Imagens comprovam que invasão em Brasília foi premeditada; Estadão identificou 88 golpistas

‘Nós vamos colapsar o sistema, nós vamos sitiar Brasília’, disse uma extremista; outro, com nome de Bolsonaro no boné, orientou pichações no Supremo; mais de 1.500 foram presos após ataques contra STF, Congresso e Planalto

Estadão – Fotografias, vídeos e trocas de mensagens em grupos restritos comprovam que a invasão ao Palácio do Planalto, ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal (STF) por extremistas foi um ato premeditado e organizado em seus detalhes, e não uma ação espontânea. Nos últimos dois dias, o Estadão analisou cerca de 26 horas de transmissões ao vivo, listas de passageiros de ônibus, postagens em redes sociais e centenas de imagens. O material deixa claro que os manifestantes foram para Brasília dispostos, efetivamente, a invadir as sedes dos três Poderes.

O Estadão identificou a participação de 88 pessoas nas invasões e depredações dos espaços públicos. A convocação para os atos já tinha um propósito golpista estabelecido: “Nós vamos colapsar o sistema, nós vamos sitiar Brasília, nós vamos tomar o poder de assalto, o poder que nos pertence”, disse Ana Priscilla Azevedo, numa live realizada em 5 de janeiro, no acampamento bolsonarista montado no entorno do Quartel General do Exército, em Brasília. Não era um grito isolado. Mensagens de mesmo teor foram reforçadas em centenas de postagens produzidas por manifestantes, que também trataram de destacar o papel de liderança do ex-presidente Jair Bolsonaro sobre a mobilização golpista.

Ana Priscila Azevedo

“Jair Messias Bolsonaro, você vai estar voltando para essa nação para continuar o seu governo”, disse o missionário Felício Quitito, ao invadir o plenário do Senado. Com a foto presidencial de Bolsonaro arrancada da galeria de ex-presidentes do Palácio do Planalto, Alcimar Francisco da Silva deixou clara a sua inspiração para invadir a casa oficial do governo federal. “Meu herói. Estamos na casa dele aqui, na nossa casa”, afirmou Silva, exibindo o retrato.

As provas que mostram a intenção golpista também revelam a conivência da Polícia Militar do Distrito Federal. A caminho do Congresso, uma mulher que se identificou como Margarida disse aos seus seguidores que o objetivo era “tomar” o local. “Orem por nós”, pediu. Já Jussara Oliveira elogiou os policiais. “Um agradecimento todo especial à PM, que a todo tempo está nos apoiando”, afirmou. Era um clima de confraternização. “Não tem Dubai, não tem Paris, não tem viagem que eu tenha feito na vida que seja melhor do que esse dia que eu sonhei tanto, que a gente ia tomar isso daqui”, vibrou Aline Magalhães em vídeo que exibiu nas suas redes sociais.

Gilberto da Silva FerreiraMarcos Alexandre Mataveli de Morais

Dentro do Congresso, Alessandra Faria Rondon ocupou a cadeira e mesa do senador licenciado e atual ministro da Agricultura, Carlos Fávaro (PSD-MT), no Senado. “Eu só saio daqui a hora que os traidores da Pátria estiverem presos”, afirmou, aos berros. “Queremos intervenção militar.”

O guarda municipal Joelson Sebastião Freitas comemorou o êxito golpista e até mesmo a direção do vento, que jogava a fumaça das bombas de gás na direção dos policiais. “Como Deus é bom, a fumaça vai só para a polícia”, celebrou, enquanto invadia o Palácio do Planalto ao lado da mulher, Marisa Nogueira. “Amor, venha, vamos subir a rampa antes que a polícia chegue.” Joelson Sebastião Freitas.

Joelson Sebastião Freitas

o Freitas Foto: Reprodução/Redes Sociais

Houve quem lamentasse a perda de itens pessoais, mas dizendo que o caos valia o preço. “Estamos quebrando tudo, fazer o quê? O povo é soberano. Eu perdi o meu Ray-Ban, caiu nessa porra toda. Mas valeu”, disse Beto Rossi, ao invadir o Planalto.

Próximo dali, Fabrizio Cisneros mostrava o Supremo depredado, ao som de vidros sendo quebrados, e pedia que seus seguidores compartilhassem as imagens. “O mundo inteiro tem que saber que a gente tomou o poder de novo e a gente não vai sair daqui. A gente não vai recuar”, disse o extremista. “Infelizmente, tivemos que ser um pouco mais ríspidos.”

Cisneros vestia um boné com o nome de Bolsonaro, que tinha o rosto estampado em uma infinidade de camisetas. Em um dos vídeos, ele pediu a outro extremista para pichar a sede do Supremo. “Não seria interessante escrever nela (janela): Supremo é o povo? Pega essa tinta e escreve nela”, disse. “É a revolução dos manés.”

Durante a transmissão ao vivo, as palavras de Cisneros repercutiam o sentimento de milhares de pessoas que se entocaram por mais de um mês dentro de barracas erguidas na porta do Exército. Disse que os radicais haviam ficado 70 dias nas ruas, “esperando que se fizesse algo” sobre a vitória de Lula Inácio Lula da Silva (PT). “Nada foi feito. Então, viemos tomar o poder, que é nosso por direito”, afirmou. “A gente vai ser resistência até o dia que o Exército intervier com a GLO (Garantia da Lei e da Ordem).”

Os apoiadores do ex-presidente acreditavam que, ao causar o caos nos prédios públicos, as Forças Armadas teriam uma justificativa para dar um golpe e tirar Lula do Palácio do Planalto. “Já tomamos aqui, o pior já foi feito”, afirmou Cineroso. “Não podemos perder essa única e última oportunidade. O Exército tem que vir, tem que intervir.” Após a depredação, o petista decretou intervenção federal na segurança do Distrito Federal e mais de 1.500 extremistas foram presos.

No início da noite, Rafael Faus mostrou que a Esplanada dos Ministérios já estava tomada pelas forças de segurança. “Polícia para c* jogando bomba na gente”, reclamou. “Vamos para cima, vamos entrar de novo.”

Rafael FausFátima Mendonça

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Por Celeste Silveira

Produtora cultural

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