. O plano de trabalho prevê, por exemplo, que o desenho do imóvel piloto do programa no Brasil será definido em conjunto com os portugueses.

Há candidatos para esse posto na planilha dos imóveis da União. O próprio ministério já definiu que o piloto poderá partir dessa lista, a partir de três filtros aplicados ao levantamento. Dos 222 imóveis, ficaram 34 para serem usados numa adaptação mais direta do Revive – ou seja, têm que ser necessariamente edificações (não valem terrenos neste momento) e que estejam já no Mapa do Turismo brasileiro.

Entre as prioridades definidas estão, no Rio de Janeiro, o Forte de Copacabana, o Forte do Leme, o Museu Aeroespacial, o Museu do Exército, o Forte da Conceição, o Observatório Nacional, a Fortaleza São João e o Cais Imperial de Sepetiba. Em Brasília, estão a Praça dos Três Poderes, o Teatro Nacional, a Ermida Dom Bosco e a Praça do Cruzeiro.

Por e-mail, a assessoria de imprensa do ministério disse que não há nada definido e que o piloto irá focar em prédios desocupados, levando em conta tanto a distribuição geográfica quanto “a relação do imóvel com a cultura lusófona”.

Na definição de qual será o imóvel piloto, vale prestar atenção às movimentações do Vila Galé, segundo maior grupo hoteleiro de Portugal, atrás do Pestana. A empresa esteve na linha de frente da implementação inicial do programa na Europa. Foi justo o primeiro hotel viabilizado com o programa, erguido sobre a estrutura de um convento na região do Alto Alentejo, que recebeu a comitiva liderada por Mateus Martins durante parte da passagem por Portugal em junho.

No Brasil, o Vila Galé já está sendo pioneiro. No último dia 24 de setembro, o grupo assinou um termo de compromisso com o governo da Bahia. Os portugueses farão um “estudo de viabilidade técnica, econômica e jurídica” para um “Projeto de Intervenção” no prédio sede do Palácio Rio Branco, para a “instalação de empreendimento hoteleiro de nível superior (hotel de luxo)”. Pelo prazo previsto no acordo, o estudo deve estar concluído até o Natal. O palácio foi centro de decisão e residência oficial dos primeiros governadores do Brasil e vice-reis de Portugal ainda no século 16 e seguiu assim até o início do século passado, quando foi bombardeado numa revolta.

Ainda em junho, o secretário de Turismo da Bahia, Fausto Franco, deu o tom do que está por vir. “Estamos mapeando imóveis que podem ser incluídos numa primeira etapa, a fim de impulsionar a instalação de novos restaurantes, hotéis, cafeterias, lojas de artesanato e outros equipamentos que ativem o mercado turístico, com desenvolvimento econômico”, disse o secretário.

A cúpula do Vila Galé é convidada especial para um seminário organizado pelo Ministério do Turismo em que, pela primeira vez publicamente, o programa Revive será discutido no Brasil. O encontro de três dias, sobre aproveitamento de patrimônios históricos e culturais, acontece entre 23 e 25 de outubro, em Porto Alegre. Representantes do Instituto Turismo de Portugal também estarão presentes.

Duas semanas antes do convite ser enviado, os responsáveis do Vila Galé estiveram no Ministério do Turismo, onde se reuniram com Babington dos Santos, o secretário de Integração Interinstitucional. Conhecido como Bob Santos, ele é uma figura muito importante nessa articulação. Grande parte das definições sobre o programa passam por ele. É dele a atribuição regimental de “delimitar e promover a regularização e o desenvolvimento turístico das áreas de domínio da União com potencial para o desenvolvimento do turismo e de articular programas, projetos e ações que promovam a realização de concessões e parcerias público-privadas para o desenvolvimento de destinos turísticos”.

Mas o poder de Bob Santos não é mera questão de palavras. Ele chegou ao ministério ainda no ano passado, em maio. Veio apadrinhado por Herculano Passos, deputado federal pelo MDB paulista que preside a Frente Parlamentar do Turismo. Passos é um dos maiores representantes dos interesses do setor hoteleiro e turístico em geral no Congresso. Uma de suas bandeiras é a legalização dos cassinos no país. Recentemente, foi designado por Jair Bolsonaro vice-líder do governo na Câmara. Foi também de Passos a indicação, chancelada pela Frente Parlamentar, de Marcelo Álvaro Antônio para o ministério. Bob Santos foi o principal assessor de Passos desde o início do mandato do deputado, ex-prefeito de Itu, na Câmara. Uma eventual queda de Marcelo Álvaro Antônio não deverá afetar sua permanência na pasta. E a equipe que está tocando o Revive é quase toda subordinada a ele.

O plano Angra

Vila Galé não é novata no país. Seu site mostra hotéis de encher os olhos e esvaziar os bolsos. Seu foco são hóspedes de alto poder aquisitivo. Uma de suas unidades mais charmosas representa a prévia do sonho de Jair Bolsonaro de ter uma nova Cancún em Angra dos Reis, no litoral fluminense. O Eco Resort Vila Galé de Angra, com uma praia particular, cobra por volta de R$ 1.700 a diária para um quarto de casal.

E é em Angra dos Reis que está um dos planos colocados em marcha pelo governo, como deixam claro os documentos aos quais tive acesso. Não é segredo que, entre as trocentas bravatas de Bolsonaro, está a idealização de uma abertura generalizada ao turismo em Angra – onde o presidente tem imóvel. Uma de suas obsessões é acabar, ou ao menos reduzir, a Estação Ecológica de Tamoios, que protege a paradisíaca baía localizada entre Angra e Paraty. O que não se sabia é que isso não é apenas uma bravata. O Plano de Ação para o Turismo em Angra dos Reis, apresentado pelo governo federal a representantes da prefeitura numa reunião realizada em agosto deste ano, indica que uma das estratégias é “rever a categoria da unidade de conservação de forma que concilie a possibilidade de visitação, sem impactar na preservação ambiental”. Essa ação, no entanto, dependerá da avaliação do Instituto Chico Mendes, o ICMBio).

A planilha com os 222 imóveis depende majoritariamente do governo.

Se mudanças nas regras de preservação da Estação Ecológica de Tamoios ainda dependem de outros fatores, a planilha com os 222 imóveis depende majoritariamente do governo. Todo um arcabouço regulatório já oficializado durante os primeiros meses de governo Bolsonaro garante espaço para uma forte presença de empresas privadas explorando áreas da União para fins turísticos – inclusive em unidades de conservação, como Tamoios.

No fim de julho, uma portaria do Ministério do Meio Ambiente criou uma comissão para avaliar estratégias e definir modelos jurídicos de concessão turísticas em unidades de conservação. Na lista das possibilidades de concessões estão práticas de “turismo ecológico” em geral e de recreação em contato com a natureza (arvorismo, por exemplo). Essas iniciativas podem envolver novas construções nessas áreas de conservação.

Em abril, uma das medidas tomadas na celebração dos 100 primeiros dias de governo foi definir uma política oficial de estímulo direto do governo federal para o desenvolvimento de “produtos turísticos” (privados ou bancados por dinheiro privado) nos sítios do Patrimônio Mundial reconhecidos pela Unesco. Entre os sítios naturais estão as zonas de Mata Atlântica, a Amazônia, o Pantanal, a Chapada dos Veadeiros, Fernando de Noronha… E, entre os culturais, Ouro Preto, centros históricos de Salvador e Olinda, entre vários outros. Essa política, que ainda será regulamentada, prevê também o apoio para a elaboração de projetos e “modelos de negócio” para ações nessas áreas. Na área ambiental, o decreto também prevê “o apoio à elaboração ou à revisão dos planos de manejo das Unidades de Conservação que constituem os Patrimônios Mundiais”.

A medida mais recente, tomada em setembro, coloca o Ministério do Turismo como o grande intermediário entre os interesses de empreendedores e a Secretaria do Patrimônio da União, a SPU. O órgão, no entanto, tem poder de iniciativa tanto para propor uso turístico de áreas da União por conta própria quanto para garantir a reserva de áreas para que, futuramente, sejam exploradas comercialmente via hotéis, resorts ou outros tipos de empreendimento. Em paralelo, a SPU irá “apresentar áreas de reconhecido interesse do turismo local e nacional ao Ministério do Turismo para que avalie a regularização de empreendimentos ou desenvolva projetos para o local”.

Questionado, o ministério evitou responder se foi orientado por Bolsonaro a priorizar Angra e jogou para a pasta do Meio Ambiente a questão de Tamoios. Técnicos do ministério, diz a pasta de Turismo, já trabalham para a construção de planos de desenvolvimento em outras áreas como a Rota das Emoções, no Lençóis Maranhenses.

É nesse ponto que aquela relação gigantesca, e que ainda vai crescer, de áreas que o Ministério do Turismo está disposto a passar pra frente pode se viabilizar. Na planilha do governo, há, além das edificações, que serão priorizadas no programa Revive, terrenos. Muitos terrenos. Estão lá o Parque Nacional de Jericoacoara (no Ceará), Parque Nacional do Ubajara (também no Ceará, em área de vegetação, onde há um teleférico público), o Parque Nacional da Chapada dos Guimarães (Mato Grosso), o Parque Nacional da Serra da Capivara (localizado no Piauí, considerado Patrimônio Cultural da Humanidade, tem 100 mil hectares e a maior concentração de sítios arqueológicos atualmente conhecida das Américas), entre outros.

Destaques também, em Brasília, para a Orla do Lago Paranoá, o Parque da Cidade, o Jardim Botânico e a Floresta Nacional de Brasília (área de Cerrado, com as nascentes que abastecem a maior represa da região, responsável por abastecer a maior parte da capital federal).

Em maio, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, já admitiu a intenção de privatizar os parques nacionais. Uma reportagem do Estadão citou quatro: Jericoacoara, Lençóis Maranhenses, Chapada dos Guimarães e Aparados da Serra. O Pantanal, por exemplo, como muitos outros, não estava na lista divulgada pelo ministro. Mas está na planilha do Ministério do Turismo.

O plano, pelo jeito, é alugar o Brasil.

Um dos documentos é uma planilha produzida no primeiro semestre deste ano que lista 222 propriedades da União, espalhadas por 17 estados e Distrito Federal, que o governo quer passar para a iniciativa privada explorar (clique aqui para ver a lista completa).

 

*Do Intercept Brasil