Ano: 2020

Vídeo – Zanin: Quem questiona o projeto de poder da Lava Jato vira alvo de seus métodos

A operação Esquema S foi até agora a “mais violenta de todas” as ações da Lava Jato contra seus críticos. É o que afirma, em entrevista exclusiva à TV GGN, o advogado Cristiano Zanin.

No dia 9 de setembro, o defensor do ex-presidente Lula teve casa e escritório revirados numa operação de busca e apreensão autorizada pelo juiz Marcelo Bretas, da Lava Jato no Rio de Janeiro.

A Lava Jato sustenta que o escritório de Zanin foi contratado pela Fecomércio do Rio, em meados de 2012, de maneira irregular. A instituição teria usado recursos financeiros do Sistema S e Zanin, em vez de prestar serviços advocatícios, supostamente teria indicado advogados com “influência” sobre tribunais.

“Na dúvida foi feita uma operação de busca e apreensão, quando poderia ter sido sanada simplesmente pela solicitação de qualquer informação”, disse Zanin. “A prestação de serviço é inequívoca. Está comprovada nos autos do processo, além de outros documentos que temos disponíveis”, afirmou.

Então dirigida por Orlando Diniz, hoje delator da Lava Jato, a Fecomércio/RJ congrega dezenas de sindicatos patronais que representam 326 mil estabelecimentos comerciais, e também o SESC e SENAC porque é obrigada por lei.

Zanin foi contratado para atuar no litígio envolvendo a tentativa da Confederação Nacional do Comércio (CNC) em assumir a presidência do SESC e SENAC no lugar da Fecomércio/RJ.

O advogado destacou que a Lava Jato enxerga “problemas na contratação de um lado [Fecomércio], e não enxergar do outro [CNC], ainda que haja situações idênticas”. “Parece que eles queriam atingir pessoas pré-definidas.” Em alguns veículos de imprensa, a operação contra Zanin foi o destaque. Já a GloboNews focou nas acusações que envolvem ainda Adriana Alcelmo e Sergio Cabral.

Não é a primeira vez, aliás, que a Lava Jato pratica arbitrariedades contra Zanin. Com autorização de Sergio Moro, a força-tarefa de Curitiba conseguiu grampear a banca durante a defesa de Lula. Mas a busca e apreensão na casa e no escritório do advogado, “sem dúvidas, foi a mais violenta de todas elas e nós vamos tomar todas as providências cabíveis”, disse Zanin. “Até porque, desde o ano passado, a violação a prerrogativas do advogado configura crime.”

REPRESÁLIA E PROTAGONISMO POLÍTICO

Ainda na visão de Zanin, se de um lado há a vingança da Lava Jato, de outro, há o desejo de Marcelo Bretas em aparecer para Jair Bolsonaro.

“A Lava Jato não gosta de ser questionada. Nós temos uma atuação de questionamento de seus métodos desde o início e sabemos que tudo isso que está sendo feito é vingança, represália. Tivemos várias vitórias na defesa de Lula, inclusive decisões do STF reconhecendo ações ilegais do ex-juiz Sergio Moro e também o viés político da sua atuação. Não é por acaso que ocorre um ataque dessa magnitude. A Lava Jato se tornou uma instituição e projeto de poder. Todo aquele que questiona esse projeto, pode ser alvo dos seus métodos. (…) De um lado, existe uma vingança. E também existe, da parte do juiz Bretas, uma tentativa de assumir um protagonismo político, tal como era Sergio Moro.”

REAÇÃO

Zanin disse na entrevista a Luis Nassif que, dessa vez, espera as instituições reajam à altura. “Muitos já fizeram essa auto-crítica, de que a Lava Jato só chegou a esse patamar de ilegalidades e arbitrariedades porque os tribunais e órgãos correicionais deixaram de atuar quando era necessário. Quando houve grampo no nosso escritório, a reação foi extremamente tímida, até por parte da OAB. Dessa vez espero uma reação mais efetiva, até porque o pretexto colocado, a dúvida sobre a prestação de serviços, não existe.”

 

*Cíntia Alves/GGN

 

Escândalo: A pedido de Dallagnol, ONG “Transparência Internacional” combinava defesa pública com a Força-tarefa

A aliança da Lava Jato com a Transparência Internacional.

ONG internacional teve acesso à minuta do contrato que tratava da fundação que administraria a verba da Petrobras antes dele ser assinado; diretor sugeriu que MPF estivesse fora do conselho, mas Dallagnol o ignorou.

Mensagens de Telegram trocadas entre o procurador Deltan Dallagnol e o diretor-executivo do capítulo brasileiro da Transparência Internacional, Bruno Brandão, entregues ao Intercept Brasil e analisadas pela Agência Pública sugerem uma proximidade pouco transparente da organização com a Operação Lava Jato.

Com credibilidade mundial no combate à corrupção, a Transparência Internacional, também conhecida pela sigla TI, atuou nos últimos anos para defender publicamente a Lava Jato e seus protagonistas dentro e fora do Brasil, por meio de entrevistas, contatos com a imprensa e publicação de notas de apoio. As mensagens revelam que a ONG agiu diversas vezes a pedido do procurador Deltan Dallagnol, que deixou no começo de setembro a força-tarefa.

Os chats mostram que o então chefe da força-tarefa da Lava Jato tinha uma relação próxima com Bruno Brandão, diretor da Transparência Internacional. Dallagnol recorria a ele quando a imagem da operação estava em perigo ou quando queria promovê-la.

Revelam também que a ONG teve acesso e palpitou na minuta do contrato assinado entre a força-tarefa e a Petrobras para a criação de uma fundação. A Transparência Internacional recomendou ao procurador da República Deltan Dallagnol que o Ministério Público Federal (MPF) não tivesse assento no conselho da bilionária Fundação Lava Jato, a ser formada com dinheiro das multas recolhidas pela Petrobras. Mas Dallagnol deu de ombros para a sugestão e viu sua fundação desmoronar ao ser questionada pela comandante do MPF, a então procuradora-geral da República Raquel Dodge, e por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

Procurada pela reportagem, a organização afirmou, por meio de nota (leia a íntegra aqui), que essa parceria, assim como a colaboração com a força-tarefa da Lava Jato, faz parte da natureza do seu trabalho e missão. A organização afirmou também que para cumprir sua missão “dialoga e coopera sistematicamente com agentes públicos, sociedade civil, jornalistas investigativos, entre outros” e que “é natural que, na consecução de sua missão institucional, tenha estabelecido parceria institucional com o MPF e colaboração com as Forças-Tarefa da Lava Jato, Greenfield, Amazônia e outras”.

O MPF reforçou que os contatos entre o procurador e Bruno Brandão “sempre se deram de modo republicano” e foram “focados em defender a causa anticorrupção, o estado de direito e a democracia”. Leia a íntegra da resposta aqui.

Foto: Antonio Cruz – Agência Brasil – Arte: Larissa Fernandes – Agência Pública

Bruno Brandão é diretor-executivo da Transparência Internacional no Brasil

“Colocando isso na boca do investidor estrangeiro, daria muita credibilidade”

Após os primeiros anos, a Lava Jato passou a receber crescentes críticas sobre o seu impacto na economia brasileira. Em junho de 2017, o então procurador-chefe da Lava Jato pediu a Brandão que o ajudasse a pensar em estratégias para a operação conseguir apoio internacional. “Fiquei pensando se não poderia haver uma declaração internacional de apoio”, escreveu em chat privado no Telegram, no dia 2 de junho de 2017, às 14h17. “Falando que é importante que para o desenvolvimento econômico do país é preciso que a investigação prossiga, dentro da lei”, acrescentou.

Como solução, o diretor-executivo da TI chegou a propor a Dallagnol que a ONG, por meio de um estudo, desse o crédito da recuperação da economia do país à Lava Jato: “Acho que temos várias opções e que devemos começar a agir rapidamente. Podemos começar a ver isso na quinta-feira mesmo. Estamos pensando em começar uma pesquisa sobre a percepção dos maiores investidores institucionais estrangeiros no Brasil sobre o que eles pensam da Lava-Jato, se é bom pra economia ou não – e duvidaria que um investidor olhando o médio e longo prazo diria que não. Se o Brasil está começando a se recuperar podemos começar a creditar isso na conta do trabalho de vcs tb, colocando isso na boca do investidor estrangeiro daria muita credibilidade – e desmontaria um dos argumentos que os críticos mais repetem”, sugeriu Brandão a Dallagnol em 2 de junho de 2017.

Questionada, a Transparência Internacional se posicionou afirmando que refuta veementemente o argumento de que a luta contra a corrupção é danosa à economia, mas informou que o estudo não foi feito e “se viesse a ser realizado, seguiria o mesmo processo transparente e independente de formulação e validação metodológica que seguem todos os estudos da TI”.

Em 14 de fevereiro de 2018, no entanto, Bruno Brandão publicou uma coluna no Valor Econômico com o título: “Legado de combate à corrupção será positivo para a economia”. “Publiquei hoje um artigo no Valor usando os resultados do TRAC pra rebater o discurso oportunista de que Lava Jato e o combate à corrupção estão prejudicando a economia”, escreveu o diretor da TI a Dallagnol.

No artigo, Brandão cita o estudo publicado no início daquele mês, “Transparência em Relatórios Corporativos: as 100 Maiores Empresas e os 10 Maiores Bancos Brasileiros”, que seria, de acordo com ele, “o primeiro feito pela organização voltado exclusivamente ao setor privado brasileiro”.

No texto, Brandão escreve que os resultados do estudo “confirmam que a luta contra a corrupção já não tem como único vetor as investigações e os processos judiciais”. “Ela também se reforça pela resposta no mercado ao que já se consolida como uma nova realidade nacional”, destaca.

A troca de mensagens no Telegram sugere que a ONG teria sido usada também para defender interesses pessoais de Deltan Dallagnol, contrariando o código de ética e conduta da entidade, que diz que a organização prima pela transparência na defesa do interesse público: “somos sempre transparentes em nossas interações com tomadores de decisão e sobre a causa que defendemos de acordo com nossa missão e valores”, diz o texto.

Dallagnol acionou Brandão quando o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) instaurou, em 2018, um processo administrativo contra o então procurador Carlos Fernando dos Santos Lima – hoje aposentado – por quebra de decoro, em razão de críticas ao ex-presidente Michel Temer (MDB) e ao STF na imprensa e nas redes sociais. Dallagnol demonstrou preocupação de que o caso abrisse brecha para um processo contra manifestações públicas que ele mesmo já tinha feito em redes sociais ou pela imprensa.

Enquanto criticava privadamente a postura de Carlos Fernando, Brandão acolheu o pedido de Dallagnol.

Os diálogos são reproduzidos no formato original em que foram entregues ao Intercept, incluindo erros de ortografia. “CF” é Carlos Fernando.

Naquele dia, o procurador não recebeu nenhuma resposta. No dia 10 de maio, voltou a cobrar um posicionamento da Transparência Internacional. “Bruno, será que a TI conseguiria soltar algo (equilibrado, como sempre) sobre liberdade de expressão até a próxima segunda?”, questionou. Dessa vez, Brandão respondeu positivamente. “Conseguimos. Vou tentar escrever algo amanhã.”

Depois de diversas outras mensagens do procurador solicitando a nota, enfim, no dia 22 de maio de 2018, ela foi publicada na página do Facebook da Transparência Internacional. Na nota, a TI “expressa sua preocupação com a ameaça ao direito de liberdade de expressão de procuradores e promotores de Justiça” e “exorta também o órgão a esclarecer – não no caso individual, mas em interpretação geral – o que configura a quebra de decoro da qual Lima é acusado”, precipitando-se a um cenário em que Dallagnol poderia ser alvo de investigação.

No diálogo com Brandão, Dallagnol deixa claro que precisava do posicionamento da entidade para fazer pressão política.

Uma semana depois, o chefe da força-tarefa da Lava Jato enviou nova mensagem para Brandão, dessa vez para agradecer a contribuição. “PAD” significa “processo administrativo”.

“Bruno, hoje foi julgado o caso do Carlos Fernando e, por 7 votos a 7, o Conselho não referendou a instauração do PAD contra Carlos Fernando, com base na preliminar de falta de representação do suposto ofendido (Temer). Em relação aos outros dois fatos, decidiram encaminhar para a corregedoria de origem (o MPF), para que tenha o trâmite regular que acontece com todas as representações (e que não havia sido adotado nesse caso). Sua voz foi importantíssima para levantar a importante discussão sobre esse caso, essencial para a liberdade de expressão, e consequente independência, dos membros do MP em casos envolvendo poderosos. Mais uma vez, gostaria de reconhecer sua importante e corajosa contribuição. Grande abraço, Deltan”, escreveu no dia 29 de maio de 2018, às 21h37.

De acordo com a Transparência Internacional, o posicionamento da nota foi impessoal e está em convergência com a missão institucional da organização e com o histórico de defesa da liberdade de expressão de agentes de aplicação da lei. Já o MPF defendeu que o fato “trata-se de interesse público e não questão de interesse particular”.

A TI afirmou ainda que “em todos os países em que houve tentativa real de autoridades locais de levar investigações adiante, houve poderosa reação através de campanhas de deslegitimação dos processos e criminalização de seus agentes” e que “em todos os casos, a TI atuou e continua atuando contra a impunidade e, principalmente, contra as intimidações e retaliações sobre os agentes públicos”.

Na terça-feira, 8 de setembro, Dallagnol foi punido justamente por conta de seus tweets. O CNMP acatou uma queixa de Renan Calheiros (MDB-AL) a respeito de postagens nas quais o procurador afirmava que a eleição de Calheiros à presidência do Senado travaria projetos anticorrupção do Congresso. O CNMP avaliou que Dallagnol extrapolou os limites da liberdade de expressão e agiu para interferir em outro poder. A pena imposta determina que ele não pode ser promovido por um ano.

Preocupação com a percepção pública sobre apoio à Lava Jato

Desde junho de 2017, Brandão e Dallagnol começaram a conversar sobre a criação de um fundo para distribuir aportes a projetos de combate à corrupção. A ideia partiu do diretor da TI. “Deltan, talvez uma boa ideia seria vcs criarem uma espécie de fundo para distribuir mini-grants para iniciativas de controle social e de prevenção da corrupção. A TI pode ajudar a operacionalizar isto. Seria uma mensagem muito positiva da FT-LJ também…”, escreveu Brandão à Dallagnol em 8 de junho daquele ano.

“Difícil gerenciar pra nós. Só se for algo com a TI, mas teria que ser montado a partir daí pq nem pelo MPF posso assinar rs. Nós poderíamos participar das decisões de destinação… se quiser propor o desenho disso, gostei mto da ideia”, respondeu Deltan.

A proposta surgiu depois de Dallagnol ter oferecido à ONG uma doação de US$ 75 mil que a força-tarefa poderia ganhar em um prêmio. “Ponto é: podemos doar pra TI?”, perguntou o procurador a Brandão.

“Sobre a doação, mais uma vez obrigado pelo grande apoio, vou conversar com os colegas em Berlim e avaliar os riscos. Seria sem dúvida uma grande ajuda, mas o risco que vemos é comprometer – pelo menos na percepção pública – nosso apoio à Força Tarefa (que com certeza teremos que apoiar cada vez mais)”, respondeu o diretor da organização, enviando em seguida uma mensagem com a seguinte correção: “*comprometer, na percepção pública, a isenção do nosso apoio a vocês”.

A doação não foi adiante, segundo a própria TI explicou – todas as doações são publicadas no site da organização. Mas o diálogo sobre a criação de um fundo seguiu adiante e tomou forma com a possibilidade da multa bilionária da Petrobras.

TI foi consultora informal da fundação da Lava Jato

A Transparência Internacional foi parceira de primeira hora na criação da fundação prevista em um acordo firmado entre o MPF e a Petrobras, depois considerado ilegal pelo STF, que entendeu que o MPF estava “exacerbando suas funções”.

O protagonismo dos procuradores na criação e gestão de uma organização de direito privado, que ficaria com uma parcela da multa da Petrobras, gerou desconfiança da sociedade e duras críticas de juristas e autoridades contra a força-tarefa da Lava Jato. O acordo previa, por exemplo, que a fundação teria sede em Curitiba e que o MPF e o MP do Paraná teriam a prerrogativa de ocupar um assento cada um no órgão de deliberação superior da fundação. Ao mesmo tempo, conforme revelado pela Folha de S.Paulo e The Intercept Brasil, Dallagnol estava negociando a criação de uma empresa para vender palestras anticorrupção em parceria com outro procurador.

Em relatório de fim de ano denominado “Retrospectiva Brasil 2019”, em que a Transparência Internacional faz um resumo dos avanços e retrocessos da agenda anticorrupção no período, a entidade chamou de “ato hostil” o pedido de anulação do acordo feito pela então procuradora-geral da República Raquel Dodge ao STF, que suspendeu a medida em março de 2019. A verba acabou sendo destinada para o combate à Covid-19.

A ONG, no entanto, não informou à sociedade que havia participado extraoficialmente da elaboração do texto da minuta desse mesmo acordo. Ele previa a destinação de R$ 2,5 bilhões para uma fundação privada que investiria em projetos, iniciativas e entidades com atuação na prevenção e combate à corrupção – mesmo perfil da Transparência Internacional.

A destinação desse dinheiro estava sendo discutida entre os procuradores brasileiros e as autoridades americanas desde 2015, conforme revelado pela Pública em março, e é fruto de um acordo entre a Petrobras e o governo americano. Já em outubro daquele ano, Deltan Dallagnol defendia usar a verba para entidades que combatem a corrupção – e citava, inclusive, a Transparência Internacional. “Precisamos de alguém que se disponha a estudar e bolar um destino desses valores que agradaria a todos, como um fundo, entidades contra a corrupção, o sistema de saúde público, fundo de direitos difusos, fundo penitenciário, órgãos públicos que combatem corrupção, a transparência internacional Brasil ou contas abertas etc”, afirmou no Telegram aos colegas que participavam do Chat FT MPF Curitiba 2, em 8 de outubro.

Em dezembro de 2018, mais de um mês antes de o acordo que criava a fundação se tornar público – o que aconteceu em 23 de janeiro de 2019 –, pelo Telegram Dallagnol encaminhou o arquivo com uma versão preliminar da minuta para Bruno Brandão e para Michael Mohallem, professor da Fundação Getulio Vargas Direito Rio, pedindo sugestões.

“Caros, temos uma versão preliminar do acordo com a Petrobras. Vcs podem olhar e dar sugestões, com base na sua experiência? […]”, escreveu o procurador no chat 10M+ a Vingança, no dia 7 de dezembro de 2018. Esse grupo do Telegram, formado por Dallagnol, Brandão e Mohallem, foi criado com objetivo principal de debater as novas medidas de combate à corrupção.

Sete dias depois da mensagem do procurador, o diretor da TI enviou um arquivo com suas sugestões para o acordo.

Deltan Dallagnol e Bruno Brandão chegaram a discutir os pontos propostos pelo diretor-executivo da Transparência Internacional ao texto da minuta. “Bruno, suas sugestões foram ótimas e nos abreviaram um grande trabalho”, agradeceu o procurador, às 13h36 do dia 17 de dezembro de 2018.

Entre eles, Brandão alertou Dallagnol sobre possíveis críticas, que se concretizaram após a publicação do acordo, de que “o MP está criando sua própria fundação pra ficar com o dinheiro da multa”. Deltan ignorou as sugestões do diretor da TI.

Mesmo assim, depois de a minuta ter vindo a público e causado diversas críticas, Brandão foi à imprensa defender o texto final. “A crítica [de exacerbação do papel do Judiciário] seria razoável se o Ministério Público determinasse, de maneira discricionária, o destino dos recursos. Mas não é isso que está acontecendo. Eles não estão se apropriando dos recursos; estão devolvendo para a sociedade”, defendeu Brandão, em entrevista à Folha de S.Paulo, em 3 de março de 2019.

Em 29 de novembro de 2018, o procurador Paulo Roberto Galvão se reuniu com Brandão e o professor Michael Mohallem “para ver o modelo de destinação” dos recursos da Petrobras.

No resumo do encontro que fez aos colegas no Chat Acordo Petro x DOJ x SEC, ele escreveu, sobre a proposta: “Por enquanto pedem para não ser compartilhada com Petrobras. TI tem receio de ficar fora da possibilidade de receber recursos Possibilidade de questionamento do modelo – na J&F há gente querendo dizer que o dinheiro deveria ser usado integralmente para ressarcimento ao erário – mas não afeta o nosso caso”.

A Transparência Internacional participou da elaboração de um plano de trabalho para gerir recursos da multa de R$ 2,3 bilhões imposta à J&F pela força-tarefa da Greenfield, do MPF. O acordo de leniência previa a destinação do dinheiro para projetos sociais. A colaboração formalizou-se com a assinatura de um memorando de entendimento, em 12 de dezembro de 2017, entre a TI, J&F e o MPF.

De acordo com a TI, foi com base nessa experiência que a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba solicitou à organização, em dezembro de 2018, recomendações técnicas para diretrizes de governança e destinação de investimento social, para inserção em acordo com a Petrobras.

“A TI Brasil apresentou as sugestões, baseadas nas referências do trabalho realizado no âmbito do Memorando de Entendimento, conforme solicitado pelos procuradores da Força Tarefa Lava Jato em Curitiba. Entre as recomendações apresentadas pela TI Brasil, estava o alerta para que o Ministério Público não fosse instituidor ou participasse da governança da entidade a ser criada”, destacou a entidade.

O professor Michael Mohallem afirmou que, devido à sua participação em projetos de pesquisa relacionados ao combate à corrupção, recebe “ocasionalmente consultas acadêmicas sobre iniciativas no campo do conhecimento”.

Questionada sobre a possibilidade de receber recursos, a Transparência Internacional respondeu que “nunca recebeu qualquer tipo de remuneração ou pleiteou qualquer função de gestão e jamais teve qualquer acordo para receber recursos” e que “a TI Brasil não contribuiu com recomendações para o caso dos recursos da Petrobras visando beneficiar-se”.

Segundo o MPF, o processo de reflexão e formatação do acordo foi de responsabilidade exclusiva dos 14 procuradores da força-tarefa.

“Houve grande preocupação dos procuradores em garantir mecanismos de governança para que a fundação de interesse público que seria criada atuasse segundo as melhores práticas e com ampla transparência, observando-se regras como objetividade, impessoalidade e accountability. Por isso, nesse processo, foram buscados subsídios junto a vários atores de órgãos públicos e da sociedade civil”, afirmou o MPF.

Conflito de interesses?

Semanas depois de o diretor da Transparência Internacional ter opinado sobre o texto da minuta, a ONG foi convidada a opinar sobre a formação da fundação. O acordo assinado pelo MPF e pela Petrobras previa que entidades da sociedade civil indicariam nomes para compor um Comitê de Curadoria Social. Seus membros seriam responsáveis por supervisionar a constituição da entidade, a cargo do próprio MPF. Por escolha de Dallagnol, a TI foi uma das primeiras organizações convidadas.

“Temos agora que começar os passos pra constituir a fundação. Precisamos expedir ofícios. Acho que um próximo passo é obter indicação de pessoas com reputação ilibada e tal… FAz um despahco para expedirmos ofícios: -para convidar AGU e CGU para indicarem pessoa para participarem da constituição da fundação… um ofício dizendo que dadas as importantes funções e expertise etc, seria muito profícuo etc… e pede pra indicar alguém -para as entidades … Olha o acordo e veja o que mais precisamos Quanto às entidades, tem que selecionar tb. De cabeça, penso em TI e Observatório Social. Tem tb a Contas Abertas, a Amarribo, o Instituto Ethos…. tem que ver quais mais. Vou perguntar”, escreveu Dallagnol a um assessor da procuradoria em 30 de janeiro de 2019.

Dallagnol chegou a ser questionado por colegas sobre a forma como essas entidades foram escolhidas. O procurador Vladimir Aras apontou falta de transparência. Ele também demonstrou incômodo com a participação do MPF e do Ministério Público Estadual do Paraná na estrutura da fundação, vista por ele como a principal fraqueza do acordo. “Pensem bem nisso. Ser fiscal e integrante da entidade fiscalizada não é uma boa prática de conformidade e governança”, observou a Dallagnol.

Questionado sobre possível conflito de interesses, o MPF ressaltou que várias entidades foram consultadas para indicar nomes de pessoas qualificadas para compor o Comitê de Curadoria Social. “O que não deve ser confundido com um convite à entidade ou a seus membros”, pontuou.

Segundo a Procuradoria do Paraná, os critérios de destinação de recursos seriam ainda definidos em estatuto, “inclusive para evitar conflitos de interesses”. “É importante esclarecer mais uma vez que o acordo previa que o Ministério Público Federal teria uma de várias cadeiras do Conselho Curador, tendo participação reduzida, portanto, e jamais qualquer controle, sobre a planejada fundação”, acrescentou.

À reportagem, a Transparência Internacional afirmou que “a TI Brasil não contribuiu com recomendações para o caso dos recursos da Petrobras visando beneficiar-se. Estivesse em busca de recursos, teria aceito diretamente a oferta de financiamento feita pelo grupo J&F, ainda em 2017, para cumprir obrigação de seu acordo de leniência. Em vez disso, a TI optou por se engajar em empreitada muito mais demandante e desafiadora, mas com potencial transformador da realidade da sociedade civil brasileira”.

Parceira fiel

A Transparência Internacional continuou apoiando a Lava Jato e seus protagonistas mesmo após as revelações da série de reportagens da Vaza Jato que explicitou o papel político da operação e mostrou comportamentos antiéticos e fora dos padrões legais de Sergio Moro, Deltan Dallagnol e outros procuradores da força-tarefa. A entidade, inclusive, amenizou o escândalo.

“O conteúdo das mensagens revelava um grau problemático de proximidade entre o juiz Moro e os membros da FT [força-tarefa], assim como instâncias de conduta antiética ou questionável. Embora parte das críticas feitas aos integrantes da força-tarefa seja justificada, as publicações da Vaza Jato foram usadas para atacar a operação e os seus agentes”, posicionou-se a TI no relatório de fim de ano “Retrospectiva Brasil 2019”.

“Ainda não houve relatos de ofensas mais graves ocorridas durante as investigações ou nos julgamentos, como falsificação de provas ou coerção de testemunhas. O escândalo afetou a imagem da Operação Lava-Jato e aprofundou a divisão dentro do Ministério Público”, acrescentou. À Pública, a organização afirmou que “os vazamentos foram instrumentalizados por quem queria apenas colocar fim à maior operação de combate à corrupção no Brasil e perpetuar a impunidade”.

No mesmo dia em que o então ministro Sergio Moro anunciou sua demissão (motivada, segundo ele, pela interferência política do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal), a ONG publicou uma forte nota de apoio a Moro. “As instituições e a sociedade brasileira devem agir para salvar a luta contra a corrupção e o regime democrático: as gravíssimas revelações do ex-ministro Sergio Moro precisam ser apuradas”, diz o título do texto.

Dias depois, a organização criticou a tentativa do procurador-geral da República, Augusto Aras, de retomar a negociação de um acordo de delação premiada com o advogado Rodrigo Tacla Duran, apontado como operador financeiro da Odebrecht no exterior, que atingiria um amigo do ex-ministro e ex-juiz da Lava Jato. “Quando um PGR indicado politicamente transita tão intensamente no meio político, instala-se permanente receio de que suas ações não se blindem inteiramente da política”, escreveu a ONG no Twitter no dia 3 de junho.

A Transparência Internacional, no entanto, não se manifestou quando Moro abandonou a magistratura para entrar no governo Bolsonaro, mesmo sendo o principal nome da Operação Lava Jato e o responsável pela prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que o tirou da disputa eleitoral e abriu caminho para a vitória do capitão reformado.

Em 2016, a TI deu o seu prestigioso Prêmio contra a Corrupção para a força-tarefa, afirmando que “a Operação Lava Jato começou como uma investigação local sobre lavagem de dinheiro e se transformou na maior investigação que expôs casos de corrupção no Brasil até o momento”. A organização reforçou que os promotores “lidaram com um dos maiores escândalos de corrupção do mundo, o caso Petrobras, averiguaram, processaram e obtiveram severas penas contra alguns dos membros mais poderosos da elite político-econômica do Brasil”.

 

*Da Pública

*Foto destaque: Marcelo Camargo/Agência Brasil – Arte: Larissa Fernandes/Agência Pública

 

Após STF reconhecer ilegalidades, Lava Jato inventa nova denúncia contra Lula

Nota da Defesa do ex-Presidente Lula

A defesa do ex-presidente Lula foi surpreendida por mais uma denúncia feita pela Lava Jato de Curitiba sem qualquer materialidade e em clara prática de lawfare. A peça, também subscrita pelos procuradores que recentemente tiveram suas condutas em relação a Lula analisadas pelo CNMP após 42 adiamentos — e foram beneficiados pela prescrição —, busca criminalizar 4 doações lícitas feitas pela empresa Odebrecht ao Instituto Lula entre 2013 e 2014. Tais doações, que a Lava Jato afirma que foram “dissimuladas”, estão devidamente documentadas por meio recibos emitidos pelo Instituto Lula — que não se confunde com a pessoa do ex-presidente — e foram devidamente contabilizadas.

A Lava Jato mais uma vez recorre a acusações sem materialidade contra seus adversários, no momento em que a ilegalidade de seus métodos em relação a Lula foi reconhecida recentemente em pelo menos 3 julgamentos realizados pelo Supremo Tribunal Federal. No caso do uso da delação de Palocci em processos contra Lula às vésperas das eleições presidenciais de 2018, o Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, também identificou possível motivação política do ato, além da própria ilegalidade. Para além disso, o mesmo tema tratado na nova denúncia já é objeto de outra ação penal aberta pela mesma Lava Jato de Curitiba contra Lula, que foi recentemente sobrestada por decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, acolhendo pedido da defesa do ex-presidente.

O excesso de acusações frívolas (overcharging) e a repetição de acusações são táticas de lawfare, com o objetivo de reter o inimigo em uma rede de imputações, objetivando retirar o seu tempo e macular sua reputação.

A denúncia acusa Lula e outras pessoas pela prática de lavagem de dinheiro, partindo da premissa de que o ex-presidente integraria uma organização criminosa. No entanto, Lula já foi absolvido de tal acusação pela 12ª. Vara Federal de Brasília, por meio de decisão que se tornou definitiva (transitada em julgado) e que apontou fins políticos na formulação da imputação. Nos contratos da Petrobras referidos na denúncia não há qualquer ato praticado por Lula (ato de ofício), assim como não há qualquer conduta imputada ao ex-presidente que tenha sido definida no tempo e no espaço, mesmo após 5 anos de investigação.

Essa nova investida da Lava Jato contra Lula reforça a necessidade de ser reconhecida a suspeição dos procuradores de Curitiba em relação ao ex-presidente, que está pendente de análise no Supremo Tribunal Federal, assim como a necessidade de ser retomado o julgamento da suspeição do ex-juiz Sergio Moro — a fim de que os processos abertos pela Lava Jato de Curitiba em relação a Lula sejam anulados.

Cristiano Zanin Martins

 

*Lula.com.br

 

Operação da PF mira responsáveis por queimadas no Pantanal

Cinco fazendeiros cujas propriedades se encontram em áreas remotas da região são investigados.

A Polícia Federal cumpriu 10 mandados de busca e apreensão nas cidades de Corumbá e Campo Grande, em Mato Grosso Sul na manhã desta segunda-feira. A operação, batizada de Matáá, tem o objetivo de identificar os responsáveis por promover as queimadas que consomem a região do Pantanal há mais de um mês.

As investigações da PF recaem sobre cinco fazendeiros cujas propriedades se encontram em áreas remotas do Pantanal. Não há mandados de prisão expedidos, porém, podem ocorrer prisões em flagrante nos locais onde estão sendo feitas as buscas.

A suspeita é de que as queimadas em torno dessas cinco fazendas possam ter sido organizadas da mesma forma que o chamado “Dia do Fogo”, no ano passado, no Pará, quando fazendeiros teria se articulado para atear fogo em áreas da floresta amazônica.

O chefe da delegacia da PF em Corumbá, Alan Nascimento, disse que os indícios são de que as queimadas realizadas nessas fazendas foram intencionais.

— Elas ficam em áreas inóspitas que, de outra forma, dificilmente pegariam fogo. Os indícios apontam que esse fogo pode ter sido intencional — afirmou o delegado.

Nascimento afirmou que a polícia pretende analisar o conteúdo de e-mails e mensagens de texto enviados pelos fazendeiros e seus funcionários para averiguar se houve algum tipo de orquestração entre os proprietários para dar início às queimadas na área.

O delegado disse que o volume das queimadas na região atrapalhou até a deflagração da operação. O planejamento previa que helicópteros fossem usados durante a ação, mas eles não puderam ser utilizados por conta da fumaça.

Na operação de hoje, a PF utilizou imagens de satélites e sobrevoou as áreas devastadas no interior do Pantanal para identificar os focos de fogo. Segundo a PF, a estimativa é a de que 25 mil hectares do bioma foram atingidos pelas chamas diretamente pelos investigados.

Os envolvidos podem responder por crimes de dano à floresta de preservação permanente e dano direto e indireto a unidades de conservação. Se forem condenados, as penas podem superar 15 anos de prisão.

A operação desta segunda-feira foi batizada de Matáá, que significa fogo no idioma guató, em referência aos índios pantaneiros Guatós que vivem nas proximidades das áreas atingidas.

Sem previsão de chuvas para a região, a perspectiva é de que as queimadas continuem a se alastrar. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), 12% do Pantanal já foi consumido pelas chamas. Números do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo) indicam que mais de 2,2 milhões de hectares do bioma já foram consumidos pelo fogo. As chamas também ameaçam as espécies animais, que tiveram seu habitat devastado.

 

*Jéssica Moura e Leandro Prazeres/O Globo

*Foto destaque: André Zumak

 

Um coronel na cultura: sai o amigo do Carluxo, entra um coronel

Dois meses no cargo, presidente da Funarte é demitido após embate com Mario Frias.

Coronel da reserva foi nomeado para substituir Luciano Querido na fundação. E assim segue a coitada da cultura brasileira, sem eira nem beira, mas com um coronel à frente da Fundação Nacional das Artes.

Dois meses depois de ser nomeado para comandar a Funarte, Luciano Querido foi demitido. Bateu de frente com Mario Frias, secretário de Cultura, por causa de nomeações — algumas que foram feitas e outras que deixaram de ser feitas.

Querido foi assessor de Carlos Bolsonaro na Câmara dos Vereadores, cuidando da área de mídias sociais do gabinete. Participou também da pré-campanha de Jair Bolsonaro à presidência. Depois, foi afastado pelo próprio Bolsonaro, e ganhou abrigo na Funarte.

O próprio Bolsonaro deu o.k. para a troca. Querido, no entanto, deve ser aproveitado em algum outro cargo no governo.

Para o lugar de Querido, foi nomeado um coronel da reserva do Exército, Lamartine Holanda. Bolsonaro conversou com ele nos últimos dias.

Aos 60 anos, Holanda exibe um currículo variado. Estão lá desde a graduação na Escola Militar das Agulhas Negras a cursos de roteirista na Escola de Cinema de São Paulo, de manutenção de material bélico, de gestão de direitos do processo de financiamento de projetos audiovisuais com recursos públicos, de transportes de cargas perigosas e de comunicação neurolinguística.

 

*Com informações de Lauro Jardim/O Globo

 

Por uma amizade imaginária com Trump, Bolsonaro sacrifica interesses brasileiros

Jair Bolsonaro adora dizer que falta patriotismo à sociedade civil brasileira. Usa a manjada teoria da conspiração de que a defesa dos direitos dos povos indígenas às suas terras abre caminho para a internacionalização da Amazônia. Mas é ele que, novamente, deu provas que seu fetiche político-ideológico nos guia para “America First, Brazil later”.

O governo brasileiro renovou a cota de etanol dos Estados Unidos que pode entrar no Brasil sem pagar imposto de importação, um mar de 62,5 milhões de litros por mês. Acima disso, o valor é a tarifa comum do Mercosul, 20%. A cota havia expirado em agosto.

Mas para ajudar Donald Trump, que busca votos nos estados produtores de milho (matéria-prima do etanol por lá), Bolsonaro dificultou a vidas dos produtores brasileiros, que estão com estoques para gastar devido à redução no consumo na pandemia.

E isso logo depois dos Estados Unidos terem reduzido a cota de aço semiacabado que o Brasil pode vender a eles sem tarifas – o total caiu de 350 mil para 60 mil toneladas para o quatro trimestre do ano. O motivo também foi pressão da indústria dos EUA sobre Trump, candidato à reeleição, por causa da queda de demanda devido à pandemia.

Ou seja, após levarmos um pescotapa de alguém que Bolsonaro chama de amigo e aliado, servimos a ele um chazinho e fizemos massagem nos seus pés. O chanceler Ernesto Araújo pode chamar isso de diplomacia, mas por aqui tem outro nome: paga-lanche.

No debate que levou à renovação da cota, o Ministério da Agricultura foi contra. Acabou vencido sob a justificativa de que isso abre caminho para facilitar a exportação de açúcar para os EUA. Fontes ouvidas pela coluna afirmam que é mais fácil o tal camelo passar pelo buraco da tal agulha do que isso ocorrer no curto prazo.

Além disso, a renovação da cota dura apenas três meses. O produtor de etanol de milho nos Estados Unidos tem que ser muito otário para não perceber que isso vai funcionar como uma jogada eleitoral, pois muito provavelmente o Brasil vai elevar a cota novamente após as eleições presidenciais de novembro nos EUA.

Mas o que a história nos mostra é que tem gente que gosta de ser enganada. Lá, aqui, em todo o lugar.

A questão que está em jogo aqui não é o livre comércio de etanol, de açúcar, de álcool. Você pode ser a favor de que Brasil e Estados Unidos tenha uma relação de compra e venda sem tarifas para vários produtos – como já aconteceu com o etanol até os EUA darem um salto no total exportado para cá.

A questão é que tudo soa como subserviência bem crua mesmo, inclusive na opinião de negociadores. Bolsonaro teme que Trump saia do poder, o que fragilizaria a posição da extrema direita internacionalmente. E, por conta disso, aceita fazer o que for necessário. Inclusive agir como poodle do norte-americano, passando por cima dos interesses dos brasileiros.

Nos últimos meses, Trump usou o Brasil de Bolsonaro até como exemplo negativo no combate à covid-19. Mas nosso presidente segue firme e forte na arte de lamber botas.

O atual governo não é muito bom de trocas. Tanto que abandonou uma tradição de mais de um século de uma diplomacia independente em nome de amigos imaginários.

 

*Leonardo Sakamoto/Uol

 

Assustador: Governo discute o congelamento das aposentadorias

Tereza Cruvinel escreve sobre o plano do governo Bolsonaro de desvincular o reajuste das aposentadorias do salário mínimo e congelá-las por dois anos: “Se ele concordar com esta proposta indecente da turma de Guedes, dará um tiro no pé”.

“Não vou tirar dos pobres para dar aos paupérrimos”, disse Bolsonaro recentemente, quando a equipe de Paulo Guedes tentou acabar com o abono salarial e a Farmácia Popular em busca de recursos para o Renda Brasil.
A turma de Guedes não pensou em tirar dos mais ricos, através da tributação do patrimônio ou dos dividendos, os recursos de que precisa para empinar o programa com que Bolsonaro quer turbinar sua popularidade e reeleger-se em 2022. Mirou outro pobres, os aposentados, inclusive os que ganham o salário mínimo. O que se discute no governo, segundo o portal G1, é o congelamento de todas as aposentadorias por dois anos.

Isso significa desvincular do salário mínimo as aposentadorias que hoje têm este valor, o piso garantido pela Constituição. E tirar dos que ganham acima disso a correção anual da inflação pelo INPC. Em dois anos, os mais pobres do INSS estarão ganhando bem abaixo do mínimo e os valor das demais aposentadorias começará a virar pó. A maior aposentadoria do INSS é R$ 6.101,06. Não estamos falando de ricos, pois não.

Congelando as aposentadorias, a área econômica espera conseguir R$ 17 bilhões em 2021 e R$ 41,5 bilhões em 2022, um total de R$ 58,5 bilhões em dois anos para financiar o Renda Brasil.

A proteção aos mais vulneráveis é necessária, e tornou-se imperativa com a pandemia, que jogou mais gente no desemprego e na miséria. Mas Bolsonaro não pode tungar os que contribuíram para o INSS durante a vida inteira para financiar sua ambição eleitoral.

Se ele concordar com esta proposta indecente da turma de Guedes, dará um tiro no pé. Ganhará votos entre os paupérrimos mas vai ser odiado pelos 35 milhões de aposentados, dos quais 70% ganham um salário mínimo.

Boa parte deles apertou o 17 em 2018. Mas não repetirá este voto depois deste confisco.

 

*Tereza Cruvinel/247

 

Bolsonaro atende a Guedes, veta perdão a dívidas de igreja, mas estimula a derrubada do veto

O presidente Jair Bolsonaro atendeu à recomendação do ministro Paulo Guedes ​e vetou parte do dispositivo que concedia anistia em tributos a serem pagos por igrejas no país, medida que poderia ter impacto de R$ 1 bilhão.

Para não desagradar o segmento religioso, um dos pilares de sustentação de seu governo, o presidente defendeu a derrubada do veto pelo Congresso e anunciou que enviará uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) para atender à demanda do grupo.

Também sancionou dispositivo que anula autuações da Receita anteriores a uma lei de 2015 que determinou que os valores pagos, em dinheiro ou como ajuda de custo, a ministros ou membros de ordem religiosa não configuram remuneração direta ou indireta. O artigo sancionado por Bolsonaro anula autuações anteriores a junho de 2015, data de publicação da regra.

“Confesso. Caso fosse deputado ou senador, por ocasião da análise do veto que deve ocorrer até outubro, votaria pela derrubada do mesmo”, escreveu o presidente nas redes sociais. “No mais, via PEC a ser apresentada nessa semana, manifestaremos uma possível solução para estabelecer o alcance adequado para a imunidade das igrejas nas questões tributárias.”, acrescentou.

O veto, que pode ser derrubado pelo Congresso, foi assinado na sexta-feira (11), data-limite para sanção da proposta, e será publicado no “Diário Oficial da União” desta segunda-feira (14).

Nos últimos dias, a bancada evangélica na Câmara vinha pressionando para evitar o veto.

No anúncio da decisão de Bolsonaro, o Palácio do Planalto fez questão de ressaltar que o presidente “irá propor instrumentos normativos a fim de atender a justa demanda das entidades religiosas”.

“O presidente Jair Bolsonaro se mostra favorável à não tributação de templos de qualquer religião. Porém, a proposta do projeto de lei apresentava obstáculo jurídico incontornável, podendo a eventual sanção implicarem crime de responsabilidade do presidente”, observou.

Na última quarta-feira (9), em reunião com a bancada evangélica, Bolsonaro já tinha informado aos deputados presentes que o perdão da dívida poderia ser questionado pelo TCU (Tribunal de Contas da União) e sustentar um pedido de impeachment contra ele.

 

*Com informações da Folha

 

 

Vídeo: Racismo, não! Neymar é chamado de “macaco” em jogo na França, reage e é expulso

Neymar reagiu uma ofensa racista de um jogador branco do Olympique de Marselha, o espanhol Álvaro González que o teria xingado de “macaco”: “Racismo, não!”.

Foi durante jogo válido pelo Campeonato Francês neste domingo (13). Neymar reclamou das ofensas racistas. Na etapa final, ele discutiu outra vez com o zagueiro González e foi expulso.

Na saída de campo, Neymar admitiu ter agredido o espanhol. Após a partida, o craque declarou nas redes sociais: “Único arrependimento que tenho é por não ter dado na cara desse babaca”.

O Paris Saint-Germain de Neymar foi derrotado para o Olympique de Marselha por 1 a 0. De volta após se livrar do coronavírus, o brasileiro participou de um jogo conturbado. Neymar acabou expulso no fim do jogo, após uma confusão generalizada em campo, quando agrediu justamente Álvaro González, pivô da confusão do primeiro tempo. Após o tumulto, outros quatro jogadores também receberam o cartão vermelho da arbitragem.

Veja os vídeos em que Neymar protesta contra a ofensa racista e o post do jogador:

https://twitter.com/NeymarMilGrau10/status/1305236613732204546?s=20

 

*Com informações do 247

 

Vídeos: O pantanal está em chamas, mas Bolsonaro ri

“Ninguém quer ver de perto a morte que o fogo traz para o Pantanal. Eu vi”

Era meu último dia fotografando as queimadas no Pantanal. Saio para pegar o ônibus quase acostumado com o cheiro de fumaça impregnado na roupa, o gosto amargo na boca, os olhos vermelhos e lacrimejando. Ignoro a ardência nos olhos para mantê-los abertos; fico em vigília, atento, câmara na mão.

Do lado de fora, vejo a calamidade. Perto de Poconé (MT), focos de incêndio. A fumaça e velocidade do ônibus atrapalham, mas aperto o olhar e avisto uma cena brutal. O corpo duro e sem vida de uma jaguatirica. Grito para pararem o ônibus e desço para fotografar. O ar é pesado. Os olhos do animal brancos e a língua de fora, como se tivesse tentado sorver o pouco que ainda resta do ar do Pantanal.

O motorista aparece ao meu lado, e falamos baixo, como que em luto. Ele diz que ela não foi atropelada. Morreu fugindo. Me abaixo no asfalto escolhendo um ângulo que mostre a quantidade de fumaça no caminho que ainda vou seguir. Clico o filhote tentando não mostrar toda a brutalidade que a morte impôs naquele animal tão belo. Eu nunca tinha visto uma jaguatirica. Ainda não vi.

Ninguém quer ver a morte que o fogo traz para o Pantanal tão de perto assim. Eu vi. Vi o fogo e o fim de tudo em um dos biomas mais ricos e lindos do planeta.

Quando cheguei em Poconé, perto da meia noite, a cidade estava envolta na penumbra. A fumaça era tão pesada que acreditei ser a névoa da madrugada. Não era. Era o efeito causado pelos mais de 2 milhões de hectares que estavam em chamas no Pantanal. Várzea Grande e Cuiabá também sentem o impacto da queimada criminosa e covarde. Vi como o agronegócio abre pasto com gasolina e diesel. Fazendeiros apressados em passar a boiada com a chancela do governo federal e do Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Quantos genocídios mais são possíveis na nossa nação? O Pantanal é só mais um crime impune na lista interminável dessa administração.

No meio de uma tarde de 43ºC e da fumaça sem fim em Barão de Melgaço (MT), os bombeiros e brigadistas olham o fogo, impotentes. Um dos brigadistas, com a pá na mão, é ‘seu’ Crovis. Ele diz que o fogo tem raiva. Pula de um lado para o outro. Está vivo. Ele olha para o caminho sem fim, escondido pela fumaça e avisa que não dá pra fazer nada além de esperar. Encosta no caminhão-pipa ao seu lado, que está vazio, e toma seu tererê.

O barulho do fogo é assustador

O fogo consome tudo ao redor e o barulho é assustador. Os bombeiros — são cinco no local — usam um drone para avaliar a situação. Mas a conclusão é a mesma: não há nada a ser feito. É esperar o fogo se cansar do mato e desaparecer debaixo da terra.

O ecoturismo é forte na região, que tem como atração espécies endêmicas como a arara azul do Pantanal e o cervo pantaneiro. Mas o ecoturismo esbarra no agronegócio e na abertura de pasto para a boiada. É preciso expandir a área do gado. E os brigadistas, inconformados, me contam que, para isso, fazendeiros ordenam que se use o fogo em nas áreas secas com solo rico em metano e matéria orgânica. É o fogo da ganância. Destruição, pra essa gente, é sinônimo de progresso.

Cansados de ver os animais sofrendo, guias turísticos, biólogos e veterinários locais se uniram para tentar salvá-los. Um dos resgates foi de uma onça pintada, transferida para Goiás. Eu acompanho o grupo, que me explica que a desidratação — por conta da seca e da falta de água em riachos e lagoas -, a fumaça e o fogo deixam os animais desorientados, fazendo com que passem por áreas em brasa. Com as patas queimadas e morrendo de sede, esses animais sucumbem ao choque da dor. E, sem conseguir se locomover, morrem.

Os voluntários também saem diariamente para deixar recipientes com água em vários pontos de rio seco e da mata. Falta água. Falta chuva. E, ficou claro para mim, falta humanidade no Pantanal.

Brigadista teve 80% do corpo queimado

À noite, de volta ao Sesc Pantanal, onde fiquei hospedado, escuto a conversa na mesa ao lado da minha no refeitório. Um dos militares, também alojado ali, não consegue segurar sua revolta e raiva ao comentar o ministro Salles pretendia bloquear a verba destinada para a batalha contra as queimadas na região pantaneira além da Amazônia. “Ele se precipitou, pô.”

Um desgoverno que brinca com os nervos de quem vê a morte todos os dias e vai dormir sabendo que, no dia seguinte, pode ser pego na mudança de direção do fogo e morrer queimado. Foi o caso do Wellington Fernando Peres Silva, brigadista do ICMBio que teve 80% do corpo queimado em uma ação contra os incêndios do Parque Nacional das Emas (GO).

O que Salles e o governo federal não entenderam é que igual a mim existem muitos na região. Moradores, fotógrafos e jornalistas que testemunharam tudo. Viram o que a boiada representa. Gente que sentiu o fogo de perto e respirou diariamente o ar esfumaçado e doente da Transpantaneira. Gente que rezou para ver uma onça ou jaguatirica vivas, mas que, em vez disso, tiveram de se deitar na estrada ao lado de um corpo gelado para mostrar ao mundo o que a boiada faz quando passa. Ela queima.

https://twitter.com/alice_pataxo/status/1303333925935345666?s=20

https://twitter.com/Annluizalima/status/1303399948390719488?s=20

 

*João Paulo Guimarães- Fotógrafo/Uol