A decisão do procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, de alterar o estatuto e acabar com os mandatos de conselheiros e coordenadores da Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU) traz riscos diretos para a autonomia do órgão, que desde 2004 atua com mandatos independentes do governo federal e da própria PGR.
A opinião é do promotor de Justiça Gustavo Roberto Costa, membro do coletivo Transforma MP, formado por integrantes do Ministério Público dos Estados e da União. Ao GGN, Costa afirmou que a interferência de Aras na instituição de ensino é um “fato grave” que atrela a Escola do Ministério Público “aos interesses” do atual PGR.
“O fato é grave, principalmente quando se trata do órgão máximo e deliberativo em matéria acadêmica, administrativa e orçamentária – o Conselho Administrativo -, que, desta forma, fica subjugado aos interesses do Procurador Geral da República”, narrou.
Todos os integrantes do colegiado foram destituídos, sem prévia consulta ou comunicação, quebrando com a tradição vigente há 16 anos de dois anos de mandatos, prorrogáveis por mais dois. Essa regra é do estatuto interno da Escola, que estabelece 16 conselheiros, incluindo 8 suplentes, com a função de decidir sobre as questões acadêmicas, administrativas e orçamentárias da instituição.
Entre as responsabilidades dos coordenadores de ensino demitidos por Aras estão “coordenar os trabalhos de elaboração do Plano Anual de Atividades do respectivo ramo; propor plano anual de atividades comum a todos os ramos; supervisionar o processo de seleção dos docentes das atividades do respectivo ramo, entre outras atribuições (art. 19 do Estatuto)”, explicou ao GGN.
Para fazer possível essa mudança, o PGR alterou o estatuto, acabando com os mandatos em exercício e, imediatamente, demitiu os 16 membros. Em seguida, publicou uma portaria com os nomes dos substitutos escolhidos, nesta terça-feira (04).
Uma das consequências diretas da alteração estatutária é abrir espaço para a exoneração a qualquer tempo de conselheiros e coordenadores, criando uma subordinação direta dos mesmos aos interesses do procurador-geral.
Gustavo lembra que a intenção do PGR foi explicitada ainda durante a sabatina no Senado, em setembro de 2019, quando o então candidato mostrou a intenção de acabar com uma suposta “linha de doutrinação, um viés na formação de procuradores na Escola Superior do Ministério Público da União”.
“Ou seja, sua intenção foi desrespeitar a linha acadêmica traçada pelos órgãos colegiados, e, assim, afetar a autonomia da escola”, apontou. O que, para ele, vai na contramão do papel histórico da ESMPU, que “é o de estimular o pensamento crítico dentro da instituição, com independência”.
*GGN