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Privatização da água: Governo Bolsonaro quer um novo marco hídrico sem participação popular. Entidades protestam

Ministério do Desenvolvimento Regional quer agir para acabar com comitês e abrir setor para a iniciativa privada.

Segundo reportagem da Rede Brasil de Fato, mais de 100 entidades, ONGs e personalidades estão promovendo um abaixo-assinado em defesa da Lei 9.433/1997 que estabeleceu a Política Nacional de Recursos Hídricos. Apelidada de “Lei do Diálogo”, a legislação regulamenta o uso da água no Brasil como um bem público, mas corre o risco de desmonte, de acordo com o manifesto, diante da nova proposta de marco hídrico que vem sendo defendida pelo governo de Jair Bolsonaro.

Desde outubro, o Ministério do Desenvolvimento Regional vem anunciando mudanças na lei. Nesta terça-feira (30), o ministro da pasta, Rogério Marinho, confirmou que o presidente da República deve encaminhar ao Congresso Nacional a iniciativa nos próximos dias. As centenas de entidades pressionam, no entanto, para que a medida seja discutida de forma democrática pela sociedade civil organizada com transparência e tempo privilegiado antes de ser enviada ao Legislativo. Sem dar maiores detalhes, o governo federal destaca apenas que o novo marco vai permitir uma gestão mais eficiente das outorgas hídricas no país.

Mas a avaliação de especialistas é que a população corre risco. O destaque é para uma mudança que esvazia a possibilidade de diálogo ao retirar dos comitês de bacia hidrográfica a capacidade de intervenção. Pela proposta de Bolsonaro, apenas o Conselho Nacional de Recursos Hídricos será mantido. Este é o único órgão que não tem representação dos estados brasileiro. Ao contrário dos comitês, formados também pela sociedade civil e os municípios que formam a bacia.

O que está em jogo

“Na verdade, nós estamos assistindo uma centralização bastante preocupante em termos de gestão da água no Brasil”, observa o professor de Geografia e do programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental da Universidade de São Paulo (USP), Wagner Ribeiro. Em entrevista a Marilu Cabañas, do Jornal Brasil Atual, o geógrafo também rebateu a fala do ministro de Desenvolvimento Regional de que que o “novo marco hídrico dará segurança jurídica e previsibilidade para atração de dinheiro da iniciativa privada”. De acordo com Ribeiro, o que está em jogo é ainda a possibilidade de quem detém a outorga da água hoje poder oferecer o uso do recurso para quem pagar mais.

“É um pouco do modelo chileno que está sendo muito criticado pela sociedade do país vizinho. Nós tivemos uma reunião da nossa rede de pesquisa, em 2019, justamente no Chile para discutir o modelo do país, que de fato não preconiza o interesse geral e público. Imagine uma situação de escassez, quem puder pagar mais vai garantir o acesso à água e obter o que está na própria lei 9.433, que é a garantia da dessedentação humana e de animais. Então essa reforma que o governo está propondo é muito preocupante”, alerta.

Autoritarismo e a população em risco

O professor da USP também classificou como um “desconhecimento” de Marinho que propôs o “novo marco” como uma forma de “proporcionar segurança hídrica às regiões mais deprimidas do semiárido”. Segundo o ministro, o aporte do capital privado permitirá obras estruturantes para impulsionar a indústria e a agricultura. O que não é verdade, de acordo com Ribeiro. O geógrafo critica o desmonte do programa federal de cisternas na região, que neste ano atingiu o menor patamar de investimento de sua história.

“Se houver por exemplo uma empresa de bebidas, qualquer que seja. Ela tem uma necessidade fundamental de água e pode eventualmente pagar mais para uma pequena prefeitura que não tenha capacidade de arrecadação e uma concessão de água. Ela (prefeitura) não vai conseguir concorrer com uma empresa dessa ordem. E vai haver essa grande empresa captando esta água para manter sua produção. De outro lado, haverá uma população desassistida para o uso fundamental da água”, contesta o geógrafo.

Ribeiro resume que, por conta desses riscos, “não é por acaso que essa proposta não teve diálogo ou não foi debatida por fórum algum, sem instituições ou qualquer tipo de organização da sociedade civil e com pesquisadores que se dedicam ao tema”. “É mais uma demonstração desse caráter autoritário e centralizador desse governo”, conclui. No geral, o governo federal pretende repetir o que também foi feito no marco do saneamento básico do país.

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Bolsonaro sobre ambientalistas: “Se um dia eu puder, os confino na Amazônia”

Fala do presidente veio em defesa de projeto de lei que permite mineração em terras indígenas, que deve chegar ao Congresso em breve.

Na solenidade de 400 anos de Governo, o presidente Jair Bolsonaro comentou, nesta quarta-feira 05, que, se um dia puder, confinaria todos os “ambientalistas, esse pessoal do meio ambiente” na Amazônia.

A fala veio quando Bolsonaro estava defendendo o projeto de lei assinado por ele na ocasião, que altera a Constituição para permitir a exploração de terras indígenas a fins de mineração e outras atividades econômicas. Uma provável resistência do Congresso ao projeto fez com que o presidente criticasse os ambientalistas.

“Esse projeto do ministro das Minas e Energia, que depende do Congresso… [eles] vão sofrer pressão desses ambientalistas, esse pessoal do meio ambiente. Se um dia eu puder, eu os confino na Amazônia, já que gostam tanto do meio ambiente, e deixam de atrapalhar os amazônidas aqui de dentro das áreas urbanas”, declarou Bolsonaro.

No início de seu discurso, Bolsonaro exaltou que indígenas têm “coração, sentimentos, alma, desejos, necessidades, é tão brasileiro como nós”, para depois justificar que a exploração de territórios demarcados poderia ser benéfica para a economia. Para o presidente, é uma questão de vieses diferentes.

“Tem algum problema comprar ouro, pedras preciosas, de modo que elas possam ser lapidadas dentro do Brasil e não serem vendidas como commodities comuns? É um viés”, afirmou Bolsonaro.

A Constituição Federal proíbe a atividade de mineração em terras indígenas sem a aprovação do Congresso, que não mexeu no assunto desde 1988. Além disso, é necessária uma consulta prévia com as comunidades indígenas antes de quaisquer decisão, afirma o parágrafo 3º do artigo 231:

“O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei”.

O evento contou com todos os ministros de Estado e demais figuras públicas. O mote principal era que o Brasil “já mudou” nos 400 dias de governo, concluídos nesta terça-feira.

No primeiro ano de governo Bolsonaro, os índices de desmatamento da Amazônia bateram recordes de séries históricas e acumularam polêmicas. No discurso, o presidente não comentou sobre o combate à destruição da floresta.

 

 

*Com informações da Carta Capital