Maria Elizabeth Rocha afirmou que corte militar deve julgar ex-presidente e militares envolvidos em tentativa de golpe após condenação pelo STF. “Isso é muito simbólico, porque é importante mostrar para a sociedade que ninguém está acima da lei”
A iminente condenação pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que pode levá-lo à cadeia por tentativa de golpe de Estado, não será o fim do périplo de Jair Bolsonaro (PL) pelas altas cortes do país.
Presidenta do Superior Militar (STM), Maria Elizabeth Rocha afirmou em entrevista à revista Veja, divulgada nesta sexta-feira (11), que após o julgamento no STF, o ex-presidente terá que lidar com a corte militar, onde deve sofrer uma dupla perda: a patente de capitão, seu principal mote eleitoral; e o salário da reserva, o que lhe garante R$ 12 mil aos ganhos mensais, que ultrapassam R$ 100 mil – montante pago exclusivamente com recursos públicos.
“Ele poderá perder a patente de capitão”, disse a presidenta do STM, que vai julgar todos os militares condenados a mais de 2 anos pela corte civil. “Se ele vier a ser condenado e a sentença transitar em julgado no STF, a depender do quantitativo da pena que vai ser aplicada, ele será julgado também no STM e poderá vir a perder o posto, a patente para oficialato e os proventos, se o tribunal entender plausível”, emenda.
Segundo ela, “nesse caso da trama golpista, muito provavelmente os militares serão julgados no STM”, incluindo nessa conta o general quatro estrelas Walter Braga Netto, e seus comparsas fardados, Augusto Heleno, Paulo Sergio Nogueira de Oliveira, Almir Garnier, Mario Fernandes, Mauro Cid, entre outros militares denunciados na organização criminosa golpista.
“Sobre os atos perpetrados no 8 de Janeiro e os desdobramentos que os antecederam, por certo eu vislumbro a existência do cometimento de eventuais crimes militares, não só pela condição dos agentes perpetradores — militares da ativa e da reserva —, como em razão de o acampamento em frente ao QG do Exército ser um local sob administração militar, o que em tese atrairia a competência da Justiça Militar da União”, afirma a magistrada, sinalizando que a Justiça Militar pode acionar ainda os responsáveis por darem aval aos acampamentos golpistas em área militar.
Indagada se a condenação dos militares de alta patente pode provocar “insatisfação nas tropas”, Maria Elizabeth mostrou uma postura firme, dizendo que “essas insatisfações serão absorvidas” e rebateu: “O fato é: porque vai provocar insatisfações, não se condena?”.
Segundo ela, a condenação de Bolsonaro e de militares de alta patente pela Justiça Militar terá um caráter pedagógico dentro das Forças Armadas.
“Isso é muito simbólico, porque é importante mostrar para a sociedade que ninguém está acima da lei. E que o fato de vestirem fardas não os exonera dos compromissos de cidadania que todos nós temos o dever de zelar. Do militar se exige, por estar investido das armas da nação, por ser armado pelo Estado, uma série de restrições dos seus direitos fundamentais para o bem do Estado democrático e a preservação do bem-estar da sociedade civil, que é desarmada e vulnerável. Então, é necessário que se avalie, dentro dessa conduta, se houve um mau ferimento do éthos militar, da honra militar, daquilo que eles gostam tanto de falar, de um honor militar. Se realmente for verificado, o militar precisa ser punido”.
Maria Elizabeth, que é esposa de general – Romeu Costa Ribeiro Bastos – que foi alvo da Ditadura, afirma ainda que a “Democracia é um processo inacabado” e precisa ser aprimorada. Por isso, a punição aos militares golpistas deve ser exemplo.
“A história tem que servir de lição. Fico muito assombrada quando vejo as pessoas pedindo a volta da ditadura. Quem pede isso é porque não sabe o horror que era, não sabe o que é ter medo do Estado. Não tem nada pior do que ter o Estado como inimigo invisível porque ele é um algoz de que você não pode se defender”, diz.
“O Brasil, lamentavelmente, tem surtos liberalizantes, tem episódios institucionais corretos, legítimos, e outros nem tanto. Temos uma tradição autoritária. Não significa que essa tradição tenha necessariamente que ser a do golpismo. E isso o 8 de Janeiro deixou bem claro. O passado ainda é vivo”, emenda. Com Forum.