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É chegada a hora de a Justiça sair pra pescar peixes graúdos

Os bolsonaro saíram pra pescar, em plena segunda-feira, às seis e pouco da matina.

Veja você.

E foram em cardume, num comboio naval que incluiu um barco e duas motos aquáticas.

Por que tão cedo?, perguntavam uns desconfiados curiosos.

Ora, todos sabemos, desde os bíblicos tempos, que a madruga é o melhor horário para a pescaria.

Os peixinhos, vulneráveis porque ainda insones, espreguiçam-se, bocejam e, depois de escovarem os dentes, saem em busca do café da manhã.

É espetar uma minhoca na ponta do anzol, botar um cigarrim de palha no canto da boca e esperar a fisgada.

Nesse meio tempo, aprecia-se o silêncio marulhento daquela imensidão azul,

Ouve-se o alarido das gaivotas a esfregar as asas no vento,

Avista-se uma gigante jubarte a passear com um filhote,

Fotografa-se um golfinho rotador dando acrobáticos giros no ar.

É silêncio, solidão e cerveja.

Mas veja como é ilusória a paz do pescador de segundas-feiras.

Enquanto carluxo se distraía com uma vara na mão, os federa baculejavam o seu cafofo.

Reviravam gavetas, levantavam colchões e espremiam creme dental em busca de vestígios criminosos.

Chegaram mesmo a encontrar uma estranhíssima sacola de lingeries no quarto do cabeçorra.

Só a sacola, nada dentro.

Suspeita-se de que ali estava a farda de pescaria de carluxo.

A vara ele pode ter comprado numa sexy shop.

Pois bem, o horário, como vimos, era propício para a pescaria.

As embarcações, como se deduz, estavam equipadas com os mais modernos equipamentos para a prática de uma fashion fishing.

E o mar, como sempre, estava tranquilo e majestosamente piscoso.

Qualquer caiçara com uma humilde vara de bambu e um anzol remendado, diante de um cenário desses, não voltaria pra casa de mãos abanando.

Pois num é que os nossos diligentes pescadores chegaram à praia sem trazer um único peixe.

Uma escama, uma espinha, nada.

O que nos remete a joão 21, onde lemos que pedro e seus amiguinhos saíram para uma pescaria, “todos subiram no barco, mas naquela noite não pescaram nada”.

Há controvérsias.

As imagens sugerem que jair trazia no ventre a mesma baleia que engolira o jonas bíblico.

Há quem diga que isso é história de pescador.

Mas há, ainda, algo mais mais curioso;

Carluxo, que parece um mero, voltou da pescaria a nado, deixando o jet na casa de um bróder.

Ora, esse bracejar mar a fora levantou suspeita.

Acredita-se que a rede que os pescadores lançaram ao mar já estava cheia de peixes graúdos.

Tratou-se, portanto, de uma pescaria reversa.

O fundo do mar de angra, nesse momento, pode estar repleto de equipamentos eletrônicos.

Espera-se que um bom escafandrista, escarafunchando o pélago marinho, encontre a lan house de carluxo nas obscuras profundezas abissais.

E que Xandão, fantasiado de poseidon, com uma barba rélvica e um tridente afiado, espete o rabo desses mitômanos vigaristas.

É chegada a hora da justiça sair pra pescar, e que não retorne mais com os bagrinhos de sempre, queremos os peixes grandes.

Palavra da salvação.

Lelê Teles é jornalista, roteirista e mestre em Cinema e Narrativas Sociais pela Universidade Federal de Sergipe (UFS)

*Viomundo

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Como Angra dos Reis tornou-se o bunker do crime sob controle dos Bolsonaro

Casa em Angra, alvo da operação da PF, não é coincidência. Relembre como a cidade foi usada pelo clã para projetos e milícias.

“É Central o fator Angra dos Reis para entender o projeto Bolsonaro. O fato de ele ter uma casa lá apenas completa um cenário que a gente vem traçando já há alguns anos”, resumiu Luis Nassif.

A Operação da Polícia Federal nesta segunda (29) mirou filho do ex-presidente, Carlos Bolsonaro, em uma série de buscas e apreensões, uma das principais em uma casa da família em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, aonde Jair, Flávio, Eduardo e Carlos Bolsonaro se encontravam até a manhã de hoje.

Reportagens do GGN desde 2019 vêm mostrando como a cidade se tornou alvo da entrada do crime organizado e milícias, sob o controle dos Bolsonaro. Relembre:

Angra dos Reis tornando-se o bunker do crime
Reportagem de fevereiro de 2020 de Luis Nassif, no GGN, revelava o interesse do então governo de Jair Bolsonaro de legalizar os cassinos junto a resorts, em uma das séries de tentativas de desregulamentações do então mandatário para a entrada no país de financiadores da ultradireita junto a mercados do crime, como é o caso dos cassinos.

A principal região de interesse dos Bolsonaro para a criação desse modelo de resorts com cassinos era Angra dos Reis. Ainda em 2019, o ex-mandatário já indicava seus planos de transformar Angra em uma “Cancun brasileira”, com negociações posteriores do clã com os Emirados Árabes, chegando a angariar recursos do país para o projeto.

*GGN

 

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Justiça condena Luciano Hang, dono da Havan, a pagar R$ 85 milhões por ter coagido funcionários a votar em Bolsonaro

Hang teria ameaçado fechar lojas e demitir funcionários caso o adversário de Bolsonaro, Fernando Haddad (PT), vencesse a disputa.

A Justiça do Trabalho de Florianópolis condenou as lojas Havan e seu dono, Luciano Hang, a pagarem uma indenização de R$ 85 milhões por coagirem seus funcionários a votarem no candidato Jair Bolsonaro (PL) nas eleições presidenciais de 2018. A decisão, que ainda cabe recurso, foi proferida pelo juiz Carlos Alberto Pereira de Castro, da 7ª Vara do Trabalho.

O Ministério Público do Trabalho (MPT) ajuizou uma ação civil pública contra os réus, alegando que eles promoveram campanhas políticas favoráveis a Bolsonaro, com a participação obrigatória dos empregados em “atos cívicos” na empresa. Além disso, Hang teria ameaçado fechar lojas e demitir funcionários caso o adversário de Bolsonaro, Fernando Haddad (PT), vencesse a disputa. Os trabalhadores também foram obrigados a responder enquetes internas sobre suas intenções de voto, sendo que a preferência do empresário já era conhecida.

Para o MPT, os réus abusaram de sua condição de empregadores para impor sua opinião política sobre os candidatos à Presidência e para condicionar a manutenção dos empregos dos colaboradores, usando métodos humilhantes, vexatórios e ilegais.

Em nota, Luciano Hang criticou a decisão como “descabida e ideológica” e disse que não houve irregularidades comprovadas. Ele afirmou que o juiz não seguiu as provas e agiu por ideologia. Ele se disse vítima de perseguição e de tentativa de criminalização do empresariado.

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Operação contra Carlos Bolsonaro deve levar PF a Jair

Investigado por arapongagem, Zero Dois sempre deixou claro que cumpria ordens do pai.

Depois de se eleger presidente, Jair Bolsonaro informou que presentearia o filho Carlos com a Secretaria de Comunicação Social. “O cara é uma fera nas mídias sociais. Tem tudo para dar certo”, justificou. A ideia pegou mal, e o capitão desistiu do ato de nepotismo explícito. O Zero Dois não virou ministro, mas se tornaria uma eminência parda do governo.

Carluxo fabricou crises, derrubou ministros e comandou o famigerado gabinete do ódio. Sem cargo formal em Brasília, ganhou o apelido de vereador federal. O pai preferia chamá-lo de “meu pit bull”. Um cão feroz, sempre a postos para morder a canela dos adversários.

Em março de 2020, o ex-ministro Gustavo Bebianno disse que o Zero Dois queria criar uma “Abin paralela”. Um sistema de informações clandestino, que não deixaria rastros de suas atividades. Agora a Polícia Federal acredita que essa ideia também ficou pelo caminho. Os Bolsonaro acharam mais útil capturar a Abin oficial.

Na decisão que autorizou as buscas desta segunda-feira, o ministro Alexandre de Moraes enumerou provas do “desvirtuamento” da agência no governo passado. Em vez de produzir inteligência para o Estado, a Abin fez arapongagem para o clã. Ajudou a bisbilhotar opositores e obstruir investigações que ameaçavam os filhos do presidente.

A espionagem usou um programa israelense que descobre a localização de pessoas pelo sinal do celular. A ferramenta foi acionada ilegalmente contra congressistas, uma promotora do caso Marielle e ao menos dois ministros do Supremo. A Abin era comandada por Alexandre Ramagem, hoje deputado e pré-candidato a prefeito do Rio. Acima dele estava o general Augusto Heleno, que será ouvido na semana que vem.

Para a PF, Carluxo integrava o “núcleo político” da quadrilha. Como ele nunca fez nada para si mesmo, é provável que os investigadores ainda batam na porta do ex-presidente, que agora se diz vítima de “perseguição implacável”.

No primeiro discurso como vereador, o Zero Dois avisou que não devia obediência à legenda pela qual se elegeu: “Falo não em nome do Partido Progressista, mas em nome do Partido do Papai Bolsonaro”. Vinte e quatro anos depois, só mudou a sigla de fachada.

*Bernardo Mello Franco/O Globo

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Vídeo: Bolsonaro confessa o crime de Carlos, mas diz que o crime não é crime

Bolsonaro confessa crime de Carlos Bolsonaro, ao vivo e a cores na Jovem Pan, sem rodeios, mas disse que o crime de Carluxo não é crime.

Qual é o problema de seu criminoso preferido cometer um crimezinho de espionagem ilegal de autoridades?

Bandido bom, é filho bandido!

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Carlos Bolsonaro acordou na mira da PF

Carlos Bolsonaro amanhece esta segunda com a Polícia Federal fungando no seu cangote.

A Polícia Federal fez uma operação nesta segunda-feira (29) para apurar ações da Abin durante o governo Bolsonaro.

Carluxo é um dos alvos da operação de busca e apreensão.

Bolsonaro, ontem, em pleno domingo, provavelmente sabendo por suas “fintes” da operação da PF de hoje, que chegaria em Carluxo, não disse nada de prestável. Era só pra enxertar com robôs comandados pelo próprio Carlos para bancar o fisiculturista de janela que tem o peito bombado e as pernas de saracura.

Robô não ganha eleição e nem impede Carlos Bolsonaro de ir para prisão.

Este é o balanço daquela live Mandrake de ontem às vésperas da visita da PF à casa de Carluxo.

Moral da história: Bolsonaro, com a live extemporânea, feita a toque de caixa, acabou confessando que, não só tinha, como mantém arapongas dentro da estrutura do Estado, que o informaram, possivelmente, neste domingo, que, na manhã deste segunda-feira, Carlos Bolsonaro receberia a visita da Polícia Federal. Toc toc toc.

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O silêncio dos inocentes ou covardes e o temor dos golpistas

Nem fechar os olhos nem tapar os ouvidos diante do que aconteceu.

Metade ou pouco mais da classe política assiste placidamente e sem manifestar-se à descoberta do esquema gigante de espionagem que funcionou durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, obcecado com ideia de manter-se no poder a qualquer preço.

A outra metade estrebucha na maca, destila ódio e promete reagir por todos os meios com medo de que o aprofundamento das investigações bata à sua porta mais cedo ou mais tarde. Seus alvos preferenciais são, pela ordem, a Justiça, a Polícia Federal e o governo.

Cada um sabe onde lhe apertam os calos. E os que não tem calos a incomodá-los, silenciam porque padecem do mal do corporativismo. Ou porque em ano de eleições não querem pôr em risco alianças com seus pares. Ou porque não se dão conta do risco que também correram.

A espionagem promovida pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) concentrou-se nos adversários dos Bolsonaro e nas instituições que poderiam contrariar os interesses deles de se perpetuar no poder. Afinal, o adversário de amanhã poderia ser o falso amigo de hoje.

Todos que não se alinhavam com os propósitos do clã e dos seus devotos de absoluta confiança foram tratados como potenciais inimigos, a merecer a especial atenção dos arapongas. É o que restará provado quando a lista dos espionados for finalmente revelada.

No dia em que os agentes federais foram buscar a lista na sede da Abin, a nova direção da agência recusou-se a entregá-la. Alegou que a ordem de apreensão assinada pelo ministro Alexandre de Moraes, ministro do Supremo, era vaga, genérica e não especificava a lista.

Então o ministro viu-se obrigado a expedir na mesma hora outra ordem onde deixou claro que mandaria prender quem dificultasse o trabalho de investigação dos agentes federais. Obtida a lista, ela hoje está sendo examinada e dará origem a futuras operações policiais.

*Noblat

 

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ONG espionada pela Abin quer entrar com queixa-crime no STF contra Ramagem

Para a PF, Abin tentou usar um trabalho feito na ONG — que defende acusados de integrar CV e PCC — para ligar ministros do STF e políticos do PT a essas facções.

A ONG Instituto Anjos da Liberdade quer ajuizar uma queixa-crime no Supremo Tribunal Federal contra o deputado Alexandre Ramagem, do PL do Rio de Janeiro, por ter espionado a diretora da organização, Nicole Fabre, e a presidente, a advogada Flávia Fróes.

Segundo o colunista Guilherme Amado, do portal Metrópoles, as investigações da Polícia Federal apontam que a Abin tentou usar um trabalho feito dentro da ONG — que visa defender acusados de integrar o Comando Vermelho e o PCC — para incriminar ministros do Supremo Tribunal Federal e políticos do PT.

A PF suspeita de que, durante o governo de Jair Bolsonaro, a Abin, sob comando de Ramagem, tenha usado o software israelense FirstMile para monitorar, ilegalmente, autoridades públicas como governadores e até integrantes do Supremo Tribunal Federal.

O relatório produzido pela corporação diz que foram produzidos documentos sobre as diligências da Anjos da Liberdade no STF e audiências realizadas no Senado Federal.

A PF ressalta também que a ação de espionagem foi motivada pela ação da ONG na Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 2019, contra Jair Bolsonaro em razão de violações de Direitos Humanos no Sistema Penitenciário Federal.

Fróes disse à reportagem que a ONG, citada no relatório da PF, pediu acesso aos autos e que irá ajuizar uma ação contra Ramagem por espionagem.

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O resgate de um diário: Mércia Albuquerque e a resistência à ditadura

Nos 60 anos do golpe militar, anotações de advogada viram livro e inspiram monólogo de Andrea Beltrão.

Em 2 de abril de 1964, militares amarraram Gregório Bezerra à traseira de um jipe e o arrastaram seminu pelas ruas do Recife. Preso nas primeiras horas do golpe, o ex-deputado foi espancado e exibido como um troféu do novo regime. A brutalidade chocou a jovem advogada Mércia Albuquerque, que presenciou a covardia contra o velho comunista.

“Gregório, apenas com um calção preto e uma corda de três pontas amarrada no pescoço, era arrastado por soldados, seguidos de perto por um carro de combate, com pés que haviam sido banhados em soda cáustica, sangrando”, registrou Mércia. Naquele dia, ela tomou uma decisão: abandonaria o emprego para defender presos políticos.

A advogada virou referência para vítimas do arbítrio em todo o Nordeste. Denunciou torturas, peitou coronéis, ajudou a localizar desaparecidos vivos e mortos. Para aguentar o tranco, despejou suas angústias e num diário secreto, recém-publicado pela Editora Potiguariana. O livro inspira “Lady Tempestade”, monólogo de Andrea Beltrão que tem lotado todas as sessões no Teatro Poeira.

“As prisões continuam indiscriminadamente, revestidas de imensa violência”, escreve Mércia, em outubro de 1973. “O pânico domina o Recife, um terror envolve as universidades. As famílias intranquilas, sem segurança”, prossegue, dias depois. “Não sei até quando vai durar essa chacina”, desespera-se, no mês seguinte.

O leitor acompanha a advogada em peregrinação por cadeias, hospitais e necrotérios. Testemunha sua revolta com os maus-tratos aos presos, que recebiam comida podre e tinham pertences roubados pelos carcereiros. “O DOI é um lugar horrível”, anota. “Os percevejos infestam as celas, o mau cheiro é terrível, restos de fezes, sangue, vômitos dentro da cela”.

Mércia narra o calvário de “homens transformados em bagaços” em ambientes que compara a campos de concentração. “Presos submetidos a tortura medieval, cortes provocados com tesoura e ponta de faca, queimaduras com cigarros, pau de arara, cadeira do dragão”, enumera.

Ela descreve os torturadores como seres necrófilos, que “vibram com a morte” e “explicam os atos anormais como amor à pátria”. Num momento de alívio cômico, reproduz diálogo com o diretor da cadeia de Itamaracá. “Dr. Ednaldo me disse que mais lhe dói a morte de um cavalo do que a de um preso político. Ao que repliquei: ‘Faz muito bem em defender sua espécie. Eu defendo a minha, os homens’”.

A altivez lhe traria problemas com a repressão. Mesmo sem se envolver com a política, ela foi presa 12 vezes. Numa, foi ameaçada com revólver na cabeça. Em outra, arremessada para fora de uma viatura. “Não me arrependo de nada”, escreve a advogada, que morreria em 2003.

Entre testemunhos de coragem, o diário também revela passagens de fraqueza e desespero. “Desejo ficar só para chorar, sinto uma tristeza imensa e me perco no escuro da minha amargura, da minha descrença em tudo”, anota. Com a saúde fragilizada, ela ouve do médico que só conseguirá engravidar se parar de trabalhar. “Luto pelos filhos dos outros, entram em minha vida, amarguram-me a existência e ainda me privam de ter filhos”, ironiza.

Às vésperas dos 60 anos do golpe, o resgate de Mércia joga nova luz sobre a atuação de advogados que resistiram à ditadura. “Nunca deixei de ajudar quem me procura”, orgulha-se a pernambucana, em novembro de 1973. “Levei a paz, devolvi filhos a pais, dei a alegria antes do Natal a cinco lares”, festeja, ao registrar a libertação de cinco clientes no mês seguinte.

*Bernardo Mello Franco/O Globo

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Como vivem os monstros: um panorama da extrema direita

Historiador analisa extremismo na América Latina e na Europa e alerta: a luta antifascista é internacional.

Quando Luiz Inácio Lula da Silva venceu as eleições presidenciais brasileiras em 2022, uma espécie de alívio coletivo tomou conta não apenas do Brasil, mas também da América Latina e, até mesmo, da Europa. Seu antecessor não havia causado apenas graves prejuízos internos – humanos e ambientais – como também havia enfraquecido drasticamente a articulação dos países do continente, enquanto confrontava-se, com frequência, com os países europeus diante das críticas à política oficial de desmatamento e ampliação do garimpo.

Nos meses seguintes, Jair Bolsonaro seria condenado pela justiça eleitoral e transformado em inelegível, enquanto seus aliados mais próximos eram investigados pela Polícia Federal e por uma Comissão do Congresso por tentativa de golpe de Estado. Somada à derrota anterior de Donald Trump e seu semelhante ajuste de contas com as instituições estadunidenses, a onda neofascista, que ascendera em todo mundo, parecia um curto pesadelo prestes a acabar. E então, a Argentina elegeu Javier Milei.

É simbólico que não apenas Jair Bolsonaro, mas também Viktor Orbán, primeiro-ministro da Hungria, estivesse lá. A ausência de qualquer um dos chefes de Estado dos países do G20 também é ilustrativa. Milei nos recorda que a ameaça da extrema direita continua vigente; e que parte desta direita constitui uma espécie de “Internacional do Mal”, antiga pretensão e construção do ex-ideólogo de Trump, Steve Bannon.

Evidentemente, não se trata de um problema latino-americano. Na França, Marine Le Pen, candidata do partido de extrema direita Reunião Nacional (RN), perdeu as eleições presidenciais para Emmanuel Macron. Entretanto, obteve 42,4% dos votos, o melhor resultado de um candidato de extrema direita no país desde 1958.

O partido de extrema direita Irmãos da Itália (FdI) não apenas sextuplicou sua votação e ocupou a maior parte das cadeiras do Parlamento, como sua líder Giorgia Meloni alcançou o cargo de Primeira-ministra.

Na Polônia, o Partido Lei e Justiça perdeu o governo, mas manteve a maioria das cadeiras do Parlamento. Na Holanda, Geert Wilders, um político anti-islâmico e anti-União Europeia, venceu as eleições legislativas, conquistando 37 dos 150 assentos no Parlamento holandês. Isso, sem mencionarmos que a possibilidade de um retorno de Donald Trump à Casa Branca é uma ameaça real e provável.

Como chegamos até aqui?

Em cada um destes países, em cada um destes episódios, nos perguntamos: “como chegamos até aqui?”, “como isso foi possível?”. E, para nenhuma destas perguntas, encontramos respostas simples. Ao contrário, nos encontramos diante de um fenômeno complexo e multifacetado, que exige uma análise aprofundada para compreender suas raízes, dinâmicas e impactos.

Em suas múltiplas aparências, muitos têm sido os rótulos para definir estes movimentos – conservadores, populistas, de direita, etc -, entretanto, o termo neofascista parece apropriado, quando consideramos que tanto suas encarnações modernas quanto o movimento original têm como núcleo dirigente o capital financeiro e uma classe média frustrada e raivosa como sua base social. Mas é capaz de se infiltrar nos setores populares, graças às fragilidades da esquerda e das organizações populares.

Ofensiva neoliberal

Como bem apontam Stefanie Ehmsen e Albert Scharenberg em um estudo para a Fundação Rosa Luxemburgo em 2018, a origem dos novos avanços da extrema direita são resultados da ofensiva neoliberal que acentuou a desigualdade social, agravou a pobreza com políticas de austeridade e ideologicamente transformou inclusive o conceito de “Sociedade”, no melhor estilo de Margaret Thatcher, reduzindo a uma mera aglomeração de indivíduos.

As políticas neoliberais debilitaram a esquerda porque empobreceram, fragmentaram e isolaram suas bases sociais, os trabalhadores e as trabalhadoras. Ao mesmo tempo, promoveram uma ultrafinanceirização, que não apenas tem produzido frequentes colapsos econômicos, como também promove uma acelerada destruição do meio ambiente e amplia as reduções de direitos trabalhistas, como mecanismo para compensar os prejuízos causados por sua própria irracionalidade.

Neofascismo

Para sustentar uma sociedade que comporta apenas 1% de super-ricos, o capital financeiro necessita de políticas cada vez mais repressivas para manter políticas cada vez mais austeras. Portanto, o neofascismo não é um efeito colateral do neoliberalismo, mas sua fase seguinte, necessária para aprofundar e manter as políticas autoritárias na economia ou nos direitos.

Há outras semelhanças entre o velho e o novo fascismo. Ambos se movem por um culto à ação e a recusa à razão – elevada ao negacionismo sanitário ou climático – que nada mais é do que a negação a pensar ou refletir.

O léxico fascista é pobre e suas explicações para quaisquer situações são simples, justamente porque é preciso omitir, ignorar ou negar as contradições. Para impedir que estas contradições produzam um efeito desagregador, é necessário construir uma identidade acima destas contradições.

*Com BdF