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Guerra na Faixa de Gaza matou em 15 dias quase metade de jovens e crianças palestinas vítimas de conflitos desde o ano 2000

Do total de 3.265 jovens vítimas de conflitos na Faixa de Gaza desde o ano 2000, quase metade das mortes de crianças e adolescentes palestinos registradas neste aconteceu nas duas últimas semanas, durante a guerra entre Israel e o Hamas. Foram mortos ao menos 1.524 menores na região no atual confronto, ou 46,7% do total.

O número óbitos de pessoas com menos de 18 anos em 15 dias de guerra é quase três vezes o total de menores mortos no ano com mais vítimas até então. Em 2014, 548 crianças e adolescentes foram vítimas de uma ofensiva de Israel para destruir foguetes e túneis em Gaza.

A Folha de S. Paulo cruzou dados de mortes de menores de 18 anos na Faixa de Gaza, registrados pela B’Tselem, organização israelense de direitos humanos, com as informações de mortes recentes divulgadas pela Ocha, agência das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários, que considera estimativas do Ministério da Saúde de Gaza e faz esse mesmo recorte etário.

As duas organizações têm bases historicamente semelhantes e contabilizam vítimas consequentes do confronto bélico na região, mortas por explosões ou armas de fogo.

O boletim da ONU que inclui informações sobre menores, de quinta-feira (19), só traz atualização sobre crianças e jovens palestinos. Das mortes em Gaza, cerca de 40% das vítimas desde o dia 7 de outubro são menores de idade.

Do lado de Israel, autoridades locais estimam que 20 dos 705 mortos que tiveram os nomes identificados sejam crianças. A maioria morreu na ofensiva do Hamas a Israel há 15 dias.

Ao todo, o confronto tirou a vida de aproximadamente 5.800 pessoas, sendo 1.400 israelenses, e 4.449 palestinos, de acordo com autoridades locais.

A proporção de mortes palestinas é historicamente maior do que a de israelenses no confronto entre as duas partes. De 2000 até o início da atual guerra, 145 crianças e adolescentes israelenses foram mortos, sendo 90 em Israel, 51 na Cisjordânia e 4 em Gaza, de acordo com a B’Tselem.

No mesmo período, são 2.290 menores palestinos mortos, sendo 1.741 em Gaza, 537 na Cisjordânia e 12 em Israel.

Dados anteriores ao atual conflito indicam que foram 765 crianças de 0 a 12 anos e 976 adolescentes de 13 a 17 anos. No geral, 415 meninas e 1.326 meninos palestinos.

A morte de crianças foi uma das preocupações expressas na resolução proposta pelo Brasil no Conselho de Segurança da ONU. Com 12 votos favoráveis de 15 possíveis, o texto só não passou porque recebeu veto dos Estados Unidos, que destacou o direito de Israel se defender.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a mencionar as mortes de menores na sexta, em pronunciamento por vídeo, quando também classificou o ataque do Hamas de terrorista.

“Hoje quando o programa [Bolsa Família] completa 20 anos, fico lembrando que 1.500 crianças já morreram na Faixa de Gaza. Que não pediram para o Hamas fazer ato de loucura que fez, de terrorismo, atacando Israel, mas também não pediram que Israel reagisse de forma insana e as matasse. Exatamente aqueles que não têm nada a ver com a guerra, que só querem viver, brincar, que não tiveram direito de ser crianças”, disse.

Desde o início da guerra, cerca de 1 milhão de pessoas se deslocaram em Gaza: mais de 527 mil estão nas 147 estruturas emergenciais de abrigo montadas pelas Nações Unidas, a maioria na região central ou sul de Gaza.

Com o cerco à região, a crise humanitária se acentuou diante da escassez de água, alimentos, combustíveis e medicamentos.

Vinte caminhões de ajuda internacional conseguiram autorização para entrar na Faixa de Gaza neste sábado (21) a fim de levar mantimentos aos civis. Cerca de 200 caminhões ainda aguardam o sinal verde para a passagem.

Ao menos 210 pessoas ainda seguem reféns do Hamas, incluindo israelenses e estrangeiros, de acordo com as forças do país. O grupo liberou duas reféns americanas na sexta-feira.

Com informações da Folha de S. Paulo.

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Imagens de satélite mostram fila de caminhões com ajuda humanitária para Gaza perto da passagem de Rafah

Cerca de 100 caminhões aguardam autorização para entrar no território.

Imagens de satélite divulgadas na sexta-feira (20) mostram os cerca de 100 caminhões com ajuda humanitária reunidos no lado egípcio da passagem de Rafah para a Faixa de Gaza, diz o G1.

A ONU estima que os veículos conseguirão autorização para entrar no território no sábado (21). O presidente dos EUA, Joe Biden, disse na sexta-feira (20) acreditar que a ajuda chegará em entre 24 a 48 horas.

Inicialmente, o governo de Israel havia bloqueado a entrada de água, alimentos, eletricidade e combustível em Gaza. No entanto, apelos da comunidade internacional e, principalmente, um encontro com Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, em Tel Aviv, convenceram Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro israelense, a autorizar o envio de ajuda humanitária para o território.

Um porta-voz da Presidência egípcia disse na quarta-feira (19) que estava coordenando, junto com os norte-americanos e com organizações humanitárias internacionais sob a supervisão da ONU, uma forma de garantir a chegada de ajuda.

“O combustível também é necessário para geradores hospitalares, ambulâncias e usinas de dessalinização – e instamos Israel a adicionar combustível aos suprimentos vitais autorizados a entrar em Gaza”, disse o diretor geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, em coletiva de imprensa.

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Até tu, Guga Chacra?

Desde do 7, que o Hamas atacou Israel, que revelou uma inacreditável fragilidade da suposta super inteligência da Mossad de Israel, o cuidado dos entusiastas do sionismo no Brasil, ficou evidente.

Mas, desde ontem, o muxoxo se transformou em desânimo, mais que isso, num lamento murcho, típico dos derrotados com a crescente onda de manifestações internacionais, vindas de todos os lados, contra Israel.

Ou seja, a propaganda, que sempre foi a alma dos sionistas, mostra-se mais débil que a tida como intransponível inteligência dos dobermans da Mossad.

Agora, até Guga Chacra, diante dessa percepção de que Israel foi derrotado, do ponto de vista político e militar, político pelo massacre que impõe sobre a população civil de Gaza, e militar pela total falta de resistência da defesa de Israel no momento do ataque do Hamas, como mostra seu artigo de hoje, no Globo:

Israel fracassou quatro vezes em Gaza. Por que agora seria diferente?

Israel já enfrentou o Hamas quatro vezes em confrontos na Faixa de Gaza nos últimos 14 anos. Milhares de civis palestinos morreram, assim como centenas de israelenses. Mas todas essas ofensivas somadas não foram suficientes para enfraquecer o Hamas no longo prazo, já que o grupo está mais forte do que nunca como vimos no atentado terrorista que matou 1.300 israelenses, além de pessoas de outras nacionalidades, incluindo brasileiros. Por que esta quinta guerra contra o Hamas na Faixa de Gaza seria diferente? Por que não fracassará como nas outras quatro vezes? Essa é uma pergunta que tenho colocado a uma série de interlocutores, seja em entrevistas, seja em conversas informais.

Benjamin Netanyahu não era o primeiro-ministro na época da primeira guerra Israel-Hamas em 2009, mas assumiu um mês depois do cessar-fogo. Ao longo dos 14 anos seguintes, governou Israel por 13. Toda a estratégia para lidar com o Hamas e evitar ataques a partir de Gaza é dele. Como um fracassado diante do atentado terrorista do dia 7 de outubro, impopular e antidemocrático líder teria a capacidade de agora ter planos melhores do que no passado, quando tinha muito mais popularidade e legitimidade, para derrotar o Hamas?

Ninguém conseguiu me responder até agora. Na verdade, desta vez, a ofensiva será ainda mais difícil do que nas outras quatro e em especial as de 2009 e 2014, quando houve incursão terrestre, como deve ocorrer agora. Afinal, há cerca de 200 reféns nas mãos do Hamas. Quatorze anos atrás, havia um. Há nove anos, nenhum. Como entrar por terra sem colocar em risco a vida deles? Outro complicador para Israel será sempre ter de lutar contra o Hamas em meio a civis palestinos inocentes. O número de vítimas se multiplicará, incluindo o de crianças, levando a uma crescente pressão internacional para um cessar-fogo.

Não há tempo ilimitado como os EUA no Afeganistão — e os norte-americanos fracassaram de qualquer maneira ao verem o retorno do Talibã após 20 anos e trilhões de dólares de gastos. Mesmo que tivesse, isso não seria garantia de vitória. Em 1982, Israel ocupou o Sul do Líbano. Possuía aliados locais de uma forte milícia cristã libanesa. Após 18 anos, os israelenses, derrotados juntos com seus aliados cristãos libaneses, se retiraram. Mas os vencedores não foram os palestinos. Foi o grupo xiita libanês Hezbollah, que sequer existia no momento da entrada dos israelenses.

Ainda que Israel consiga derrotar militarmente o Hamas, não terá capacidade de eliminar a ideologia do grupo. Quais os planos para o “depois”, mesmo em caso de vitória? Manter a ocupação de Gaza? Controlar a vida de 2 milhões de palestinos? Enfim, quando Israel enfrentou o Hamas pela primeira vez em Gaza, metade da atual população do território tinha menos de 3 anos ou sequer havia nascido.

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Após anos de cerco à Faixa de Gaza, ataque palestino contra Israel não foi inesperado

Diogo Bercito*

Mais de 2 milhões de pessoas no território não têm liberdade de movimento nem acesso a itens básicos.

Não dá para dizer que os ataques do Hamas ao sul de Israel neste sábado (7) foram inesperados. Palestinos têm dito há anos que a situação na Faixa de Gaza era insustentável, que um dia ia explodir —como explodiu.

Hamas e Israel vão travar um embate físico, de tanques e foguetes, mas vão se enfrentar também na arena pública nos próximos dias. Vão tentar convencer o mundo da justiça e da legalidade das suas ações. Nosso desafio é enxergar através da névoa da guerra. A perspectiva histórica ajuda nessas horas.

A Faixa de Gaza abriga diversas comunidades palestinas expulsas de suas terras em 1948, data da criação do Estado de Israel e do embate com seus vizinhos árabes. Herdaram um trauma. Em 1967, na Guerra dos Seis Dias, Israel ocupou a faixa. Manteve colônias ali até a sua retirada unilateral em 2005. O território foi tomado em seguida pela facção radical Hamas, que controla Gaza desde então.

O Hamas governa Gaza de maneira autoritária e impõe costumes conservadores à população. Sua liderança se descreve como uma força de resistência. Está em constante atrito com a facção rival, o Fatah, que administra a Cisjordânia. Os laços do Hamas com o eixo iraniano preocupam Israel, em especial.

Com a justificativa de sua segurança, Israel mantém um bloqueio terrestre, aéreo e naval à faixa. É uma forma de ocupação indireta. Palestinos dizem, portanto, que vivem na maior prisão a céu aberto do mundo. São mais de 2 milhões de pessoas instaladas em um território de 365 quilômetros quadrados –um quarto da área do município de São Paulo. Uma das maiores densidades populacionais do mundo.

Moradores de Gaza não têm liberdade de movimento nem acesso garantido a coisas como eletricidade, água potável, remédios e material de construção. Governada por um grupo extremista, uma geração de jovens cresceu odiando as pessoas do outro lado do muro. O Hamas lançou nos últimos anos saraivadas de foguetes contra civis israelenses na fronteira. Israel respondeu com bombardeios, debilitando a infraestrutura local.

Na guerra de 2014, que eu cobri para esta Folha, vi em Gaza algumas cenas mais desoladoras da minha carreira. Entre elas, prédios residenciais transformados em crateras, destruindo famílias inteiras. Entre disparos israelenses vindos da terra, do ar e do mar, palestinos não tinham para onde fugir. É o tipo de memória que persiste por ali e que é instrumentalizada pelo Hamas em dias como hoje.

Desconfie, portanto, das análises dizendo que essa guerra é inesperada. O ataque do Hamas pode ter tomado o governo de Israel de surpresa —o que sinaliza um fiasco histórico de inteligência (e também de bom senso). Mas não é um evento inesperado. É um lembrete do risco de manter um status quo injusto, uma lição que vale para outros governos no mundo.

Os palestinos que aparecem nos vídeos cruzando a fronteira e entrando em Israel nunca tinham deixado a faixa de Gaza durante as suas vidas. Celebram uma fuga, também, e não apenas o ataque e os sequestros. Nada disso justifica, que fique claro, a morte de dezenas de civis israelenses. Imagens terríveis circulam neste sábado, registrando a captura e assassinato de inocentes. É preciso condenar os ataques do Hamas de maneira inequívoca, como tantos governos já fizeram, inclusive, sem titubear. É preciso pressionar as partes envolvidas para que interrompam as hostilidades, também.

Mas, na esfera pública, palestinos têm feito perguntas importantes, que não podemos ignorar. Por exemplo, querem saber por que o mundo celebra os ucranianos que resistem aos russos enquanto condena os palestinos de Gaza. Querem saber também por que as pessoas não censuram com tanta veemência o cerco contínuo à Faixa de Gaza. Querem saber, ainda, quem vai lamentar a morte de civis palestinos nos próximos dias, durante os ataques do Exército israelense, que vai tentar compensar seu fracasso com violência. A dúvida, nesse caso, é quem tem direito à humanidade.

*Folha