Janja, primeira-dama do Brasil, não desperdiçou a rara oportunidade de apontar, diante do poder chinês, um fato incômodo que todos gostariam de esclarecer: o TikTok, embora oriundo de um país que muitos rotulam como “comunista”, vem sendo paradoxalmente usado como ferramenta da extrema-direita global – assim como o Instagram, o X (ex-Twitter) e outras redes, nascidas do capitalismo mais selvagem.
Essas plataformas alavancaram figuras sinistras da extrema-direita. Jair, o ex-mito, hoje réu no STF, acusado de múltiplos crimes, surfou nos algoritmos e, apesar de sua figura grotesca, foi eleito e quase reeleito. Donald Trump, que tentou um golpe e escapou da justiça, tuitou ódio até voltar para a Casa Branca. E Elon Musk, que transformou o X num espaço onde reacionários se divertem, já atacou abertamente a soberania brasileira.
Até aí, nenhuma surpresa.
Então, por que a fala de Janja virou alvo de tanto furor?
A surpresa está aqui.
O problema não foi o que ela disse, mas a resposta que provocou. Xi Jinping, com sua serenidade oriental, lembrou que o Brasil é soberano e pode regular empresas que ameacem sua democracia ou desrespeitem suas leis. Declarou, assim – em outras palavras – que corporações, sejam chinesas como o TikTok ou pertencentes a magnatas como Musk e Zuckerberg, valem menos do que a liberdade civil dos povos e devem se submeter às constituições das nações onde operam. Uma verdade tão clara quanto a fala de Janja, mas que, como Xi ensinou, precisa ser reafirmada em tempos obscuros.
Para nossa mídia corporativa, no entanto, Janja cometeu o pecado de falar como cidadã lúcida e curiosa. E, quando a lucidez não é bem-vinda, esse aparelho da ideologia neoliberal recorre, sem pudores, ao poder da misoginia, ainda reinante, para desviar o foco. Em vez de debater o ensinamento respeitoso implícito na resposta de Xi Jinping, a narrativa foi recortada, distorcida e rebaixada, para pintar Janja como uma primeira-dama que “se intromete” em assuntos de Estado – um ataque pessoal que, aliás, contrasta com o silêncio complacente dessa mesma mídia diante das condutas escandalosas da ex-primeira-dama que o país teve de engolir junto com todo o pacote nauseabundo pós-2018.
E não é segredo que essa mídia sonha com um Brasil curvado ao “mercado”, seja através dos algoritmos, dos templos ou dos quartéis. E, para proteger seu sonho, é capaz de soterrar verdades como a de Xi Jinping – cuja postura de respeito à soberania brasileira contrasta, por exemplo, com a do governo dos EUA, ou com a de figuras como Musk ou Jair.
Nessa guerra ideológica que lutamos desde o golpe neoliberal contra Dilma, falas como a de Xi serão sempre obscurecidas para que as bravatas dos que preferem o Brasil de joelhos sigam ecoando.
P.S.: E a suposta indignação da esposa de Xi Jinping, alardeada pela fofoca? Alguém perguntou à Sra. Xi o que ela achava do TikTok, ou a história foi inflada apenas para alimentar o sensacionalismo? Algo tão nonsense que espanta ver tanta gente boa não perceber o falso problema – tão ridículo quanto óbvio.
*Do Facebook de Sergio Alarcon
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