Bolsonaro mentiu, em live, ao alegar que a OMS (Organização Mundial da Saúde) é contra a aplicação de vacinas para o combate à covid-19 entre adolescentes. A organização reconhece que o imunizante da Pfizer pode ser dado a jovens a partir de 12 anos.
A alegação falsa de Bolsonaro foi dita algumas horas depois de o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, ter anunciado a suspensão da vacinação de adolescentes sem comorbidades, voltando atrás em orientação da própria pasta. Segundo a Folha, a mudança ocorreu após pressão de Bolsonaro e apoiadores. A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) mantém a autorização da vacina da Pfizer para adolescentes.
Demissão coletiva
Membros dizem que pretendem entregar os cargos se ministro, leia-se presidente, não mudar de posição em relação ao tema.
Em reunião nesta sexta-feira (17), membros da Câmara Técnica do Plano Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde exigiram mudança de posição e retratação da pasta em relação à suspensão da orientação sobre vacinar adolescentes de 12 a 17 anos contra a Covid-19.
Eles querem que a pasta diga publicamente que a câmara não foi consultada na decisão pela suspensão e que se comprometa a retomar a recomendação da vacinação dos adolescentes.
Caso não ocorra, eles disseram que pretendem entregar suas posições na câmara. O pleito teve apoio unânime entre os participantes da reunião.
O grupo é composto por professores, especialistas, representantes de sociedades de classe e conselhos de secretários estaduais e municipais de Saúde (como Conass e Conasems), e é responsável por subsidiar tecnicamente o ministério em suas decisões.
Se o ministério vai tomar decisões sem consultá-los, afirmaram, não faz sentido manter seus nomes associados às medidas tomadas pela pasta.
O ministério foi representado no encontro por Rosana Leite de Melo, secretária extraordinária de enfrentamento à Covid-19, que disse que levaria os recados ao ministro Marcelo Queiroga.
Segundo relatos dos presentes, o encontro foi tomado pelas críticas dos membros da câmara técnica, que Queiroga ignorou ao decidir pela suspensão. Em entrevistas, ele tem dito que o órgão é consultivo e que não tem a obrigação de ouvi-lo.
A perfomance de Queiroga ao longo do episódio foi descrita como desastrosa. O ministério foi criticado por suspender a vacinação devido à morte de uma adolescente que, ao que tudo indica, não teve qualquer relação com a imunização, por surpreender a câmara técnica com a publicação da nota sobre o tema e por gerar mensagens equivocadas e danosas à população em relação à eficácia da vacinação.
Publicada na noite da quarta-feira (15), a nota técnica que trata da suspensão da vacinação destaca que o ministério é subsidiado pela câmara, o que causou grande incômodo de seus membros, que enfatizaram que querem que Queiroga deixe claro que não foram consultados para tomar a medida considerada trágica.
Esses especialistas apontaram ainda que a nota técnica está repleta de erros técnicos. Ela diz que a OMS não recomenda a imunização de criança ou adolescente e que os benefícios da vacinação em adolescentes sem comorbidades ainda não estão claramente definidos, ambas afirmações que não correspondem à realidade.
*Com informações da Folha
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Em nome do governo, ONG de reverendo tratava de compras de imunizantes com empresa americana aberta em janeiro.
Alvo da CPI da Covid no Senado, uma ONG autorizada pelo Ministério da Saúde a negociar a compra de vacinas para o Brasil buscou doses com uma empresa nos Estados Unidos gerenciada por um policial aposentado que chegou a ser afastado das ruas por suspeita de corrupção.
A sede da empresa, que foi aberta há seis meses e não comprovou ter meios de disponibilizar os imunizantes, é registrada no endereço dos fundos de um escritório de advocacia especializado em pequenas causas indenizatórias, localizado no Queens, em Nova York.
A reportagem da Folha esteve no local na semana passada e foi informada pelo sócio do escritório, Darmin Bachu, que a empresa que supostamente vende vacinas funcionaria em outro lugar, a poucos quilômetros dali. Nesse novo endereço fica um cinema de bairro, também gerenciado pelo policial aposentado.
Trocas de mensagens obtidas pela Folha apontam que, em nome do governo brasileiro, a ONG Senah (Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários), uma entidade privada, discutiu com a empresa americana a possibilidade de compra de vacinas da Pfizer e da AstraZeneca, além de luvas e seringas. A AstraZeneca nega que negocie venda para empresas privadas.
Criada em janeiro deste ano, a firma novaiorquina ganhou o nome de International Covid Solutions Corp e, segundo registros nos EUA, é presidida por Charles Ramesar e gerenciada pelo policial aposentado de Nova York Rudranauth Toolasprashad, conhecido como Rudy.
Já a Senah é comandada pelo reverendo Amilton Gomes de Paula, que foi convocado a depor na CPI da Covid e deve comparecer ao Senado na terça (3).
A ONG entrou no radar da comissão após outras negociações virem à tona. Com autorização do Ministério da Saúde, a Senah discutiu, por exemplo, a compra de 400 milhões de doses da vacina da AstraZeneca por meio da empresa Davati Medical Supply, também localizada nos EUA.
A chancela do governo para as negociações foi concedida por Laurício Monteiro Cruz, então diretor de Imunização do Ministério da Saúde, que acabou exonerado depois que o caso foi revelado.
O policial militar e vendedor de vacinas Luiz Paulo Dominghetti Pereira disse à Folha no início de julho que Roberto Ferreira Dias, então diretor de Logística do Ministério da Saúde, pediu propina para que a Davati fechasse o contrato com o governo brasileiro. Dias foi exonerado e nega as suspeitas.
Já a negociação da ONG com a International Covid Solutions Corp aconteceu em paralelo à feita com a Davati. Os representantes da Senah tratavam sobre a venda de vacinas com o gerente da empresa, Rudy, desde o início do ano.
Em um comunicado de fevereiro, Rudy diz à Senah que iria providenciar ao Brasil 4 milhões de doses do imunizante da AstraZeneca, 4 milhões de luvas e 4 milhões de agulhas e seringas para “agências governamentais e companhias privadas”.
No entanto, Rudy pede uma carta de comprovação, assinada pelo governo e empresas, com o compromisso de aquisição dessas vacinas, o que não aconteceu.
Em outro comunicado, de maio, a Senah afirma que iria se reunir com o governo brasileiro e que havia interesse oficial na compra dos imunizantes, mas acrescenta que seriam necessárias provas documentais da existência dessas doses, o que também não foi providenciado por Rudy.
Procurados, integrantes da ONG e da empresa nos EUA dizem que essas negociações não prosperaram e sinalizam desconfiança uns dos outros.
Segundo a imprensa americana, Rudy, que tem origem guianense, foi investigado num escândalo de suspeita de recebimento de propina no início dos anos 2000, mas acabou não sendo processado.
Reportagem do The New York Times afirma que, enquanto era investigado, ele teve que entregar a arma e o distintivo e passar a fazer trabalhos administrativos.
De policial, passou a gerente de cinema e da International Covid Solutions Corp, cujo endereço —o mesmo dos fundos do escritório de advocacia— é registrado em uma movimentada avenida do bairro Jamaica, no Queens, repleto de comércio e numerosa população de imigrantes.
Mas antes de conseguir identificar a casa, com numeração quase apagada em uma caixa de correio enferrujada, o visitante pode ler o anúncio: “Acidente? Ferido? Entre agora! Vamos conseguir o máximo de dinheiro para seus ferimentos.”
Na tarde de segunda-feira (26), a Folha esteve no local e visitou o escritório de advocacia Bachu & Associates. Um funcionário explicou que, entre as salas apertadas, existem outras empresas —”talvez umas três ou quatro”— mas não sabia nada sobre a venda de imunizantes. “Estou sempre no telefone, bastante ocupado e, com a pandemia, tem muita gente trabalhando remoto”, afirmou.
Ele disse que havia ouvido falar em Rudy, mas não conhecia Charles Ramesar, e passaria o contato da reportagem para o chefe do escritório.
Além da empresa envolvida na negociação de vacinas com a Senah, o escritório de advocacia também é endereço de outra firma criada por Charles Ramesar, a Covid 19 Rapid Teste Nyc Inc., registrada 12 dias antes da criação da International Covid Solutions Corp.
Durante dois dias, a Folha telefonou diversas vezes e visitou os endereços comerciais e residenciais registrados em nome dos supostos sócios da International Covid Solutions Corp, mas não os encontrou.
Máscaras do tipo KN95 adquiridas pelo Ministério da Saúde e distribuídas a profissionais na linha de frente de enfrentamento da covid-19 custaram 29% mais ao governo brasileiro do que a uma empresa privada que as adquiriu na mesma época, do mesmo importador e do mesmo fornecedor. A compra de 40 milhões de máscaras ocorreu em abril do ano passado, ao custo de US$ 66 milhões. Se nela tivesse sido aplicado o valor mais baixo, o pagamento seria de US$ 51,2 milhões, uma diferença de US$ 14,8 milhões.
A compra faz parte do maior contrato de insumos hospitalares assinado no Brasil no âmbito do combate à pandemia, que incluiu também máscaras mais simples.
De acordo com contrato assinado com a 356 Distribuidora, Importadora e Exportadora, representante no Brasil da empresa de Hong Kong Global Base Development HK Limited, o governo brasileiro pagou US$ 1,65 por máscara KN95, ou R$ 8,65, pela cotação no momento da compra.
Também em abril, a mesma 356 Distribuidora importou 200 mil máscaras para um grupo privado, também no modelo KN95, o mesmo contratado pelo governo brasileiro. No entanto, elas custaram US$ 1,28 cada, ou R$ 6,71, de acordo com documentos obtidos pela reportagem.
Caso o mesmo preço tivesse sido ofertado pela 356 Distribuidora ao governo brasileiro, o país teria economizado US$ 0,37 (R$ 1,93) por máscara, ou US$ 14,8 milhões (R$ 77,5 milhões na cotação da época), se considerado o valor total da transação.
A reportagem perguntou ao dono da 356 Distribuidora, Freddy Rabbat, por que não ofertou o mesmo preço ao governo brasileiro, mas ele preferiu não comentar. O Ministério da Saúde também não se pronunciou.
Em nota, os advogados de Rabbat, Eduardo Diamantino e Fábio Tofic, defenderam o preço aplicado ao Ministério da Saúde, que no entendimento deles “está abaixo da média de mercado na época da aquisição, momento em que havia um crescimento sem precedentes da demanda mundial pelo produto e o Brasil corria o risco de não conseguir insumos para enfrentar a pandemia de covid-19”.
Freddy Rabbat representa no Brasil a marca de relógios suíça Tag Heuer e preside a Associação Brasileira de Empresas de Luxo. Desde 2019 ele atua como conselheiro fiscal da Eucatex, empresa da família do ex-deputado federal Paulo Maluf (PP). De acordo com a assessoria da empresa, ele é parente de quarto grau dos filhos do político, Otavio e Flavio.
Cliente privado
A importação de máscaras a preço mais barato contou com o apoio do Ascensus Group, empresa de trading de Joinville (SC) que atuou como prestadora de serviços. A empresa confirmou a operação e disse que as máscaras mais baratas foram direcionadas a um cliente privado, cujo nome não poderia ser revelado em função de “cláusulas de confidencialidade”.
“A responsabilidade da operação é única e exclusiva do cliente, neste caso a 356, importadora das máscaras. Nosso grupo não fez a comercialização, compra, venda ou distribuição deste produto”, informou a Ascensus, por meio de nota.
Na operação privada, a chinesa Shenzhen Swift Imp. & Exp. Co. Ltda é registrada como fornecedora dos produtos. De acordo com documento arquivado no setor de registro de empresas de Hong Kong, a Shenzhen Swift é a única dona da Global Base Development, fornecedora oficial das mesmas máscaras ao governo brasileiro.
Documentos obtidos em órgãos de registro chineses e de Hong Kong apontam também que as duas empresas têm o mesmo administrador legal, Zhang Yong.
Na última semana, a reportagem entrou em contato com representantes da Global Base na China para tentar comprar um lote de máscaras e verificar o preço aplicado hoje pela empresa, mas o gerente de operações, Alexander Pan, informou que essa informação seria dada pelo representante brasileiro da empresa.
Na proposta de compra apresentada ao governo brasileiro, Rabbat citou o nome de BI Tian Yuan como o responsável pela Global Base e representante da empresa no negócio.
Trata-se de um jovem de 19 anos que nos Estados Unidos adotou o nome Jack Yuan. Ele é estudante da Universidade de Stanford e colega na instituição de Freddy Rabbat Neto, de 20 anos, filho do dono da 356 Distribuidora.
O processo administrativo de compra de máscaras no âmbito do governo brasileiro sugere que Rabbat Neto teve participação no negócio. Ele é copiado em emails trocados entre o pai e representantes do Ministério da Saúde para tratar de alterações no método de pagamento pelas máscaras.
Nome do pai de Boulos no cadastro do SUS foi alterado para “Kid Bengala” e a informação de que recebeu a primeira dose da vacina contra Covid foi apagada; outras lideranças de esquerda passaram por situação parecida.
O líder social Guilherme Boulos (PSOL) teve seu cadastro no Sistema Único de Saúde (SUS) invadido e os dados alterados. A informação foi revelada nesta segunda-feira (19) pelo jornalista Leonardo Sakamoto.
No cadastro de Boulos junto ao SUS, o nome de seu pai, Marcos Boulos, foi alterado para “Kid Bengala”. Além disso, a informação de que o psolista recebeu a primeira dose da vacina contra a Covid-19 não consta no sistema do Ministério da Saúde.
De acordo com informações obtidas pela Fórum junto ao Ministério da Saúde, a invasão pode ter partido de dentro da própria pasta.
“O bolsonarismo está se infiltrando de uma maneira miliciana em todos os âmbitos da administração pública. Está colocando as garras das milícias digitais, do Gabinete do Ódio, no SUS, patrimônio do povo brasileiro”, disse Boulos a Sakamoto.
Invasões
O caso de Boulos vem após outras lideranças políticas de esquerda terem passado por situação parecida.
A presidenta do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), por exemplo, teve dificuldades para tomar a segunda dose da vacina contra a Covid pois seu cadastro no SUS também foi invadido e, nele, a parlamentar passou a constar como “morta”.
Além disso, ao lado do nome de Gleisi no cadastro foi colocado um “apelido”: “Bolsonaro”.
A ex-deputada Manuela D’Ávila (PCdoB-RS), bem com os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff, ambos do PT, também já tiveram seus cadastros do SUS invadidos e alterados.
Ministério da Saúde
Fórum entrou em contato com o Ministério da Saúde para obter um posicionamento sobre essas invasões. Em nota, a pasta informou que identificou uma alteração na base de dados do SUS feita por “uma pessoa credenciada para utilizar o sistema” – sinalizando que a invasão pode ter partido de um funcionário do próprio Ministério.
Confira, abaixo, a íntegra da nota:
O Ministério da Saúde informa que verificou uma alteração na base do CNS realizada por uma pessoa credenciada para utilizar o sistema de cadastro de dados. Cabe esclarecer que já foi solicitado o bloqueio da credencial usada nestas ações.
A pasta esclarece que as informações de vacinação disponibilizadas por meio do Conecte SUS Cidadão dependem dos registros enviados por estados e municípios. Caso não esteja disponível após 10 dias da imunização, o Ministério orienta que o cidadão procure a unidade de saúde.
Um dos políticos acusados de integrar o esquema suspeito é o líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros.
A denúncia de pagamentos irregulares mensais de até R$ 296 mil a políticos e servidores ligados ao Ministério da Saúde será o foco de uma nova linha de investigação da CPI da Covid. As informações são de reportagem do Uol.
O suposto esquema mensal de propina, que teria começado em 2018 com previsão de durar cinco anos e que foi denunciado por uma ex-servidora da pasta, foi discutido em uma reunião de senadores independentes e da oposição feita em 6 de julho, um terça-feira, na casa de Omar Aziz (PSD-AM), presidente da comissão.
Entre os beneficiados estaria o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), ex-ministro e atual líder do governo na Câmara. Ele nega as acusações (leia mais abaixo).
De acordo com a denúncia, o suposto esquema de repasses de valores começou em 2018, durante a gestão de Barros no Ministério da Saúde, informaram ao UOL senadores da comissão.
Até aquele ano, a distribuição de vacinas e de outros insumos pelo governo federal era feita pelo próprio Ministério da Saúde por meio da Cenadi (Central Nacional de Armazenamento e Distribuição de Imunobiológicos), órgão que existiu por cerca de 20 anos.
Durante a gestão de Barros, porém, a Cenadi foi extinta e, em seu lugar, entrou a empresa VTC Operadora Logística Ltda, conhecida como VTCLog.
O esquema
Contratada pelo ministério, a companhia privada passou a assumir a responsabilidade pelo armazenamento, controle e distribuição de todas as vacinas, medicamentos, soros e demais insumos entregues pela União a estados e municípios do país.
Segundo um parlamentar que integra a CPI, novas testemunhas relataram a senadores que a “operadora logística” contratada durante a gestão Barros seria um meio para desviar recursos do Ministério da Saúde, inclusive durante a pandemia do novo coronavírus.
O UOL teve acesso ao contrato nº 59/18 e a todos os aditivos de valores concedidos à empresa que preveem a prestação de serviço de “transporte e armazenamento” da empresa ao SUS durante 60 meses (ou cinco anos) por um valor total de R$ 592.733.096,15.
Isso significa que, caso o suposto pagamento mensal tenha ocorrido, como acreditam senadores da cúpula da CPI, a quantia que teria sido concedida irregularmente a políticos e servidores somaria R$ 59,2 milhões, ou 10% do total.
Esse valor, dividido pelos 5 anos contratados, renderia, por mês, cerca de R$ 990 mil aos envolvidos, segundo informações repassadas à CPI pelos denunciantes. Um décimo do valor (ou R$ 99 mil) ficaria com Roberto Dias.
Um dos denunciantes, que também foi ouvido pelos senadores, informou ao UOL que Dias se encontrava “constantemente” com a CEO da empresa VTCLog, Andreia Lima Marinho. A empresária teve o pedido de convocação feito pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) aprovado, mas a data da oitiva ainda não foi definida.
De acordo com as informações recebidas pela CPI, os R$ 890 mil restantes eram, então, divididos em três partes iguais de pouco mais de R$ 296 mil cada uma e repassados para três políticos, entre eles Ricardo Barros. Os envolvidos nas investigações, porém, negaram-se a revelar quem são os outros dois envolvidos no suposto esquema.
Questionado sobre as acusações, Barros disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que não recebeu de maneira direta ou indireta recursos financeiros da VTCLog.
Contratos com a VTCLog
Em um outro requerimento, o senador Randolfe Rodrigues solicita ao Ministério da Saúde que “todos os contratos” entre a pasta e a empresa, desde 2017, sejam entregues à CPI.
Trata-se de uma empresa que possui contratos de grande monta com o Ministério da Saúde. Sendo assim, é importante que esta Comissão Parlamentar de Inquérito tenha acesso a esses contratos para realizar seu dever de fiscalização”
Randolfe Rodrigues, em requerimento Por causa dessa suspeita, a VTCLog será um dos novos focos da CPI da Covid, informaram dois senadores da cúpula do colegiado e um da oposição à reportagem.
Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, na segunda-feira passada (12), o deputado Luis Miranda (DEM-DF) afirmou que há no Ministério da Saúde um “mensalão”. O parlamentar, porém, não deu mais detalhes sobre o suposto repasse mensal a políticos.
Manobra foi registrada em termo de referência que balizou confecção de contrato para compra da vacina indiana.
Segundo matéria de Vinicius Sassine, Folha, o Ministério da Saúde chegou a prever, em documento que balizou o contrato para compra da vacina indiana Covaxin, a dispensa da necessidade de garantia por parte das empresas contratadas.
Depois, a pasta do governo de Jair Bolsonaro aceitou uma garantia irregular apresentada pela intermediadora do negócio, a Precisa Medicamentos, como revelou a Folha na última quarta-feira (14).
O termo de referência para as negociações sobre a Covaxin, elaborado por dois servidores do ministério em 17 de fevereiro, estabelecia que não haveria “garantia contratual da execução”.
A dispensa contrariava exigência prevista em MP (medida provisória) editada em janeiro para a compra de vacinas e também pontos da lei de licitações e contratos públicos.
Assinam o termo de referência o assessor técnico Thiago Fernandes da Costa e o diretor do Departamento de Imunização, Lauricio Monteiro Cruz.
Costa é réu em processo na Justiça Federal em Brasília aberto em razão de calote de R$ 20 milhões dado ao ministério pela Global Gestão em Saúde, dos mesmos donos da Precisa.
Ex-ministro da Saúde e líder do governo Bolsonaro na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR) também é réu. O servidor diz que assinou papéis que seguem diretrizes da cúpula da pasta.
Monteiro Cruz, por sua vez, foi demitido do cargo no último dia 8 em razão de uma suposta participação no mercado paralelo de vacinas, investigado pela CPI da Covid no Senado. Ele teria dado aval para que um reverendo negociasse doses inexistentes da AstraZeneca em nome do governo.
Após reuniões internas na pasta, a dispensa da garantia foi detectada e eliminada do termo de referência. Documentos sobre essa mudança indicam que a dispensa se estenderia à compra da vacina russa Sputnik V, negociada com o governo pela União Química.
O termo passou a prever, então, a necessidade de uma garantia no valor de 5% do total contratado —R$ 80,7 milhões de R$ 1,61 bilhão destinados à compra da Covaxin.
Conforme o termo de referência, essa garantia deveria ser dada num prazo de dez dias após a assinatura do contrato, por meio de uma de três modalidades possíveis: caução em dinheiro ou em títulos da dívida pública, seguro-garantia ou fiança bancária. Essa previsão foi transferida para o contrato, assinado em 25 de fevereiro.
ao ministério uma “carta de fiança” emitida pela empresa FIB Bank Garantias S.A., sediada em Barueri (SP). A carta afiança o valor de R$ 80,7 milhões. A Precisa aparece como “afiançada”. O “beneficiário”, conforme o documento, é o Ministério da Saúde, por meio do Departamento de Logística em Saúde da Secretaria-Executiva.
Naquele momento, o diretor do departamento era Roberto Ferreira Dias e o secretário-executivo, coronel Elcio Franco, a quem cabia a negociação de vacinas.
O primeiro foi demitido após entrevista à Folha de um vendedor de vacinas na qual o acusou de cobrança de propina no mercado paralelo de imunizantes. O segundo é alvo central da CPI da Covid e tem hoje um cargo de confiança na Casa Civil da Presidência.
A própria FIB Bank descreve o documento entregue ao ministério como uma “fiança fidejussória”. O site da empresa também afirma que o serviço prestado é o de “garantia fidejussória”, que consiste em uma “garantia pessoal, seja ela de pessoa física ou jurídica”.
O contrato entre Ministério da Saúde e Bharat Biotech, assinado pela Precisa Medicamentos no papel de representante, não prevê garantia do tipo pessoal.
A Precisa também descumpriu o prazo para apresentação da garantia, o que foi aceito pelo ministério sem contestação. A “carta de fiança” da FIB Bank foi emitida e assinada em 17 de março, dez dias depois do prazo contratual. O vencimento estipulado foi 17 de março de 2022, também distinto do especificado pelo ministério.
ocumentos da contratação mostram ainda que a área do diretor Roberto Dias tratou uma garantia fidejussória, bem mais frágil do que as modalidades previstas em contrato, como um seguro-garantia.
“Encaminhamos a apólice de seguro-garantia para a guarda da coordenação-geral de execução orçamentária e financeira”, cita um despacho de 22 de março, cinco dias após a assinatura da “fiança”.
A “carta fiança”, então, foi registrada no Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira) do governo federal, tendo como favorecida a Precisa Medicamentos.
À Folha a FIB Bank confirmou que não está cadastrada no Banco Central e que não é uma instituição financeira, tampouco uma empresa seguradora. Trata-se de um “fundo garantidor de crédito, que atua com a oferta de garantias fidejussórias”, afirmou em nota à reportagem.
“A companhia está devidamente constituída, conforme previsto em lei, e tem regular registro perante os órgãos de administração pública”, disse a FIB Bank. “O patrimônio da companhia está lastreado em bens imóveis integralizados em seu capital social, assim como bens e direitos e moeda corrente.”
O Ministério da Saúde e a Precisa Medicamentos não responderam aos questionamentos da reportagem sobre a garantia dada no negócio.
O contrato da Covaxin está suspenso desde o último dia 28, por determinação da Corregedoria-Geral da União, que funciona no âmbito da CGU (Controladoria-Geral da União).
Na CPI, durante o depoimento prestado na última quarta-feira, a diretora-técnica da Precisa, Emanuela Medrades, foi questionada pelos senadores sobre a existência de garantia no negócio, como prevê o contrato. Ela respondeu que existe, mas sem fornecer detalhes a respeito da garantia dada.
A garantia fidejussória é como se fosse um aval pessoal, sendo bem mais frágil do que as outras garantias especificadas no contrato para a compra da Covaxin, conforme especialistas ouvidos pela reportagem.
A própria expressão usada pela FIB Bank, “fiança fidejussória”, causa estranheza, segundo esses especialistas. A garantia dada deve ser acionada em caso de descumprimento de cláusulas pela Precisa. O objetivo é garantir a “operação financeira e logística” do contrato.
Segundo reportagem do El País. Vários coronéis, um reverendo e uma entidade com forte presença militar acusada são citados na teia de negociação de vacinas contra a covid-19 supostamente superfaturadas e que sequer existiam. Este é o roteiro inusitado que desponta do depoimento do representante da empresa americana Davati Medical Supply no Brasil, Cristiano Carvalho, à CPI da Pandemia nesta quinta-feira (15). Ele contou aos senadores que não procurou o Ministério da Saúde para negociar imunizantes, mas foi inusualmente procurado pelo órgão, quando passou a dar atenção ao assunto. Revelou ainda que grande parte da cadeia de comando da pasta ―incluindo vários militares de dois grupos distintos― participou das conversas que visavam a aquisição de 400 milhões de doses da AstraZeneca e que depois foram levadas ao centro de denúncias de corrupção. O depoimento do Carvalho empurra ainda mais os holofotes para a participação de militares nas negociações de vacinas com suspeitas de irregularidades.
Carvalho desvelou no seu depoimento uma rede de mediadores em um negócio bilionário de venda de imunizantes que ninguém tinha para entregar. A AstraZeneca sustenta não ter intermediários no país e, nesta semana, a Davati admitiu que não tinha doses à mão, conforme disse o dono e presidente da empresa, Herman Cardenas, à Folha de S. Paulo. Segundo ele, o que havia era uma promessa de alocação das vacinas feita pela companhia de um médico americano junto à AstraZeneca. Cardenas, porém, não deu nomes alegando sigilo contratual.
No depoimento, Carvalho disse não ter participado do jantar em um shopping de Brasília no qual supostamente o ex-diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias, teria pedido propina de um dólar por dose ao policial militar e vendedor da Davati, Luiz Paulo Dominguetti. Mas confirmou ter sido avisado sobre um pedido de “comissionamento extra” ―ou seja, propina― pelo grupo do ex-servidor e militar reformado, coronel Marcelo Blanco, que assessorava Roberto Dias no Ministério da Saúde. O ex-diretor do departamento de Logística nega as acusações. Aos senadores, Carvalho disse que não foi informado sobre valores e que não foram feitos pedidos de propina diretamente a ele. Afirmou ainda que Blanco, ex-servidor da Saúde, que abriu uma empresa de insumos hospitalares e que teria lhe dito que agora estava negociando vacinas com a pasta, parecia atuar ainda como auxiliar de Roberto Dias mesmo já tendo sido exonerado.
Novos militares e entidade na negociação
Carvalho adicionou novos personagens na trama e deu força à tese da existência de dois grupos em disputa dentro do Ministério da Saúde que atuavam na negociação de vacinas: um ligado ao coronel Marcelo Blanco e a Roberto Dias, e outro ligado ao coronel Élcio Franco, na época secretário-executivo do Ministério da Saúde, cargo abaixo apenas do de ministro. Ambos os grupos teriam uma forte presença de militares. O representante da Davati contou que foi pela primeira vez ao ministério em 12 de março deste ano, levado pelo coronel Helcio Bruno Almeida, presidente do Instituto Força Brasil (IFB). A entidade, segundo ele, era o braço utilizado pela ONG Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah), do reverendo Amilton Gomes, para chegar ao alto escalão da Saúde. A Senah teria tido o aval do Governo para negociar as 400 milhões de doses com a Davati e Carvalho apontou que caberia a ela também dar a segurança jurídica ao processo de venda dos imunizantes, já que a empresa americana Davati sequer tem CNPJ no Brasil.
Carvalho ainda diz que foi o Instituto Força Brasil que fez a ponte entre o representante da Davati e o coronel Elcio Franco, então número 2 do Ministério da Saúde. O IFB se apresenta como um instituto sem fins lucrativos, que trabalha dentro dos valores conservadores e cristãos, tanto pela bandeira pró-armas como pela defesa da vida e da família. O vice-presidente da instituição é o empresário Otávio Fakhoury. Mas, segundo o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), a instituição patrocina um conjunto de contas em redes sociais investigadas no inquérito das fake news. Uma delas seria a página Crítica Nacional, que de acordo com Randolfe, propagou notícias falsas sobre o uso de máscaras e a vacinação, especialmente contra a Pfizer.
O IFB, por sua vez, diz que tem civis e militares em seus quadros e que atua de forma transparente e em defesa à vida, inclusive com ações de Saúde. Também nega ter parceria com a Davati. De acordo com Igor Vasconcelos, diretor jurídico do Instituto Força Brasil, eles foram procurados pelo reverendo Amilton para ver os caminhos que ajudassem a chegar ao Ministério da Saúde com a proposta da vacinas da Davati. “Tudo que for a respeito da defesa da vida a gente tenta ajudar”, disse Vasconcelos à reportagem. Segundo ele, o presidente do IFB, o coronel Hélcio Bruno, jamais havia tido contato com o coronel Élcio Franco antes. “Fizemos a reunião, que foi rápida. Esperamos bastante para sermos atendidos. Existe ata da reunião, inclusive”, diz ele, lembrando que o IFB não debate preços.
O foco do grupo, contudo, era a possibilidade “de que o mercado brasileiro fosse atendido por uma expressiva quantidade de vacinas, em curto prazo, e que este número seria suficiente para alcançar, inclusive o setor privado (objeto da audiência), aliviando a forte demanda do produto”, disse a empresa em nota distribuída à imprensa. “Tratamos assuntos relacionados à vacinação com a secretaria-executiva, principalmente no sentido de aperfeiçoar a legislação que facilitava a vacinação por empresas privadas, com vistas a acelerar a imunização da classe trabalhadora e liberá-las à produção”, segue a nota, assinada pelo coronel Helcio Bruno. Embora o IFB se diga apolítico, em seus vídeos há várias referências positivas ao presidente Jair Bolsonaro e críticas a movimentos ligados à esquerda.
Coleção de coronéis
Na reunião de 12 de março no Ministério da Saúde, Carvalho disse que estiveram reunidos o reverendo Amilton Gomes, o policial militar Luiz Paulo Domingetti, o ex-secretário-executivo da pasta, Elcio Franco, e os coronéis Boechat, Marcelo Pires e Helcio Bruno. Ele conta que se surpreendeu ao perceber que o coronel Elcio Franco não tinha conhecimento de que as negociações das vacinas já estavam em curso com Roberto Dias antes daquele encontro, mas negou que tenha sido feito qualquer pedido de propina naquele momento. “Dentro dessas tratativas e conversas dentro do Ministério da Saúde, não houve nada que desabonasse nenhum desses coronéis servidores públicos que estavam na reunião”, declarou. Em outro momento da sessão, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) ironizou o surgimento de tantos nomes de militares na CPI: “Boechat, coronel Guerra, coronel Blanco, Élcio Franco, agora Helcio Bruno… há uma associação de vários coronéis em torno dessa operação tabajara”.
Cristiano Carvalho fez questão de minimizar seu papel dentro da Davati. Disse que não é um CEO como afirmou Dominghetti em seu depoimento à CPI e que não tem vínculo contratual com a empresa. Segundo ele, o que há é uma carta de representação no país que o colocaria na condição de um vendedor. Também afirmou nunca ter ofertado quantidades ou preços de vacinas ao Ministério da Saúde e defendeu que sua atuação visava a aproximação da americana Davati com o ministério. Caberia à empresa americana tratar com a pasta. O presidente da Davati nos Estados Unidos, Herman Cardenas, disse em entrevista à Folha de S. Paulo que a intenção da empresa nunca foi vender vacina, mas de facilitar o negócio. Ao Estadão, Cardenas havia dito que Domingueti não é representante ou funcionário da companhia e que teria sido incluído nas negociações “a pedido” em comunicações com o Governo brasileiro.
Carvalho diz que não procurou o ministério para negociar vacinas
No depoimento aos senadores, Carvalho afirma que foi Dominguetti que levou a ele a demanda por vacinas contra a covid-19 do Ministério da Saúde. Ele diz que sequer acreditava que a negociação prosperaria até começar a receber uma série de ligações e mensagens de altos cargos da pasta, quando passou a dar atenção ao assunto. Carvalho diz que Dominguetti se apresentou a ele em fevereiro deste ano, quando afirmou que já tinha uma parceria com a Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah), presidida pelo reverendo Amilton Gomes de Paula. Ambos procuravam um fornecedor no exterior para atender a demanda. “Ele [Dominguetti] se empenhou muito na venda das vacinas, fez um trabalho grande com o Senah”, afirma Carvalho, que diz ter sido apresentado a ele por um representante de vendas autônomo da Davati chamado Rafael Alves.
O reverendo Amilton tem sido apontado como intermediário na negociação de vacinas com prefeituras e também como responsável por levar Dominguetti ao alto escalão da pasta. Cristiano Carvalho disse que a Davati entrou em negociação ao menos com o Governo de Minas Gerais (além do Ministério da Saúde) e que teria sido por meio do reverendo Amilton que muitas prefeituras começaram a procurar a empresa americana em busca de vacinas. Carvalho afirmou ainda que Lauricio Monteiro Cruz, ex-diretor de imunização do Ministério da Saúde, teria enviado uma carta pedindo que a Senah, do reverendo Amilton, fosse a intermediadora das negociações da vacina. Cruz foi exonerado da Saúde no último dia 8 de julho.
Municiado de um habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para resguardar seu direito de não se autoincriminar, Carvalho respondeu à maioria das perguntas feitas pelos senadores. O representante da Davati protagonizou a última sessão da CPI antes do recesso parlamentar, que vai até 3 de agosto. Na volta aos trabalho, o reverendo Amilton deve prestar o depoimento.
Bolsonaro admitiu que prevaricou ao tomar providência quando foi informação pelos irmãos Miranda sobre o caso de corrupção no Ministério da Saúde. Bolsonaro disse: “Não posso tomar providência de tudo o que chega a mim”. Com uma justificativa ridícula e absurda como esta, confessa que está enrascado.
Em novembro, negociação inicial previa 46 milhões de doses, mas acordo foi fechado em fevereiro com lote menor e preço maior.
Segundo matéria de Breno Pires e Julia Affonso, no Estadão, o governo de Jair Bolsonaro fechou contrato para a compra da vacina indiana Covaxin por um preço 50% mais alto do que o valor inicial da oferta, de US$ 10 por dose. O acordo, fechado em 25 de fevereiro deste ano, prevê pagamento de US$ 15 a unidade, o mais alto entre os seis imunizantes negociados até agora pelo País.
Documentos do Ministério da Saúde, aos quais o Estadão teve acesso, mostram que o preço aumentou no meio das negociações, que passaram a ser investigadas após suspeitas de corrupção.
A primeira reunião técnica do Ministério da Saúde com representantes do laboratório Bharat Biotech, fabricante da vacina, e da Precisa Medicamentos, que intermediou o contrato, ocorreu em 20 de novembro. Na ocasião, segundo registrado no documento intitulado “Memória do Encontro”, foi informado o valor de US$ 10 com a possibilidade de o preço baixar a depender da quantidade de doses que o governo brasileiro comprasse.
“O valor da vacina é de US$ 10 por dose, que, em razão de eventual aquisição de montante elevado de doses, o valor poderia vir a ser reduzido e estaria aberto à negociação”, informa o documento do Ministério da Saúde, que foi enviado à Câmara em resposta a um requerimento de informação da deputada Adriana Ventura (Novo-SP). O acordo, fechado três meses depois, prevê que o Brasil vai pagar R$ 1,614 bilhão por 20 milhões de doses. A negociação sairia por R$ 538 milhões a menos se o preço inicialmente ofertado tivesse sido mantido.
O então “número 2” do Ministério da Saúde, coronel Élcio Franco, comandou a reunião com o empresário Francisco Maximiano, sócio da Precisa Medicamentos, e representantes da Bharat Biotech – estes últimos via videoconferência. A Precisa informou, na ocasião, que teria disponibilidade de oferecer 46 milhões de doses, com entrega prevista para o fim do primeiro trimestre de 2021.
Diferentemente das demais vacinas, negociadas diretamente com seus fabricantes (no País ou no exterior), a compra da Covaxin pelo Brasil foi intermediada pela Precisa. A negociação da vacina indiana foi a mais rápida até o momento, levando pouco mais de três meses, ante quase 11 meses do imunizante da Pfizer, por exemplo.
A primeira vez que o valor de US$ 15 por dose aparece nas tratativas é em um e-mail de V. Krishna Mohan, diretor executivo da Bharat Biotech, a Élcio Franco, em 12 de janeiro. Na mensagem, o diretor informou a intenção de vender 12 milhões de doses e dava um prazo de três dias para o governo brasileiro enviar uma carta de aceitação. A resposta, no entanto, só é enviada cinco dias depois, em que Franco reafirma o interesse. Não há qualquer registro de questionamento sobre o preço mais alto. A ausência de uma tentativa de negociação do valor foi apontada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) como uma “possível impropriedade” no processo de contratação da Covaxin.
Como revelou o Estadão, o valor de US$ 15 por dose é 1.000% mais alto do que a própria fabricante estimou seis meses antes, em agosto de 2020. Telegrama da embaixada brasileira na Índia registrou que, em um evento na Índia, a Bharat informou que o preço por dose da vacina, quando estivesse pronta, poderia ser de 100 rúpias (US$ 1,34, na cotação da época). Este valor não chegou a ser oferecido ao governo brasileiro. Em abril deste ano, após ter fechado contrato com o Brasil, a empresa divulgou uma tabela de preços com valores mais altos para exportação do que para o mercado interno.
Os documentos mostram ainda que o valor de US$15 por dose também foi citado na reunião realizada na pasta no dia 5 de fevereiro, 20 dias antes de o contrato ser assinado. No encontro, dessa vez, não havia representantes da Bharat Biotech, mas apenas da Precisa e do Ministério da Saúde, incluindo o tenente-coronel Alex Lial Marinho, ex-coordenador-geral de aquisições de insumos estratégicos para saúde do Departamento de Logística da pasta. Lial Marinho foi citado na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, no Senado, pelo servidor Luis Ricardo Miranda, do Ministério da Saúde, como uma pessoa que teria feito pressão para o andamento da contratação da vacina indiana.
Em depoimento à CPI na semana passada, Luis Ricardo apontou uma tentativa de pagamento antecipado e, ao lado do irmão, o deputado Luis Miranda (DEM-DF), contou que se reuniu com o presidente Jair Bolsonaro em março para apontar indícios de corrupção. Na ocasião, segundo relatou o deputado, o presidente atribuiu às suspeitas a “mais um rolo” do deputado Ricardo Barros (Progressistas-PR), ex-ministro da pasta e atual líder do governo na Câmara. Ainda segundo Miranda, Bolsonaro disse que acionaria a Polícia Federal para investigar o caso, mas nenhuma investigação foi aberta na época.
A ordem para a aquisição da vacina partiu pessoalmente de Bolsonaro. O interesse do Brasil pela Covaxin foi manifestado expressamente pelo presidente em carta enviada ao primeiro-ministro indiano Narendra Modi, em 8 de janeiro deste ano. Na ocasião, o brasileiro informou ter incluído o imunizante no Plano Nacional de Imunização, antes mesmo de a fabricante concluir os estudos para saber se a vacina é eficaz e de ter aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A falta de aprovação da agência foi citada por Bolsonaro como justificativa pela demora em comprar outros imunizantes, como o da Pfizer e a Coronavac.
O contrato da Covaxin foi suspenso pelo Ministério da Saúde, nesta semana, após recomendação da Controladoria-Geral da União (CGU), que prometeu fazer um pente-fino na negociação. A contratação é alvo também de investigação criminal do Ministério Público Federal e de inquérito na Polícia Federal.
Apesar de o contrato ter sido assinado, o governo brasileiro ainda não pagou pelas doses da vacina, o que deve fazer apenas quando o imunizante for liberado pela Anvisa. O valor de R$ 1,614 bilhão já foi empenhado, ou seja, reservado para o pagamento.
Fiscalização
Em dois relatórios distintos, tanto o TCU quanto a CGU apontaram como possível irregularidade no contrato a ausência de pesquisa por eventuais preços internacionais da vacina. Segundo os órgãos de fiscalização, esta etapa é necessária para saber se o Brasil pagaria mais caro que outros países, e de justificativa para a razoabilidade do preço contratado. A CGU apontou que a aprofundar a investigação sobre o preço da vacina era de “fundamental importância para a verificação da regularidade do processo de contratação do Ministério da Saúde”.
A lei que facilitou a compra de vacinas contra covid na pandemia dispensa a necessidade de licitação para aquisição de imunizantes. A legislação, originada da Medida Provisória 1.026/2021, no entanto, obriga que se faça uma estimativa de preços para justificar as compras.
Um despacho do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis (DEIDT), do Ministério da Saúde, advertiu sobre a necessidade legal de realização de estimativa de preços. “Sugere-se ao Departamento de Logística (DLOG) que avalie a possibilidade de realizar negociação com o fornecedor, a fim de apurar melhores preços”, diz o documento, datado do dia 17 de janeiro. O DLOG, porém, não seguiu essa orientação, o que foi destacado no relatório do TCU. O departamento era chefiado até esta semana por Roberto Ferreira Dias, ligado ao líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (Progressitas-PR). Ele foi demitido após as suspeitas de corrupção na compra de vacinas.
Autora do requerimento de informações sobre as tratativas do governo com a Covaxin, a deputada Adriana Ventura questionou a elevação de US$ 10 para US$ 15 no preço de cada dose. “Me causou estranheza, para usar uma palavra leve. Como é que a gente consegue conceber um aumento de 50% sem qualquer espanto, argumentação, contraproposta. Não tem nenhum registro de discussão na memória das reuniões que mostre que o preço estava sendo mudado. Como que o preço muda e ninguém fala nada, ninguém estranha, ninguém contra-argumenta. A gente está falando de R$ 500 milhões”, disse a deputada.
Procurada pela reportagem, a Precisa Medicamentos informou que desconhece “a existência desse documento” do Ministério da Saúde em que foi registrado o custo de US$ 10 por dose da Covaxin. Segundo a empresa, nunca houve uma oferta nesse valor.
“Ao contrário: a Precisa tentou obter junto ao fabricante a redução do preço, mas isso não foi possível”, afirma a nota. “O Brasil conseguiu o menor preço público internacional praticado pela Bharat Biotech em todo mundo, sem a necessidade de nenhum pagamento antecipado, condição essa também exclusiva ao Brasil.”
O Ministério da Saúde não respondeu aos questionamentos da reportagem. CRONOLOGIA
As fases da negociação
31/8/2020
Embaixada: Telegrama da embaixada brasileira na Índia informa o Ministério das Relações Exteriores que a Bharat Biotech, em evento no país asiático, estimou que a dose da Covaxin custaria 100 rupias (US$ 1,34, na cotação da época).
20/11/2020
Preço: Documento do Ministério da Saúde para tratar da compra do imunizante relata que representantes da Bharat Biotech e da Precisa Medicamentos informaram que o preço da Covaxin era de US$ 10 por dose. 12/1/2021
Reajuste: Carta da Bharat Biotech destinada ao Ministério da Saúde oferta 12 milhões de doses por US$ 15 cada unidade. Prazo da proposta era até 15 de janeiro.
17/1/2021
Negociação: Nota Técnica do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis (DEIDT), do Ministério da Saúde, cita a necessidade de negociação com o fornecedor, a fim de apurar melhores preços. A recomendação foi repassada ao Departamento de Logística da pasta, que não registrou qualquer tentativa de reduzir o preço e nem pesquisa de valores cobrados em outros países pela mesma vacina.
24/2/2021
Consultoria: Parecer da Consultoria Jurídica do Ministério da Saúde aponta que não observou a estimativa de preços na forma prevista no art. 6o, VI, da Medida Provisória 1.026/2021, e nem mesmo a justificativa para a sua dispensa excepcional na forma do §2o do art.
25/2/2021
Contrato: O Ministério da Saúde assina contrato com a Precisa Medicamentos para receber 20 milhões de doses da Covaxin a US$ 15 a dose (R$ 80,7, na cotação da época). O valor total do contrato é de R$ 1,614 bilhão.
“Circula em grupos de WhatsApp um áudio do deputado Luiz Miranda no qual ele reafirma as denúncias de corrupção no ministério da Saúde. A chapa está esquentando para Bolsonaro”. (Alberto Carlos Almeida)
O deputado Luiz Miranda diz que o Ministério da Saúde não comprou a vacina Covaxin porque o irmão e ele não permitiram.
“Vocês estão mexendo com as pessoas erradas, nós não temos medo de ameaça nem chantagem, nem eu e nem o meu irmão. Nós vamos até o fim agora. Nós não somos os bandidos nessa história, somos os que salvamos o Ministério da Saúde, o dinheiro público, as vidas que seriam perdidas se o meu irmão não tivesse agido”
Assista:
O Deputado Luiz Miranda destrói Bolsonaro e sua imagem de combatente da corrupção. Na mesma semana em que falta vacina no Brasil inteiro pic.twitter.com/rHrCLtxFSd
— Alberto Carlos Almeida (@albertocalmeida) June 24, 2021