Revista de tecnologia revela que, após impasse criado sobre operações da X e da Starlink no país, bilionário começou a balançar.
O bilionário Elon Musk parece estar encurralado: menos de dois anos após assumir o Twitter, hoje nomeado X, ele conseguiu fazer com a empresa perdesse acesso ao seu terceiro maior mercado global e, por consequência, a mais de 40 milhões de usuários.
O embate entre Musk e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), é tema de reportagem da entrevista norte-americana Wired, que destaca o bloqueio como “ápice de um conflito em andamento”.
Como destaca a publicação, Moraes emitiu ordens de remoção de conteúdo apontado como “uma ameaça à integridade das eleições”, no que Musk e X se recusaram a obedecer, e o fato de o bilionário ter mantido a publicação de contas acusadas de disseminar discurso de ódio e fake news na plataforma levou ao banimento no Brasil.
Nem mesmo a empresa de internet de Musk passou incólume: o STF congelou os ativos da empresa dizendo que ela integrava o mesmo “grupo econômico” que a X para um possível uso para pagamento das multas devidas pela X – e, depois da resistência inicial, a Starlink obedeceu a decisão do STF e manteve a proibição ao acesso à rede social.
Enquanto isso, Musk usava sua rede social para antagonizar Moraes com postagens insinuando a prisão do ministro, desbloqueou as contas de diversos influenciadores de extrema-direita e chegou a comparar o magistrado a um “ditador”, embora tenha cumprido ordens de bloqueio semelhantes em lugares como Turquia e Índia, onde suas redes foram usadas para censurar jornalistas e oposição.
A última cartada de Musk foi feita em agosto, com o fechamento do escritório do X no Brasil depois que o representante da empresa foi ameaçado de prisão por não cumprir as ordens do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pela empresa – levando a rede social a também violar as leis de localização do Brasil.
“Neste ponto, Musk esgotou a maioria das vias de escalada com o judiciário. E embora tenha retirado os funcionários da SpaceX do Brasil, ele já mostrou sinais de vacilação, pelo menos no que diz respeito à Starlink”, destaca a publicação.
Reportagem do ‘UOL’ mostra como a contratação da empresa pelo Comando Militar da Amazônia chegou ao Tribunal de Contas.
Um processo licitatório do Exército Brasileiro que só teve uma empresa concorrente, a Starlink – companhia de internet via satélite de propriedade do bilionário Elon Musk –, chegou ao Tribunal de Contas da União (TCU) por suspeita de favorecimento.
O caso foi revelado nesta terça-feira 3 pelo site UOL. O contrato em questão é fruto de um edital publicado pelo Comando Militar da Amazônia neste ano com critérios que faziam com que a companhia de propriedade de Musk fosse a única apta a concorrer.
A investigação sobre o caso começou após publicação, em maio, de reportagem do jornal Folha de S. Paulo que apontava apontando “série de parâmetros que eliminam a concorrência e direcionam a contratação” da Starlink. Isso chamou atenção do Ministério Publico junto ao TCU. O valor total do contrato é de 5,1 milhões de reais.
Conforme publicou o UOL, o ministro Aroldo Cedraz, do Tribunal de Contas, acionou o Comando Militar da Amazônia com uma série de questionamentos sobre a lista de exigências da licitação que, na prática, deixava a empresa de Musk como única concorrente.
Neste momento, as respostas enviadas pelo Exército estão sob análise da área técnica do TCU. O diálogo com os militares ocorre sob sigilo. Não há prazo definido para novos movimentos do caso no Tribunal.
O Exército se negou a responder perguntas do UOL, informando que “as dúvidas relacionadas quanto aos questionamentos levantados pelo TCU deverão ser demandadas àquele órgão.” A Starlink também foi procurada pelo site, mas não comentou o tema.
Empresas de Musk na mira Na esteira do descumprimento de ordens judiciais pelo X, como a de bloquear perfis investigados e a de indicar um representante legal no Brasil, o ministro Alexandre de Moraes decidiu bloquear as contas da Starlink no Brasil, a fim de garantir que a rede social pague as multas impostas pela Corte.
A Starlink é uma empresa de internet via satélite operada por uma subsidiária da companhia aeroespacial SpaceX. Foi autorizada a operar em solo brasileiro pela Anatel em 2022, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), um admirador de Musk.
Documentos expõem pressão da pasta de Fábio Faria na Anatel em favor de satélites do “homem mais rico do mundo”.
O governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) atuou junto à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) pela autorização da operação, em território brasileiro, dos satélites geoestacionários da Starlink, empresa do bilionário Elon Musk. Em tese, a agência reguladora é “administrativamente independente” da gestão federal.
Documentos obtidos via Lei de Acesso à Informação, com as correspondências entre o Executivo Federal e a empresa, evidenciam a atuação do governo brasileiro em prol da Starlink, além de demonstrar a participação do Departamento de Comércio da Embaixada dos Estados Unidos na tentativa de acelerar o processo de autorização da Anatel aos satélites da empresa de Musk.
Clique aqui e faça o download da íntegra dos documentos analisados pelo Brasil de Fato e por especialistas.
Com a aprovação concedida pela Anatel em 28 de janeiro deste ano, a Starlink passou a poder oferecer seu serviços de internet no Brasil. A maioria dos serviços atuais de internet por satélite são possibilitados por meio de satélites geoestacionários simples, que orbitam o planeta a cerca de 35 mil quilômetros de altitude. Já o de Elon Musk é uma constelação de mais de 4 mil satélites, a uma distância de apenas 550 quilômetros. O aval da Anatel foi o primeiro a projetos do tipo no país.
No final do ano passado, Elon Musk, que também é CEO da montadora Tesla e da empresa aeroespacial SpaceX, voltou a ser o homem mais rico do mundo, após superar a fortuna da Jeff Bezos, fundador da Amazon.
Para explicar o passo a passo das conversas e do trâmite legal que autorizou as operações da Starlink no país, o Brasil de Fato preparou uma linha do tempo para evidenciar a pressão do governo Bolsonaro sobre a agência reguladora em prol da empresa de Musk. Acompanhe a seguir nesta reportagem.
Reunião fora da agenda e visita “cavada”
As mensagens mostram, também, que a pasta omitiu da agenda oficial uma conversa por telefone entre o ministro das Comunicações, Fábio Faria, e o bilionário em outubro de 2021, em meio a dias decisivos para o aval da agência aos satélites. As correspondências apontam que o Ministério das Comunicações utilizou o interesse da firma de Elon Musk na aprovação da Anatel para “cavar” uma visita do ministro Fábio Faria à sede da empresa, em Los Angeles.
Uma carta demonstra que foi Faria quem trouxe pela primeira vez a Amazônia às negociações de uma parceria do governo federal com a empresa. Em um texto em que reforça algumas vezes sua admiração pela Starlink e que começa com um curioso “Dear Mr. Musk”, Faria cita a região amazônica como sendo “a maior lacuna digital” que o Brasil possuiria atualmente, sendo uma região “impossível de conectar” sem satélites. O ministro diz, ainda, que “seria uma honra” visitar a empresa presencialmente, em Los Angeles, dali a um mês, quando ele estaria nos Estados Unidos.
Prova de contato com Anatel está registrada
Em uma das mensagens, o secretário de Telecomunicações, Artur Coimbra de Oliveira, confirma textualmente à CEO da Starlink que o governo fez contato com a agência reguladora para obter informações sobre o processo envolvendo a empresa dos Estados Unidos.
A confirmação dos contatos do governo federal com a Anatel, a pedido da Starlink, consta em uma carta enviada por Coimbra no dia 29 de outubro de 2021. Na mensagem, o secretário da pasta chefiada pelo ministro Fábio Faria escreveu à Gwynne Shotwell, CEO da Starlink: “Informo também que já estamos conversando com a Anatel sobre a outorga da Starlink e entraremos em contato sobre o assunto assim que tivermos uma perspectiva sólida da agência”.
Em outra correspondência, o governo federal é informado de que a empresa estuda uma manobra no processo de autorização da Anatel para acelerar a aprovação. A CEO da Starlink afirma que está atuando para viabilizar uma “votação circular” no Conselho Diretor da Anatel. Em inglês, no jargão do mundo dos negócios, o termo se refere a decisões que não podem esperar até a próxima reunião de órgãos colegiados, sendo tomadas de forma remota, sem o debate previsto no regulamento.
“Estamos analisando se a autorização pode ser adotada antes da reunião do Conselho de 25 de novembro por meio de uma votação circular, pois, sem ela, enfrentamos uma perda diária na capacidade de prestar serviço no Brasil”, afirmou a CEO da empresa em outubro, incomodada com o fato de que a reunião da Anatel daquele mês não pautou o assunto. Foi em resposta a essa mensagem, uma semana depois, que Coimbra admitiu as conversas do governo federal com a agência reguladora.
O governo também chega a aceitar as tentativas da empresa de agendar uma reunião no ministério para tratar sobre os trâmites na Anatel. Em nenhuma oportunidade, a gestão federal cita a autonomia legal da agência para decidir sobre o processo regulatório.
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Ministério não tem prerrogativa para intervir
A especialista Renata Mielli, integrante da Coalizão Direitos na Rede e do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, comentou o caso a pedido do Brasil de Fato. Segundo ela, “o modelo de regulação brasileiro baseado em agências tem como objetivo criar um ambiente que tenha independência e autonomia do governo para adotar decisões de caráter econômico e estratégico para as áreas que foram objeto de privatizações no país”.
Mielli citou a Lei 13848/2019 e disse, ainda, que, se a pressão do governo federal influenciou diretores da Anatel, o processo de autorização do direito de exploração dos satélites da Starlink deveria ser analisado novamente.
“Se o governo, através do Ministério das Comunicações, usou seu poder político para influenciar uma decisão da Agência Nacional de Telecomunicações e, por sua vez, se diretores dessa agência se curvaram aos interesses que motivaram as negociações de forma a ferir a impessoalidade e a autonomia decisória e técnica da Anatel, todo o processo de autorização e licenciamento para a operação da Starlink no Brasil deve ser revisto”, defendeu.
Um outro especialista consultado pela reportagem, que preferiu não se identificar, utlizou a seguinte analogia para o caso: o contato entre Starlink e Ministério das Comunicações sobre um processo que corre na Anatel é o mesmo que uma fabricante de vacinas contra a covid-19 buscar o Ministério da Saúde para obter favorecimento em um processo que corre na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O que dizem os envolvidos
O Brasil de Fato procurou o Ministério das Comunicações para ter esclarecimentos sobre a relação da pasta junto à Starlink. A reportagem questionou se houve algum telefonema entre Fábio Faria e Elon Musk, conforme apontam os documentos, e se a pasta fez algum contato com representantes da Anatel para acelerar ou obter informações sobre o aval aos satélites da empresa.
A reportagem também procurou a Anatel e questionou se houve algum tipo de comunicação oficial ou extraoficial com representantes do Ministério das Comunicações. Os dois órgãos confirmaram recebimento dos emails e afirmaram que a demanda estaria “em tratamento”. Foi concedido prazo superior a dez dias para o retorno. Mesmo assim, não houve resposta. O espaço segue aberto para manifestações.
Linha do tempo
Entenda o passo a passo das comunicações entre Starlink, governo brasileiro e a Embaixada dos Estados Unidos no Brasil. Para ler a íntegra das correspondências, clique aqui.
O primeiro contato
12 de outubro de 2021: Starlink pede reunião com Fábio Faria para debater pauta de reunião do Conselho Diretor da Anatel
Brian Weir, assistente da CEO da Starlink, Gwynne Shotwell, envia por email uma sugestão de videoconferência entre sua chefe e o ministro das Comunicações, Fábio Faria, para o dia 14 de outubro. Segundo Weir, o objetivo do encontro seria discutir a inclusão da votação sobre autorização aos satélites da Starlink na reunião do Conselho Diretor da Anatel de 21 de outubro.
Embaixada dos EUA entra em ação
14 de outubro de 2021: Embaixada dos EUA faz reunião no Ministério das Comunicações representando Starlink
No dia proposto pela Starlink, Bryan Goldfinger, representante do Departamento de Comércio da Embaixada dos EUA no Brasil, participa de reunião no Ministério das Comunicações com a chefe da assessoria internacional Yasmin Azevedo. Em mensagem que seria enviada no dia seguinte, o estadunidense relembra que está “auxiliando a SpaceX em algumas de suas ações no mercado brasileiro; entre as quais, o processo de aprovação da licença junto à Anatel”. No email, a Embaixada dos EUA formaliza um pedido de reunião por videoconferência entre a CEO e o vice-presidente da Starlink com Fábio Faria e seu secretário de Telecomunicações, Artur Coimbra de Oliveira.
Dear Mr. Musk: a carta de Fábio Faria
14 de outubro de 2021: Fábio Faria responde Starlink com carta a Musk, “se convida” para visita aos EUA e cita Amazônia
Sem citar o pedido de reunião da Starlink para debater a aprovação dos satélites da empresa pela Anatel, o ministro das Comunicações “se convida” para encontro com Elon Musk. Na carta, Faria diz que estaria nos EUA em novembro e que “seria uma honra” para ele e para sua comitiva conhecer a empresa em Los Angeles. Pela primeira vez, a Amazônia é citada nas comunicações. A carta nunca teve resposta assinada por Elon Musk.
Governo brasileiro topa debater Anatel
18 de outubro de 2021: governo federal aceita falar sobre Anatel e sugere reunião de Faria com Starlink para o dia seguinte
Na manhã de segunda-feira (18), a assessora internacional do Ministério das Comunicações retorna o contato feito pelo representante da Embaixada dos EUA e aceita o pedido de reunião entre o ministro, o secretário de Telecomunicações e os executivos da Starlink. Ela sugere que o encontro ocorra por videoconferência no dia seguinte (19), às 10h. Ela agradece o estadunidense pelo apoio na tentativa de conseguir um encontro entre Fábio Faria e Elon Musk.
O grande encontro: Musk e Faria
15 de novembro: visita de Fábio Faria e comitiva à sede da Starlink e encontro com Elon Musk
Fábio Faria e sua comitiva fazem visitas às fábricas da Starlink e da SpaceX, em Los Angeles, recebidos por Gwynne Shotwell. No mesmo dia, à noite, se encontram com Elon Musk em Austin, no Texas. No Twitter, o ministro publica um vídeo do encontro com o bilionário e diz que o objetivo era “iniciar uma parceria” para levar a Starlink à região amazônica.
Acharam que iríamos parar com o leilão do 5G? Não! Agora vamos buscar empresas de inovação para investirem no Brasil. Queremos que o país seja hub de inovação da América Latina com o 5G. Eu acredito no 🇧🇷! #LetsDoThis@elonmuskpic.twitter.com/s7G4spT94A
22 de novembro: Starlink no Brasil protocola pedido à área técnica da Anatel para testes temporários de satélites em comunidade de SP
Empresa protocola pedido para fazer testes na comunidade Savoyzinho, em São Paulo (SP), em parceria com a ONG internacional Luta Pela Paz. O plano consistia em conectar um centro comunitário que atende a cerca de 40 alunos ao serviço de internet banda larga dos satélites Starlink. Se não houvesse impedimentos, os testes iriam ser realizados entre 7 de dezembro de 2021 e 4 de fevereiro de 2022.
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