O Ministério da Saúde vai criar um comitê para combater 11 enfermidades e eliminar a transmissão vertical (de mãe para filhos) de sífilis, hepatite B e de HIV nos presídios do país.
O banco de dados do sistema penitenciário brasileiro estima que há cerca de 30 mil casos de Aids, tuberculose, sífilis e hepatite nos presídios estaduais femininos e masculinos, que passarão a ser focados pelo Ministério da Saúde em nova iniciativa com outras frentes do governo a fim de eliminar o que a pasta chama de “doenças socialmente determinadas”.
O Comitê Interministerial para Eliminação da Tuberculose e Outras Doenças Determinadas Socialmente (CIEDS) vai trabalhar em propostas e iniciativas até janeiro de 2030.
De junho a dezembro de 2022, o HIV foi a principal doença transmissível em prisões estaduais do país entre homens, com 9.046 casos (32,3%). Entre as detentas, a maior transmissão foi de sífilis, com 1.413 casos (56,2%).
Há registro de 9.395 casos de sífilis nos presídios masculinos. Além disso, o sistema penitenciário contabilizou 7.304 casos de tuberculose, 1.944 de hepatite e 523 de hanseníase nas prisões femininas e masculinas durante o período.
— São doenças que tendem a se espalhar com maior facilidade em ambientes de aglomeração e com higienização precária. Hoje, temos equipes de saúde dentro dos presídios, mas eles têm capacidade de lidar apenas com o básico devido à falta de estrutura — observa a médica sanitarista e professora da UFRJ, Lígia Bahia.
No ranking de população carcerária, o Brasil fica atrás apenas da China e dos Estados Unidos. Segundo os dados mais recentes do Ministério da Justiça, há mais de 837 mil presos no país, distribuídos em 1.458 unidades prisionais.
O total de detentos ultrapassa em mais de 240 mil a quantidade de vagas dos presídios (596.442), fazendo da superlotação um dos principais problemas do sistema carcerário brasileiro. Conforme levantamento na base de dados do governo, os presídios com maior superlotação estão no Rio, em São Paulo e no Distrito Federal.
O Instituto Penal Vicente Piragibe (RJ), por exemplo, é o presídio mais superlotado do país, com 3.145 presos excedendo a capacidade. Em seguida, está a penitenciária Professor Ataliba Nogueira, em Campinas (SP), com 2.445 detentos excedentes. A Penitenciária I do Distrito Federal aparece em terceiro lugar, com 1.892 presos a mais.
— As celas superlotadas são acompanhadas de violência, insalubridade, maus-tratos, doenças e degradação. É uma bomba-relógio, um ambiente precário, propício para epidemias — complementa Lígia Bahia.
Para atendimento dos presos doentes, há 4.337 técnicos em enfermagem e enfermeiros e 1.023 clínicos gerais e de outras especialidades nas unidades prisionais. É como se cada médico fosse responsável pelo atendimento de 818 pessoas.
Segundo a especialista, há três desafios que o ministério deverá contornar para reduzir as doenças transmissíveis nas prisões: espaço físico inadequado e incompatível com as atividades médicas; distribuição inadequada de enfermeiros e técnicos; e falta de equipamento técnico, materiais e medicamentos.
Além de detentos, o governo vai priorizar pessoas em situação de rua, pacientes portadores de HIV, imigrantes e comunidades indígenas. Junto às transmissões citadas, o comitê tem o objetivo de excluir como problema de saúde pública as doenças de Chagas, malária, hepatites virais, tracoma, filariose, esquistossomose, oncocercose e geo-helmintíases.
Para tuberculose e o HIV, a meta é alcançar menos de 10 casos por 100 mil habitantes até 2035, e reduzir o número de mortes em 95%. E para a hanseníase, o grupo de trabalho focará em planos para interromper a transmissão em 99% dos municípios, eliminá-la em 75% das cidades e reduzir em 30% o número de novos casos.
A pasta estima que, atualmente, um milhão de pessoas vivem com HIV no Brasil, sendo que, destas, 900 mil conhecem seu diagnóstico. Já a tuberculose aumentou 4,9% no país em 2022 em comparação ao ano anterior, com cerca de 78 mil casos.
— Não é possível pensar o Ministério da Saúde sem abrir essa grande angular, para que nela possa caber um país com tantas desigualdades, mas também com tantas potências, como é o Brasil. Esse comitê busca reduzir as desigualdades, para que tenhamos, efetivamente, saúde para todos — disse a ministra da Saúde, Nísia Trindade, no lançamento do comitê.
Em média, 14 brasileiros morrem por dia de tuberculose, que registrou recorde de óbitos em 2021: 5 mil. Em 2022, cerca de 78 mil pessoas adoeceram por tuberculose no país.
A doença voltou a aumentar após dois anos de relativa queda: de 79 mil registros em 2019, para 70,5 mil, em 2020, e 74,3 mil, em 2021. Nos dez anos anteriores, o índice registrava estabilidade. A maioria dos casos é encontrada em Manaus, Belém, Rio Branco, Recife e Rio.
Em março, ao lançar a campanha nacional de combate à doença, a ministra afirmou que não é “admissível que as pessoas percam a vida por uma doença que tem prevenção, tratamento e cura”.
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