Um ano após o jornal O Estado de S. Paulo revelar, em 6 de dezembro de 2018, que o PM Fabrício Queiroz, ex-assessor parlamentar na Assembleia Legislativa fluminense, tivera em conta movimentações financeiras de R$ 1,2 milhão, atípicas e incompatíveis com seus ganhos, o Ministério Público do Rio retomará as investigações e seu foco: o senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ).
O salvo-conduto para a retomada da apuração foi dado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
A corte considerou legal o compartilhamento de informações fiscais e bancárias com o MP. O parlamentar alegava ilegalidade e perseguição política na ação.
Flávio virou alvo de suspeita após Relatório de Inteligência Financeira (RIF) do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) apontar que Queiroz recebia depósitos regulares de colegas de gabinete.
Essas movimentações ocorriam perto do pagamento de salários.
Para os promotores, esse era suposto indício de “rachadinha” – “devolução” de parte ou da totalidade dos salários ao deputado.
Flávio disse, à época, que todos os “mandatos na Alerj foram pautados pela legalidade e pela defesa dos interesses da população.”
Para os promotores, esse era suposto indício de “rachadinha” – “devolução” de parte ou da totalidade dos salários ao deputado. Flávio disse, à época, que todos os “mandatos na Alerj foram pautados pela legalidade e pela defesa dos interesses da população.”
O MP também apontou suposta ação de organização criminosa no gabinete de Flávio na Alerj e supostos sinais de que o hoje senador lavou o dinheiro na compra e venda de imóveis.
O parlamentar acusou a promotoria de tentar atingir o governo do seu pai. O Coaf, porém, também apontou suspeitas de outros assessores, deputados e ex-deputados, no documento gerado na Operação Furna da Onça, sobre corrupção na Alerj.
Queiroz faltou a quatro convites para depor no Procedimento Investigatório Criminal (PIC) sigiloso do MP-RJ.
Alegou problemas de saúde – trata-se de um câncer, do qual se operou no Hospital Albert Einstein, em São Paulo.
Seu desaparecimento por meses rendeu à oposição um mote – “Cadê o Queiroz?” -, desfeito depois que o PM aposentado foi localizado pela revista Veja, na capital paulista.
O ressurgimento se tornaria incômodo em outubro, quando, em áudio, o ex-assessor foi flagrado afirmando que o MP teria “uma pica do tamanho de um cometa” para “enterrar” nele e em um interlocutor não identificado.
Outros ex-integrantes do gabinete também faltaram a depoimentos no MP.
Apenas um, Agostinho da Silva, compareceu. Disse que entregava vencimentos ao ex-assessor, para que aplicação na compra e venda de carros.
O próprio Queiroz, após sustentar em entrevista ao SBT que “fazia dinheiro” comprando e vendendo veículos, apresentou ao MP defesa por escrito com versão modificada.
Afirmou que recolhia os salários dos colegas de gabinete para redistribuí-los por mais gente, pagando militantes e ampliando a base de Flávio.
O então deputado, de quem era assessor próximo, desconheceria a prática, segundo afirmou. Como o investigado não apresentou documentos (recibos, por exemplo) tornou-se difícil sustentar as alegações.
À medida que a investigação se aproximava de Flávio Bolsonaro – inclusive com a quebra de seu sigilo bancário e de dezenas de outras pessoas físicas e jurídicas ligadas a ele, determinada pelo juiz Flávio Itabaiana – aumentou o mal-estar no governo. “Venham para cima, não vão me pegar”, reagiu o presidente.
O Planalto já se incomodara com a revelação de que o Coaf mostrou que tinham saído da conta de Queiroz R$ 24 mil para a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, quando Jair Bolsonaro ainda era deputado federal, e ela, assessora parlamentar em Brasília.
O presidente afirmou que se tratava do pagamento, na conta da sua mulher, de um empréstimo que fizera ao assessor do filho. Antecipou ainda que outras prestações poderiam aparecer. Como o ex-assessor do filho, não apresentou nenhum documento para comprovar o que dissera.
Foi nesse cenário de dificuldades que Flávio Bolsonaro tentou, por três vezes, suspender as investigações que enfrentava, sem consegui-lo. Só teve sucesso quando o criminalista Frederick Wassef, muito próximo dos Bolsonaros, foi ao Supremo Tribunal Federal.
A defesa do senador alegou que, na prática, o sigilo bancário do parlamentar tinha sido quebrado, sem autorização do Poder Judiciário.
O presidente do STF, Dias Toffoli, acatou a argumentação e, em 15 de julho, suspendeu liminarmente as investigações baseadas no compartilhamento, até que o plenário da Corte se pronunciasse.
Foram 136 dias de paralisia, sem que os promotores do Rio pudessem agir. Agora, a investigação será retomada, com a legitimidade dada pelo Judiciário.
Assim como centenas de outras, atingidas pela mesma medida. O Coaf, porém, mudou de nome: agora é Unidade de Inteligência Financeira e foi transferido para o Banco Central (BC).
*Wilson Tosta/Uol