Não se retoma aqui o que já foi exaustivamente dito sobre a campanha suja que levou Bolsonaro ao poder, mas da falta de limite que rege a ganância da elite brasileira que é, em última análise, quem produziu o processo da desnaturação da democracia brasileira, atingindo, sobretudo, a classe média, por ser esta, intelectualmente, a mais frágil e não ter a menor compreensão de seus direitos como cidadã, transformando-se em mero componente do sistema de competitividade.
Lógico, cada indivíduo acredita que, nessa lógica “meritocrática”, terá os méritos superiores aos dos concorrentes.
Mas o fato é outro. As conquistas dos trabalhadores estão sendo mutiladas e o resultado está na própria filosofia de Paulo Guedes ou do presidente do Banco Central, que se disse preocupado com os pobres, mas quer ajudá-los sem atrapalhar a vida dos ricos.
Paulo Guedes foi mais sincero quando disse não ter a menor preocupação com a ampliação do fosso social criado por suas políticas para garantir mais lucros aos banqueiros, rentistas e que a esquerda é que convoque Fidel Castro para dar um jeito na desigualdade que se agravou e muito nesse um ano de governo Bolsonaro. Aliás, não se ouviu da boca do presidente, nesse tempo todo, a palavra povo uma única vez.
Muito sensível com a vida dura dos empresários, mesmo passando a vida mamando nas tetas gostosas do Estado, somado a uma rede de milicianos e seus familiares num assombroso cartel, Bolsonaro mostra sensibilidade somente com o setor privado. Ninguém na mídia pode dizer que isso é uma gigantesca piada, porque hoje ela está nas mãos dos banqueiros, os principais sócios do governo Bolsonaro, os garantes que silenciam o judiciário, a PGR, os militares sobre suas opiniões a respeito do que se tem de notícia de corrupção e crime desse governo.
O Brasil nunca viu as suas instituições tão capturadas pelos donos do dinheiro grosso que, em um ano, ficaram bem mais ricos e, principalmente mais satisfeitos em ver que os brasileiros estão mais pobres. Sim , porque a elite brasileira não é só gananciosa, é mesquinha, antinacionalista e se regozija tanto com o aumento de sua riqueza quanto com o aumento da pobreza no país.
Chega-se a acreditar que essa desigualdade, que é hoje das maiores do mundo, traz muito mais frisson à elite do que o seu próprio acúmulo.
Somente isso justifica o ódio a Lula, já que não houve perdas para os grandes empresários e banqueiros em seu governo, ao contrário, com o Brasil despontando como a 6ª maior economia do mundo, eles ganharam como nunca. Mas mesmo de forma residual, com os pobres se beneficiando da divisão dessa riqueza, com uma série de programas sociais contra a miséria e a fome, a elite se rebelou e patrocinou o golpe contra Dilma e a condenação política de Lula.
Bolsonaro, que é uma combinação política da escória do baixo clero no Congresso, uma espécie de Eduardo Cunha de segunda, transformou-se em Presidente da República. E parece, que quanto mais os crimes de Bolsonaro e sua família são revelados, a elite acha que ele é o homem certo no lugar certo e na hora certa para produzir lucros recordes aos ricos numa economia estagnada entre a recessão e o desemprego galopante, a precarização da mão de obra e o bico como emblema desse pensamento ultraliberal.
A elite quer é que o Estado continue pesando a sua mão, com seus esquadrões da morte fardados, contra negros e pobres nas periferias e favelas do Brasil, assim como o extermínio de índios, pois é isso que faz de Bolsonaro o seu sonho de consumo. A elite brasileira até hoje não conseguiu aceitar a abolição da escravatura, mesmo que isso represente o atraso que o país vivia e a decadência econômica que isso representava.
Estamos diante de um impasse, as instituições completamente falidas para impor regras que funcionem como focinheiras dessa elite selvagem, esperando que o povo, por um motivo qualquer, uma hora rompa o cercado e aconteça nas ruas o estouro da boiada, como se vê em muitos países da América Latina.
É bom sempre frisar que Bolsonaro, no conjunto de sua obra em um ano, retratou com fidedigna precisão, a elite brasileira.
*Carlos Henrique Machado Freitas