Por Ângela Carrato*
Depois de seis anos com golpista no poder e de dois sem Carnaval por causa da pandemia, o Brasil tem, nos próximos três dias, uma festa que nada deixará a dever aos melhores períodos da nossa democracia.
Foram tantas e tamanhas as maldades e perversidades de Temer e Bolsonaro que muita gente quase se esqueceu que Carnaval é alegria, mas é também tempo para debochar e escrachar os canalhas. E exaltar e aplaudir quem merece.
Foi assim no passado e já está sendo assim novamente agora.
Os presidentes campeões no carinho e na lembrança popular são Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek.
Alguns historiadores atribuem a Vargas a criação do sentido nacional em uma festa que não era nossa e tinha tudo para continuar assim.
Ao estimular e premiar as escolas de samba do Rio de Janeiro que tivessem em seus sambas-enredos temas ligados à história e à cultura brasileira, Vargas instituiu a nacionalidade no Carnaval.
Como amava os programas de auditório da Rádio Nacional, com as rainhas Marlene e Emilinha Borba, não demorou para ele próprio virar tema de marchinhas.
De todas que falam sobre Getúlio, a mais conhecida é a do refrão “tira o retrato de velho, bota o retrato do velho de novo na parede”.
Essa manchinha foi sucesso absoluto no Carnaval de 1950, quando Getúlio se preparava para deixar o “exílio” em sua fazenda em São Borja, no Rio Grande do Sul, e disputar as eleições presidenciais daquele ano.
Como se sabe, Getúlio foi derrubado por um golpe militar em 1945. Seus adversários, alojados na UDN, que comemoravam o fim de sua presença na vida pública brasileira, não poderiam imaginar que ele voltaria nos braços do povo. Aliás foi o povão nas ruas e nos improvisados blocos que exigiam que o “retrato do velho” voltasse para a parede.
Outro a merecer o carinho e o reconhecimento dos brasileiros foi JK, “o presidente bossa nova”. Sua luta para desenvolver o Brasil “50 anos em cinco” ficou eternizada em manchinhas e sambas-enredos.
Juscelino deu continuidade ao governo progressista de Getúlio, mostrando-se apoiador e amigo das artes e dos artistas brasileiros.
Para desespero da UDN (os golpistas nas décadas de 1950 e 1960), os brasileiros não escondiam o orgulho com a construção da nova capital, Brasília, e por terem um presidente que se sentava na calçada, em sua cidade natal, Diamantina, para ouvir e cantar serestas com um jovem que veio a se tornar o gigante Milton Nascimento.
Juscelino, o presidente festeiro, alegre e seresteiro, permanece no imaginário dos brasileiros como uma referência de trabalho, seriedade e modernidade.
Posso estar enganada, mas não me recordo de nenhuma manchinha de Carnaval ou samba-enredo exaltando os militares que chegaram ao poder com o golpe de 1964 e lá permaneceram até 1985.
Não me recordo, igualmente, de nenhuma canção carnavalesca que homenageasse presidentes como José Sarney, Fernando Collor ou Fernando Henrique Cardoso.
Collor, ao contrário, virou alvo de repúdio nacional pela roubalheira e
por ter que renunciar ao governo para não ser alvo de impeachment.
Já FHC, com seu ar blasé e mais interessado na vida parisiense, nunca despertou a simpatia da nossa gente sambista e mulata.
Mesmo tendo permanecido apenas dois anos no poder, os carnavais de 2017 e 2018 foram fundamentais para que a imagem de Temer ficasse associada para sempre à de golpista e à de Drácula.
Com feição que lembra caricatura, seu gosto pelas mesóclises, palavreado difícil e a traição à Dilma Rousseff estampada em seu sorriso, Temer tornou-se, com razão, sinônimo de vampiro.
Basta lembrar que os principais atos de seu governo foram a entrega do pré-sal para empresas estrangeiras, as reformas do ensino médio e a trabalhista, e a PEC do fim do mundo, que engessou as finanças e os investimentos públicos.
Não por acaso, os carnavais durante sua passagem pelo Palácio do Planalto foram marcados pelo “Fora Temer” nas ruas e nos desfiles de escolas de samba no Rio de Janeiro.
Pior que esses carnavais foram apenas os ocorridos sob o desgoverno Bolsonaro.
Como se não bastassem todas as atrocidades ditas e cometidas por ele, a pandemia impediu que as pessoas pudessem cantar e aglomerar nas ruas, nem que fosse para tentar espantar os seus males.
Bolsonaro, o imbrochável, o genocida, entra para a história do Brasil como o “pior presidente de todos os tempos”, como o inimigo das mulheres, dos negros, dos índios, dos LGBTGIA+ e dos trabalhadores.
Neste Carnaval, o primeiro após o retorno à democracia e um pouco mais de mês depois de Bolsonaro tentar dar um golpe no governo Lula, o que deve ganhar as ruas é uma espécie de acerto de contas popular com o “Inominável”.
Milhares de bloquinhos vão sair, do Oiapoque ao Chuí, detonando Bolsonaro.
Ele será retratado como o presidente vagabundo, que preferia fazer motociatas a trabalhar. Será retratado como aquele que debochou e imitou pessoas morrendo de covid por falta de ar. Será retratado como o presidente corno, que nunca conseguiu manter a “recatada” Michelle dentro do seu cercadinho e jamais deu conta de botar limites nos filhos.
Ele será retratado como o presidente vagabundo, que preferia fazer motociatas a trabalhar. Será retratado como aquele que debochou e imitou pessoas morrendo de covid por falta de ar. Será retratado como o presidente corno, que nunca conseguiu manter a “recatada” Michelle dentro do seu cercadinho e jamais deu conta de botar limites nos filhos.
Será retratado como o vilão que fugiu para Miami com medo de ser preso e lá continua tramando contra o Brasil e os brasileiros.
Engana-se, no entanto, que acha que o Carnaval 2023 será apenas o do “sem anistia” e ” Bolsonaro na cadeia”.
O Carnaval 2023 será, sobretudo, o do reconhecimento dos brasileiros e brasileiras para com a luta sem tréguas travada pelo presidente Lula.
Em menos de dois meses de governo, ele já venceu uma tentativa de golpe patrocinado por bolsonaristas e setores militares, trouxe de volta programas sociais como o Bolsa Família e o Minha Casa Minha Vida, pôs fim ao genocídio que vinha sendo cometido contra os índios Yanomami, retomou a política externa altiva e ativa, encontrou-se com Alberto Fernández, na Argentina, Biden na Casa Branca, e teve a coragem de falar, alto e em bom som, para a potência imperialista, que o mundo precisa de paz, comprou briga com os rentistas bilionários e com o Banco Central “independente” por causa dos juros estratosféricos praticados no Brasil, os mais altos do mundo.
Lula, neste Carnaval, é tema de uma infinidade de blocos. É homenageado por escolas de samba, como a Cidade Jardim, de Belo Horizonte, mas especialmente estará recebendo o carinho e o reconhecimento popular, através de refrões como “o pai está on” e o “velhinho voltou”.
A voz das ruas está certa. No fundo, ela está dando visibilidade ao que as pesquisas de opinião registram: 93% dos brasileiros são contra os atos terroristas de 8 de janeiro, 70% acham que Bolsonaro está por trás destes atos e 76% consideram que Lula está certo ao combater os juros altos.
Lula pode e deve aproveitar o Carnaval para descansar. Mas seu nome estará nas bocas e no sorriso dos foliões.
Afinal, foi ele que nos liberou do demônio Bolsonaro e devolveu a alegria ao Brasil.
*Ângela Carrato é jornalista e professora do Departamento de Comunicação Social da UFMG
*Viomundo
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