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Opinião

Nada vai reduzir o impacto causado pela propaganda da Volkswagen com a Elis Regina

Elis Regina continua sendo, talvez até mais hoje, do que quando estava viva, unanimidade nacional.

Isso não é pouca coisa em um país em que sua música se confunde com o próprio povo.

Elis Regina é Elis Regina em qualquer época, por isso não dá para reduzi-la a questões que envolvem a Volkswagen que apoiou a ditadura e foi estratégica na questão do nazismo na Alemanha.

É preciso que as pessoas vejam mais à frente, na verdade, que vejam muito mais à frente.

O impacto que Elis causou, com sua filha Maria Rita, cantando “Nossos Pais”, muito mais pelas duas do que pela composição de Belchior, foi uma sacada publicitária de gênio, porque trabalhou com aquilo que o brasileiro mais presa, a memória afetiva pela música.

Nada faz com que o brasileiro enxergue melhor o mundo do que pela música que o povo criou.

Apesar da nova kombi ser um produto à venda, o entendimento que todos fazem dessa publicidade não é da nova kombi e muito menos da Volkswagen. Esse debate lateral acaba por entrar mais como exotismo, por mais que tenha importância histórica, que de fato tem e muita.

Mas estamos falando de publicidade e do objetivo do publicitário de atingir um sucesso arrebatador e original no momento em que a revolução tecnológica abriu extremamente o leque de atenção das pessoas, porque, na internet, há indicações e massificação de todo o tipo de entretenimento.

Por isso o sucesso dessa campanha tem um peso ainda maior, pois mostra que há sim estratégias de marketing que, se bem pensadas, conseguem protagonizar e se transformar no assunto nacional, claro, se forem devidamente pensadas e trabalhadas.

É só perguntar há quanto tempo não víamos uma publicidade tradicional ganhar tanta notoriedade.

E não foi por conta inteligência artificial utilizada na cena, mas a inteligência humana de quem teve essa bela sacada, que até a polêmica em torno da história da Volkswagen impulsiona ainda mais o objetivo almejado pela peça publicitária.

Seja como for, todos sabem que a Volkswagen lançou uma kombi nova e há de se reconhecer que foi um feito de craque num mundo circunscrito a links, algoritmos e monetização.

Tem muito o que comemorar, porque, ao fim e ao cabo, foi uma vitória da cultura brasileira. E ninguém lutou mais pela cultura brasileira no pior momento, o da ditadura, do que Elis Regina.

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Vídeo: A profecia de Elis Regina, em sua última entrevista, sobre a chegada do neofascismo no Brasil

Mesmo que essa chamada pareça um pouco sensacionalista, ela não é, e vocês entenderão ao assistir ao vídeo abaixo que me foi repassado pelo meu irmão, Tadeu, que também é músico e compositor e sempre trocamos informações desde muito novos sobre tudo o que se relaciona à música brasileira.

Essa entrevista de Elis foi dada no dia 05 de janeiro de 1982, em pleno governo ditador de João Figueiredo. No dia 19 de janeiro, ou seja, 14 dias depois, Elis faleceu, estarrecendo o Brasil.

Reconhecida por nós brasileiros como a maior cantora de todos os tempos, Elis era inquieta e, assim, como não colocava amarras ou limites em sua forma de interpretar, ela colocava para fora tudo o que podia num período barra pesada em que a censura era implacável, porém, como é sabido por todos, ela sempre foi uma crítica ferrenha ao sistema implantado pela indústria de cultura de massa norte-americana no Brasil que monopolizava a produção, a difusão e a comercialização do produto cultural que a própria indústria mediocrizava cada vez mais, a ponto de ela própria confessar que, em função da massificação imposta por essa espécie de doutrina antinacional, às vezes se pegava assoviando uma música de péssima qualidade de tão entranhada em seus ouvidos.

Elis Regina tinha uma visão geral rara sobre a cultura brasileira. Ela entendeu que sua geração de grandes artistas era proveniente de ventos soprados pela Semana de Arte Moderna de 1922, comandada pelo grande guru da cultura brasileira, mas sobretudo da música, Mário de Andrade.

Com observações profundas, Elis, nessa entrevista que deu a Salomão Esper, Zuza Homem de Mello e Maurício Kubrusly , transformou sua fala num momento histórico, principalmente por sua clarividência, quando fala do estímulo à mediocridade cultural estrangeirista promovida pelo funil de interesses comerciais das multinacionais norte-americanas que dominavam o mercado fonográfico no Brasil e que isso fazia parte de um sistema de destruição da cultura brasileira.

E é nesse momento que Elis avisa que isso era uma preparação para a implantação de um pensamento neofascista no Brasil quando diz que vem por aí um homem de bigodinho, com um gesto de quem se referia claramente a Hitler e ao número 666 do anticristo. Todos riram e ela disse com a autoridade de quem entendia o panorama amplo da nossa cultura: vocês vão ver.

Assista:

*Carlos Henrique Machado Freitas

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Brasil Notícia

Vídeo: Morre Aldir Blanc, que escancarou o Brazil que não conhece o Brasil

Na fieira das vítimas fatais do coronavírus, promovida pela cruzada da morte de Bolsonaro contra a quarentena, a certeza de que o país perdeu um dos seus maiores artistas, Aldir Blanc que, como poucos, soube desossar todos os vícios colonialescos da elite brasileira e as virtudes criativas do povo.

O boêmio de rua saudou como poucos os brasileiros de fato e criticou com uma acidez inflamada os medíocres e suas vidas igualmente medíocres.

O país da choldra penou nas letras impecáveis de Aldir.

A invasão estrangeira, fomentada pelo método oficial das classes dominantes, teve que enfrentar um Aldir Blanc, sublinhando a apoteose do acaso, saída da espontaneidade do povo como forma de resistência cultural para se opor ao pensamento banal do quadrado institucional.

Ninguém foi tão poeta para descrever a graça natural que Deus deu ao povo brasileiro. Lógico que, com a capacidade de pintar a realidade brasileira com os olhos postos nos desenhos tortos da nossa civilização tropical, Aldir buscou a essência da alma do povo e os princípios que norteavam a visão do brasileiro comum.

O que importava para Aldir era desenhar a realidade brasileira. O outro país que nunca esteve na história oficial.

Querelas do Brasil é uma letra villalobiana, pois fala das nossas fontes raciais naturais e comportamentais como a maior de nossas glórias.

Para dar um sentimento mil vezes mais importante nesse espetáculo de obra musical, segue o vídeo com Elis Regina interpretando magistralmente esta obra magnífica de Aldir em parceria com Maurício Tapajós, mostrando que, quando se é um mestre genuinamente brasileiro, não há o obstáculo do tempo. E sua obra se imortaliza pela essência contemporânea, porque nada descreve tão bem o Brasil de hoje de forma tão original e de poder tão conciso que Querelas do Brasil.

Querelas do Brasil
Aldir Blanc e Maurício Tapajós

O Brazil não conhece o Brasil
O Brasil nunca foi ao Brazil
Tapir, jabuti
Iliana, alamanda, alialaúde
Piau, ururau, akiataúde
Piá, carioca, porecramecrã
Jobimakarore Jobim-açu
Uô-uô-uô-uô

Pererê, câmara, tororó, olerê
Piriri, ratatá, karatê, olará!

O Brazil não merece o Brasil
O Brazil tá matando o Brasil
Jerebasaci
Caandrades cunhãs, ariranharanha
Sertões, Guimarães, bachianaságuas
Imarionaíma, arirariboia
Na aura das mãos de Jobim-açu
Uô-uô-uô-uô

Jereerê, sarará, cururu, olerê
Blá-blá-blá, bafafá, sururu, olará

Do Brasil, S.O.S. ao Brazil

Tinhorão, urutu, sucuri olerê
Ujobim, sabiá, bem-te-vi olará
Cabuçu, Cordovil, Cachambi olerê
Madureira, Olaria ibangu olará
Cascadura, Águasanta, Acari olerê
Ipanema inovaiguaçu olará

Araguaia e tucuruí
Cantagalo, ABC, japeri
Cabo frio xingú sabará
Florianópolis piabetá
Araceli no espirito santo
E o aézio em jacarépaguá
Os inamps o jari a central
Instituto medico legal

Do Brasil, S.O.S. ao Brazil
Do Brasil, S.O.S. ao Brasil

 

*Carlos Henrique Machado Freitas