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Declarações desastrosas e irresponsabilidade de Bolsonaro são ameaças à economia e ao Mercosul

Na 55ª Cúpula do Mercosul, o presidente brasileiro e seu chanceler voltaram a cometer gafes e fazer provocações gratuitas em ambiente diplomático.

A 55ª Cúpula do Mercosul, realizada nos dias 4 e 5 últimos, em Bento Gonçalves (RS), como se esperava, foi marcada por gafes, avaliações políticas equivocadas e provocações gratuitas do presidente Jair Bolsonaro e seu ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. “Quero continuar presidente, não dá pra dar um golpe, não?’, brincou Bolsonaro, na quinta-feira (5), aparentemente sem saber que o microfone estava “aberto”.

Já o ministro Araújo proferiu ataques ao socialismo e disse que o Brasil conseguiu “parar esse trem”. “Conseguimos parar esse projeto que havia instrumentalizado o Mercosul. Conseguimos desinstrumentalizar o Mercosul. Queremos ajudar a parar esse trem em toda a região. Os que querem recolocar o trem na marcha insana e destrutiva devemos chamar de ideológicos”, declarou o chanceler.

No final de novembro, Bolsonaro afirmou que não iria à posse do presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández. “Não vou à posse de um cara que se elege falando Lula Livre, não vou”, justificou, contra todos os parâmetros das relações diplomáticas.

Enquanto isso, na mesma quinta-feira, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), se reunia com o presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, em Buenos Aires. Do encontro, uma mensagem de Fernández ao presidente brasileiro. “Se nos respeitamos, é mais fácil conviver. Transmitam ao presidente Jair Bolsonaro o meu respeito e o meu apreço para trabalharmos juntos”, disse o argentino.

“No fundo, estamos vendo algo inédito em relação ao funcionamento do presidencialismo brasileiro, que é um protagonismo do Parlamento, no sentido de colocar a agenda em pauta”, diz o cientista político Vitor Marchetti, da Universidade Federal do ABC (UFABC), sobre as posturas de Maia e de Bolsonaro.

“Sempre vimos, no mínimo desde a redemocratização, que agendas de governo são organizadas e articuladas pelo Executivo, com cooperação do parlamento. O que vemos agora é uma lógica, por parte do Executivo, de obstrução completa de qualquer possibilidade de articulação e cooperação com o parlamento para colocar e discutir uma agenda”, avalia.

Na opinião do analista, as agendas visíveis do atual governo são as propostas do ministro da economia, Paulo Guedes, e nesse caso ele mesmo se articula com o Parlamento, e a agenda do ministro da Justiça, Sergio Moro, sobre segurança pública. “Mas Moro não tem traquejo político nenhum, tanto que o governo foi derrotado em várias questões na votação do projeto anticrime”, aponta Marchetti.

As declarações desastrosas de Bolsonaro sobre agenda ambiental, segurança publica, política internacional, na visão do professor da UFABC, produzem estragos e vão produzir efeitos no curto prazo. “O impacto mais evidente vai ser criar um ambiente de negócios instável e incerto no Brasil, com possibilidade de fuga de capital, crise de credibilidade, desemprego.”

Ele chama a atenção para o fato de o jornal inglês Financial Times ter publicado esta semana reportagem em que mostra desconfiança de dados da economia brasileira. “Isso não é pouca coisa.”

Para Marchetti, quando os efeitos da política do governo começarem a não aparecer para o mercado, “a coisa começa a derreter”. Porém, o analista não crê que o mandato do presidente seja interrompido. “Não aposto no fim do mandato antes dos quatro anos. Mas acho que fazer a sucessão ele não faz.”

Brasil x Argentina

Do ponto de vista do Mercosul, na opinião de Thomas Heye, do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF), o bloco entra em uma fase de tensão. “Tirando a taxa usual de gafes de Bolsonaro e Ernesto Araújo, com a eleição de Fernández o bloco vai mudar. Vão aumentar os conflitos dentro do Mercosul.” Na Cúpula desta semana, Bolsonaro passou a presidência pro tempore do Mercosul ao colega paraguaio, o direitista Mario Abdo Benítez.

A perspectiva óbvia é que Brasil, Paraguai e Uruguai estarão de um lado e a Argentina, de outro. Os argentinos devem tomar medidas protecionistas e adotar a perspectiva dos governos Kirchner, apostando no Mercosul como instrumento de promoção industrial e comercial. “Provavelmente, Fernández vai querer manter as tarifas no patamar em que estão, enquanto o Brasil, de Guedes, quer abrir o Mercosul e as economias dos países, e a brasileira em especial, para a economia internacional”, acrescenta Heye.

Como consequência desse braço de ferro entre os dois países mais importantes do bloco e da América do Sul, quem sairá vencedor? “Quem sai perdedor é a região como um todo, porque, para se pensar a interação da América do Sul, o eixo estratégico – desde os anos 50 com Hélio Jaguaribe – é a parceria Brasil e Argentina. Depois de progressos consistentes nas últimas décadas, agora pelo visto vamos ter uma paralisia na integração do bloco”, observa o professor da UFF.

Bolsonaro e Maia

Na questão política, o contraste entre as posturas de Bolsonaro e Rodrigo Maia traça uma linha divisória entre a responsabilidade e a irresponsabilidade institucional, na avaliação de Marchetti. Em sua opinião, o modo de agir de Bolsonaro (por exemplo, em relação a Alberto Fernández e o Mercosul) se explica por duas razões.

“A primeira é que ele não tem, e nunca teve, condições políticas de construir a relação com o Parlamento. Mas tem outra razão: isso é deliberado. Bolsonaro não está preocupado em construir agenda X ou Y, mas em reforçar a lógica para um eleitorado mais coeso e radical de que ele não é político. Ele traduz isso ao não negociar com partido, com o Parlamento, segundo a lógica de que fazer a gestão da política partidária se iguala à corrupção.”

Já Rodrigo Maia é o oposto. Tem o perfil do político que sabe o impacto e as consequências econômicas das agendas como a do bloco sul-americano. Não se trata de política de esquerda ou progressista, no caso da relação do Brasil com a América Latina. “Tem a ver com os interesses do empresariado, do capital, os interesses econômicos do país”, avalia o cientista político.

Para Marchetti, as práticas de Bolsonaro mantêm a coerência de sua imagem, no que ele é bem sucedido, já que visa ao público mais radical que se mantém seu aliado. “Um cara truculento, que não está aberto à negociação. Já Rodrigo Maia age com responsabilidade. Posso discordar das posições de Maia, da agenda que ele representa, mas do ponto de vista da lógica de agir da política, do agente político, ele age de acordo com uma ética da responsabilidade.”

 

 

 

*Com informações da Rede Brasil Atual

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Áudio: CPMI tem como identificar ‘fábricas de desinformação’ a favor de Bolsonaro

A partir dos metadados das mensagens, é possível chegar a destinatários e financiadores. Professor da UFABC defende que Whatsapp e Facebook devem ser regulados.

Empresário Luciano Hang estaria entre os suspeitos de financiar ‘fábricas’ de fake news pró-Bolsonaro.

O sociólogo Sérgio Amadeu, professor associado da Universidade Federal do ABC (UFABC), diz que a a Comissão Parlamentar de Mista de Inquérito (CPMI) que investiga notícias falsas nas redes sociais vai ter muito trabalho pela frente para identificar as “fábricas de desinformação” que foram utilizadas durante a campanha eleitoral do ano passado. Ele afirma que a partir dos metadados de postagens patrocinadas no Facebook e disparos em massa no Whatsapp é possível chegar aos responsáveis que financiaram ilegalmente esses esquemas.

A partir desses metadados, que registram informações como remetente e destinatário das mensagens, segundo Amadeu, é possível identificar o “núcleo duro” de pessoas ligadas ao presidente Jair Bolsonaro que, desde a disputa eleitoral, disseminam informações distorcidas e ataques a adversários políticos. O especialista diz não gostar do termo fake news, pois essa expressão pode dar a entender que a divulgação de uma notícia falsa ocorre por simples descuido ou desconhecimento.

“Essa CPI, além de pegar as estruturas que fazem de conta que são veículos de imprensa e divulgam notícias completamente inverídicas, precisa avançar também para pegar notícias descontextualizadas, informações completamente sem base na realidade. Isso faz parte de uma estratégia. A CPI pode constatar isso com muita facilidade. Tudo isso está registrado nas redes”, afirmou aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, para o Jornal Brasil Atual, nesta segunda-feira (28).

Em junho deste ano, uma reportagem da Folha de S.Paulo confirmou que empresários brasileiros contrataram uma empresa espanhola para fazer disparos em massa de mensagens pelo Whatsapp em favor de Bolsonaro. A informação foi confirmada pelo espanhol Luis Novoa, dono da Enviawhatsapps. Ainda durante a campanha eleitoral, o jornal havia denunciado que empresários que empresários estariam investindo milhões para fazer campanha baseada em fake news pelo Whatsapp contra o PT e o seu candidato a presidente Fernando Haddad. A utilização de recursos privados em campanhas políticas é prática proibida, desde 2015, pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

A CPMI receberá o deputado federal Alexandre Frota (PSDB-SP) na próxima quarta-feira (30). O requerimento para ouvi-lo foi apresentado pela deputada Luizianne Lins (PT-CE). Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, em agosto, Frota disse saber do “jogo sujo” feito pela campanha do presidente Jair Bolsonaro. O blogueiro Allan dos Santos, apoiador de Bolsonaro e um dos fundadores do blog Terça Livre, também foi convocado para ser ouvido na próxima semana. O requerimento é do deputado Rui Falcão (PT-SP), que também quer ouvir outros três assessores especiais da presidência da República.

Responsabilidades

Além de identificar os empresários que cometeram crime eleitoral ao financiarem postagens e disparos em massa de notícias falsas, Amadeu cobrou que as plataformas digitais, como Facebook e Google, tenham uma regulação mais rígida em relação aos conteúdos pagos.

Para o Facebook, ele defende que “todo post pago, em qualquer rede social, e que tenha a ver com política no período das eleições, precisa ser acompanhado do gasto relativo ao impulsionamento”. Assim, segundo ele, será possível identificar a origem dos recursos utilizados. Já no Whatsapp, o professor da UFABC diz que, além de identificar o remetente original da postagem replicada, é preciso tornar acessível a lista de todos os números que tenham também compartilhado a mensagem.

 

*Sergio Amadeu/Rede Brasil Atual