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‘África tem tudo para se tornar potência agrícola’, diz Lula na CPLP

Em discurso focado na juventude, o presidente falou sobre educação, sustentabilidade, fome e futuro do trabalho.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) participou neste domingo (27/8), em São Tomé, da XIV Cúpula dos Chefes de Estado e de Governo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Em discurso, o chefe do Executivo falou sobre educação, sustentabilidade, fome e futuro do trabalho, segundo o Correio Braziliense.

“As novas gerações vivem com as incertezas de um mercado de trabalho que se transforma. As novas tecnologias são uma conquista extraordinária da inteligência humana, mas com elas o desemprego e a precarização alcançam novos patamares. O uso irresponsável das redes sociais, com a propagação de fake news e discursos de ódio, ameaça a democracia. O culto ao individualismo leva à descrença de muitos jovens na ação coletiva”, apontou.

Lula disse que a maioria dos países da CPLP possui uma população jovem. “Para que eles tenham esperanças de um futuro melhor, a sustentabilidade tem de ser promovida, desde agora, nas suas três dimensões: a social, a econômica e a ambiental. Sem alimentação adequada não há perspectiva de uma vida digna”.

“Na CPLP, podemos nos orgulhar do nosso trabalho conjunto na promoção da segurança alimentar e nutricional. Nossa cooperação em prol da agricultura familiar e do reforço dos programas de alimentação escolar são exemplos a serem multiplicados”, emendou.

O petista afirmou ainda que “a África tem tudo para se tornar uma potência agrícola, com capacidade para alimentar seu povo e o mundo”, que o “Brasil continuará a ser parceiro nessa empreitada” e que deve reeditar o Programa Mais Alimentos, relançado em junho passado, que permite que pequenos produtores possam ter acesso a financiamento para compra de tratores e implementos agrícolas.

“Assim como no passado, uma versão do Mais Alimentos para a África deve ser retomada como mais uma vertente da cooperação Sul-Sul brasileira”, pontuou.

Ele ressaltou que mais de 1.700 estudantes dos países lusófonos concluíram estudos de graduação no Brasil nos últimos 20 anos.

Lula citou também que em setembro deve ir aos EUA para participar da abertura da Assembleia Geral da ONU, onde deverá tratar sobre iniciativas por “trabalho decente”.

“Com as mudanças no mundo do trabalho, vivemos o desafio de dinamizar nossas economias garantindo trabalho digno, salário justo e proteção aos trabalhadores e trabalhadoras. Esse é o espírito da iniciativa em defesa do trabalho decente que lançarei com o presidente Biden, à margem da próxima Assembleia Geral da ONU”.

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Vivaldo Barbosa: O mundo pede Lula já

O povo brasileiro se recuperou, se recompôs e está escrevendo um dos momentos mais bonitos da nossa história. Reassumiu sua condição cívica e patriótica, retomou seu veio ético.

Diante das tensões que pairam sobre todos e das ameaças que lançam, dos últimos dias para cá muitos estão pensando e procurando decidir isto já, o quanto antes, para retomar a paz e a tranquilidade.

E há outras razões.

O mundo está vivendo situação de guerra, delicada e perigosa. Surgiu a OTAN como aliança militar a querer tudo controlar, em estreita ligação com os interesses do Império. Em vez de aliança para produção de alimentos contra a fome, em defesa da saúde da humanidade, moradia, trabalho, surge aliança para produção de armamentos, para a guerra.

O conflito entre Rússia e Ucrânia, lamentável em todos os sentidos, pois o mundo deseja viver em paz, assume um momento delicado, perigoso. Até ameaças nucleares ressurgem. Nesta hora delicada do mundo, o Brasil não pode ser guiado pela mediocridade, incompetência, sem compreensão dos acontecimentos, sem liderança de respeito. É preciso o Brasil ter liderança definida o quanto antes para entrar nesse diálogo.

Por outro lado, é crescente a articulação dos interesses dos países do outro lado do mundo, nas regiões de Ásia e Eurásia, como acabamos de acompanhar nos encontros de Vladivostoki e na cidade histórica de Samarcanda, no Uzbequistão, em que dezenas de nações discutiram seus destinos e interesse face à situação atual do Império e da OTAN. E o Brasil, desinteressado, sem compreender seu papel e sem defender nossos interesses, de tudo está fora, governado pela mediocridade.

O Brasil é importante no mundo, não pose fugir do seu papel, tem o dever de procurar entender o que acontece e atuar na sua dimensão. Ainda mais agora, com governos na América Latina de natureza popular e que estão a procurar definir seus interesses, o Brasil tem muito a ver na articulação com todos.

Todos nós sabemos, o mundo todo sabe o papel que Lula tem para um posicionamento digno e construtivo no mundo que vive esta complexidade. Sabemos do papel de Lula na América Latina, na nossa relação com a África, em nosso diálogo histórico com o Ocidente e com esses blocos que estão a se definir diante das condições atuais.

Por isso, o povo brasileiro, já recomposto e já se vendo como Nação de respeito, está fazendo seu segundo movimento importante e belo diante da história: nós estamos colocando Lula no mundo. Sabemos o que isto significará para a humanidade.

E tem que ser agora, é pra já. No dia 2 de outubro. Todo o Brasil e o mundo ao saber que Lula é o novo líder do Brasil, um alívio geral vai perpassar na mente e corações de todos. Melhor, ainda, Lula vai começar a falar ao povo brasileiro e ao mundo. Um valor mais elevado se levantará.

Lula agora, prá já!

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Mundo

Julgamento de bilionário que contratou Moro abre janela inédita para a pilhagem da África no século 21

Tribunal de Genebra condenou nesta sexta, 22, Benjamin Steinmetz, acusado de subornar mulher de ditador para explorar mina de ferro na República da Guiné depois negociada com a brasileira Vale.

Uma montanha de minérios, o ditador doente da República da Guiné e suas quatro esposas, supostas propinas, contas secretas na Suíça, um bilionário do ramo de diamantes, a gigante brasileira Vale, o ex-juiz e ex-ministro de Jair Bolsonaro Sergio Moro e uma pobreza profunda. Numa sala do Tribunal de Genebra, situado no coração do bairro medieval da cidade suíça, todos esses elementos se cruzaram no julgamento do magnata Benjamin Steinmetz, que se revelou um mergulho na dimensão da pilhagem das riquezas naturais do continente mais pobre do mundo. O caso foi julgado nesta sexta, 22 e o bilionário israelense, de 64 anos, repleto de controvérsias e herdeiro de uma família de negociadores de diamantes, foi condenado por “corrupção de funcionários públicos estrangeiros”, num dos raros julgamentos de um cidadão de fora da Suíça, tido como o caso mais emblemático do setor de mineração em décadas. O esquema teria organizado a transferência de pelo menos 8,5 milhões de dólares de 2006 a 2012 para garantir o direito de explorar a mina de ferro Simandou, na República da Guiné.

Oficialmente, Steinmetz, conhecido com Beny, pagou 165 milhões de dólares ao Governo local pela concessão do que seria uma espécie de “Carajás Africana”. Mas, 18 meses depois, sua empresa causou indignação de membros do Governo do país africano ao fechar um acordo privado de parceria com a brasileira Vale, no valor de 2,5 bilhões de dólares, para explorar exatamente a mesma área.

Com o negócio, era como se tivesse ganhado na loteria. Quase sozinho. De acordo com a promotoria pública de Genebra, o executivo se envolveu em um “pacto de corrupção” com o ex-presidente da Guiné, Lansana Conté, que esteve no poder de 1984 a 2008, e sua quarta esposa, Mamadie Touré, em parte através de contas bancárias suíças e empresas de fachada.

Nesta sexta, a Justiça suíça condenou Beny a cinco anos de prisão e determinou uma multa de 50 milhões de francos suíços, o equivalente a 308 milhões de reais, por corrupção dos servidores públicos e também por falsificação de documentos. O bilionário avisou que vai recorrer da sentença. Mas sua história rocambolesca mostrou um bastidor do mundo da mineração pouco conhecido pelos reles mortais.

A meta do suborno praticado por Beny era a de retirar a mina das mãos do conglomerado anglo-australiano Rio Tinto, uma concorrente mundial da Vale, e garantir que a Beny Steinmetz Group Resources (BSGR) ficasse com uma das maiores reservas de minério de ferro do mundo. A acusação aponta que, em 2008, a BSGR se aproveitou das últimas horas de vida do ditador Conté para obter a concessão dos blocos 1 e 2 da jazida de minério de ferro. No julgamento iniciado no começo deste mês, enquanto pela janela da sala do tribunal via-se a neve cair, a declaração de Steinmetz e o próprio julgamento ofereciam frestas a um mundo subterrâneo pouco acessível. No fundo, uma visão de uma tragédia geológica e sociológica.

Simandou possui mais de 2 bilhões de toneladas de minério de ferro de alto grau. Para especialistas, a descoberta teria a possibilidade de mudar o destino de uma nação. De fato, a pequena Guiné já era o local da maior reserva provada de bauxita, além de minas de ouro, diamante e urânio, sem contar o petróleo em suas costas. Ainda assim, a Guiné continua sendo um dos países mais pobres do mundo: 70% de sua população vive em favelas, apenas uma minoria da população tem acesso aos serviços de saneamento e metade sequer tem água potável.

A história revelada na corte mostra que a montanha de ferro está permeada por uma sucessão de acusações e pagamentos suspeitos, golpes e traições. E que, enquanto enriqueceu alguns, deixou milhões na miséria absoluta.
Traições, Moro e disputa com a Vale

Com perfil de Indiana Jones de terno, grisalho, olhos azuis profundos, um certo bronzeado, apesar do frio de oito graus negativos, Benjamin Steinmetz era apresentado por seus advogados como uma espécie de salvador da África. Ele admitiu que o ganho para sua empresa foi grande com o acordo com a Vale pela mina de Simandou. “Mas o maior ganho é para o país, pois existem impostos, royalties. Muda tudo”, disse. “Era um sonho para a Guiné”, disse.

Não à toa a Vale, que agora trava guerra judicial com o bilionário, foi outro nome que ecoou nas audiências em Genebra. Diante das revelações de corrupção nos últimos anos contra Beny, a gigante brasileira entrou com um processo no Tribunal de Arbitragem Internacional, em Londres, contra seu ex-parceiro israelense. A mineradora venceu o processo em 2019 e Steinmetz foi obrigado a pagar 2,2 bilhões de dólares em indenização. O tribunal londrino apontou que o empresário omitiu informações da Vale ao ingressar na sociedade, entre elas o pagamento de propinas na Guiné.

No início da semana, ao ser questionado pela promotoria de Genebra em plena audiência sobre sua derrota diante do caso apresentado pela Vale, Steinmetz fez questão de dizer que sua batalha não havia terminado contra os brasileiros. “Existem novas coisas que vão sair e mostrar que a Vale mentiu durante o processo [em Londres]”, disse. Ele avisou que vai recorrer da sentença desta sexta.

De fato, Beny não desistiu da batalha. Ele contratou, no ano passado, os serviços do ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro para ter mais munição contra a gigante brasileira. Em um parecer, Moro argumentou que a Vale não teria o direito de receber o dinheiro solicitado pelo tribunal londrino. Segundo o ex-juiz, se confirmada a apuração, “os executivos da Vale S/A teriam, em tese, prestado afirmações falsas e ocultado fraudulentamente do mercado e de seus acionistas as reais condições do negócio celebrado com a BSGR acerca dos direitos de exploração sobre Simandou e sobre os motivos da rescisão posterior”. Procurada, a empresa brasileira repetiu: “A Vale reitera que recebeu das cortes arbitral e judicial em Londres e nos Estados Unidos a permissão para prosseguir com a execução da sentença arbitral de 2 bilhões de dólares contra a BSGR”, declarou.

*Jamil Chade/El País

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Quando você mata dez milhões de africanos, você não é chamado de “Hitler”

Leopoldo II foi Rei da Bélgica de 1865 a 1909, data de sua morte. Ele comandou o Congo de 1885 a 1908, quando cedeu o controle do país ao parlamento belga, após pressões internas e internacionais.

Olhe para essa foto. Você sabe quem é?

A maioria das pessoas não ouviu falar dele.

Mas você deveria. Quando você vê seu rosto ou ouve seu nome, você deveria sentir um enjoo no estômago assim como quando você lê sobre Mussolini ou Hitler, ou vê uma de suas fotos. Sabe, ele matou mais de 10 milhões de pessoas no Congo.

Seu nome é Rei Leopoldo II da Bélgica.

Ele foi “dono” do Congo durante seu reinado como monarca constitucional da Bélgica. Após várias tentativas coloniais frustradas na Ásia e na África, ele se instalou no Congo. Ele o “comprou” e escravizou seu povo, transformando o país inteiro em sua plantação pessoal com escravos. Ele disfarçou suas transações comerciais como medidas “filantrópicas” e “científicas” sob o nome da Associação Internacional Africana. Ele usou o trabalho escravo para extrair recursos e serviços congoleses. Seu reinado foi mantido através de campos de trabalho, mutilações corporais, torturas, execuções e de seu próprio exército privado.

A maioria de nós não é ensinada sobre ele na escola. Não ouvimos sobre ele na mídia. Ele não é parte da narrativa de opressão repetida amplamente (que inclui coisas como o Holocausto durante a Segunda Guerra Mundial). Ele é parte da longa história de colonialismo, imperialismo, escravidão e genocídio na África que se chocaria com a construção social da narrativa de supremacia branca em nossas escolas. Isso não se encaixa bem nos currículos escolares em uma sociedade capitalista. Fazer comentários fortemente racistas recebe (geralmente) um olhar de reprovação na sociedade “educada”; mas não falar sobre genocídios na África cometidos por monarcas capitalistas europeus está tudo bem.

Mark Twain escreveu uma sátira sobre Leopoldo chamada “King Leopold’s Soliloquy; A Defense of His Congo Rule” [Solilóquio do Rei Leopoldo; Uma defesa de seu mando no Congo], onde ele ridiculariza a defesa do Rei sobre seu reinado de terror, principalmente através das próprias palavras de Leopoldo. É uma leitura simples de 49 páginas e Mark Twain é um autor popular nas escolas públicas americanas. Mas como acontece com a maioria dos autores politizados, nós geralmente lemos alguns de seus escritos menos políticos ou os lemos sem aprender por que é que o autor os escreveu. A Revolução dos Bichos de Orwell, por exemplo, serve para reforçar a propaganda anti-socialista americana de que sociedades igualitárias estão fadadas a se tornar o seu oposto distópico. Mas Orwell era um revolucionário anti-capitalista de outro tipo – um defensor da democracia operária desde baixo – e isso nunca é lembrado. Nós podemos ler sobre Huck Finn e Tom Sawyer, mas King Leopold’s Soliloquy não faz parte da lista de leituras. Isso não é por acidente. Listas de leitura são criadas por conselhos de educação para preparar estudantes a seguir ordens e suportar o tédio. Do ponto de vista do Departamento de Educação, os africanos não têm história.

Quando aprendemos sobre a África, aprendemos sobre um Egito caricatural, sobre a epidemia de HIV (mas nunca suas causas), sobre os efeitos superficiais do tráfico de escravos, e talvez sobre o apartheid sul-africano (cujos efeitos, nos ensinam, há muito estão superados). Nós também vemos muitas fotos de crianças famintas nos comerciais dos Missionários Cristãos, nós vemos safáris em programas de animais, e vemos imagens de desertos em filmes. Mas nós não aprendemos sobre a Grande Guerra Africana ou o reinado de terror de Leopoldo durante do Genocídio Congolês. Tampouco aprendemos sobre o que os Estados Unidos fizeram no Iraque e Afeganistão, matando milhões de pessoas através de bombas, sanções, doença e fome. Números de mortos são importantes. Mas o governo dos Estados Unidos não conta as pessoas afegãs, iraquianas ou congolesas.

Embora o Genocídio Congolês não esteja incluído na página “Genocídios da História” na Wikipédia, ela ainda menciona o Congo. O que é hoje chamado de República Democrática do Congo é listado em referência à Segunda Guerra do Congo (também chamada de Guerra Mundial Africana e Grande Guerra da África), onde ambos os lados do conflito regional caçaram o povo Bambenga – um grupo étnico local – e os escravizaram e canibalizaram. Canibalismo e escravidão são males terríveis que certamente devem entrar para a história, mas eu não pude deixar de pensar sobre que interesses foram atendidos quando a única menção ao Congo na página era em referência a incidentes regionais, onde uma pequena minoria das pessoas na África estava comendo umas às outras (completamente desprovida das condições que criaram o conflito, e das pessoas e instituições que são responsáveis por essas condições). Histórias que sustentam a narrativa de supremacia branca, sobre a inumanidade das pessoas na África, são permitidas a entrar nos registros históricos. O homem branco que transformou o Congo em sua plantação pessoal, campo de concentração e ministério cristão – matando de 10 a 15 milhões de pessoas congolesas no processo – não entra na seleção.

Sabe, quando você mata dez milhões de africanos, você não é chamado de “Hitler”. Isto é, seu nome não passa a simbolizar a encarnação viva do mal. Seu nome e sua imagem não produzem medo, ódio ou remorso. Não se fala sobre suas vítimas e seu nome não é lembrado.

Leopoldo foi apenas uma das milhares de coisas que ajudaram a construir a supremacia branca, tanto como uma narrativa ideológica quanto como uma realidade material. Eu não pretendo dizer que ele foi a fonte de todo o mal no Congo. Ele teve generais, soldados rasos e gerentes que fizeram sua vontade e reforçaram suas leis. Ele era a cabeça de um sistema. Mas isso não nega a necessidade de falar sobre os indivíduos que são simbólicos do sistema. Mas nós nem mesmo chegamos a isso. E como isso não é mencionado, o que o capitalismo fez à África e todo o privilégio que as pessoas brancas ricas receberam do genocídio congolês permanecem escondidos. As vítimas do imperialismo, como costuma acontecer, são invizibilizadas.

 

*Geledés – Instituto da Mulher Negra

*O seguinte texto foi escrito por Liam O’Ceallaigh para a página Diary of a Walking Butterfly, em dezembro de 2010.