O presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou estar “chateado” com o ministro Celso de Mello, decano do STF (Supremo Tribunal Federal), e falou que “foi esculachado” em crítica “muito para o lado pessoal” após este dizer que Bolsonaro “minimiza perigosamente” a importância da Constituição Federal e “degrada a autoridade do parlamento brasileiro” ao ter reeditado medida provisória sobre demarcação de terras indígenas.
“Fui esculachado pelo ministro do Supremo. Pela maneira [da crítica], dói no meu coração”, afirmou o presidente, após ir a culto em uma igreja evangélica em Brasília na manhã de hoje.
Pouco antes, Bolsonaro qualificou a crítica de Mello como pessoal. “Eu já falei que me equivoquei na questão da medida provisória. Foi um assessor que fez, mas eu trago para minha culpa. A responsabilidade é minha. Eu achei que ele foi muito para o lado pessoal. Tô chateado? Tô, porque ele foi muito para o lado pessoal”, disse na saída do Palácio da Alvorada.
Mello fez as críticas em entrevista publicada ontem pelo jornal O Estado de S.Paulo. Na quinta-feira (1), o STF decidiu manter na Funai (Fundação Nacional do Índio) a atribuição para demarcar terras indígenas. O principal argumento para barrar a transferência das demarcações foi o de que o presidente da República não pode editar duas vezes no mesmo ano legislativo medidas provisórias tratando do mesmo tema, já que isso é proibido pela Constituição Federal.
Em janeiro, o governo apresentou medida provisória que previa a transferência da demarcação para o Ministério da Agricultura. Porém, o trecho tratando da mudança foi rejeitado pelo Congresso Nacional. Em junho, nova medida provisória com o mesmo objetivo foi reapresentada, o que é proibido pela Constituição em um único ano.
Para Celso de Mello, ministro há mais tempo em atividade no STF, a edição de duas medidas provisórias com a tentativa de retirar as atribuições da Funai demonstra “autoritarismo” e “transgressão” à Constituição Federal.
“O comportamento do atual presidente revelado na atual edição de medida provisória rejeitada pelo Congresso no curso da mesma sessão legislativa traduz uma clara, inaceitável, transgressão à autoridade suprema da Constituição Federal e uma inadmissível e perigosa transgressão ao princípio fundamental da separação de Poderes”, disse Celso.
“Parece ainda haver na intimidade do poder hoje um resíduo de indisfarçável autoritarismo”, afirmou o ministro na sessão de quinta no Supremo.
No julgamento, o STF não chegou a analisar o mérito das ações contra a medida do governo, ou seja, não foi julgado se a retirada da Funai da atribuição de demarcar terras indígenas contraria a Constituição Federal.
O que foi julgado, e rejeitado, foi a possibilidade de o governo editar uma segunda medida provisória para tentar se sobrepor à decisão do Congresso.
O tema poderá voltar a ser analisado pelo STF para julgar a questão central das ações: a legalidade de se retirar essas atribuições da Funai.
*Com informações do Uol