Dois meses após o ex-presidente Michel Temer viajar de São Paulo a Brasília para ajudar Jair Bolsonaro a escrever a carta em que recuou das ameaças que fez ao ministro Alexandre de Moraes nos atos de 7 de setembro, o governo mantém sob sigilo os gastos o custo do deslocamento do emedebista de São Paulo até Brasília em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB).
A equipe da coluna Malu Gaspar, O Globo, solicitou ao Ministério da Defesa, via Lei de Acesso à Informação, os gastos da Aeronáutica no translado de Temer. Contudo, a Defesa se amparou em um decreto-lei da ditadura militar assinado em 1980 para dizer que os dados são sigilosos por comprometer a segurança nacional.
Foi o próprio ex-presidente que revelou à imprensa, no dia 9 de setembro, que viajara à capital federal em um avião da FAB após apelos de Bolsonaro por uma reunião.
Ele então formulou a “carta à nação”, que acenava para uma pacificação com o Supremo Tribunal Federal e conclamava a desocupação de rodovias por caminhoneiros que ameaçavam paralisar o país até que os ministros da corte fossem destituídos.
Temer contou, ainda, ter intermediado uma conversa telefônica entre Bolsonaro e o ministro do STF Alexandre de Moraes, chamado pelo presidente de “canalha” no ato da Avenida Paulista apenas dois dias antes. Moraes é o principal alvo dos bolsonaristas no Supremo, junto do atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Luís Roberto Barroso.
Segundo o decreto-lei usado pela Defesa para justificar o sigilo, o sistema de defesa aeroespacial brasileiro é “isento de quaisquer prescrições que determinem a publicação ou divulgação ostensiva de sua organização e funcionamento”, e o esclarecimento de quanto se gastou no transporte de Temer até a capital federal “coloca em risco a segurança e a operacionalidade da Defesa Aeroespacial, e em consequência, a própria segurança do Estado”.
A pasta limitou-se a informar quem voou com Temer de São Paulo, onde ele mora, e Brasília: além do ex-presidente, estavam a bordo do Legacy Embraer-135 da FAB seu marqueteiro, Elsinho Mouco, e dois passageiros, Ronaldo da Silva Fernandes (segurança) e Rogério do Nascimento.
De acordo com a Defesa, a aeronave estava na capital paulista à disposição do chefe da pasta, Walter Braga Netto, e decolou às 10h40m, “sem custos adicionais com diárias ou passagens”.
Já sobre o voo de volta para São Paulo, a Defesa diz que é responsabilidade do Ministério das Comunicações informar os custos, mas não esclareceu o motivo. O ministério dirigido por Fábio Faria foi procurado pela reportagem, mas não quis se manifestar.
Alvo de críticas beligerantes de Bolsonaro no passado, Temer se tornou um confidente do presidente e chegou a chefiar uma missão especial do governo brasileiro no Líbano, em 2020, a convite do atual chefe do Planalto.
O emedebista, de 81 anos, já declarou ter votado em Bolsonaro no segundo turno de 2018 e gosta de repetir que o capitão reformado do Exército representa “um governo de continuidade”. Mas seu protagonismo no distensionamento da crise de setembro foi atípico para um ex-presidente.
Não à toa, a autoria da carta foi logo divulgada pelo próprio Temer, que procurou capitalizar ao máximo o momento nas redes sociais e dando entrevistas. Em um convescote com empresários que acabou se tornando notícia, o ex-presidente voltou a se vangloriar pelo seu papel no episódio e acabou revelando outros detalhes do encontro sigiloso com Bolsonaro.
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