Categorias
Investigação

Três versões da ‘minuta do golpe’ e documento pedindo prisão de ministros do STF e de Pacheco engrossam material golpista apreendido pela PF

Apurações da PF indicam que no entorno de Bolsonaro havia uma equipe para assessorar e elaborar documentos e decretos com fundamentação jurídica e doutrinária.

Pelo menos três versões de minutas que revelam objetivos golpistas foram citadas nas investigações ou encontradas em endereços de aliados próximos a Jair Bolsonaro desde o fim de sua gestão. Apurações da Polícia Federal (PF) indicam que no entorno do ex-mandatário havia uma equipe para assessorar e elaborar documentos de decretos com fundamentação jurídica e doutrinária que atendessem os interesses de manter o grupo no poder.

Um dos quatro alvos de mandados de prisão, na última quinta-feira, o ex-assessor para Assuntos Internacionais da Presidência, Filipe Martins, teria entregue a Bolsonaro uma minuta que detalhava supostas interferências do Poder Judiciário no Executivo e decretava a prisão de autoridades. A defesa de Martins diz que ele está submetido a uma “prisão ilegal”.

Segundo os investigadores, Bolsonaro teria lido o documento e solicitado que o assessor alterasse as ordens contidas na minuta, que teria sido entregue novamente, com as alterações. Segundo a colunista Malu Gaspar, do GLOBO, entre as alterações solicitadas, estava a retirada da ordem de prisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), mantendo no texto apenas a prisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF.

A PF aponta que, uma vez atendida a solicitação e apresentada a nova versão da minuta, Bolsonaro teria concordado com os termos ajustados e convocado os chefes das Forças Armadas, para que comparecessem ao Alvorada, no mesmo dia, a fim de apresentar a minuta e “pressioná-los a aderir ao golpe de Estado”.

No despacho em que deferiu a operação, Moraes enumerou núcleos de atuação do suposto grupo criminoso que atuava para manter Bolsonaro no poder. Entre esses grupos, haveria o “Jurídico”, justamente o que tratava das minutas.

O documento citado é a terceira minuta de teor golpista revelada pelas investigações. Em janeiro de 2023, um documento apócrifo foi apreendido na casa do ex-ministro da Justiça e então secretário de Segurança do Distrito Federal, Anderson Torres.

A minuta propunha a instauração de um Estado de Defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com o objetivo de reverter o resultado das eleições de 2022, em que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) saiu vencedor. Em seu depoimento na CPI dos Atos Golpistas, Torres classificou a minuta como “imprestável” e negou conhecer sua origem.

– A polícia encontrou um texto apócrifo, sem data, uma fantasiosa minuta, que vai para coleção de absurdos que constantemente chegam aos detentores de cargos públicos — disse. — Basta uma breve leitura para que se perceba ser imprestável para qualquer fim, uma verdadeira aberração jurídica. Este papel não foi para o lixo, por mero descuido.

No início do segundo semestre do ano passado, a PF também encontrou no celular do coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, a minuta de um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e alguns “estudos” que seriam destinados a dar suporte a um eventual golpe de Estado. A defesa de Cid disse que só vai se manifestar depois que tiver acesso às investigações.

A GLO é uma operação militar que permite ao presidente da República convocar as Forças Armadas em situações de perturbação da ordem pública. Na decisão que autorizou o depoimento de Cid, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que o oficial “reuniu documentos com o objetivo de obter suporte jurídico e legal para a execução de um golpe de Estado”.

Além dessas minutas, a Polícia Federal encontrou na sala de Bolsonaro na sede do PL, em Brasília, na quinta-feira, documento que previa uma “declaração” de estado de sítio e um “decreto” de GLO no país.

Em entrevista na noite de sexta-feira, o ex-presidente minimizou o teor do texto e negou ter relação com o documento que, segundo Bolsonaro, seria peça de um processo solicitado por ele para tomar conhecimento.

— O presidente não decreta estado de sítio. Ouve o Conselho da República e encaminha para o Congresso. Isso não é golpe — afirmou à “TV Record”, de sua casa em Angra dos Reis (RJ).

 

Por Celeste Silveira

Produtora cultural

Comente