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Fogo tem sido arma usada por ruralistas para expulsar comunidades camponesas e indígenas

Em 2021, foram registrados 142 conflitos envolvendo o fogo criminoso em 132 comunidades, atingindo 37.596 famílias em todo país. Os dados vêm à tona a partir do levantamento da terceira fase do Dossiê Agro é Fogo, após lançamento realizado em Brasília, DF, durante este mês de outubro.

O documento, composto pelo relato de casos, e sistematização de artigos, demonstra que os incêndios vêm sendo utilizados como principal estratégia para a expulsão de comunidades tradicionais de seus territórios, para ampliar as principais fronteiras do agronegócio pelo país.

Os estados com maior número de conflitos por fogo foram Mato Grosso do Sul (26 ocorrências), Mato Grosso (22), Bahia (14) e Rondônia (10), que, juntos, concentram 50,7% dos casos. O Mato Grosso chegou a registrar mais de 7,4 mil km² de incêndios, área equivalente à cidade de São Paulo.

As principais vítimas deste tipo de conflito são os povos indígenas. No MT, das dez áreas protegidas mais desmatadas entre agosto de 2020 e julho de 2021, seis pertencem ao povo Xavante. Além destes, ribeirinhos, comunidades quilombolas, camponesas e famílias Sem Terra também são afetadas.

A maior parte dos conflitos envolvendo fogo no Brasil (54%) está localizado no Cerrado. Nas áreas da Amazônia Legal, que envolve nove estados do Brasil localizados na bacia Amazônica, 44% das comunidades sofreram com conflitos por incêndios.

Governo Bolsonaro aliado a ruralistas batem recorde de destruição

Desde o início do governo de Jair Bolsonaro (PL), o desmatamento no país atingiu cerca de 42 mil quilômetros quadrados de matas nativas, entre 2019 e 2021. O correspondente à área do estado do Rio de Janeiro. O desastre ambiental sem precedentes faz parte do Relatório Anual de Desmatamento no Brasil, divulgado este ano pelo Projeto MapBiomas.

O documento mostra também que no ano passado o desmate foi 20% maior que no ano anterior, indicando que o atual governo bateu recordes de destruição. A partir do levantamento foi possível constatar que a agropecuária foi responsável por 97% do desmatamento no país, o que causa destruição não somente ambiental, mas também que recai sobre a vida dos povos que vivem em tais regiões.

Além disso, o orçamento secreto nas mãos de ruralistas contribui para o crescimento de queimadas. Em 2021, o total de gastos com emendas destinadas ao orçamento secreto (R$ 10,79 bilhões) alcançou mais de quatro vezes os valores destinados ao Meio Ambiente.

“O descontrole das queimadas e do desmatamento é expressão do desmonte da política de fiscalização ambiental do atual governo, sendo esse desmonte do orçamento uma peça importante, mas não única”, apontou Alessandra Cardoso, em artigo publicado no Dossiê. O controle da máquina orçamentária por grupos que querem destruir o meio ambiente é fundamental para tornar a violência contra as comunidades tradicionais algo sistemático.

Nos últimos dois meses, pelo menos, quatro áreas ocupadas por famílias Sem Terra também foram alvos de incêndios

Casos de incêndio em áreas ocupadas por famílias Sem Terra foram registrados em Goiás, Tocantins, Bahia e Rio de Janeiro.

No último mês de agosto, um incêndio destruiu casas, plantações, sistemas de irrigação e a rede elétrica no Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Osvaldo de Oliveira, localizado em Macaé, Rio de Janeiro. Mais de 60 famílias vivem no local, ocupando uma área de mais de 1,6 mil hectares, que ficou destruída pelas chamas que se alastraram rapidamente devido à seca e aos fortes ventos na região.

Não se sabe ao certo a origem do fogo, investigações seguem em curso. Porém, as famílias denunciam que o retardo dos bombeiros em atender as famílias durante o incêndio ampliou os estragos de sua destruição.

Ao mesmo tempo em que denunciam a falta de infraestrutura das estradas que facilitam acesso ao local, agregado a delonga da construção de casas de alvenaria previstas no projeto de desenvolvimento da área, foram agravantes de risco e destruição, já que o fogo sob os barracos minaram as chances de salvaguarda das moradias.

Em 12 de setembro deste ano, as 280 famílias do acampamento Dom Tomás Balduíno, em Formosa, Goiás, foram vítimas de um incêndio que atingiu suas casas, quintais produtivos, roçados e até a barraca de uma Igreja evangélica da comunidade. De acordo com as famílias, o ataque está ligado a fazendeiros da região, que estão insatisfeitos com a presença delas na área.

Mata atingida por queimada em GO Foto: Pablo Vergara

Há inclusive, segundo relatos, uma estratégia de ação bem definida. Primeiro, os fazendeiros fazem a derrubada das árvores maiores, de modo a formar montes de vegetação. Estes montes, chamados de “lerões” são queimados em seguida, dando origem aos incêndios.

No dia 1 de outubro, o acampamento Clodomir Santos de Morais, localizado em Ipueiras, Tocantins, foi atacado com fogo. O fogo, além de destruir as plantações das famílias agricultoras, também danificou parte da vegetação nativa. Foi a segunda vez que o acampamento sofreu ataques de incêndio em menos de um mês, sendo que o outro ocorreu em 21 de setembro.

Na última quarta-feira (12), mais de 20 pistoleiros atacaram o acampamento Antônio Maeiro, na Chapada Diamantina, Bahia. Os pistoleiros atearam fogo nas plantações e barracos, forçando as famílias a saírem de suas casas. O acampamento é referência na produção de alimentos sem veneno e as plantações foram todas dizimadas pelo ataque. As famílias foram agredidas e ameaçadas e tiveram que se refugiar na mata em torno do acampamento para não serem alvejadas.

*Foto destaque: Pablo Vergara

*Com DCM

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Mundo

Vídeo: Maior usina nuclear da Europa na Ucrânia pega fogo

As tropas russas estão avançando de forma vertiginosa no território ucraniano. Os balanços apresentados pelos dois países dão dimensão de como as cidades estão sendo invadidas e bombardeadas pelos militares.

Nesta quinta-feira (3/3), forças russas abriram fogo na cidade ucraniana de Energodar e um incêndio tomou conta da maior usina nuclear da Europa, na cidade de Zaporizhzhia, segundo informou o assessor do Ministério do Interior ucraniano, Anton Herashchenko. Por volta das 21h20, pelo horário de Brasília, um incêndio foi registrado no local.

Segundo relatos de fontes do governo ucraniano à agência internacional de notícias Associated Press, a radiação na região aumentou após o incêndio. As informações iniciais indicam que os bombeiros que foram controlar o fogo foram recebidos a tiros.

*Com Metrópoles

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Política

‘não pega fogo’ e ‘ataques não são justos’, disse Bolsonaro sobre a Amazônia em Dubai

Durante evento para captação de negócios, presidente convidou árabes a conhecer ‘o Brasil de fato’. Dados oficiais mostram que floresta enfrenta recordes de queimadas e desmatamento.

O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta segunda-feira, durante evento com investidores em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, que “os ataques que o Brasil sofre em relação à Amazônia não são justos.”

Bolsonaro convidou os investidores árabes a conhecer a floresta – que, segundo ele, “por ser uma floresta úmida, não pega fogo”.

“Nós queremos que os senhores conheçam o Brasil de fato. Uma viagem e um passeio pela Amazônia é algo fantástico, até para que os senhores vejam que a nossa Amazônia, por ser uma floresta úmida, não pega fogo. Que os senhores vejam realmente o que ela tem. Com toda certeza, uma viagem inesquecível”, afirmou Bolsonaro durante a abertura do evento Invest in Brasil Forum, em Dubai. As informações são do site G1.

“Além de turismo, conhecer aquilo que seria um paraíso aqui na Terra. A Amazônia é um patrimônio, a Amazônia é brasileira. E vocês lá comprovarão isso e trarão realmente uma imagem que condiz com a realidade. Os ataques que o Brasil sofre quando se fala em Amazônia não são justos. Lá, mais de 90% daquela área está preservada, está exatamente igual quando foi descoberto no ano de 1500. A Amazônia é fantástica”, declarou.

Os dados reunidos por órgãos oficiais desmentem a fala de Bolsonaro. Em agosto deste ano, por exemplo, o número de focos de queimadas na Floresta Amazônica superou a média histórica para o período. Em junho, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou o maior número de focos para o mês em 14 anos.

Entre agosto de 2019 e setembro de 2020, o mesmo Inpe, vinculado ao governo federal, mostrou que mais de um terço dos quase 150 mil focos de queimadas ocorridos na Amazônia no período aconteceram em terras públicas sem destinação.

Bolsonaro ainda afirmou que os países árabes “são um dos parceiros preferidos” pelo Brasil. O presidente disse estar de “portas abertas” para negócios em diferentes áreas, em especial na agricultura.

No sábado, primeiro dia da viagem oficial ao Oriente Médio, Bolsonaro reclamou que o Brasil teria sido “atacado” na COP 26, a Conferência do Clima organizada pela ONU, em Glasgow.

Bolsonaro não foi à COP, mas integrantes do governo representaram o país. A gestão de Bolsonaro vem sendo criticada pela comunidade internacional desde 2019, quando começou o governo, em razão da postura do presidente em relação ao meio ambiente.

“Desde 2019, o governo do Brasil, com o apoio das Forças Armadas e de segurança pública, tem incrementado políticas contra crimes ambientais. Os desafios de cuidar do meio ambiente em um país continental são imensos, mas o governo brasileiro tem envidados esforços bem-sucedidos nesse sentido”, disse.

Em 2020, Bolsonaro recriou o Conselho Nacional da Amazônia Legal, chefiado pelo vice-presidente Hamilton Mourão. O presidente autorizou três operações para que as Forças Armadas combatessem crimes ambientais, contudo, os registros de desmatamento seguiram altos na Amazônia.

França também citou no discurso as metas do Brasil para redução de emissões e de desmatamento, anunciadas durante a conferência sobre o clima da ONU, a COP26, recém-encerrada em Glasgow.

O governo brasileiro faz uma ofensiva para tentar vender a imagem de um país que protege suas florestas. Isso ocorreu na COP26 e prossegue em Dubai. Na Expo 2020, por exemplo, o pavilhão brasileiro fica no distrito da sustentabilidade da exposição universal.

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Vídeos: O pantanal está em chamas, mas Bolsonaro ri

“Ninguém quer ver de perto a morte que o fogo traz para o Pantanal. Eu vi”

Era meu último dia fotografando as queimadas no Pantanal. Saio para pegar o ônibus quase acostumado com o cheiro de fumaça impregnado na roupa, o gosto amargo na boca, os olhos vermelhos e lacrimejando. Ignoro a ardência nos olhos para mantê-los abertos; fico em vigília, atento, câmara na mão.

Do lado de fora, vejo a calamidade. Perto de Poconé (MT), focos de incêndio. A fumaça e velocidade do ônibus atrapalham, mas aperto o olhar e avisto uma cena brutal. O corpo duro e sem vida de uma jaguatirica. Grito para pararem o ônibus e desço para fotografar. O ar é pesado. Os olhos do animal brancos e a língua de fora, como se tivesse tentado sorver o pouco que ainda resta do ar do Pantanal.

O motorista aparece ao meu lado, e falamos baixo, como que em luto. Ele diz que ela não foi atropelada. Morreu fugindo. Me abaixo no asfalto escolhendo um ângulo que mostre a quantidade de fumaça no caminho que ainda vou seguir. Clico o filhote tentando não mostrar toda a brutalidade que a morte impôs naquele animal tão belo. Eu nunca tinha visto uma jaguatirica. Ainda não vi.

Ninguém quer ver a morte que o fogo traz para o Pantanal tão de perto assim. Eu vi. Vi o fogo e o fim de tudo em um dos biomas mais ricos e lindos do planeta.

Quando cheguei em Poconé, perto da meia noite, a cidade estava envolta na penumbra. A fumaça era tão pesada que acreditei ser a névoa da madrugada. Não era. Era o efeito causado pelos mais de 2 milhões de hectares que estavam em chamas no Pantanal. Várzea Grande e Cuiabá também sentem o impacto da queimada criminosa e covarde. Vi como o agronegócio abre pasto com gasolina e diesel. Fazendeiros apressados em passar a boiada com a chancela do governo federal e do Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Quantos genocídios mais são possíveis na nossa nação? O Pantanal é só mais um crime impune na lista interminável dessa administração.

No meio de uma tarde de 43ºC e da fumaça sem fim em Barão de Melgaço (MT), os bombeiros e brigadistas olham o fogo, impotentes. Um dos brigadistas, com a pá na mão, é ‘seu’ Crovis. Ele diz que o fogo tem raiva. Pula de um lado para o outro. Está vivo. Ele olha para o caminho sem fim, escondido pela fumaça e avisa que não dá pra fazer nada além de esperar. Encosta no caminhão-pipa ao seu lado, que está vazio, e toma seu tererê.

O barulho do fogo é assustador

O fogo consome tudo ao redor e o barulho é assustador. Os bombeiros — são cinco no local — usam um drone para avaliar a situação. Mas a conclusão é a mesma: não há nada a ser feito. É esperar o fogo se cansar do mato e desaparecer debaixo da terra.

O ecoturismo é forte na região, que tem como atração espécies endêmicas como a arara azul do Pantanal e o cervo pantaneiro. Mas o ecoturismo esbarra no agronegócio e na abertura de pasto para a boiada. É preciso expandir a área do gado. E os brigadistas, inconformados, me contam que, para isso, fazendeiros ordenam que se use o fogo em nas áreas secas com solo rico em metano e matéria orgânica. É o fogo da ganância. Destruição, pra essa gente, é sinônimo de progresso.

Cansados de ver os animais sofrendo, guias turísticos, biólogos e veterinários locais se uniram para tentar salvá-los. Um dos resgates foi de uma onça pintada, transferida para Goiás. Eu acompanho o grupo, que me explica que a desidratação — por conta da seca e da falta de água em riachos e lagoas -, a fumaça e o fogo deixam os animais desorientados, fazendo com que passem por áreas em brasa. Com as patas queimadas e morrendo de sede, esses animais sucumbem ao choque da dor. E, sem conseguir se locomover, morrem.

Os voluntários também saem diariamente para deixar recipientes com água em vários pontos de rio seco e da mata. Falta água. Falta chuva. E, ficou claro para mim, falta humanidade no Pantanal.

Brigadista teve 80% do corpo queimado

À noite, de volta ao Sesc Pantanal, onde fiquei hospedado, escuto a conversa na mesa ao lado da minha no refeitório. Um dos militares, também alojado ali, não consegue segurar sua revolta e raiva ao comentar o ministro Salles pretendia bloquear a verba destinada para a batalha contra as queimadas na região pantaneira além da Amazônia. “Ele se precipitou, pô.”

Um desgoverno que brinca com os nervos de quem vê a morte todos os dias e vai dormir sabendo que, no dia seguinte, pode ser pego na mudança de direção do fogo e morrer queimado. Foi o caso do Wellington Fernando Peres Silva, brigadista do ICMBio que teve 80% do corpo queimado em uma ação contra os incêndios do Parque Nacional das Emas (GO).

O que Salles e o governo federal não entenderam é que igual a mim existem muitos na região. Moradores, fotógrafos e jornalistas que testemunharam tudo. Viram o que a boiada representa. Gente que sentiu o fogo de perto e respirou diariamente o ar esfumaçado e doente da Transpantaneira. Gente que rezou para ver uma onça ou jaguatirica vivas, mas que, em vez disso, tiveram de se deitar na estrada ao lado de um corpo gelado para mostrar ao mundo o que a boiada faz quando passa. Ela queima.

https://twitter.com/alice_pataxo/status/1303333925935345666?s=20

https://twitter.com/Annluizalima/status/1303399948390719488?s=20

 

*João Paulo Guimarães- Fotógrafo/Uol