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Bolsonaro deixa rombo, e Brasil pode perder direito de voto na FAO

Jamil Chade – Um dos maiores produtores agrícolas do mundo e, até pouco tempo, líder na luta contra a fome, o Brasil vive uma situação constrangedora na FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura). Sem completar o pagamento de sua contribuição obrigatória, o governo brasileiro pode perder seu direito ao voto na instituição em 2023.

Dados da FAO obtidos pela coluna revelam que a última vez em que o Brasil pagou de forma plena sua contribuição foi em 2019, o primeiro ano de mandato de Jair Bolsonaro. Desde então, os repasses foram suspensos.

A regra na entidade estabelece que, ao completar dois anos sem fazer depósitos completos, um governo perde seu direito ao voto nas decisões da instituição. Hoje, o Brasil contribui com cerca de 3% do orçamento da FAO e, se pagasse o que lhe corresponde, seria o oitavo maior contribuinte para o orçamento da instituição.

Procurado pela reportagem para comentar a situação, o Itamaraty explicou que os “repasses referentes a contribuições a organismos internacionais são de competência do Ministério da Economia”.

“As dívidas do Brasil junto à FAO incluem valores em dólares norte-americanos e em euros, e seu pagamento, assim como as demais ações orçamentárias, está sujeito a restrições fiscais que se impõem ao orçamento federal, dentro dos montantes previstos na Lei Orçamentária Anual”, disse.

“Atualmente, os valores devidos pelo Brasil, até 30/06/22, discriminados conforme a moeda (USD [dólar] e EUR [euro]), são, respectivamente, de USD 23.563.897,70 e EUR 16.651.071,42”, completou. No orçamento da FAO, parte dos pagamentos é na moeda americana e uma segunda parcela é feira em euro, como forma de amenizar o impacto da variação cambial para o orçamento da instituição.

O UOL pediu um posicionamento do Ministério da Economia. Assim que a resposta for dada, ela será incluída na reportagem. Para a FAO, porém, o interlocutor é o Itamaraty.

e no mundo. Mas, se não pagar sua dívida até o final do ano, o Brasil sem poder dar sua voz nas decisões. Situações de dívidas foram vividas pelo Brasil, principalmente durante o segundo mandato de Dilma Rousseff. Mas, pelo menos na FAO, o país nunca perdeu o direito de voto.

Agora, mesmo se acabar evitando a perda de seus direitos, a situação na qual o governo brasileiro se encontra é descrita por funcionários da agência como “vexame” e “reveladora” da atual política externa. Para manter seus direitos plenos na FAO, o Brasil precisava pagar os valores pelo menos relativos ao ano de 2020. Isso envolveria o desembolso de US$ 7,6 milhões e 5,5 milhões de euros, para pelo menos salvar seu direito ao voto. Ameaçados de perder o voto também estão países como a Venezuela, Irã ou Líbia.

A crise de pagamentos do Brasil não se limita à situação na FAO. Na ONU, o governo também sofre para pagar. Mas, tendo sido eleito para o Conselho de Segurança da instituição, o governo teve de encontrar recursos para garantir a transferência de dinheiro para a ONU, antes do final do ano.

A dívida do Brasil com a entidade de alimentos gerou indignação do brasileiro José Graziano da Silva, que liderou a instituição entre 2012 e 2019. Graziano foi ministro do governo de Luiz Inácio Lula da Silva e considerado como pai do programa Fome Zero.

“O Brasil não paga sua cota de contribuição obrigatória da FAO desde 2019 e corre o risco de ser excluído das decisões da entidade”, explicou. “Ele perde o direito de voto se não pagar pelo menos uma parte da dívida”, afirmou.

“Essa é uma situação inaceitável. Neste momento em que o Brasil busca se

reinserir no mundo, a FAO tem um valor simbólico. É ali que vai se debater as medidas de combate à fome no mundo. O Brasil terá muito a contribuir e muito a receber”, disse Graziano.

Ele lembrou que, em 2002, a FAO mandou uma missão especial que permaneceu por semanas no Brasil, ajudando a montar o Fome Zero.

Graziano destacou ainda como Lula voltou a colocar como sua prioridade a retirada do Brasil do mapa da fome. Para ele, portanto, é importante que se faça um movimento pata pagar essa conta. O ex-chefe da FAO ainda destacou como, enquanto a dívida se acumula no exterior, Bolsonaro distribuiu benesses a vários setores antes das eleições, inclusive aos caminhoneiros que fizeram parte dos atos golpsistas nos últimos dias.

Para a senadora Kátia Abreu, “a falta de apreço do governo Bolsonaro pelos organismos internacionais é notório, e por todos”.

A ex-ministra da Agricultura no governo de Dilma Rousseff ainda cita a incoerência entre o discurso do presidente e suas ações no exterior. “A FAO, em especial, trata de alimentação e produção de alimentos. Portanto, deveria ser a prioridade número 1, mas Bolsonaro disse que no Brasil ninguém passa fome”, disse a ex-presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado.

“Tenho a convicção que em janeiro de 2023 governo Lula quitara as dívidas do Brasil junto a FAO e demais organismos”, disse. “Brasil deve ser protagonista e não coadjuvante frente ao mundo”, insistiu. “Credibilidade se alcança nos detalhes », destacou a senadora.

*Uol

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Política

Com dívida inédita, Brasil corre risco de perder direito ao voto na FAO

Um dos maiores produtores agrícolas do mundo e, até pouco tempo, líder na luta contra a fome, o Brasil vive uma situação constrangedora na FAO, a agência da ONU para a Agricultura. Sem completar o pagamento de sua contribuição obrigatória, o governo brasileiro começa o ano de 2022, em tese, com o risco de perder seu poder de voto na instituição.

Desde o início do primeiro ano de mandato de Jair Bolsonaro, o país parou de pagar a instituição de forma integral. A regra na entidade estabelece que, ao completar dois anos sem fazer depósitos completos, um governo perde seu direito ao voto nas decisões da instituição. Hoje, o Brasil contribui com cerca de 3% do orçamento da FAO e, se pagasse o que lhe corresponde, seria o oitavo maior contribuidor para o orçamento da instituição.

Procurado pela reportagem para comentar a situação, o Itamaraty explicou que houve uma mobilização para tentar quitar as dívidas com diferentes organismos internacionais na última semana. Sem o pagamento e diante de um saldo devedor inédito, o Brasil correria o risco de perder o direito ao voto em diferentes instituições.

“O Itamaraty busca permanentemente evitar que atrasos nos pagamentos de contribuições a organismos internacionais comprometam a atuação do Brasil. Nesse sentido, mantém estreita coordenação com o Ministério da Economia e com outros órgãos do governo federal, aos quais sinaliza regularmente as potenciais consequências decorrentes daquelas pendências financeiras”, explicou.

“Esse esforço conjunto permitiu, na última semana, viabilizar pagamentos da ordem de R$ 846 milhões a organismos internacionais e R$ 2,8 bilhões a bancos e agências de fomento de 2021. Com isso, o País preserva sua capacidade de atuação em foros tais como ONU, UNESCO, OMC, OIT e OPAQ, entre outras”, disse.

FAO é risco

Mas o governo admite que seu esforço pode não ter sido suficiente. “No caso da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o Brasil aguarda manifestação do secretariado sobre o recebimento dos montantes enviados nos dias 29 e 30 de dezembro. A efetiva disponibilização desses recursos depende de prazos de compensação bancária, bem como do câmbio vigente, inclusive porque a FAO emite faturas tanto em dólares quanto em euros”, afirmou.

“Nesse contexto, é possível que os pagamentos brasileiros não tenham sido suficientes para saldar integralmente a contribuição do exercício 2019. Com vistas a neutralizar quaisquer impactos, o Ministério das Relações Exteriores já está em contato com o Ministério da Economia no sentido de priorizar novos pagamentos à FAO, tão logo haja disponibilidade de recursos”, disse. De acordo com o Itamaraty, o direito a voto é restaurado “tão logo os países-membros quitem seus débitos em atraso”.

De acordo com negociadores brasileiros, a perda de voto ainda não ocorreu na prática, ainda que em tese a suspensão já possa ser aplicada a partir do dia 1 de janeiro de 2022.

Neste ano, não há uma previsão de conferência da FAO, o que amenizaria o constrangimento para o Itamaraty. Mas, se uma crise surgir e uma reunião exigir a convocação de um voto, o Brasil pode ficar de fora de uma decisão.

O tema dos devedores ainda poderá entrar na agenda do Conselho Executivo da FAO, que irá deliberar sobre cada um dos governos com pendências.

Mesmo se acabar evitando a perda de seus direitos, a situação na qual o governo brasileiro se encontra é descrita por funcionários da agência como “vexame” e “reveladora” da atual política externa.

Para manter seus direitos plenos na FAO, o Brasil precisava pagar a soma dívidas acumuladas de US$ 2,5 milhões e 7,1 milhões de euros, referentes ao orçamento de 2019. Mas, segundo fontes em Brasília, apenas uma parcela desembarcou nos cofres da agência.

No orçamento da FAO, parte dos pagamentos é na moeda americana e uma segunda parcela é feira em euro, como forma de amenizar o impacto da variação cambial para o orçamento da instituição.

Mas a dívida vai muito além. Num comunicado enviado ao governo brasileiro cobrando pagamentos, a FAO detalhou a dimensão do buraco deixado pelo país.

O Brasil deve US$ 9,8 milhões e 5,5 milhões de euros, relativos ao ano de 2021. O governo também deve a mesma quantidade para o ano de 2020, tanto em euros como em dólares. Isso tudo sem contar com o valor de 7,9 milhões de dólares e 5,5 milhões de euros que o Brasil precisa pagar em 1 de janeiro, relativo às contribuições para o ano de 2022.

Somando todos os anos relatados no documento da FAO cobrando o governo, a dívida chega a US$ 23 milhões e 23,8 milhões de euros.

Em outro documento oficial da FAO, obtido pelo UOL, a entidade também constata que a dívida brasileira é a segunda maior entre todos os países que fazem parte da instituição.

Apenas o governo americano conta com um buraco maior. O que a Casa Branca deve chega a mais de US$ 110 milhões. A contribuição anual dos EUA, porém, é muito superior que a brasileira.

A crise de pagamentos do Brasil não se limita à situação na FAO. Na ONU, o governo também sofre para pagar. Mas, tendo sido eleito para o Conselho de Segurança da instituição, o governo teve de encontrar recursos para garantir a transferência de dinheiro para a ONU, antes do final do ano.
Fome

A crise diplomática na FAO ocorre no mesmo momento em que a instituição revela, em seus dados, um salto sem precedentes da fome no Brasil nos últimos 20 anos, enquanto o governo é denunciado por um desmonte das políticas de segurança alimentar.

De acordo com a informação coletada pela instituição, 24% dos brasileiros vivem um estágio de fome moderada, enquanto 8% atravessam uma situação de fome severa. Antes da pandemia, a taxa era de apenas 2,5%.

A FAO foi comandada pelo brasileiro José Graziano da Silva entre 2012 e meados de 2019. Graziano foi ministro do governo de Luiz Inácio Lula da Silva e considerado como pai do programa Fome Zero.

*Jamil Chade/Uol

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Máquina de Guerra

Em 20 anos, conflitos custaram US$ 6 tri aos EUA; quantia poderia eliminar fome ou reverter aquecimento.

Quando a estátua de Saddam Hussein foi derrubada no Iraque, em 2003, as imagens que rodaram o mundo simbolizavam a vitória do exército mais poderoso do mundo. Meses antes, a campanha no Afeganistão também mostrara a avassaladora superioridade das forças americanas.

Mas se essas guerras foram vencidas em sua etapa inicial, o governo americano logo descobriu que conquistar a paz seria uma tarefa mais difícil – e muito mais cara.

Nesta semana, os acontecimentos em Bagdá e a crise aberta entre EUA e Irã podem antecipar o fim da presença americana no Iraque. Mas certamente a conta permanecerá por muito tempo ainda e já supera por ampla margem os gastos na Guerra do Vietnã (1969-1975).

Em quase 20 anos de conflitos no Oriente Médio e no Golfo, o governo americano já destinou quase US$ 6 trilhões para financiar as operações, conta que deve crescer nos próximos anos, mesmo que haja uma retirada imediata de Bagdá, como querem os iraquianos.

Cálculos realizados pelo Watson Institute da Universidade de Brown (EUA) somaram os gastos do governo americano no Iraque, Afeganistão, Paquistão e Síria, além de operações pontuais na região.

O valor é considerado a partir de 2001, ano que os EUA foram atacados em 11 de setembro e num ato que transformou a posição americana no mundo.

Desde então, Washington colocou a guerra contra o terror como prioridade, levando à queda de governos, troca de regimes políticos, criação de milícias e uma mudança no mapa de influências no Oriente Médio e Golfo. Em 2001, o Afeganistão foi alvo de uma operação e, dois anos depois, chegou a vez do Iraque.

Com o dinheiro destinado às campanhas americanas, o mundo teria eliminado a fome ou preparado o planeta para as mudanças climáticas (veja mais abaixo).

Além dos valores com armas e infraestrutura, a conta também inclui as taxas de juros com as dívidas contraídas para pagar pela guerra, assim como medidas de segurança para prevenir atentados na região.

Apenas nas operações militares em solo iraquiano, a conta chegaria a US$ 822 bilhões desde 2003, contra cerca de US$ 975 bilhões no Afeganistão desde 2001. Nos ataques que começaram em Bagdá em 19 de março de 2003, os EUA destinaram US$ 90,3 bilhões. Um mês depois, Saddam havia sido derrotado.

AFP PHOTO/US NAVY/KENNETH R. HENDRIX

Gastos do gigante

Mas esse dinheiro não conta a história completa dos gastos, já que bilhões precisam ser somados na preparação, na logística fora do país, treinamento, pagamentos de pensões, construção de bases, tecnologia e burocracia. Por essa conta, a Universidade de Brown estima que apenas a guerra no Iraque superou a marca de US$ 2 trilhões.

As contas com o combustível das tropas também pesam.

Devido ao enorme uso de combustível de uma organização que opera 24 horas por dia em todo o mundo, o Departamento de Defesa é o maior utilizador individual de petróleo e outros produtos petrolíferos do mundo. Entre 2010 e 2015, o Departamento adquiriu uma média de 102 milhões de barris de combustível por ano.

Estudo da Universidade de Brown Os valores precisam ainda incluir os gastos do governo americano com a pensão de milhares de homens e mulheres destacadas para região. Para aqueles que sofreram algum dano físico ou mental, uma compensação também está prevista, enquanto as famílias das vítimas apenas no Iraque também recebem benefícios.

No total, o instituto acredita que, entre 2020 e o ano de 2059, o governo americano terá de destinar mais de US$ 1 trilhão aos veteranos de guerra.

Esse grupo de pessoas atingirá um pico de mais de 4,3 milhões de veteranos, por volta de 2039.

Apenas no Iraque, além dos 4,4 mil soldados americanos mortos, outros 32,2 mil foram gravemente feridos e terão de ser mantidos até o final de suas vidas.

REUTERS/Chris Helgren

Financiamento

Ao contrário de conflitos do século 20, as dotações de guerra dos EUA para o Iraque e o Afeganistão não foram financiadas com novos impostos ou títulos de guerra. Desta vez, o governo pagou por meio de seu orçamento e empréstimos.

O americano médio, portanto, não sentiu o peso dessas guerras enquanto elas ocorriam. Mas a consequência desse sistema é que ele deixou uma dívida às futuras gerações.

O problema, segundo a Universidade Brown, é que “não existe uma estratégia para pagar responsavelmente por estas guerras”. Na avaliação da entidade, deve ser questionado se de fato a ameaça que os EUA sofriam eram compatíveis com tais números.

O elevado nível de gastos com a guerra e outros preparativos militares pode não ser proporcional às ameaças que os EUA enfrentam. Quando associados à retórica agressiva que tem caracterizado a política externa dos EUA nos últimos anos, estes elevados níveis de gastos e a expansão das operações antiterror dos EUA em todo o mundo podem ser muito alarmantes para estados e povos que, de outra forma, não teriam motivos para aumentar os seus próprios gastos militares e forças armadas.

Estudo da Universidade de Brown

Em suma, os elevados custos da guerra e os gastos relacionados com a guerra representam uma preocupação de segurança nacional, porque são insustentáveis”, alertaram.

Fome e Clima

A realidade é que o valor destinado pelos EUA até agora para financiar suas guerras supera o que institutos, acadêmicos e organismos internacionais sugerem como investimentos para preparar o planeta para lidar com as mudanças climáticas.

No ano passado, um grupo de 34 personalidades – entre eles o fundador da Microsoft Corp. Bill Gates, o ex-Secretário Geral da ONU Ban Ki-moon e a Diretora Executiva do Banco Mundial Kristalina Georgieva – concluiu que o mundo precisaria de US$1,8 trilhão em investimentos até 2030 para lidar com as mudanças climáticas.

O dinheiro, segundo eles, deveria ser investido em sistemas de alerta meteorológico, infraestrutura, agricultura em terras secas, proteção de manguezais e gestão de água. Não apenas o investimento ajudaria o planeta a estar pronto para as mudanças climáticas, mas renderia US$7,1 trilhões em benefícios.

Num outro estudo, a FAO, braço das Nações Unidas para a alimentação mundial, estimou que, para eliminar a fome no mundo até 2030, governos precisariam investir m 265 bilhões de dólares por ano através de gastos em medidas como transferências de renda, investimento público a favor dos pobres em irrigação, recursos genéticos, mecanização e estrutura.

Em dez anos, a conta não chegaria aos gastos das guerras americanas no Golfo.

Nos bastidores da agência de alimentos da ONU, um dos comentários que se fazia era que o orçamento dos EUA para os programas da entidade era ‘migalha’ perto do que se gastava no Pentágono.

Gastos Públicos, Lucros Privados

Mas as guerras dos últimos 20 anos também representaram um ótimo negócio para empresas americanas.

Parte do dinheiro, de fato, foi usado para contratar companhias dos EUA que prestaram serviços durante a ocupação.

Pelo menos US$ 140 bilhões foram gastos em logística e serviços, além de reconstrução. Isso inclui desde gelo, segurança à papel de banheiro. Uma das empresas que recebeu o maior número de contratos foi a KBR, ex-subsidiária da Halliburton. A empresa de logística chegou a ser comandada por Dick Cheney, vice-presidente na gestão de George W. Bush. Sozinha, ela ficou com quase US$ 40 bilhões em contratos.

Apenas para a segurança da embaixada americana em Bagdá, hoje sob ataque, essas empresas receberam mais de US$ 3 bilhões nos cinco primeiros anos.

Dez anos depois das guerras terem tido seu início, um informe ainda mostrou que, por dia, US$ 12 milhões eram desperdiçados ou perdidos em fraude.

Além disso, estudos passaram a revelar que, se o governo americano quer criar empregos, investimentos em defesa não são os mais recomendados.

Avaliações elaboradas pelo projeto Cost of War, da mesma Universidade Brown, apontaram que a cada US$ 1 milhão gasto em defesa, 6,9 empregos diretos são gerados. Mas, se o mesmo valor fosse aplicado em educação primária e secundária, a taxa de empregos gerados seria de 19,2 empregos para cada US $ 1 milhão.

Caso o dinheiro fosse usado em saúde, 14,3 empregos diretos seriam criados com US$ 1 milhão.

Mas a grande recompensa viria do setor do petróleo. Em 2003, quando a operação foi lançada, a Casa Branca insistia que seu objetivo era um mundo mais seguro e a liberdade para milhões de iraquianos. Em 2007, porém, o ex-presidente do Federal Reserve Bank, Alan Greenspan, deixou claro que a história não era exatamente como havia sido contada.

É politicamente inconveniente reconhecer o que todos sabem: a guerra no Iraque é, em grande parte, por conta do petróleo. Alan Greenspan, ex-presidente do Federal Reserve Bank.

Antes de 2003, a segunda maior reserva do mundo estava nas mãos do estado iraquiano. Quase 20 anos depois, ela está praticamente privatizada e sob o controle de empresas ocidentais. No governo americano, a estimativa é de que a reserva seja de 112 bilhões de barris. Em 2003, 90% desse volume não estava explorado. Os lucros, portanto, prometem ser bilionários por décadas.

17 anos após a invasão, a produção de petróleo do Iraque passou de menos de 1 milhão de barris por dia para 4,8 milhões. Em abril de 2019, o governo iraquiano anunciou que a receita do petróleo havia superado a marca de US$ 7 bilhões para o país.

Para a Agência Internacional de Energia, essa produção pode garantir um total de US$ 5 trilhões até 2035 em receitas.

Win McNamee/Getty Images/AFP

 

 

 

*Jamil Chade/Uol

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Resposta do governo Bolsonaro é patética, diz um dos maiores especialistas internacionais em derramamento de óleo

Há cerca de um mês, o especialista canadense em contenção de derramamentos de óleo, Gerald Graham, adquiriu o costume de abrir o Google News para acompanhar as notícias sobre o crime ambiental que se espalha há 54 dias pelas praias do Nordeste. Ele vem observando as imagens e vídeos, além de notícias, e afirma estar espantado com a falta de respostas sobre a origem do vazamento.

“É muito estranho, até hoje tudo é muito estranho porque não se sabe de onde o óleo está vindo. É uma surpresa o óleo continuar chegando às praias. Parece que continua vindo da fonte original e ainda não se sabe de onde vem”.

A surpresa não se resume ao mistério da origem do óleo. Para o especialista, o mais chocante é o perigo a que voluntários estão se submetendo ao limpar as praias sem que o Governo Federal cumpra seu papel e assuma a retirada do óleo da costa. “Quando eu vi pela primeira vez essas notícias do vazamento, cerca de um mês atrás, eu falei com um jornalista e vi algumas imagens e pensei: ‘isso parece ruim!’”, lembra.

Graham é presidente da Worldocean Consulting, empresa especializada em planejar o uso de tecnologia no processo de limpeza em episódios de derramamento de óleo. Recentemente, deu uma série de entrevistas para apresentar softwares que permitem a visualização de cenários de derramamento de óleo, apontando os métodos mais rápidos e baratos de limpeza.

O extenso currículo de Gerald Graham inclui consultorias para o Banco Mundial, OCDE, Unesco, FAO, União Europeia, Agência de Desenvolvimento do Canadá e alemã GTZ. O expert conversou com a reportagem da Marco Zero por Skype sobre o que considera serem os pontos críticos da limpeza das praias no Nordeste brasileiro e comentou a ação das autoridades responsáveis. Confira abaixo os principais trechos da entrevista.
Resposta desorganizada ao vazamento

A partir das imagens que eu vi e venho vendo há semanas, há uma resposta desorganizada aos vazamentos. Não há sinal de ninguém no comando, nem soldados. Eles não estão sequer devidamente equipados para a tarefa.

Governo não sabe fazer e não pede ajuda

A última imagem que vi tinha uma mulher dentro da água, sentada na água, tentando limpar o óleo. É ridículo.

Eu esperaria mais do Brasil. Não é um país da Europa ocidental, nem os Estados Unidos, mas não é um país subdesenvolvido. Eu escutei que parte da costa que o óleo atingiu é uma região mais pobre, me corrija se estiver errado.

Eu não tenho visto imagens que mostram manchas na superfície, o material parece ficar nas praias, preso. Por isso a dificuldade de observar com imagens aéreas e satélites.

E a resposta do governo, para mim, é totalmente patética. É um segundo desastre. Primeiro o óleo, depois as respostas são um outro desastre.

Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, fez visita relâmpago à praia de Itapuama. Fez uma live para as redes sociais, falou rapidamente com a imprensa e deixou o estado

As consequências do contato com o óleo

As pessoas são afetadas pelo óleo, elas podem não sentir no começo, mas estão inalando. O óleo pode entrar pela pele, também pode ir para o cérebro.

As pessoas precisariam de um treinamento. Eu não vi nenhuma evidência de que isso está acontecendo. Também não vi equipamentos de limpeza nas praias ou no mar. Onde estão as máquinas que poderiam fazer a limpeza das praias?

A questão é: se a autoridade federal não tem um plano de contingência do óleo não deveria deixar voluntários fazerem isso.

As autoridades regionais e locais, com as autoridades políticas, deveriam manter as pessoas afastadas da praia, evitando que as pessoas sofram as consequências da exposição ao óleo.

Eu não vi nenhuma evidência de um plano. E eu entendo as pessoas estarem tentando dar o seu melhor para limpar as praias, mas elas não deveriam estar fazendo isso. As pessoas vão acabar ficando doentes.

Dificuldade em mensurar o desastre

Algumas imagens mostram barris de óleo. É realmente muito difícil mensurar a extensão do vazamento e afirmar se é uma catástrofe ou não. Eu não posso realmente dizer o que é a partir do que eu vi. Mas, duas semanas atrás, eu vi um vídeo feito de um avião ou drone mostrando a costa e mostrava uma longa mancha de óleo, de cerca de 5 quilômetros. Você via uma foto antes e depois.

É bastante chocante, eu franzi as sobrancelhas e fiquei sem acreditar. Parece que é pior em algumas áreas, do que em outras.

Eu não diria que é um pequeno desastre. Mas quando se tem a visão do óleo parece ser relativamente uma quantidade pequena na costa, comparada a outros vazamentos.

Você precisa colocar em perspectiva. Mas ao mesmo tempo, continua espalhando, continua chegando nas praias e isso causa muitos estragos.

Não seria difícil limpar tudo

Tem apenas uma comparação que eu poderia fazer, com o caso do vazamento em Nakhodka, na Rússia. Naquele vazamento, houve 1,2 milhão de voluntários, mais de 1 milhão envolvidos na limpeza. Houve uma forte resposta voluntária. Em casos como esses, com uma extensão grande de costa – eu não sei quantas pessoas estão envolvidas – não se compara nesse sentido, mas a questão é que o volume do óleo parece pequeno. Mas acho que é subestimado. Eu vi notícias que afirmam que 600 toneladas foram coletadas, eu ficaria bastante cético com essa contagem porque contando 200 comunidades, seriam apenas 3 toneladas por praia.

E o óleo, quando você recolher, vai estar misturado com areia. É relativamente um volume pequeno espalhado por uma área enorme. É incrivelmente não usual fazer essa comparação.

Falando de um modo geral, parece uma quantidade pequena nas praias. Focos de óleo aqui e ali, então não parece um grande desafio limpar tudo. Não é como um massivo vazamento de óleo, como o que ocorreu no Alaska em 1989. Não deveria ser tão difícil de limpar.

Parece que ninguém sabe o que está fazendo

Obviamente, você não consegue conter quando chega na costa, mas você consegue evitar que chegue na costa. Não vi evidência alguma de que isso foi feito.

Normalmente, muitos países têm barreiras em pontos estratégicos da costa, caso algo aconteça. E no Brasil isso não aconteceu.

Uma vez que o óleo chega na costa, você precisa de pessoas treinadas – e não precisam ser profissionais, voluntários poderiam receber um treinamento básico da Marinha para saber como limpar. Poderia ser um curso de dois dias. E qualquer pessoa que não estiver limpando precisaria ficar afastada.

Você precisaria tirar as pessoas, pois é uma zona perigosa. Depois você forneceria o equipamento, técnicas e máquinas para coletar e retirar o óleo.

Esse seria o centro da operação, mas parece que ninguém sabe o que está fazendo e estão tentando ajudar, mas é uma operação extremamente amadora.

 

 

*Com informações do Marco Zero