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Se passar, acordo da PEC é bom para Lula, com percentual maior do Orçamento

Reinaldo Azevedo – Há duas formas principais de ler uma negociação política: 1) o melhor acordo é o possível, já que o pior é o desejável, mas irrealizável; 2) ou tudo sai como quer uma das partes, de sorte que a outra saia humilhada, ou nada feito. A primeira é própria da política; a segunda fabrica impasses e crises. Parece, por ora, que tudo caminha para uma solução política no que respeita à PEC da Transição e ao Orçamento do ano que vem. O futuro governo, ao fim de tudo, ganhou ou perdeu? Ganhou. Volto ao ponto mais adiante.

Se tudo sair como negociaram Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, os líderes dos partidos e os petistas Fernando Haddad (futuro ministro da Economia), Josué Guimarães (CE), líder do PT na Câmara, e o senador Jaques Wagner (BA) — os três últimos falando pelo futuro governo –, caminha-se para o seguinte:
– os termos da PEC de Transição terão validade por um ano;
– o teto de gastos será elevado em R$ 145 bilhões;
– mantêm-se os 6% sobre receitas extraordinárias, coisa da ordem R$ 23 bilhões;
– mantêm-se a possibilidade de investir R$ 24,6 bilhões, fora do teto, de contas abandonadas do PIS-Pasep — que não têm origem no Orçamento;
– recursos oriundos de acordos com organismos multilaterais não poderão ser usados fora do teto; isso será suprimido do texto;
– a PEC de Transição também dará a nova destinação aos R$ 19,4 bilhões das Emendas do Relator, tornadas inconstitucionais pelo STF. A divisão ficará assim:
a: R$ 9,7 bilhões (metade dos recursos) serão convertidos em emendas individuais, de execução obrigatória (RP6);
b: a outra metade irá para as emendas RP2, que o governo usa de forma discricionária.

Há o entendimento de que a mudança do prazo de dois para um ano e a questão relativa ao financiamento internacional não precisam ser referendados pelo Senado. Já a nova destinação dos R$ 19,4 bilhões tem de ser incluída na PEC da Transição. As emendas individuais, que ficarão com metade da grana, correspondem a 1,2% da Receita Corrente Líquida. Isso foi definido por emenda em 2015 e por emenda tem de ser alterado.

As principais lideranças que participaram do acordo acreditam que se pode conseguir algo em torno de 340 votos na Câmara para esse arranjo. Há ainda os inconformados, que querem suprimir da emenda os recursos referentes às receitas extraordinárias e ao PIS-Pasep.

Tudo caminhando sem novos percalços, a Câmara pode votar ainda hoje a PEC, e há a expectativa de que o Senado também referende ainda nesta terça a alteração referente à divisão das emendas do relator. A Comissão Mista do Orçamento se reúne amanhã, e haverá um esforço para definir, então, a nova peça orçamentária. Celso Sabino (União-PA), presidente da Comissão, não descarta a eventual convocação do Congresso para a semana que vem caso isso não aconteça.

O senador Marcelo Castro (MDB-PI), relator-geral do Orçamento, está convicto de que tudo se resolve nesta semana. Em entrevista coletiva, afirmou:
“Nós vamos votar essa semana. Nós vamos votar o Orçamento, esperamos, amanhã ou depois de amanhã, que é o último dia. Quinta-feira vai ser o último dia de funcionamento do Congresso Nacional. No dia 23, o Congresso entra em recesso. Então, nós temos de votar até o dia 22, que é quinta-feira”.

FUTURO GOVERNO GANHA OU PERDE?
Vamos ver.

O fato de a elevação do teto valer apenas por um ano é, por óbvio, um contratempo para o futuro governo. Afinal, antes da metade do ano que vem, começa a negociação sobre o Orçamento de 2024. E a nova gestão tem seis meses para negociar com o Congresso uma nova âncora fiscal.

Mas considerem:
1 – dado que dinheiro não cai do céu, os recursos que ficarão fora do teto agora não aparecerão por mágica. Quando menos, qualquer que seja a âncora, será preciso fazer frente às despesas, não? Ou o futuro Congresso vai mandar os pobres à breca? Ademais, o ministro Gilmar Mendes lembrou ao Parlamento que aí está — e valerá para o próximo — que os recursos do Bolsa Família, por lei e por determinação Constitucional, estão garantidos. Como está na sua decisão, inexiste âncora fiscal que invalide o que dispõe a Constituição nos Artigos 3º, 6º e 23. Ademais, há a Lei 10.835, que dispõe sobre a renda mínima. E, num Mandado de Injunção, o STF definiu, por unanimidade, em 2021 que ela tem de ser posta em prática;

2 – os R$ 145 bilhões fazem frente ao complemento necessário para os R$ 600 do Bolsa Família e os R$ 150 a crianças abaixo de seis anos de famílias atendidas pelo programa. As duas contas somam R$ 70 bilhões;

3 – haverá recursos para recompor os orçamentos da Saúde, que havia perdido R$ 16,6 bilhões, da Educação, com quase R$ 5 bilhões a menos e do Minha Casa Minha Vida, que contava com ridículos R$ 34 milhões;

5 – caso se mantenham os termos do acordo, o governo poderá elevar o valor dos investimentos com os R$ 23,9 bilhões previstos, oriundos de receitas extraordinárias. É um ganho considerável porque, acreditem, no Orçamento atual, estão reservados apenas R$ 22 bilhões para esse fim;

6 – a grana abandonada no PIS-Pasep há mais de 20 anos não tem mesmo de entrar no teto. O dinheiro é privado e não sai do Orçamento;

7 – a decisão do Supremo, que tornou inconstitucional a forma como estavam as emendas do relator, acabou liberando para uso discricionário do governo outros R$ 9,4 bilhões.

Assim, tudo saindo como se definiu na reunião, o resultado é obviamente positivo para o futuro governo. E se vai ter, afinal, um Orçamento mais realista do que aquela patuscada entregue pelo atual governo.

A Bolsa sobe enquanto escrevo; o dólar cai. Alguma tia ou algum tio no parquinho “Duzmércáduz” disse àquela garotada buliçosa e um tantinho perigosa que a PEC foi desidratada — ou que nome queiram dar —, embora, a rigor, a mudança diga respeito apenas ao prazo, como se, em 2024, fosse chover maná… Mas sempre é melhor quando os infantes do mercado especulam a favor, obedecendo a uma lógica muito própria, que, como frequência, desafia a lógica clássica.

Vai ver a moçada está feliz porque, depois da decisão do Supremo sobre as emendas do relator, o futuro governo ganhou uma margem de R$ 9,4 bilhões a mais para interferir no Orçamento.

*Uol

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Por Celeste Silveira

Produtora cultural

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