“Será que não está na hora de termos um homem ou uma mulher trans no STF?”
“Será que não está na hora de termos, de novo, negros no STF?”
“Será que não está na hora de termos lésbicas e gays assumidos no STF?”
“Será que não está na hora de reduzirmos o número de judeus no STF?”
“Será que não está na hora de termos mais mulheres no STF?”
“Será que não está na hora de termos menos homens no STF?”
“Será que não está na hora de termos mais flamenguistas e corintianos no STF?”
“Será que não está na hora de termos um evangélico no STF?”
“Será que não está na hora de termos um ateísta no STF?”
“Será que não está na hora de termos um alérgico no STF?”
“Será que não está na hora de termos um vegetariano no STF?”
Achou as perguntas absurdas, leitor amigo? Como notam, entre elas está a indagação feita pelo presidente da República, na sexta, num evento com evangélicos, posteriormente reproduzida nas redes sociais. Perguntou se não está na hora de o tribunal abrigar um ministro dessa vertente religiosa. Com a indagação, Bolsonaro expressava o seu descontentamento com o fato de que seis ministros do STF já se manifestaram a favor de estender as punições previstas na Lei 7.716 — para crimes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional — também aos cometidos em razão de preconceito de “gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero”. Vou respondera pergunta feita pelo presidente. Antes, algumas considerações.
Já acompanharam o relator Celso de Mello nessa posição os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux. O presidente sugeriu que o STF está legislando. Não está. O instrumento que permite ao tribunal fazer a interpretação extensiva é a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão. Se crimes motivados por gênero, sexo, orientação ou identidade estão sendo cometidos de maneira ostensiva — e estão —, é evidente que se deve estender a esses grupos a proteção já garantida aos que são discriminados por preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Ou será que não podemos tolerar preconceito contra evangélicos, por exemplo — e não podemos mesmo! —, mas nada nos custa condescender com a discriminação contra gays, lésbicas ou trans?
“Está comparando tudo, Reinado Azevedo?” Eu não comparo nada. Justamente porque são grupos distintos, cumpre indagar por que alguns mereceriam proteção, e outros não. E notem que uma pessoa pode escolher ser católica, evangélica, budista ou outra coisa qualquer, mas não escolhe ser gay ou hétero. Se a lei protege uma escolha, deve deixar ao relento e à mercê de agressões covardes o que é uma condição existencial? A propósito: as religiões que continuarem a vituperar contra a homossexualidade porque em desacordo com sua crença terão a liberdade para fazê-lo em seus cultos. A lei vai punir crimes, não exercício da opinião, ainda que atrasada.
*Por Reinaldo Azevedo/Uol