O planeta esteve tão quente este ano que, mesmo antes do fim, 2023 já foi declarado recordista de calor pela Organização Meteorológica Mundial (OMM).
As temperaturas globais estiveram cerca de 1,4°C acima da média pré-industrial nos primeiros dez meses do ano, de acordo com o Relatório Provisório sobre o Estado do Clima Global de 2023 da OMM. Isso fornece certeza suficiente para declará-lo o ano mais quente já registrado, mesmo faltando um mês. A declaração serviu de aviso para negociadores climáticos reunidos em Dubai para a COP28.
— O aquecimento global recorde deve causar arrepios nas espinhas dos líderes mundiais e deve induzi-los a agir — disse o secretário-geral da ONU, António Guterres, no Dubai, nesta quinta-feira, no início da conferência climática COP28. — Estamos vivendo um colapso climático em tempo real, e o impacto é devastador.
A OMM alertou que 2023 quebrou uma série de recordes climáticos, com condições meteorológicas extremas que deixaram “um rastro de devastação e desespero”.
— É uma cacofonia ensurdecedora de quebra de recordes — disse o chefe da OMM, Petteri Taalas. — Os níveis de gases de efeito estufa são recordes. As temperaturas globais são recordes. O aumento do nível do mar é recorde. O degelo marinho da Antártica está em níveis recordes.
Os riscos nunca foram tão elevados. Cientistas alertam que a capacidade de limitar o aquecimento a um nível administrável está em vias de escapar do alcance da humanidade.
Os acordos climáticos de Paris de 2015 visavam a limitar o aquecimento global a bem menos de dois graus Celsius acima dos níveis pré-industriais – e 1,5ºC, se possível. A OMM deverá publicar o seu relatório final sobre o Estado do Clima Global 2023 no primeiro semestre de 2024.
Mas a organização já disse que a diferença entre os primeiros dez meses deste ano e 2016 e 2020 – que anteriormente lideraram as paradas como os anos mais quentes já registrados – “é tal que é muito improvável que os últimos dois meses afetem a classificação”.
O relatório também mostrou que os últimos nove anos foram os mais quentes desde o início dos registros modernos.
— Isto é mais do que apenas estatísticas — disse Taalas. — Corremos o risco de perder a luta para salvar os nossos glaciares e controlar a alta do nível do mar. Não podemos regressar ao clima do século XX, mas devemos agir agora para limitar os riscos de um clima cada vez mais inóspito neste e nos próximos séculos, diz O Globo.
A OMM alertou que o aquecimento do fenômeno climático El Niño, que surgiu em meados do ano, “provavelmente aumentará ainda mais o calor em 2024”.
Isto porque o padrão climático natural, normalmente associado ao aumento do calor em todo o mundo, geralmente aumenta as temperaturas globais no ano seguinte ao seu desenvolvimento.
O relatório preliminar também concluiu que as concentrações dos três principais gases com efeito de estufa que retêm o calor – dióxido de carbono, metano e óxido nitroso – atingiram níveis recorde em 2022, com dados preliminares indicando que os níveis continuaram a crescer este ano.
Os níveis de dióxido de carbono foram 50% superiores aos da era pré-industrial, disse a agência, o que significa que “as temperaturas continuarão a subir durante muitos anos”, mesmo que as emissões sejam drasticamente reduzidas.
A taxa de alta do nível do mar na última década foi mais que o dobro da taxa da primeira década de registros de satélite (1993-2002), afirmou a OMM. E o nível máximo de gelo marinho da Antártida este ano foi o mais baixo já registrado.
Na verdade, foi menos um milhão de quilômetros quadrados do que o recorde anterior, registrado no final do inverno do hemisfério sul, afirmou a OMM – uma área maior do que a França e a Alemanha juntas.
Impactos socioeconômicos dramáticos acompanham esses registros climáticos, dizem os especialistas, incluindo a diminuição da segurança alimentar e os deslocamentos em massa de população.
— Este ano vimos comunidades em todo o mundo atingidas por incêndios, inundações e temperaturas escaldantes — disse o secretário-geral da ONU, Guterres, numa mensagem de vídeo.
Ele apelou aos líderes reunidos no Dubai para que se comprometessem com medidas dramáticas para controlar as alterações climáticas, incluindo a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis e a triplicação da capacidade de energia renovável.
— Temos o roteiro para limitar o aumento da temperatura global a 1,5ºC e evitar o pior do caos climático — disse ele. — Mas precisamos que os líderes deem o tiro de partida na COP28, numa corrida para manter vivo o limite de 1,5 graus.