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Álvaro Linera: Ódio ao índio, vingança primitiva de uma classe histórica e moralmente decadente

Como uma espessa nuvem noturna, o ódio percorre vorazmente os bairros das classes médias urbanas tradicionais da Bolívia.

Seus olhos transbordam de ira. Não gritam, cospem; não pedem, impõem. Seus cânticos não são de esperança nem irmandade, são de desprezo e discriminação contra os índios.

Montam em suas motos, sobem em suas camionetes, se agrupam em seus grêmios carnavalescos e universidades privadas e saem à caça de índios insolentes que se atreveram a lhes tomar o poder.

No caso de Santa Cruz, organizam hordas motorizadas em 4×4 com porrete em mãos para reprimir os índios, chamados por eles de collas e que vivem nos bairros marginais e nos mercados.

Suas palavras de ordem dizem que têm que matar collas, e se no caminho cruza por eles uma mulher de pollera [em tradução livre “pollera” é saia, neste caso o autor usa como expressão popular para se referir à indumentária típica indígena] a golpeiam, a ameaçam e ordenam que saia do território deles.

Em Cochabamba organizam comboios para impor a supremacia racial na zona sul, onde vivem as classes necessitadas, e avançar como se fossem um destacamento de cavalaria sobre milhares de mulheres camponesas indefesas que marcham pedindo paz.

Levam nas mãos bastões de beisebol, correntes, granadas de gás, alguns exibem armas de fogo.

A mulher é sua vítima preferida, agarram a uma prefeita de uma população camponesa, a humilham, a arrastam pela rua, a golpeiam, urinam nela quando cai no chão, lhe cortam o cabelo, a ameaçam de linchamento e quando se dão conta de que são filmados decidem jogar tinta vermelha sobre ela simbolizando o que farão com seu sangue.

Em La Paz suspeitam de suas empregadas e não falam quando elas trazem a comida à mesa, no fundo as temem, mas também as desprezam.

Mais tarde saem às ruas a gritar, insultar Evo e nele a todos estes índios que ousaram construir democracia intercultural com igualdade.

Quando são muitos, arrastam a wiphala, a bandeira indígena, e cospem, pisam, a cortam, a queimam.

É uma raiva visceral que se descarrega sobre este símbolo dos índios que eles quiseram extinguir da terra junto com todos os que se reconhecem nela.

O ódio racial é a linguagem política desta classe média tradicional. De nada serve seus títulos acadêmicos, viagens e fé; porque no fim tudo se dilui diante de sua linhagem.

No fundo a estirpe imaginada é mais forte e parece apegada à linguagem espontânea da pele que odeia, dos gestos viscerais e de sua moral corrompida.

Tudo explodiu no domingo 20 (de outubro) quando Evo Morales ganhou as eleições com mais de 10 pontos de diferença sobre o segundo, mas já não com a imensa vantagem de antes, nem os 51% dos votos.

Foi o sinal que estavam esperando as forças regressivas à espreita, desde o amedrontado candidato opositor liberal às forças políticas ultraconservadoras, à OEA e à inefável classe média tradicional.

Evo havia ganhado novamente, mas já não tinha 60% do eleitorado, e então estava mais frágil e era necessário se lançar sobre ele. O perdedor não reconheceu a derrota.

A OEA falou de eleições limpas, mas de uma vitória pouco expressiva e pediu um segundo turno, aconselhando ir contra a Constituição que afirma que se um candidato tem mais de 40% dos votos e mais de 10 pontos de diferença sobre o segundo é ele o candidato eleito.

E a classe média se lançou à caça dos índios. Na noite de segunda-feira (21) queimaram cinco dos nove órgãos eleitorais, incluídas as cédulas do sufrágio.

A cidade de Santa Cruz decretou um paro cívico que articulou os habitantes das zonas centrais da cidade, ramificando-se a paralisação às zonas residenciais de La Paz e Cochabamba. E então se desatou o terror.

Bandos paramilitares começaram a assediar instituições, a queimar sedes sindicais, a incendiar os domicílios de candidatos e líderes políticos do partido do governo, por fim até a própria casa privada do presidente seria saqueada.

Em outros lugares, as famílias, incluindo filhos, foram sequestradas e ameaçadas de ser flageladas e queimadas se seu pai ministro ou dirigente sindical não renunciasse ao cargo. Havia se desencadeado uma noite das facas longas e o fascismo espreitava os ouvidos.

Quando as forças populares mobilizadas para resistir a este golpe civil começaram a retomar o controle territorial das cidades com a presença de operários, trabalhadores mineiros, camponeses, indígenas e populações urbanas e o balanço da correlação de forças estava se inclinando para o lado das forças populares, veio o motim policial.

Os policiais haviam mostrado durante semanas uma indolência e inaptidão para proteger a gente humilde quando era golpeada e perseguida por bandos fascistoides; mas a partir de sexta [8 de novembro], com o desconhecido comando civil, muitos deles mostrariam uma extraordinária habilidade para agredir, deter, torturar e matar manifestantes populares.

Claro, antes tinham que conter os filhos da classe média e supostamente não tinham capacidade, mas agora que se tratava de reprimir índios revoltosos, o empenho, a prepotência e a sanha repressiva foi monumental. O mesmo aconteceu com as Forças Armadas.

Durante toda nossa gestão de governo nunca permitimos que saíssem a reprimir manifestações civis, nem durante o primeiro golpe de Estado cívico de 2008.

Agora, em plena convulsão e sem que alguém perguntasse nada, disseram que não tinham munição antidistúrbio, que tinham apenas 8 balas por integrante e que para se fazer presentes nas ruas de forma dissuasiva se requeria um decreto presidencial.

Contudo, não hesitaram em pedir-impor ao presidente Evo sua renúncia, rompendo a ordem constitucional; fizeram o possível para tentar sequestrá-lo quando se dirigia e quando estava em Chapare; e quando se consumou o golpe, saíram às ruas a disparar milhares de balas, a militarizar as cidades, a assassinar camponeses. Tudo sem decreto presidencial.

Claro, para proteger o índio se requeria decreto. Para reprimir e matar índios só bastava obedecer o que o ódio racial e classista ordenava. Em cinco dias já há mais de 18 mortos e 120 feridos de bala, obviamente, todos eles indígenas.

A pergunta que todos devemos responder é: como é que esta classe média tradicional pôde incubar tanto ódio e ressentimento contra o povo levando-a a abraçar um fascismo radicalizado centrado no índio como inimigo?

Como a polícia e as Forças Armadas fizeram para irradiar suas frustrações de classe e ser a base social desta fascistização, desta regressão estatal e degeneração moral?

Foi o rechaço à igualdade, ou seja, o rechaço aos fundamentos de uma democracia substancial.

Nos últimos 14 anos de governo, os movimentos sociais têm tido como principal característica o processo de igualação social, redução abrupta da extrema pobreza (de 38 para 15%), ampliação de direitos para todos (acesso universal à saúde, à educação e à proteção social), indianização do Estado (mais de 50% dos servidores da administração pública têm identidade indígena, nova narrativa nacional em torno do tronco indígena), redução das desigualdades econômicas (queda de 130 para 45 a diferença de renda entre os mais ricos e os mais pobres), ou seja, a sistemática democratização da riqueza, do acesso aos bens públicos, às oportunidades e ao poder estatal.

A economia cresceu de 9 bilhões de dólares para 42 bilhões, se ampliou o mercado e a reserva financeira interna, que permitiu a muita gente ter sua casa própria e melhorar sua atividade laboral.

Mas então isso deu lugar a que em uma década a porcentagem da chamada classe média, medida em renda, tenha passado de 35% para 60%, a maior parte proveniente dos setores populares, indígenas.

Se trata de um processo de democratização dos bens sociais mediante a construção de igualdade material, mas que inevitavelmente levou a uma rápida desvalorização dos capitais econômicos, educativos e políticos possuídos pelas classes médias tradicionais.

Se antes um sobrenome notável ou o monopólio dos saberes legítimos ou o conjunto de vínculos familiares próprios das classes médias tradicionais lhes permitia ascender a postos na administração pública, obter créditos, licitações de obras ou bolsas, hoje a quantidade de pessoas que disputa o mesmo posto ou oportunidade não só foi duplicada, reduzindo à metade as possibilidades de ascender a esses bens.

Mas, além disso, os ascendentes, a nova classe média de origem popular indígena tem um conjunto de novos capitais (idioma indígena, vínculos sindicais) de maior valor e reconhecimento estatal para disputar os bens públicos disponíveis.

Se trata, portanto, de um colapso do que era característico da sociedade colonial, a etnicidade como capital, ou seja, do fundamento imaginado da superioridade histórica da classe média sobre as classes subalternas, porque aqui na Bolívia a classe social só é compreendida e vista sob forma de hierarquias raciais.

Os filhos desta classe média terem sido a força de choque da insurgência reacionária é o grito violento de uma nova geração que vê como a herança do sobrenome e da pele se dissolve diante da força da democratização dos bens.

Ainda que levantem bandeiras de democracia entendida como o voto, na realidade se rebelaram contra a democracia entendida como igualdade e distribuição de riquezas.

Por isso a explosão de ódio, o excesso de violência, porque a supremacia racial é algo que não se racionaliza; se vive como impulso primário do corpo, como tatuagem da história colonial na pele.

Daí que o fascismo não só é a expressão de uma revolução falida, mas paradoxalmente, também em sociedades pós-coloniais, o êxito de uma democratização material alcançada.

Por isso não surpreende que enquanto os índios recolhem os corpos de cerca de uma vintena de mortos assassinados à bala, seus algozes materiais e morais narram que o fizeram para salvaguardar a democracia.

Mas na realidade sabem que o que fizeram foi proteger o privilégio de casta e o sobrenome.

Mas o ódio racial só pode destruir, não é um horizonte, não é mais que uma primitiva vingança de uma classe histórica e moralmente decadente que demonstra que, por trás de cada liberal medíocre, se esconde um golpista consumado.

*Álvaro García Linera é vice-presidente da Bolívia em exílio.

*Do Viomundo

 

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Vídeo: Povo boliviano pró Morales impede abastecimento de La Paz com bloqueios nas estradas

Comida escasseia; diesel e gasolina estão em falta. A cidade de La Paz, na Bolívia, sofre também com escassez de frango, ovos e etc.

Com os protestos, caminhões e veículos que trazem alimentos, especialmente da região leste do país, estão bloqueados. O acesso à única central que distribui combustível a La Paz também está fechado pelos manifestantes, provocando uma escassez crescente que começou a afetar o transporte de veículos na cidade.

Outras cidades do país também sofrem com a falta de alimentos por conta dos bloqueios. Em Cochabamba (centro), o principal mercado da cidade sofre com escassez de verduras, legumes e carnes.

Oruro, ao sul da capital, também registra falta de carne bovina. Em Potosí, no centro-sul do país, o preço de alguns alimentos, como a batata, já sofre alterações.

Os golpistas estabeleceram uma “ponte aérea” para La Paz tentando atenuar o bloqueio de suprimentos. Eles afirmam também que as autoridades esperam fazer o mesmo com outras grandes cidades bolivianas que foram isoladas de suprimentos.

Mas a pressão contra os golpistas se mantém e ganham mais adesão inclusive de parte de militares mais novos.

Seis sindicatos de cultivadores de coca de Chapare, reduto de Morales, exigiram na noite de sábado “a renúncia da autoproclamada presidente de facto Jeanine Áñez Chávez em um prazo de 48 horas”

Uma associação de moradores de El Alto aprovou também “um cerco à cidade de La Paz” a partir de segunda para forçar “a renúncia imediata” de Áñez, qualificando sua nomeação como ilegal.

https://twitter.com/RalitoDigital_/status/1196131633759428609?s=20

 

*Da redação

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Bolívia – Urgente: Denúncias de 23 mortos após golpe de Estado

Na TeleSur, Teresa Zubieta, confirmou que ’23 pessoas em todo o país morreram em meio a um contexto de golpe de Estado’, especificamente ‘quatro em La Paz (todos por disparo de bala), cinco em Sacaba (região de Cochabamba)” e os outros no resto do país.

Desde a renúncia de Evo Morales em consequência do golpe de Estado na Bolívia, são reportados 23 mortos. As informações são da TeleSur, que está presente no país.

Na emissora, a delegada defensora do Departamento de La Paz, Teresa Zubieta, rejeitou a ‘violação dos Direitos Humanos, sobretudo de nossa gente humilde e simples.

Nesta entrevista, a delegada confirmou que ’23 pessoas em todo o país morreram em meio a um contexto de golpe de Estado’, especificamente ‘quatro em La Paz (todos por disparo de bala), cinco em Sacaba (região de Cochabamba)” e os outros no resto do país.

A funcionária boliviana expressou sua grande preocupação pela situação que vive atualmente o país ‘diante da barbárie, diante da violação dos Direitos Humanos’ e, sobretudo, pela situação dos pobres.

Zubieta disse que ‘mataram nossos irmãos como se fossem animais’, e considerou que esta situação representa ‘um retrocesso de mais de 30 anos no que diz respeito à pessoa humana e aos Direitos Humanos’.

Neste sentido, Zubieta disse que o Parlamento tenta entabular uma aproximação com o governo de fato para encontrar uma saída institucional para a situação atual do país.

Por outro lado, ela enfatiza as denúncias recebidas sobre a ação de grupos paramilitares, que estariam ‘reprimindo e amedrontando pessoas que estavam simplesmente caminhando para sua casa do trabalho’.

Após o golpe de estado contra o legítimo presidente Evo Morales, o povo boliviano continua mobilizado exigindo respeito pela democracia, bem como a renúncia da senadora Jeanine Áñez, autoproclamada presidente interina do país.

 

 

*Com informações do GGN

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A América Latina na mira dos milicianos

As milícias se tornaram a ponta de lança do golpe boliviano e modelo para toda a região.

Ao que tudo indica, o que está acontecendo na Bolívia de hoje não é um levante popular. Foram as milícias as responsáveis pelos atos que geraram a total desestabilização do sistema político boliviano. Nos dias que sucederam as eleições, inúmeros representantes do governo, do judiciário e dos parlamentares eleitos foram atacados em suas casas, com suas famílias, por milicianos e renunciaram aos seus mandatos. Não por pressão política, mas por violência explícita. O caso mais escandaloso noticiado pela imprensa brasileira é o da prefeita Patrícia Arce, da pequena cidade de Vinto, próxima a Cochabamba, que foi arrastada pelas ruas, agredida, humilhada e teve seu cabelo cortado. Considerou-se a sua renúncia, mas como se pode discutir renúncia nesse contexto de violência?

As milícias se tornaram a ponta de lança do golpe boliviano. E este é o ensaio – a antessala dos movimentos golpistas. México em primeiro lugar e Brasil em seguida têm a mesma estrutura da boliviana. Um misto de milicianismo messiânico invade o Estado com seus tentáculos pela ação política e o método da repressão.

O que preocupa e deve ocupar nossa atenção é o modelo. Não estamos diante dos golpes institucionais (que podem ser mais lentos e custosos) ou dos golpes militares (que têm sua legitimidade previamente questionada). As milícias podem se camuflar do clamor das ruas, são militarizadas, mas bem menos burocráticas que os aparelhos estatais e conseguem se mobilizar rapidamente. Com uma faísca política acesa é possível acionar essa estrutura de violência que tem por objetivo provocar um choque que cala a própria democracia.

Para as milícias atuarem é preciso que as forças de segurança nacional e local não atuem de forma a garantir o Estado de Direito. Dada a interpretação peculiar de que parte das forças armadas tem espaço dentro das milícias, inclusive com membros correlatos em ambas as instituições. Não existem milícias sem a leniência no Estado e sem ações de apropriação do bem público. Milícias são máfias que vendem proteção contra a violência delas próprias e com isso se apropriam de vários outros negócios onde a regulação pública não consegue ou não quer atuar.

Guardadas as devidas proporções que distanciam o tempo e o espaço, não é coisa recente o uso de grupos paramilitares para atingir objetivos políticos de grupos minoritários pelo terror contra minorias. A noite dos cristais da Alemanha Nazista é a mais conhecida ação de grupos milicianos a serviço da política contra o Estado. Numa mesma noite, casas, comércio, sinagogas judaicas foram invadidas, depredadas e a violência caracterizou a violência alemã sobre os judeus que levou cerca de 30 mil aos campos de concentração, calando qualquer oposição à política antissemita do III Reich.

O que ocorreu na Bolívia recentemente merece ser esclarecido e interpretado. O que se supõe tem respaldo na realidade? Podemos supor que o que ocorreu é uma reação espontânea ou pontual aos acontecimentos eleitorais ou ao confuso sistema de contagem de votos boliviano em reação a um quarto mandato de Evo Morales? Ou é uma ação orquestrada de desestabilização política para forçar um golpe de Estado que tem traços fascistas?

Isso pode ter efeito diverso. Supondo que temos mais indícios de que a segunda hipótese é mais consistente que a primeira, o que provocou toda a instabilidade política foi uma ação paramilitar de um grupo organizado que estava às margens do Estado que foram acionadas por líderes que não querem usar os mecanismos legais disponíveis para questionar os procedimentos e antecipar qualquer movimento para controlar a decisão – portanto, é absolutamente antidemocrático.

Somando-se a esse fato, podemos argumentar que as forças progressistas já estão derrotadas. Supondo que na Bolívia a situação retome a normalidade e os radicais sejam afastados do poder, mesmo assim, não será Evo Morales que retorna com poderes presidenciais, mas retoma o neoliberalismo radical que ampliou as desigualdades sociais e fortaleceu os super-ricos como caminho intermediário ou moderado (esse é o ponto, os milicianos levam a situação ao absurdo tão exagerado, que o absurdo econômico se torna razoável).

A mesma agenda que foi derrotada nas urnas no início do século e novamente se encontra em plena derrocada é a que sustenta silenciosamente as atrocidades bolivianas. Porque assim como a insatisfação popular generalizada está ligada à ampliação da desigualdade social e a transferências da crise de 2008 aos mais pobres, a reação miliciana travestida de religiosidade está ligada ao fortalecimento do neoliberalismo e do status quo através de uma categoria social que quer oprimir minorias e pautas progressistas.

Nesse sentido, o neoliberalismo triunfando na Bolívia, mesmo que Macho Camacho não se torne o presidente, a retomada da estabilidade na Bolívia passa pelo reconhecimento antidemocrático do neoliberalismo. E o antidemocrático neste caso tem efeito direto no empobrecimento do povo e no enriquecimento de uma restrita elite.

 

*Por Luis Fernando Vitagliano

*Com informações do Desacato

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Vídeos: Mega deslocamento da população boliviana exigindo a volta de Evo Morales

Não há o que um povo unido não possa mudar.

Parlamentares exigem respeito à linha sucessória e centrais sindicais ameaçam greve geral pela volta do presidente

Protesto, que em 2008 evitou o golpe de estado contra o presidente, reclama novamente a volta de Evo Morales. De acordo com as informações recebidas desde a Bolívia, os manifestantes partiram de Alto e já assumiram o controle de alguns postos policiais da zona.

De acordo com as fontes ouvidas pela Carta Maior os manifestantes já estão às porta de La Paz e são iminentes os confrontos com as forças de segurança que respaldam a autodeclarada presidenta Jeanine Áñez.

Os rumores no país são que a polícia da capital boliviana já está negociando para evitar enfrentamentos armados. Os manifestantes esperam nas próximas horas o retorno de presidente eleito, Evo Morales, a seu cargo.

Informações confirmadas pela Carta Maior até o momento

1. – A primeira vice presidenta do Congresso Boliviano (militante do partido Movimento al Socialismo – MAS). Declara que sua renúncia à mesa diretora não foi aceita, pelo que ela segue na linha sucessória presidencial.

2. – Vice presidenta da câmara de deputados, Susana Riveros, não renunciou a seu cargo, e mantém as sessões do congresso junto com a bancada do MAS.

3. – As principais centrais operárias convocaram os trabalhadores a desmontar o Golpe de Estado, caso contrário o país enfrentará uma greve geral.

4. – As principais centrais sindicais camponesas bloquearam as estradas do país para pressionar a direita a desmontar o golpe.

https://twitter.com/jummasky/status/1195085898356023296?s=20

 

 

*Com informações da Carta Maior

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Vídeos: Após golpe, povo boliviano reage e constitucionalista alerta: “É fundamental que Evo Morales continue vivo”

No dia seguinte à renúncia do presidente boliviano, o povo reage nas ruas e La Paz amanhece com manifestações.

O dia seguinte ao golpe da direita na Bolívia, que levou à saída de Evo Morales da Presidência do país, foi de protestos nas ruas e apreensão. A capital La Paz amanheceu com barricadas e manifestações. Em Cochabamba, milhares de manifestantes marcharam pedindo a volta do líder indígena e campesino. O futuro do ex-presidente preocupa os bolivianos e também o doutor em Direito Constitucional, Gladstone Leonel, que teme pela vida de Evo.

“É muito difícil imaginar o que acontecerá com o Evo. É fundamental que ele continue vivo. É fundamental que se preze pela segurança do Evo”, afirma Leonel, que é professor do programa de Pós-Graduação de Direito Constitucional na Universidade Federal Fluminense (UFF) e que estudou a Bolívia em seu doutorado.

Para Leonel, o futuro da Bolívia será decidido nos próximos dias e Evo Morales deve ter um papel preponderante. “O povo está sofrendo e toma um susto com o que está acontecendo, mas a capacidade desse povo de reagir nos surpreenderá. Haverá muita reação. Os grupos políticos, obviamente, querem afastar o Evo, da mesma forma que fizeram com o Lula aqui no Brasil”, explicou.

Confira a entrevista na íntegra:

Brasil de Fato – Como o Evo Morales, que conduz a Bolívia a um crescimento de 5% ao ano, pode ser alvo de um golpe?

Gladstone Leonel – O governo de Evo não é impopular, tanto que foi eleito em primeiro turno, o que não é fácil para um governo que foi eleito [pela primeira vez] em 2006 e tem todo o desgaste político de uma exposição por tanto período. Recentemente, vimos isso com o PT no Brasil, também um golpe de Estado, mas, sobretudo, com um desgaste de governo, porque o PT estava no poder desde 2002. No entanto, o fato de o governo estar desgastado não pode ser motivo para um golpe de Estado.

Em 2019, se tumultuou o cenário eleitoral porque a diferença do Evo ficou pequena e eles estavam esperando ainda os votos da zona rural. Até chegar, a direita conseguiu se articular e tumultuou o ambiente político. Tanto que a OEA [Organização dos Estados Americanos] dá o ultimato para a auditoria. A meu ver o Evo erra ao aceitar a auditoria da OEA. O organismo enfrenta frontalmente as políticas da Bolívia. Ele dá a possibilidade para que a OEA legitime uma postura política, que foi o pedido de novas eleições. A partir desse momento, os golpistas ficam à vontade para derrubar o governo e derrubar as lideranças populares da Bolívia.

Qual a influência do episódio do plebiscito, que avaliava a possibilidade de um quarto mandato de Evo Morales, no golpe na Bolívia?

Esse episódio já indica um desgaste dentro de um contexto político que mostra que a liderança política não foi renovada. Isso é um problema? Sim, é um problema. Porém, não podemos esquecer que o Evo recorreu a um poder independente, que é o Judiciário. Recorreu ao Tribunal Constitucional Plurinacional, que é um poder separado e independente, que reconheceu a possibilidade de uma candidatura. A partir do momento que foi reconhecida a possibilidade da candidatura, há legitimidade para haver o pleito. Lembrando que diferentemente do Brasil, na Bolívia, os representantes dos tribunais superiores são eleitos pelo povo, há um fluxo democrático muito maior que no Brasil, por exemplo. Então, era um indício de desgaste, mas que não pode haver um rompimento com o Estado Democrático de Direito.

Qual o papel que a região de Santa Cruz de La Sierra exerce nesse golpe?

Precisamos retomar os passos históricos para compreender aquela região. Primeiro, no que diz respeito à própria geografia da Bolívia. Santa Cruz não faz parte do Altiplano Andino, que é a região associada aos indígenas. É uma região diferente, de desenvolvimento agrícola, com influência do latifúndio. Santa Cruz tem uma importância econômica, mas também é onde há a maior resistência aos processos de transformação social. Em 2008, sob a liderança dos latifundiários, há uma tentativa de golpe na Bolívia, rádios e emissoras de TV foram queimadas, mas essa tentativa foi fracassada. Com o passar do tempo, o governo faz algumas concessões à essa região, o que gerou popularidade para Evo lá, mas também gerou críticas ao então presidente, porque passou a estimular o agronegócio local. Essa elite cruzcenha ficou ali, adormecida, esperando o melhor momento para golpear. Parece-me que o momento foi agora.

Como serão os próximos dias na Bolívia?

É importante chamarmos a atenção que, no caso da Bolívia, é importante olhar para a história recente desse povo e do sujeito transformador ali, que foi o sujeito responsável pela Constituinte que eles têm. Essa Constituinte só foi possível porque teve a revolta da água em Cochabamba, quando os bolivianos expulsaram a transnacional que queria privatizar a água; teve também a guerra do gás em El Alto. O povo está sofrendo e tomou um susto com o que está acontecendo, mas a capacidade desse povo de reagir nos surpreenderá. Haverá muita reação. Os grupos políticos, obviamente, querem afastar o Evo, da mesma forma que fizeram com o Lula aqui no Brasil. No entanto, me parece que o destino da Bolívia pode ser decidido nos próximos dias.

Então você aposta em uma resistência ao golpe?

Eu acho que será difícil ter tranquilidade em curto prazo. Foi um golpe à moda antiga, o Evo foi eleito em primeiro turno. Por mais que parte das Forças Armadas tenha apoiado o golpe, outra parte tem laços estreitos com ele. Mas não é só isso, os grupos rurais e indígenas reconhecem o Evo como sua principal liderança e vão sustentar essa resistência. Porém, me parece que houve uma surpresa com o golpe e esses grupos precisam de tempo para se organizar, mas não deve demorar. Nessa madrugada mesmo, o povo de El Alto já fechou as principais vias da cidade.

Sobre o futuro de Evo, México ofereceu abrigo, mas ele decidiu permanecer em Cochabamba, de onde ele denunciou uma tentativa de prisão contra ele. Qual será o papel de Evo agora?

É muito difícil imaginar o que acontecerá com o Evo. É fundamental que ele continue vivo. É fundamental que se preze pela segurança do Evo. Quando acontece um golpe contra o Hugo Chávez [Venezuela] em 2002, eles retiram o Chávez da Presidência. Logo depois, há uma insurgência e o povo pede a volta do Chávez no Palácio de Miraflores. O maior arrependimento daqueles golpistas naquela época foi ter mantido o Chávez vivo. Essa é uma lição que fica, ele tem que ser mantido vivo e em um lugar seguro. Por quê? Porque ele tem um papel central nos próximos passos, como liderança política.

Edição: Camila Maciel

 

 

*Com informações do Brasil de Fato