De quarentena há 21 dias em São Bernardo do Campo, desde que voltou da Alemanha, “sem por os pés para fora de casa”, o ex-presidente Lula não reclama da vida.
No final da tarde de segunda-feira, ele falou com o UOL por telefone sobre como está passando estes dias, outra vez confinado, agora por conta da pandemia.
A localização da casa alugada é mantida em sigilo, “para evitar aglomerações”, e respeitar o isolamento social imposto pelo Ministério da Saúde.
“Quando eu cheguei, consultei três médicos. Como eu não tinha nenhum sintoma, eles me falaram que não precisava fazer exames, só ficar em casa. Agora estou aqui, na bela companhia da Janjinha (apelido da namorada Rosângela da Silva, que acompanhou a entrevista por telefone). Não posso reclamar de nada. Aqui tem quintal, tem espaço para andar, bem melhor do que a cela em Curitiba, de 15 metros quadrados, onde passei 580 dias”.
Esta semana ele conversou bastante com Fernando Haddad, candidato do PT que o substituiu na última eleição presidencial, um dos articuladores do manifesto dos partidos de oposição que pede a renúncia do presidente Jair Bolsonaro, divulgado na véspera.
“Eu gostei da iniciativa do manifesto, acho que ficou muito bom. Na ideia inicial, era para ser assinado só pelos candidatos à Presidência da República em 2018 (além de Haddad, Ciro Gomes e Guilherme Boulos) e os governadores. Mas alguém vazou o documento enquanto esperavam as assinaturas dos governadores e só acabou entrando o Flávio Dino, do Maranhão, representando o PCdoB. Foi dado um passo importante pelos partidos de oposição porque, além da pandemia, temos um problema grave no Brasil hoje, que é o comportamento do Bolsonaro. Ele é o epicentro da crise que vivemos”.
Nesse ponto da conversa, Lula vira novamente líder da oposição e parte para o ataque como nos velhos tempos.
“Esse homem não respeita a ciência, os pesquisadores, não respeita nada. Para ele, a orientação científica para combater a epidemia vale muito pouco. O maior problema da crise é a falta de gerenciamento, tem que ter um comando centralizado. Ele tinha que conversar com os governadores e prefeitos, os partidos no Congresso, o movimento social, mas Bolsonaro não ouve ninguém, só os filhos e aquele guru dele lá da Virgínia. A oposição vai ter que encontrar um caminho para ver o que fazer com o Bolsonaro porque ele hoje é um perigo, não só para o Brasil, mas para o mundo”.
Aos que estranharam a ausência do nome dele no manifesto, Lula explica que não foi candidato em 2018, e a decisão coube aos partidos.
“O importante foi o Ciro Gomes ter entrado, não era correto eu assinar. PT, PDT, PSOL, PCdoB e o PSB têm-se reunido toda semana. Quando os partidos entenderem que eu devo participar dessas conversas, não terei problema nenhum, estarei pronto para falar com o Ciro. O importante agora é afastar o Bolsonaro”.
Aos 74 anos, Lula quer casar de novo, mas não tem pressa. Habituado a ajudar nos afazeres domésticos desde quando era casado com Marisa Letícia, Lula gosta de cozinhar e vai para a pia lavar pratos. No caso dele, a quarentena já é uma lua de mel.
“Não marcamos o casamento ainda, mas minha vida agora é uma eterna lua de mel. Eu sou um cara agraciado por Deus. Quando tudo parecia esvair-se na minha vida, surgiu a Janjinha”. Por ter o mesmo sobrenome, Lula brinca que ela “já é minha parente há muito tempo…”.
“Ele não quer a verdade. Ele quer criar o caos”, alertou Lula.
O ex-presidente Lula e o ex-ministro da Educação, Fernando Haddad, realizaram uma transmissão ao vivo nesta quarta-feira (25) comentando sobre a crise do novo coronavírus e a postura do presidente Jair Bolsonaro.
Lula criticou duramente a forma com que o ex-capitão tem lidado com o surto da doença e sugeriu o fim do governo. “Ou esse cidadão renuncia, ou faz o impeachment dele, porque não é possível que alguém seja tão irresponsável de brincar com a vida de milhões de pessoas”, declarou.
“Os partidos políticos, não apenas os de esquerda, todos do Congresso Nacional, devem começar a discutir muito seriamente o que vai acontecer com o Bolsonaro”, disse ainda o ex-mandatário.
Para o ex-presidente, o pronunciamento de Bolsonaro foi uma “demonstração de inabilidade política tremenda”. “Ele não estava preocupado com o coronavírus. Ele está preocupado com ele. Estava preocupado com o público a quem ele queria se dirigir para manter o clima de acirramento”, declarou.
“O pronunciamento acirra os ânimos contra governadores e prefeitos”, disse ainda.
Segundo Lula, Bolsonaro nunca fez questão de pensar em todos. “Ele foi eleito por uma parcela e tanta governar tentando dar respostas a uma pequena parcela, sempre com um discurso raivoso”, disse.
O ex-presidente criticou ainda a postura da Confederação Nacional das Indústrias. “O movimento sindical deveria partir pra cima da CNI. Nada que esse governo faz é de graça. Tudo que é feito parece que busca atender os interesses maquiavélicos do presidente da República”, afirmou.
“O duro é que estou aqui e o povo, que está em suposta liberdade, é vítima da maior canalhice jamais vista neste país. Um bando de incompetentes governa o Brasil”
Confiante em uma absolvição, Lula diz não aceitar piedade e que o estado terá de se responsabilizar pelos erros cometidos em seus processos.
Lembra Ricardo Stuckert, eterno retratista do ex-presidente, que eu, Mino Carta, visitei Lula preso em maio de 1980. Estava ele na carceragem do Dops, aos cuidados do delegado Romeu Tuma, que cuidava de trazer à presença do então sindicalista a mulher e os filhos, sem contar que lhe servia frequentemente lulas fritas. Fui visitá-lo em companhia de Raymundo Faoro e, recebidos fidalgamente, tivemos a possibilidade de uma conversa direta com o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo no próprio gabinete de Tuma, do qual o titular se retirou para nos deixar à vontade.
Passaram-se pouco mais de 39 anos e começamos a conversar, agora na Superintendência da PF em Curitiba, a partir dessa lembrança. No fundo, desde então, tudo piorou bastante, com o intervalo de um governo do próprio Lula, de esperanças hoje perdidas. Mas não pelo entrevistado, capaz de crer que, em prazo a ser definido pelo destino, ainda será reconhecido como vítima de um golpe que pretendeu impedir a sua participação nas eleições de 2018 e demonizá-lo, bem como ao seu partido. “A maior canalhice da história deste País”, conforme o injustiçado. A partir deste momento, as perguntas serão, independentemente de quem as fez, de CartaCapital. E o entrevistado receberá o tratamento de senhor, em sinal de respeito.
CartaCapital: Em todas as provas, a essa altura, mostram que você foi atingido como primeiro objetivo do golpe. O golpe começa pela Lava Jato, em 2014, e atingiu o alvo, pra impedir a sua eleição e demonizar você e o seu partido.
Lula: Em dezembro de 2013, logo depois da vitória da Dilma, e eu alertei a direção de que era importante que o PT começasse a dar-se conta do processo de criminalização do partido. O objetivo era tentar, em qualquer hipótese, evitar que houvesse 2018 com uma candidatura do Lula. Nunca consegui compreender por que a Operação Lava Jato, com mais de 200 que já houve, se transformou em uma instituição. Eles esqueceram que era uma operação policial para investigar um determinado tipo de crime e transformaram em uma instituição com o objetivo veementemente político. E está claro o papel preponderante da Secretaria de Justiça dos Estados Unidos. O objetivo final era não me deixar ser candidato, era quebrar as empresas de engenharia no Brasil, quebrar a indústria de gás e óleo, quebrar indústria naval, para que, tal como aconteceu no Iraque, as indústrias americanas e outras indústrias europeias viessem fazer aqui o que as brasileiras faziam. Isso está acontecendo nesse instante.
CC: Nós estamos aí, há quase três meses de revelações do Intercept. Todo dia aparecem novas. Dallagnol poupou uma empresária em troca de uma contribuição para um instituto ligado à Lava Jato. E ele mesmo pretendia ser candidato a senador. Mas até agora ninguém foi punido. A ação contra o Dallagnol foi suspensa no Conselho do Ministério Público. Ainda queríamos que o senhor comentasse o seguinte fato: em todas as pesquisas feitas recentemente, a maioria da população vê erros da Lava Jato, denuncia sua politização, mas acha que está tudo bem o senhor estar preso e o Moro continuar como ministro.
Lula: Nós, seres humanos normais, reagimos de acordo com as informações que nós obtemos. Quando você vai conversar comigo, num jantar à noite, você vai conversar comigo normalmente sobre as coisas que aconteceram durante a semana e não as coisas que vão acontecer no futuro. Então, a sociedade reage de acordo com a quantidade de informações que tem. A política foi demonizada, sempre mais, a começar de 2005 com mais força envolvendo a política e de preferência um partido como o PT.
CC: O Mensalão…
Lula: A partir de 2005, do Mensalão, cuidou-se de demonizar o PT. As pesquisas mostram que a sociedade brasileira está começando a enxergar o que está acontecendo. Até agora, esses canalhas dizem que o desemprego é por conta da Dilma. Eles se esquecem de dizer à opinião pública que, em dezembro de 2014, nós tivemos o menor desemprego da história do País. E que o desemprego começou quando eles começaram a boicotar o governo da Dilma, a partir da indicação do Eduardo Cunha para presidente da Câmara, que tinha como objetivo não permitir que nada que a Dilma fizesse pra melhorar fosse aprovado. Eles se esquecem disso, que eles jogaram o Congresso Nacional pra atrapalhar. Eles se esquecem de que o Aécio Neves é o responsável por parte do ódio que está criado nesse País com a alavancagem da Rede Globo de Televisão. Tudo que é da política não presta, tudo que o PT fez foi errado… E ainda hoje há uma doença na cabeça dessa gente de tentar mostrar que, no período do PT, não aconteceu nada. Pois o período do PT foi o de melhor distribuição de renda, aumento do salário mínimo, geração de emprego. A sociedade vai descobrindo isso. O problema é que a gente, às vezes, tem pressa. Eu, aqui, na minha celinha, fico sempre pensando: a democracia tem um problema, de vez em quando você perde. E quando você perde, quatro anos é muito pouco pra quem ganha, mas muito pra quem perde. Esperar quatro anos pra disputar outra eleição é muito difícil, e pra quem ganha, acaba logo. O PT tem que ter paciência, e ir mostrando para o Brasil que o País pode ser melhor. Nós precisamos trabalhar 24 horas por dia para arejar a cabeça da sociedade, primeiro pra diminuir o ódio, segundo, pra mostrar que o Brasil pode ser governado de forma diferenciada, e mostrar claramente quem é bandido nesse País. Por que eu sou agressivo contra o Moro e sou agressivo contra o Dallagnol? Eles construíram uma mentira, inventaram várias histórias. Eles sabiam que estavam errados. Moro é mentiroso, Dallagnol é mentiroso e que essa gente deveria ser exonerada a bem do serviço público.
Lula sobre Amazônia: “Quem taca fogo são os milicianos do Bolsonaro” Lula: “Esses canalhas dizem que o desemprego é por conta da Dilma” Lula diz que PT errou em 2014: “Colhemos o que plantamos” “Está claro o papel dos EUA na Lava Jato”, diz Lula a CartaCapital Lula ataca Eduardo Bolsonaro por indicação a embaixada: “Um serviçal”
CC: As instâncias que poderiam cuidar disso, principalmente o STF, nada fizeram. Agora, o senhor ainda tem esperança de que o Supremo irá avaliar o caso do senhor com a isenção necessária?
Lula: O dia em que eu perder a esperança, eu pego uma caneta dessa e me dou um tiro de tinta na cabeça. Eu me alimento de esperança, e também da certeza absoluta de que a sociedade brasileira ainda vai ouvir: eu fui vítima da maior canalhice política já cometida no País. Agora tudo isso, Lirio, na minha cabeça, é secundário se o sacrifício que eu estivesse fazendo hoje pudesse resolver o problema do povo brasileiro. Se eu estivesse aqui e o povo estivesse com pleno emprego, tendo aumento de ganhos salariais, estivesse comendo melhor, passeando melhor, morando melhor, estudando melhor… Era um sofrimento pessoal, mas o povo estava bem. Duro é que eu estou aqui e o povo que está em suposta liberdade é prisioneiro de uma canalhice jamais vista nesse País. Com um bando de incompetentes que não conhecem o Brasil, que não sabem o que é governar, porque até agora – oito meses de governo as únicas palavras que eles decoraram no dicionário são “corte” e “ajuste”. E Bolsonaro foi criado assim, ele acredita em toda asneira que fala, em toda bobagem, fala “não, ele está falando bobagem”, nada! Ele acredita naquilo e acha que aquilo é um charme.
CC: Por que o Haddad, na véspera da eleição, se pôs a fazer o elogio do Moro?
Lula: Eu não sei qual foi o contexto e qual foi a pergunta feita pro Haddad. Eu tenho consciência de que tem vários interesses em jogo no momento nesse País. Tem os interesses militares, interesses político empresariais, financeiros, e os interesses políticos. Acho que o interesse maior do chamado setor financeiro e setor empresarial é permitir que o Bolsonaro consiga desmontar os direitos que levamos décadas para conquistar.
CC: Mas por que o Haddad estava elogiando o Moro?
Lula: Repito, eu não sei qual é o contexto em que o Haddad falou. A verdade é que outro dia eu dei uma entrevista para uma moça aqui da BBC brasileira e ela perguntou da Lava Jato. E eu disse que a Lava Jato, enquanto operação, é igual a qualquer outra. Na hora em que virou uma instituição política, ela deixou de ser uma operação de apuração de corrupção pra ser uma operação política com objetivo definido. E aí eu falo pelo meu processo, eu não posso falar pelo processo que eu não conheço. Se tem um canalha que chegou aqui e resolveu se vender e fazer delação e diz que roubou, ele que seja preso pro resto da vida! Agora, o que eu quero saber é o seguinte: todas as pessoas têm direito a um julgamento decente. Toda pessoa tem direito a mostrar provas de crime ou de inocência, então eu pego o meu caso. No meu caso, a Lava Jato mentiu do começo ao fim e ela foi deformada, porque eu acho que muito dinheiro que os empresários falam que foi propina, na verdade era evasão fiscal. Isso, Mino, vai ter que ser apurado.
CC: Vamos lembrar que recentemente o presidente do Supremo, Dias Toffoli, deu uma entrevista à Veja e admitiu que houve um acordo entre militares e empresários com a participação dele e políticos com dois objetivos: impedir que o Bolsonaro fosse derrubado já com quatro meses de governo, e que o senhor fosse mantido preso. Como o senhor avalia uma declaração dessas, ou pelo menos a admissão de que “ele não desmentiu o conteúdo”?
Lula: Faz mais de 30 anos que não leio a Veja. Não acredito em nada que a Veja fala. Nada! Nem se ela falar que o “Lulinha” é santo eu acredito. Vamos analisar a pressão para que eu não fosse candidato. Essa gente não quer que o povo pobre tenha ascensão. Essa gente não quer que os mais pobres frequentem o Parque do Ibirapuera lá em São Paulo. Essa gente não gosta que o povo mais pobre viaje de avião, que tenha acesso a um teatro, à universidade, a um restaurante.
O Brasil está jogando fora a sua soberania, está batendo continência para a bandeira dos EUA. Esse é o mal maior
CC: A casa-grande precisa da senzala.
Lula: Acho que isso fez com que essa gente fosse alimentada desse ódio, só pode ser. Quando deixei a Presidência da República, eu brincava “vou sair com mais de 100% de aprovação”. Porque a última pesquisa do Censo mostrava que eu tinha 87% de bom e ótimo, 10% de regular, se somasse já dava 97%, e 3% de ruim e péssimo, que deve ter sido feito na minha casa, porque os filhos e a Marisa deviam estar de mal comigo. Ou feito lá no comitê do PSDB. Eu lembro que, quando eu deixei a Presidência, em São Paulo eu tinha 88% de bom e ótimo. Esse ódio foi alimentado desde que eu saí da Presidência. Eles sempre tentaram criar uma intriga entre a Dilma e eu, sempre. Não criou porque a Dilma tem uma cabeça boa e não se permitiu criar. Depois, eles começaram a negar a existência do sucesso do nosso governo. Não sei se vocês viram o Jornal Nacional, eu não vi, mas me contaram. Eles falaram do ProUni, das cotas… sem citar o meu nome. Obras de pai desconhecido!
CC: Claramente a deterioração da imagem do apoio ao Bolsonaro é a mais impressionante de qualquer presidente, desde o fim da ditadura. Ele está caindo em todas as áreas, em todos os campos, mas tem uma faixa entre 2 e 5 salários mínimos que ele ainda consegue o maior percentual de apoio. E é uma faixa que justamente teve uma melhora significativa de vida sobre os governos do PT. O que o senhor acha que aconteceu?
Lula: Ele cresce mais entre os mais ricos, é onde ele tem a maior força, no setor médio.
CC: Mas ele perdeu apoio nesse segmento.
Lula: Qualquer coisa que você perguntar vai ter entre 8 e 9%. Eu quando fui reeleito presidente do Sindicato em 98, tive 92% dos votos. Os meus adversários exploravam o fato de que 8% que votaram contra mim. Numa sociedade de 210 milhões de habitantes, você ter 10% que gosta de um fanático sempre vai acontecer. A maioria da sociedade começa a se dar conta do desastre que aconteceu em 2018. Quando Bolsonaro não tem um nome, ele chama um general como se ser general fosse símbolo de competência. O general não é formado pra dirigir a Fazenda ou a Educação. O general é formado pra dirigir as Forças Armadas em proteção à nossa soberania. E a nossa soberania tá sendo jogada fora. O Brasil está batendo continência para a bandeira americana. Esse é o mal maior. Não sei se você lembra, quando há uma guerra no Iraque, ou seja, as empresas que foram reconstruir Iraque eram empresas americanas, e só ia lá quem tinha participado da guerra do lado dos americanos. Pois bem, quem é que está entrando agora para ocupar o lugar das empresas que foram destruídas neste país? Empresas americanas.
CC: O golpe foi dado pelos Poderes da República.
Lula: Eu às vezes fico me perguntando por que nós do PT, em vez de fazer uma ação privilegiada na Câmara e no Senado em relação ao impeachment, não fomos primeiro ao STF. Como eu não sou advogado, não tenho certeza. Eu acho que nós fizemos uma aposta imaginando que tinha maioria no Congresso e nunca tivemos. Quem sabe se a gente tivesse ido à Suprema Corte, o debate fosse em outro nível… e a gente não ficaria se esgarçando como ficamos. Depois que a gente começou, só perdemos votos. Não ganhamos nenhum. Outra coisa, Mino, foi construída neste País a partir de junho de 2013, no começo das grandes manifestações e com a campanha do Aécio Neves, a radicalização. Outro dia eu estava dizendo aqui em uma entrevista que era preciso fazer uma comparação. Em 1999, o Fernando Henrique estava na mesma situação da Dilma em 2015. Ele estava com 8% nas pesquisas da opinião pública, a economia já tinha quebrado duas vezes. Mas o que salvou o Fernando Henrique Cardoso foi que o Temer entrou na presidência da Câmara facilitou a aprovação de todas as reformas que o FHC tentou fazer. O que aconteceu com a Dilma foi o contrário. Ela tinha o Eduardo Cunha, que trabalhou o tempo inteiro com a aprovação de pauta-bomba para dificultar a ação do governo. Então, tudo que a Dilma tentou fazer para reverter a situação, ela não conseguiu. Terminamos 2014 com 4,3% de desemprego.
CC: Mas o senhor acha que o que aconteceu com a Dilma foi só a sabotagem ou foram opções erradas? O ajuste que a Dilma propôs a fazer a partir de 2015 não é um ajuste errado?
Lula: O ajuste da Dilma começou a criar um problema na nossa base. Tudo isso já faz cinco anos, meu caro. O que não pode é essa canalhice ficar… “o Brasil queimou por conta da Dilma”, “o Brasil não sei o que lá por conta da Dilma”, não. Eu, quando ganhei as eleições do FHC, descobri a herança maldita e não fiquei xingando o FHC, fui consertar o Brasil. Quem é eleito é eleito para governar, não é eleito para diagnosticar. O bom médico não é aquele que descobre a doença, o bom médico é aquele que dá o remédio que cura.
CC: O senhor acha que o Bolsonaro completa o mandato? O PT ingressou com um processo de cassação no TSE. Seria um caminho?
Lula: Eu não fico torcendo para a desgraça ser maior do que já é. O meu problema não é o Bolsonaro, o meu problema é o projeto que ele representa. O Bolsonaro cai, com todas as sandices que ele fala, e entra o Mourão. Vai mudar o projeto? Eu estou vendo o Rodrigo Maia tentar se apresentar como primeiro-ministro, mas tudo o que a elite brasileira quer ele aprova na Câmara. O projeto está equivocado, não pensa o Brasil para os brasileiros. Não pensa em 210 milhões de seres humanos. Pensa o sistema financeiro… A Petrobras vai contratar sondas de exploração de petróleo. Vamos gastar 30 bilhões de reais para importar 12 ou 13 sondas, quando a gente poderia fazer aqui no Brasil, gerando emprego, salário, renda, impostos e alegria e orgulho para os brasileiros. Se quem governa é o Bolsonaro, é o Mourão, não importa. Nós não questionamos a vitória logo depois das eleições, deveríamos ter questionado, mas não o fizemos. O cara agora tem um mandato para cumprir. Em nenhum momento ele disse que ia ser eleito para destruir o Brasil. Ele deveria começar a mudar de comportamento e pedir para a sua Polícia Federal, para o seu Ministério Público entregar o Queiroz. Por que o Queiroz está escondido?
CC: Ele mora no Morumbi.
Lula: Se é o Lula, estaria lá o endereço do filho, do neto, do bisneto. O Queiroz foi se esconder aonde? Na Favela da Maré? Em Heliópolis? Não, ele foi se esconder no Morumbi, no antro que protege ele. Então, o meu problema não é pessoal. Eu não tenho problema com o Bolsonaro. Aliás, nem sei se algum dia ele fez algum discurso contra mim na Câmara quando era deputado. Se ele for honesto, ele terá de admitir que fui o presidente que melhor cuidou das Forças Armadas. E não cuidei por medo. Fiz, pois me pergunto: “Para que é que serve as Forças Armadas se não tem uniforme? Se não tem coturno? Se não tem arma? Se não tem preparo? Se não tem inteligência?” Era para defender quase 16 mil quilômetros de fronteira seca, quase 8 mil quilômetros de fronteira marítima, mais o pré-sal, que está na divisa, no limite da divisa marítima do Brasil. Os americanos têm a Quarta Frota e os militares brasileiros, de forma subserviente, aceitam indicar um general para integrá-la. A que ponto chegamos…
CC: O senhor citou a Polícia Federal e o Ministério Público. Hoje, em uma entrevista, o Bolsonaro deixa claro que o atual diretor da Polícia Federal vai ser trocado. E promete nomear um procurador-geral da República “alinhado”. O FHC fez a mesma coisa. Tinha um diretor da PF “alinhado”. Tinha um procurador-geral “alinhado”. Os governos do PT fizeram diferente. Respeitava-se a lista tríplice, deu estrutura e independência. O senhor se arrepende desse republicanismo?
Lula: A gente não pode ser criticado pelas coisas boas. Sou republicano porque eu acho que o Estado não é meu. Ser presidente não é uma profissão, é cumprir uma tarefa. Fui eleito com data para tomar posse e com data para sair. E eu tinha que governar pensando no povo brasileiro e não em mim. Eu falava para o presidente Chávez: “No Brasil, a gente não pode fazer o que você faz”, porque o Brasil não é meu. Não posso indicar para a Suprema Corte um amigo meu. Não posso indicar um procurador amigo. A minha formação política não permitia que eu agisse assim. Tenho falado aqui na sede da Polícia Federal, onde estou detido: “… a Polícia Federal vai se arrepender da bobagem que fez trabalhando para o Collor… Desculpa, Collor… Para o Bolsonaro. O Ministério Público também vai se arrepender”. Quanto mais republicano for o presidente da República, mais autonomia essas instituições vão ter para exercer a sua função. E, quanto mais autonomia tiverem, mais precisam ser responsáveis. Eu não quero um delegado meu amigo. Eu não quero um procurador meu amigo. Eu quero um procurador que seja procurador, que tenha respeito pelo povo, que tenha a capacidade de investigar e de acusar com seriedade, que cumpra o papel constitucional a ele determinado na Constituição. Não é uma República de amigos. Se um dia você, Lirio, ganhar um cargo público, nunca indique para trabalhar com você alguém que não possa mandar embora.
CC: O Bolsonaro pode demitir o Moro?
Lula: O Moro não serve para ser ministro da Justiça. Ele fez um curso de Direito, passou em um concurso, pegou uma toga e só. Esse cara não tem experiência de vida para exercer um cargo político.
“Não torço para a desgraça ser maior do que é. Meu problema não é o Bolsonaro, mas o projeto que ele representa. Se ele cai, entra o Mourão. E daí?”
CC: Mas o senhor acha que o Bolsonaro tem condições políticas, dados os arranjos feitos, para demitir o Moro?
Lula: Eu não sei. Não vou julgar, pois mandar ministro embora é uma questão unicamente do presidente da República. Não vou dar palpite no governo do Bolsonaro.
CC: Gleisi Hoffmann disse que a eleição de 2022 será uma disputa entre Bolsonaro e o PT. O senhor concorda?
Lula: Há um incômodo no meio político. Virou moda agora falar “precisamos acabar com essa polarização entre o PT e não sei quem”. Entre o PT e o Bolsonaro. É engraçado. Quando eram os tucanos que polarizavam conosco, eles não queriam acabar com a polarização. O PT é o maior partido do País. O PT vai ter uma disputa interna agora em 4 mil municípios. São 4 mil diretórios que vão votar na eleição direta para presidente do partido. São quase 2,5 milhões de filiados. O PT não é um amontoado de interesses eleitorais como o PSL. Se o Bolsonaro perder as eleições, o PSL acaba, desmancha que nem farinha. Que nem o PRN do Collor. O Brasil só tem um partido na concepção da palavra, organizado, com decisões nacionais, o PT. Há alguns outros partidos, como o PCdoB, histórico, desde 1922 tem uma briga entre o PCdoB e o PPS para saber quem é mais velho. O restante não passa de siglas eleitorais. Os caras trocam de partido como se trocassem de cueca. Tenho muito orgulho daquilo que o PT fez. E, se o PT errou, pague pelo erro.
CC: Mas o PT não chegou exatamente a criar uma consciência da cidadania em muita gente. Não conseguiu.
Lula: Mino, discuto muito isso com os companheiros. Eu não fui eleito para criar consciência ideológica, mas para governar o Brasil. O PT é que deveria ter tirado proveito das coisas boas que fizemos e conscientizar. Comecei a minha vida política como admirador do PCI. Achava o Partido Comunista Italiano a coisa mais perfeita em termos de organização política. Tive o prazer de sentar à mesa ao lado do Enrico Berlinguer. Eu conheci bem o Partido Comunista Italiano e era muito fã. Depois percebi que ele não passava de 30%, 33%, nas eleições.
“O Zé Alencar como vice foi obra-prima”
CC: Chegou a 36%.
Lula: Eu cheguei à conclusão de que o PCI não queria ganhar as eleições.
CC: Mas havia um projeto de aliança…
Lula: Aconteceu o mesmo com o PT. Quando fui disputar a quarta eleição, tinha a consciência de que não podia ser candidato para ter 30%. Precisava de 50% mais 1. Daí por que eu descobri a minha obra-prima chamada José Alencar. Eu não queria ir a uma festa comemorativa dele. Fui por que o Zé Dirceu me encheu o saco. Aí eu ouvi o discurso do Zé Alencar. Mino, ele falava e eu pensava: “Descobri o meu vice”. Ninguém na história teve um vice da competência do Zé Alencar. Empresário de primeira, ser humano de primeira, alma de primeira. E era de uma honestidade, de uma solidariedade… Mesmo assim, não foi perdoado pela elite. A coisa que mais me deu ódio foi, na campanha da Dilma, ele no estágio final, não aguentava nem ficar em pé por causa do câncer, ver os vizinhos dele, naquele bairro chique em que ele morava, fazer assim (gesto com o polegar para baixo). Sinceramente, tem uma parte da elite que não vale o que come.
CC: Outros tempos.
Lula: Vamos ser francos, a sua geração é um pouquinho mais velha que a minha. Mas a gente é do tempo do Antonio Ermírio de Moraes, do Bardella. Gente que pensava neste País, na indústria. Quem tem hoje? Cite um empresário. Não tem. O Brasil fez uma opção, ainda nos tempo do Collor, de desmontar a indústria. Quando eu cheguei na Presidência, a gente resolveu fazer ferrovia, mas o Brasil não produzia mais trilho. Importava da Polônia, da Itália. Não fazia mais dormente, não tinha mais engenheiro naval, não tinha mais engenheiro ferroviário. Tudo isso nós recriamos. Um país soberano é aquele que toma conta do seu nariz. Não por bravata. A forma de ser importante no mundo é ter conhecimento. Hoje não se é importante por exportar máquinas, por exportar soja, mas por exportar engenharia e conhecimento. Para se transformar em uma nação soberana, o Brasil precisa fazer o contrário do que faz o governo Bolsonaro: acreditar que educação é investimento. Que bolsa para formar gente no exterior não é gasto, é investimento. Que colocar pobre na universidade é investimento. Que fazer os cidadãos comerem três vezes ao dia é investimento. Esses canalhas repetem “aquilo é culpa do PT, o desemprego é culpa do PT”. Devem lavar a boca antes de falar do PT. O Brasil ainda não quebrou por causa dos governos do PT. Se não fosse a nossa decisão de fazer uma reserva cambial de 380 bilhões de dólares, o governo estaria mendigando ao Fundo Monetário Internacional, ao Banco Mundial. O Brasil chegou a ser a sexta economia do mundo e hoje é governado por um presidente orientado por um sujeito que acredita que a Terra é plana. Eu, sinceramente, custo a crer que nos demos esse presente. Ou seja, que o Brasil deu a si próprio um presente tão destruidor. Como se tivesse passado um furacão na Flórida e o Brasil falasse “não, vem para cá”, e trouxe o furacão para cá.
“Haddad tem uma vantagem sobre os outros: estar no maior partido do Brasil”
CC: Esse furacão tem um objetivo. O Paulo Guedes tem manifestado, sempre que pode, a intenção de privatizar a Petrobras. O senhor acha que eles vão conseguir?
Lula: De vez em quando fico nervoso, sabe? O povo brasileiro não sabe ainda os efeitos da Lava Jato na economia brasileira. Tem muitos números sofisticados. Ela precisa destrinchar isso em uma linguagem popular. Nós precisamos dizer para o povo quantos milhões perderam emprego. São quase 50 milhões de brasileiros trabalhando na informalidade, fazendo bico…
CC: Mas isso é uma falha do PT.
Lula: Talvez seja do PT, talvez seja de todo mundo. Temos de informar a sociedade, pois eles recorrem a um discurso fácil. “Ah, na hora que faltou oxigênio, é culpa do PT. Ah, não deu certo, é culpa do PT”. O PT, gostem ou não, produziu a mais extraordinária distribuição de renda no País. Nunca, vou dizer de boca cheia, nunca, em nenhum momento da história, o Brasil viveu um experimento tão extraordinário de ascensão social.
CC: Por que o campo progressista, os partidos ditos de esquerda, não conseguiu capitalizar o descontentamento da sociedade com Bolsonaro?
Lula: Leva um tempo. Tudo é um processo. A vitória de Bolsonaro precisa ser relativizada. Ele teve o apoio de 39% do conjunto da sociedade, 55% dos votos válidos. Ou seja, 61% do povo disseram não ao Bolsonaro. Não é pouca coisa. O que precisamos ter consciência é de que a única coisa que não vale agora é ficar nervoso e dormir todo dia falando “Bolsonaro tem que cair”. Precisamos alertar a sociedade sobre o processo de destruição em andamento e tentar começar a fazer o povo se manifestar para não permitir essa destruição.
“O PCI de Berlinguer era a “mais perfeita organização política”
CC: Quem vai alertar?
Lula: Temos liderança em todos os movimentos. Nós temos gente boa. Foi lançada uma carta ao povo em defesa da soberania. Precisamos dizer para a sociedade que não dá para aceitar um ministro da Educação grosseiro como este. Não dá para aceitar um ministro do Exterior deste naipe. O povo tem de ir para a rua exigir respeito. Não sou contra o Bolsonaro indicar o filho dele. A culpa é do Senado, que vai assumir a responsabilidade. Se o filho fosse um gênio, ao menos um Celso Amorim, tudo bem. Mas indicá-lo porque aprendeu a fritar hambúrguer? Não é possível, precisamos de alguém com um pouco mais de finesse intelectual, de conhecimento de política externa, economia e comércio. A embaixada nos Estados Unidos é a mais importante. Quanto mais independente for o embaixador, melhor. Colocar um serviçal é um erro.
CC: O Haddad desempenha a contento o papel de principal opositor? O senhor está satisfeito com o que ele tem feito?
Lula: O Haddad foi uma surpresa extraordinária para o PT. É um quadro altamente qualificado, como outras lideranças na oposição. O PT tem o Rui Costa, governador na Bahia, estado mais importante do Nordeste, e o Camilo Santana no Ceará. Tem o Flávio Dino, o Ciro Gomes, o companheiro Guilherme Boulos, outros governadores, um monte de gente boa. Qual é a vantagem do Haddad? Ele está no partido mais importante, o que tem mais voto, mais experiência.
CC: Por que o senhor é contra ele assumir a presidência do PT?
Lula: O Haddad saiu fortalecido da eleição presidencial, ele deveria ser alguém com a capacidade de conversar com amplos setores da sociedade, não apenas com o PT. Se ele vira presidente do PT, ficará marcado com a estrela do partido e será mais difícil fazer contato com outras forças políticas. Então, ele tem que ter mais essa facilidade. É isso que eu penso do Haddad. O papel dele é viajar o Brasil, debater com o Brasil, ajudar na formação política, fazer debate no exterior.
“Não sou pombo-correio. Se quiserem colocar uma corrente, coloquem no pescoço do Moro, não na minha canela. Só saio daqui com a minha inocência total”
CC: E elogiar o Moro também, né?
Lula: Sou do tempo em que muita gente elogiava o Moro. Quem criticava eram somente a vítima e os advogados.
CC: CartaCapital também.
Lula: Toda vez que o meu advogado enfrentou o Moro, veio conversar comigo. E a minha decisão foi a seguinte: não tem trégua. Estou aqui há um ano e meio, e isso vai ter um preço quando eu sair daqui. O Estado vai ter de se responsabilizar. Não adianta vir com favor, não estou precisando. Não adianta falar: “Ah, coitado do Lula, ele já tá com 74 anos, deixa ele ir para casa fazer prisão domiciliar”.
CC: O senhor não vai mesmo aceitar?
Lula: Falam “vamos colocar uma tornozeleira nele”. Não sou pombo-correio. Se quiserem colocar uma corrente, coloquem no pescoço do Moro, não na minha canela. Só saio daqui com a minha inocência total. Ou esses canalhas provam que errei ou vou provar que eles são uns canalhas e vão ficar desmoralizados. Fui criado por uma mulher que nasceu e morreu analfabeta, passou fome juntamente com os filhos, mas me deu dignidade e disso eu não abro mão. Dignidade e caráter, Mino, a gente não encontra nos shoppings, aeroportos e supermercados. Dignidade a gente encontra na nossa formação de berço.
O objetivo é dilapidar as nossas riquezas, diz Lula
CC: Se o senhor for inocentado, será candidato em 2022?
Lula: Como é que posso falar? Eu estou com 74 anos. Estou novo. O Mino sabe que eu sou um cara de muita energia. Estou até pensando em casar (risos). Obviamente vai ter gente muito mais nova, com muito mais disposição.
CC: Mais disposição do que você?
Lula: Não sei. Antes eu preciso sair daqui, saber como é que estou, como estão as forças políticas. Obviamente tem um monte de gente de 40, 50, 60 anos que pode ser candidato e eu me contentaria em ser cabo eleitoral, não tem problema. Agora, se não tiver ninguém capaz de derrotar essa podridrão da elite brasileira, pode ficar certo que o Lula estará no jogo.
CC: E será diferente? O senhor sempre foi um conciliador por natureza, até pela história sindical. Acredita ainda em uma conciliação?
Lula: Conciliação haveria se eu tivesse feito uma guerra, matado metade dos adversários e, depois de ganhar, fosse negociar. Mas eu ganhei uma eleição nas circustâncias que aconteceram. De 513 deputados eu tinha 91. De 81 senadores eu tinha 10. Não tem conciliação, você tem de negociar para governar. É assim no mundo inteiro.
“Trump usou os mesmos métodos de Bolsonaro para vencer”
CC: Calma, veja, até a mídia vendeu essa ideia do “Lula é paz e amor”…
Lula: Não, fui eu que vendi essa ideia. O “paz e amor” é uma frase minha, se alguém utilizar indevidamente é plágio. O lado adversário me pintava como demônio. Em 1989, a Igreja Universal fez um jornalzinho com a seguinte manchete: “Lula: o demo”. Se o PT ganhar, se eu ganhar, se a esquerda ganhar, quem ganhar terá de conversar com outras forças políticas. A não ser que faça a maioria na Câmara, no Senado, mude completamente os 11 integrantes da Suprema Corte. Há uma dinastia. Tem uma coisa que a CartaCapital poderia pesquisar: a árvore genealógica dos representantes do Judiciário. Estão aí desde a Independência.
“Se eu fosse chefe da Casa Civil, o Brasil teria dois presidentes”
CC: Mas os governos do senhor e da presidenta Dilma Rousseff tiveram a chance de nomear 13 ministros no Supremo.
Lula: Não tivemos chance… Não é assim que se escolhe. Não se pode fazer indicação de compadrio. Qual foi o critério? Não sou advogado, não conheço os nomes. Consultava gente importante, via o currículo e o histórico. Nunca sentei com alguém para falar: “Olha, você será escolhido, mas terá que votar em mim”. Não tem gente que casa e um mês depois está separado? Não tem time que contrata um jogador por uma fortuna e um mês depois o cara tá fora porque não prestou? Indicamos profissionais da área. Agora, quando o cara bota a toga, ele pode se achar Deus, sabe? Pode pensar “quem é um presidente perto de mim, um governador? Eu sou o fulano de tal”. Tenho o orgulho de nunca ter pedido um favor. Eles não foram indicados para me favorecer, mas para cumprir exatamente o que está escrito na nossa Constituição.
CC: Mas não cumprem.
Lula: Não é culpa minha. O ideal seria que o presidente que indica pudesse destituir em função de um critério. O cara é indicado, tem uma lista de compromissos, se faltar em algum, sai imediatamente.
“O Bolsonaro não vai sobreviver politicamente. Não estou dizendo que ele vai cair hoje ou amanhã, mas não vai sobreviver a uma nova eleição”
CC: O senhor acha que o Trump vai ser reeleito? Qual seria a consequência para para o Brasil e para o Bolsonaro?
Lula: Primeiro vamos ter clareza, o Trump ganhou por ter utilizado a mesma metodologia usada aqui no Brasil em 2018. Ele é resultado do ódio, da discórdia e da mentira. E a Hillary Clinton não era a melhor candidata. Os EUA mereciam algo melhor, como nós. Qualquer um tem a possibilidade de se reeleger se a economia estiver bem. Ou, no caso dos Estados Unidos, se inventar uma guerra, um inimigo externo. O Bolsonaro tenta crescer sobre o Emmanuel Macron para tentar mostrar que é nacionalista. Ele não é nacionalista, é entreguista. Um presidente da República que vai passar para a história por bater continência para a bandeira americana e lambendo as botas do Trump. Não é nacionalista. E os militares que participam desse governo também não são nacionalistas.
CC: O Bolsonaro convocou os brasileiros a saírem de verde no 7 de Setembro para mostrar patriotismo e apoio ao governo. O que o senhor acha?
Lula: Como eu era republicano, eu convidava o povo para ir à rua com a roupa que quisesse. Habitualmente, se você pegar todas as fotografias históricas do 7 de Setembro, tem muita gente de verde e amarelo, com a camisa da Seleção. O povo usa a camisa brasileira com orgulho, não por causa dele. Eles tentaram usurpar o verde-amarelo. A Argentina é uma lição a ser seguida pelos brasileiros. O Macri foi vendido como uma mentira maior do que o Bolsonaro aqui. Aliás, o Bolsonaro se mirava no Macri como espelho do bom governante. Não deu certo. Na minha opinião, o Bolsonaro não vai sobreviver. Não estou dizendo que ele vai cair hoje ou amanhã, mas não vai sobreviver politicamente a uma nova eleição. E acho que os setores progressistas vão retomar vários países, pois seus governos deram certo. Qual é o melhor país da América Latina hoje? A Bolívia.
“Deveríamos imitar a Argentina”
CC: O que o senhor achou da decisão da Cristina Kirchner de, diante da perseguição que vive lá, ter aceitado o posto de vice?
Lula: A Cristina avaliou várias coisas. Acho uma decisão acertada. Muito bem acertada. Espero que dê certo.
“Não fizemos política corretamente. A Dilma, o PT, eu, todos erramos e colhemos o que plantamos. A direita ensadecida agora quer destruir as conquistas sociais”
CC: O senhor se dá conta de que, se tivesse dito para a Dilma quando foi reeleita: “Eu vou ser o seu chefe da Casa Civil”, no lugar de fazer isso quando já era tarde, as coisas seriam diferentes?
Lula: No Palácio do Planalto, em nenhum palácio do mundo, cabem dois presidentes. É preciso saber as circunstâncias que, naquela época, depois da 1 hora da manhã, eu ter dito “sim”. Não achava conveniente politicamente, pois entraria como o salvador da pátria. Mas não vamos discutir isso agora, é desagradável. Se eu tivesse que citar um erro, é o de não ter assumido que eu era candidato em 2014 e não assumi porque gosto da Dilma, respeito ela e democraticamente ela tinha o direito de ser candidata. Depois, querer governar no lugar, não dá, na minha cabeça não dá. Não fizemos política corretamente. A Dilma, o PT, eu, todos erramos e colhemos o que plantamos. A direita ensandecida agora pretende destruir o pouco que tínhamos conquistado na área social.
Nas eleições de outubro passado, Bolsonaro foi eleito presidente com 55,13% dos votos válidos (excluídos brancos, nulos e indecisos). Haddad obteve 44,87%.
Pesquisa Datafolha divulgada nesta segunda-feira (2) mostra que as atitudes de Jair Bolsonaro – que foram manipuladas e escondidas durante a campanha – além de derreterem sua popularidade poderiam influenciar nas eleições de 2018. Segundo o levantamento, caso o segundo turno das eleições fosse hoje, Fernando Haddad (PT) venceria Bolsonaro por 42% a 36% dos votos. Outros 18% votariam branco ou nulo e 4% não souberam responder.
Nas eleições de outubro passado, Bolsonaro foi eleito presidente com 55,13% dos votos válidos (excluídos brancos, nulos e indecisos). Haddad obteve 44,87%.
Segundo o levantamento, entre aqueles que declarararam voto em Bolsonaro no ano passado, 74% manteriam a opção se a eleição fosse hoje. Um total de 10% migraria para Haddad, e 13% votariam branco ou nulo. Já 88% dos eleitores do petista manteriam seu voto hoje. Somam 4% os que mudariam o voto para Bolsonaro e 6% os que votariam nulo ou branco.
Os números divulgados nesta segunda-feira mostram que reprovação do presidente subiu de 33% para 38% em relação ao levantamento anterior do instituto, feito no início de julho.
Outro dado da pesquisa também aponta, pela primeira vez, o abandono dos eleitores mais escolarizados, ou seja, que têm ensino superior. O índice dos que consideram a gestão de Bolsonaro como ruim ou péssima saltou de 36% para 43%.
A pesquisa revela ainda para a queda de desempenho entre aqueles mais ricos, com renda mensal acima de 10 salários mínimos. Neste segmento, a aprovação ao presidente caiu de 52% em julho para 37% agora —bastante significativa, ainda que se mantenha acima da média.
Como tem mostrado os vazamentos do Intercept, o judiciário brasileiro, em parceira com a mídia, trabalha na sombra da noite fora dos anais da legalidade. Isso no Brasil se transformou num sistema que encontrou na grande mídia, sobretudo na Globo, as portas abertas se a vítima do cangaço jurídico for alguém do PT para bani-la da vida pública, como baniram Lula da disputa eleitoral de 2018, numa trama macabra entre Moro e seus capangas da Lava Jato para beneficiar a milícia de Bolsonaro.
Não precisa ser intérprete, astuto para entender o recado que vem nessa condenação de Haddad, a simples escolha da data para a condenação oficial por si só já responde. É uma clara reação fascista à indignação que tem tomado conta de milhões de brasileiros com a prisão política de Lula que completa nesta terça-feira (20) 500 dias.
É essa instituição de justiça que se tornou uma coisa perigosa no país, igualando-se à práticas milicianas ou ao tribunal do crime, querendo mostrar poder acima do que reza a constituição.
Nessa guerra promovida pelo estado policial, a ordem é extinguir, exterminar adversários considerados perigosos para a oligarquia, com o assassinato da reputação via Globo ou com o cárcere político. Essa ditadura estatutária que começou na farsa do mensalão e se ampliou com o partido da Lava Jato, é o retrato de um judiciário brasileiro, hoje, completamente desmoralizado na comunidade jurídica internacional, por suas práticas ocultas e ações clandestinas, em parceria com o baronato midiático.
Evento nesta segunda, 19, contou com presença de Haddad e Boulos e diversos juristas.
Centenas de pessoas participaram na noite desta segunda-feira, 19, na Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, em São Paulo, do lançamento da campanha #MoroMente, organizadada pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD).
Diante da crescente onda de manifestações de apoio de representantes do Judiciário à libertação de Lula e em repúdio às arbitrariedades da Lava Jato, a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) decidiu reforçar a mobilização com o lançamento da campanha #MoroMente.
A iniciativa, apresentada nesta quinta (1º) e cujo ato de lançamento ocorre no próximo dia 19, pretende explicar para a população as razões que comprovam a atuação política, arbitrária e criminosa do ex-juiz em conluio com agentes da operação.
A ação contará com a participação de juristas dispostos a explicar como os envolvidos no escândalo que desmoronou a credibilidade de parte do Judiciário ao atropelar leis e corromper a Constituição.
“A campanha #MoroMente é para mostrar à população quais foram as violações de direitos cometidas pelo ex-juiz, e apontar as mentiras que ele conta para justificar sua atuação criminosa durante a Lava Jato”, reitera o texto publicado pela própria ABDJ.
#MoroMente: Em ato na Faculdade de Direito da USP, no Largo São Francisco, juristas e autoridades homenageiam Lula e denunciam ilegalidades de Moro pic.twitter.com/0llkQSGyyh
A ABJD considera fundamental que a sociedade entenda que os diálogos divulgados são de uma gravidade absoluta, e que Moro e os procuradores da Lava Jato agiam de forma ilegal para atingir pessoas e fins específicos.
Desde que foi flagrado em conversas com o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da operação Lava Jato, Moro insiste em dizer que não reconhece a autenticidade das mensagens, que elas podem ter sido parcial ou totalmente adulteradas e, mais impressionante, que o conteúdo não traz nada de ilegal, e que ilustra a atuação normal de um juiz, comum ao dia a dia de uma operação.
Para a entidade, o discurso do ministro da Justiça é falso e mentiroso, porque “não é normal um juiz antecipar que está faltando determinada prova, sugerir testemunhas, sinalizar quando as ações devem ser realizadas, verificar petições antes que elas sejam protocoladas e façam parte do processo, avisar dos prazos, opinar sobre delações premiadas e combinar ações de investigação de atos processuais”. Escândalos revelados
Considerado o grande herói do combate à corrupção, a imagem mítica de Sergio Moro começou a se desfazer no dia 9 de junho de 2019, quando o portal de notícias The Intercept Brasil lançou uma série de reportagens com as conversas privadas, obtidas de forma anônima, do ex-juiz com o procurador chefe da força-tarefa da Lava Jato Deltan Dallagnol e entre o grupo de procuradores.
As divulgações, em parceria com outros veículos, mostram ao Brasil e ao mundo que as ações da operação eram combinadas e coordenadas entre os membros do Ministério Público Federal, que conduziam as investigações e Moro, que era o responsável pela análise e julgamento dos envolvidos.
Desde então, a ABJD (Associação Brasileira de Juristas pela Democracia) está entre as entidades que busca respostas dos órgãos competentes, e exige medidas rigorosas e necessárias contra os envolvidos.
Marcha reúne mulheres de movimentos sociais na luta em defesa de temas como práticas agroecológicas, políticas de educação e saúde
Trabalhadoras rurais de todo país deram início, na manhã desta quarta-feira (14), à Marcha das Margaridas, manifestação que ocorre desde 2000 reafirmando a defesa de temas voltadas ao campo. A passeata ocorre entre o Pavilhão do Parque da Cidade e o Congresso Nacional. Organizadores estimam público de 100 mil pessoas, o que acabou paralisando o Eixo Monumental na capital.
“Estamos aqui para reivindicar aquilo que é nosso por direito, um país com soberania, justiça e segurança para todas, mas principalmente para as mulheres do campo, da floresta e das águas”, explicou Mariana Janeiro, filósofa, líder RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade) e ativista feminista.
De acordo com Mônica Olinto, secretária-executiva da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais), a Marcha também reafirma “a defesa de temas como práticas agroecológicas, políticas de educação e saúde, combate à violência de gênero e Previdência Social, hoje no centro da principal queda de braço no Congresso Nacional”.
Mariana comentou que este ano o ato realiza um marco histórico, pois conta com a participação de diversas lideranças femininas indígenas. “Grandioso e histórico, é primeira vez que isso acontece em um momento de retrocesso. Então, a gente tem que se acirrar e se juntar nas trincheiras nas fileiras da luta”, completou Mariana.
A última segunda-feira (12) marcou os 36 anos do assassinato de Margarida Maria Alves, símbolo da maior ação de mulheres da América Latina. Por essa razão, milhares de Margaridas de todo o Brasil e de outros 26 países participam da marcha na Esplanada.
O grupo deixou o Pavilhão do Parque da Cidade por volta das 7h30. De lá, seguiu pelo Eixo Monumental, onde chegou a ocupar todas as faixas da via S1. De acordo com Mariana, desde às 5h da manhã já havia pessoas iniciando a mobilização para fazer essa caminhada do Parque do Pavilhão até a Praça dos Três Poderes.
Sociólogo esclarece o drama pré-eleitoral na Argentina e relata como as direitas latino-americanas atuam com as forças imperialistas para manter a divisão dos povos no século XXI.
sociólogo argentino Atilio Boron é um dos intelectuais marxistas mais ativos da América Latina hoje. Seus artigos e livros contribuem para o debate ideológico dos defensores de Nuestra América. Em conversa com Jacobin Brasil, se mostrou otimista com os rumos da política no continente, vê grandes chances do retorno do kirchnerismo na Argentina e uma pronta derrota de Bolsonaro no Brasil. Nesta entrevista, Boron trata de sua mais recente obra, O Feiticeiro da Tribo – Mario Vargas Llosa e o Liberalismo na América Latina (2019), que será publicada em breve no Brasil pela editora Autonomia Literária, onde desconstrói as referências liberais do autor peruano que jamais deveria ter abandonado a literatura para se tornar analista político. Guerras Híbridas, Chernobyl, Netflix, Unasul, realismo mágico, perspectivas políticas, nada passa despercebido aos olhos deste que nos garante: antes de qualquer coisa, é preciso vencer a batalha ideológica.
O kirchnerismo tem chances de voltar ao poder nas eleições presidenciais deste ano na Argentina?
AB – Definitivamente, há possibilidades reais de que o macrismo seja derrotado. De toda forma, é necessário ser cuidadoso porque noto em muitos companheiros, tanto na Argentina quanto no Brasil, um diagnóstico muito economicista da crise. Pensam que diante da clara intensificação da pobreza e do desemprego, com a bancarrota de muitas empresas pequenas e médias, a inflação, que com tudo isso as pessoas automaticamente votarão em uma alternativa ao macrismo. É provável, mas não é certo que as coisas aconteçam assim. Muita gente ainda pensa que, apesar desta crise econômica, as promessas de governo Macri podem ser cumpridas num próximo turno presidencial. Há muita gente neste país que foi conquistada pela “ideologia da festa”. Ou seja, a crença de que na houve uma festa populista na Argentina nos tempos dos Kirchners e chegou o momento de pagar a conta.
Esta é uma narrativa da grande mídia?
AB – É uma narrativa da mídia que tem tido muito êxito não só na Argentina, mas em grande parte da América Latina. No Brasil se escuta algo parecido. É uma coisa séria que pode ser um obstáculo ao triunfo do kirchnerismo. Minha segunda consideração é: o kirchnerismo 2.0 – para usar a linguagem da informática – não é o mesmo que o Kirchnerismo 1.0. Alberto Fernández não é Cristina Fernández Kirchner, é um homem muito mais moderado. Evidentemente terá o apoio de Cristina no Senado, se chegar a ganhar, mas este é um regime presidencialista onde por mais que haja uma grande líderança política como Cristina no Senado – salvo que ela saia a organizar o campo popular, coisa que ainda não tem feito – a pressão do parlamento sobre Alberto Fernández não vai ser suficiente para impulsionar políticas mais radicais.
Por exemplo, Alberto Fernández não está disposto a reinstalar a Lei de Meios que foi revogada por Macri. Alberto Fernández tem uma posição pelo menos ambígua em relação à Venezuela, não está a favor de Juán Guaidó, mas ao mesmo tempo não deixa de falar que há uma ditadura ou uma situação de violação dos Direitos Humanos por lá. Alberto Fernández acredita que a Argentina deve voltar aos seus alinhamentos internacionais tradicionais com os Estados Unidos. Tudo isso evidentemente não era a versão do kirchnerismo 1.0. Mas um setor importante da esquerda argentina está convencido de que não podemos apostar numa fórmula que vá perder para Macri. Se nossa opção for votar no demônio, primeiro elegemos o demônio, depois nos encarregamos de saber o que fazer com ele. O mais importante é acabar com o inimigo principal que está produzindo este verdadeiro holocausto social na Argentina.
No Brasil, onde a esquerda errou ao não apostar todas as fichas em uma só candidatura nas eleições presidenciais?
AB – Eu acredito que este é o erro tradicional das esquerdas em todo o mundo. A direita sabe muito bem o que defende e raramente se equivoca. Além disso, o imperialismo também raramente comete um erro ao identificar o adversário. Já nós, da esquerda, como não temos uma situação de privilégio para defender, e temos que debater planos alternativos para superar o capitalismo, é muito fácil que haja dispersão de votos. E ainda há setores da esquerda que subestimam o imperialismo de forma surpreendente. Aqui na Argentina os setores muito radicalizados não têm a menor noção do que significa o imperialismo e o que significa realmente a dominação capitalista. A partir de um diagnóstico muito abstrato, dizem que Macri e Fernández são dois políticos burgueses. Isso é óbvio. Mas Hitler também era um político burguês, bem como os sociais-democratas alemães, e se comprovou que havia diferenças. Um deles mandou 6 milhões de judeus ao holocausto e desencadeou a Segunda Guerra Mundial, enquanto o outro teria feito uma política muito modicamente reformista, mas não teria produzido esta tragédia. Então existe esta incapacidade de diferenciar as matizes entre um político burguês capaz de produzir um holocausto e um político burguês que vai fazer uma política moderada de reformas sociais. Acredito que no Brasil aconteceu exatamente o mesmo. Claro que Haddad não era Che Guevara e Manuela não era Rosa Luxemburgo.
Este é um tema que Fidel Castro falou muito: é a consciência possível. Ou seja, até que ponto o povo brasileiro está disposto a defender uma proposta revolucionária socialista radical? Com este monopólio dos meios de comunicação, esta enorme vitória ideológica da direita não somente na América Latina, mas em todo o mundo… Há uma população mobilizada disposta para receber esta mensagem e sair a lutar hoje pelo socialismo e pela revolução? Não há! Então se não há, estamos em um processo de construção, temos que ir fazendo aos poucos. Temos que fazer aquilo que Frei Betto chama de “alfabetização política do povo”. E este processo de alfabetização política não foi feito pelas forças progressistas na América Latina.
Com os sucessivos golpes que sofremos nos últimos anos, em Honduras, Paraguai e Brasil, o ciclo progressista está frágil, apesar de alguns países ainda resistirem, como a Venezuela e a Bolívia. Mais recentemente o México passou a integrar este quadro. Se Evo Morales for reeleito e o kirchnerismo voltar ao poder, pode começar uma nova fase da esquerda no continente?
AB –
O ciclo progressista está fraco, mas não morreu. Como você disse, o México se incorpora quase 20 anos depois porque López Obrador tem mais sintonia com Evo, Lula ou Cristina que com Macri ou Bolsonaro. Ou seja, houve retrocessos grandes em países importantes como Argentina e Brasil, mas vai ser possível recuperar de alguma forma a marcha. E nem a Argentina, nem o Brasil, demonstraram até agora ser capazes de estabilizar um processo de reorganização reacionária do capitalismo.
No caso argentino, Macri tem chances muito grandes de perder a eleição. No Brasil, a verdadeira comoção social, econômica e política, coloca o país quase como um ‘Estado canalha’ porque, depois das revelações do The Intercept, Lula teria que ter sido imediatamente posto em liberdade. O Supremo Tribunal do Brasil está discutindo algo que nos Estados Unidos, ou na França ou na Alemanha, teria provocado imediata liberação de Lula. O ciclo progressista tem problemas? Sim! Está morto? Não! O novo ciclo da direita surgiu com força? Não!
Assim como Lula, Cristina Kirchner e Rafael Correa também foram vítimas de lawfare. Os vazamentos do Intercept, ao trazer à tona as inconsistências deste processo brasileiro, podem colocar em xeque o “método Lava Jato” que foi usado em outros países para perseguir lideranças políticas?
AB – Os Estados Unidos decidiram substituir os velhos golpes militares por golpes chamados “brandos”, mas que na verdade são muito violentos. Estes golpes se apoiam em três dispositivos. Primeiro, o controle quase absoluto da imprensa que desempenha um papel fundamental. Segundo, os juízes e os procuradores são treinados durante muito tempo pelos Estados Unidos nos cursos de boas práticas e as consequências disso Sérgio Moro mostrou de forma clara ao condenar Lula não pelas evidências, mas por suas convicções – isso significa um salto para trás de mais de dois séculos na história do Direito moderno. E, em terceiro lugar, estão os legisladores corruptos que também são convidados periodicamente a fazer cursos de boas práticas nos EUA. Este é o tripé que acabou com Manuel Zelaya, Fernando Lugo e Dilma Rousseff.
Há um dado muito interessante: no caso de Lugo e Dilma houve a mesma diretora da orquestra que foi Liliana Ayalde [embaixadora norte-americana]. Liliana Ayalde esteve no Paraguai, montou a operação e foi embora, em seguida retornou como embaixadora no Brasil, em 2013, para fazer exatamente a mesma coisa. Ou seja, é uma pessoa especializada em produzir este tipo de golpe brando.
Os Estados Unidos hoje optam por este tipo de ação que tem um resultado muito mais conveniente porque não é mais necessário apelar à figura odiosa de um militar com a cara de Augusto Pinochet, ditador no Chile entre 1973 e 1990, ou Castelo Branco, ditador no Brasil entre 1964 e 1967.
Então sim, vão aplicar este modelo em toda a América Latina, não só onde esteve a Operação Lava Jato, mas vão aplicá-lo até mesmo em países onde a Odebrecht não esteve presente executando obras públicas. E não se esqueça de uma coisa, toda esta ofensiva não foi destinada apenas a acabar com líderes incômodos para os Estados Unidos, mas também para tirar do jogo a maior empresa latino-americana de construção de obras públicas que era a Odebretch, em favor de empresas americanas como a Halliburton Construction e outras. Não podemos pensar que isso é só um problema político, é também um interesse econômico em acabar com estes governos e abrir espaço para as empresas americanas que vão começar a fazer agora o que a Odebrecht fazia.
Na esteira dos desmontes, há um projeto em curso para desarticular a Unasul e o Brasil tem tido um papel importante neste processo.
AB – A Unasul, originalmente, foi um projeto de Fernando Henrique Cardoso, depois foi retomada e redefinida por Hugo Chávez que atraiu Lula e Néstor Kirchner e gerou uma proposta totalmente diferente. Mas a Unasul é um projeto fundamental para os nossos países, inclusive para o Brasil, e vem de muito longe. O cientista político brasileiro Hélio Jaguaribe tinha uma tese fundamental: segundo ele, ”o Brasil não consegue sozinho”. Quando todos nós pensávamos que o Brasil, poderia se destacar sozinho por suas dimensões, ele dizia que apesar disso, o atraso tecnológico e social do Brasil faz com que a união dos países da América Latina seja absolutamente necessária para potencializar a todos. O Brasil é um país que precisa da energia que sobra da Venezuela, precisa da alimentação que sobra da Argentina, dos minerais do Chile e do Peru, então ele tinha a tese de formar um polígono de resistência. A Unasul vem deste conceito, por isso Fernando Henrique propose Hugo Chávez redefiniu-a, em função da nova realidade do século 21.
Agora, uma das primeiras coisas que o governo Macri fez foi enfraquecer a Unasul. Ou seja, retirar-se, subestimar apoio. E por fim, o supremo traidor da política latino-americana, Lenín Moreno, presidente do Equador, colocou os últimos pregos no ataúde da Unasul. Isso evidentemente reflete o sucesso de um objetivo antigo da Política Externa dos Estados Unidos para o qual qualquer processo de integração sul-americano soa como uma ameaça à hegemonia imperialista.
Toda união dos países de baixo significa enfraquecer o poder imperialista na região. Então não é casualidade que governos absolutamente subordinados aos Estados Unidos, como Macri, Bolsonaro, Sebastián Piñera [Chile], Iván Duque [Colômbia], que são maus governos da América Latina, tenham atacado a Unasul. Obviamente a direita tem muito claro que é preciso manter a divisão dos povos da América Latina. Mas nós vamos ressuscitar a Unasul, e vamos fazê-la melhor, é uma questão de tempo apenas.
Para as gerações que já cresceram nestes países no período progressista e ingressaram na universidade através das políticas públicas, reverter o atual cenário soa como uma tarefa muito difícil. Mas falando contigo, me parece que está bastante otimista…
AB – O Brasil vai dar certo, não há dúvidas sobre isso! Mas é preciso se dar conta que os processos históricos não são lineares. Agora estamos num retrocesso, mas isso vai dar lugar a uma superação. O Brasil não está condenado a ter um governo vergonhoso como o de Bolsonaro. Precisamos nos preparar para a mudança, fazer um exercício de autocrítica, se perguntar por que o Brasil chegou até aqui, reconhecer que houve erros. Houve erros na questão do PT que explicam o desenlace de toda essa situação crítica até chegar em Bolsonaro. Mas o Brasil é um país com imensos recursos e se conseguir organizar a grande massa popular, ainda que parcialmente, poderá recuperar o rumo. Só não pode perder a esperança, a história é assim. O Brasil não está voltando para o ano de 1964, apesar das promessas de voltar à ditadura.
O lema “Lula Livre” é uma agregação social e política muito importante. Mas há novos líderes surgindo, muito capazes, que ainda não se lançaram com tudo para organizar um movimento social e político renovador e isso faz falta. Me preocupa não ver Fernando Haddad cumprindo um papel importante que deveria agora. É uma pessoa muito inteligente, com muita experiência, mas não o vejo agora no primeiro plano da luta política, o vejo fechado nas Universidades como professor. Eu creio que Haddad tem enorme potencial de ser um dos polos de aglutinação da sociedade brasileira. Manuela D’Ávila também é uma pessoa que tem um enorme potencial de liderança. E há outros líderes que não podem ser subestimados, Ciro Gomes não é um personagem qualquer, é um homem que tem um discurso e uma capacidade de interpretação importante; João Pedro Stédile é um fenomenal líder de massas, Guilherme Boulos também. Há toda uma camada de líderes que são uma promessa de que o Brasil pode dar um salto.
Eu entendo a situação de todos eles porque o fenômeno de Bolsonaro era algo totalmente imprevisível. Mas foi uma operação maestra do imperialismo e inclui a famosa facada que, cada vez levanta mais suspeitas de ter sido uma operação cinematográfica. Há suspeitas de que houve cumplicidade dos médicos – que precisam ser denunciados – pois afirmaram que Bolsonaro não poderia participar dos debates quando ele estava claramente em condições de participar. Foi uma conspiração entre os meios de comunicação, os médicos, os juízes e os procuradores que impediram Bolsonaro de ir aos debates porque se ele tivesse ido em apenas um debate com Haddad teria sido um papelão universal e ninguém teria votado nele. Então creio que devemos ter esperança que o Brasil vai encontrar rapidamente seu rumo e o tempo passa rápido. A deterioração de Bolsonaro está nítida, as pesquisas mostram que é o presidente mais impopular nos primeiros seis meses da história do país.
Em seu livro, que em breve será lançado no Brasil, você apresenta Vargas Llosa como um grande romancista que infelizmente usa sua impressionante capacidade com as palavras para manipular a opinião pública e defender o neoliberalismo. Quem é este “Feiticeiro da Tribo”?
AB – A meu ver, Vargas Llosa é hoje o principal propagador do neoliberalismo no mundo. Não só nos países de língua hispânica e portuguesa, mas também nos EUA, na Inglaterra em parte da Europa. Seus artigos publicados periodicamente no El País são reproduzidos em mais de 300 jornais somente na América Latina e no Caribe. É um homem muito hábil, tem um manejo extraordinário da linguagem, seu espanhol é límpido, muito claro, musical, agradável, mas ele o tem colocado a serviço dos piores interesses do imperialismo.
Originalmente Vargas Llosa veio da esquerda, como mostro em meu livro. Ele foi militante de uma célula clandestina do Partido Comunista do Peru e provocou toda esta transformação que passa de uma esquerda marxista dura, à qual ele foi fiel até o ano de 1971. A Revolução Cubana contou com o apoio dele desde 1959 até meados de 1971 e depois lentamente ele foi se afastando, não foi uma ruptura brusca. Mas tem tido um impacto imenso.
No livro “O Chamado da Tribo”, que eu critico, ele aborda os fundamentos teóricos onde está embasada sua concepção liberal. O que eu faço em minha obra, O Feiticeiro da Tribo, é examinar um a um os sete autores fundamentais sobre os quais ele se apoia – Adam Smith, José Ortega y Gasset, Raymond Aron, Friedrich Von Hayek, Karl Popper, Isaiah Berlin, e Jean-François Revel – e mostro as inconsistências.
Capítulo a capítulo mostro que não há nem boa análise empírica, nem argumentação teórica correta. E no último critico a ideia inicial de que liberalismo e democracia são duas caras da mesma moeda. Isso é absolutamente falso. O liberalismo é intrinsecamente inconciliável com a democracia porque como expressão ideológica do capitalismo significa fundamentalmente o individualismo e o princípio da ganância como condutor da organização da vida social. Já a democracia se organiza sobre a base de justiça e igualdade. Portanto são duas instituições que vivem em choque permanente: quanto mais liberalismo existir, menos democracia vamos ter.
Portanto, termino o livro com este capítulo de reflexão mais teórica questionando o que Varga Llosa defende. Claro que ele o diz num espanhol encantador, por isso o chamo de “feiticeiro”. Ele engana com seu jogo de palavras. E aí aproveito uma frase que ele mesmo usa para falar sobre sua tarefa como escritor, ele diz: ”um novelista é um senhor que diz mentiras que parecem verdades”. Isso é o que ele faz em sua obra de ensaios políticos, por isso há tantos ataques brutais contra López Obrador, contra Chávez, Correa, Evo, Cristina e Lula. Por que? Porque ele, como diz Noam Chomsky, é um “mandarim do império” e cumpre muito bem essa função.
A partir da perspectiva brasileira, tenho a sensação de que estamos de costas para a América Latina, apenas a literatura, em especial o boom do realismo mágico do qual Vargas Llosa é um dos precursores, conseguiu atravessar esta fronteira. Isso é um projeto? Seu livro pode contribuir para quebrar esta barreira?
AB – A classe dominante brasileira é uma das mais experimentadas e tem sido muito inteligente e muito perversa em blindar o Brasil e mantê-lo fora da América Latina. Um grande sociólogo e economista brasileiro, Ruy Mauro Marini, dizia que o projeto da direita brasileira é ser o subimpério. É justamente isso, mas este é um projeto mesquinho para um país como o Brasil. Impedir que sua população sequer saiba o que acontece com os vizinhos é uma forma de reforçar sua dominação interna e ao mesmo tempo apostar todas as fichas de que o Brasil será grande nas mãos dos Estados Unidos. Pobrezinho! Os Estados Unidos vão esmagar qualquer país que de alguma forma possa crescer tanto a ponto de ser uma ameaça a seus interesses. Nunca vão permitir que o Brasil seja a grande potência que está destinado a ser, sobretudo se o Brasil seguir se submetendo às regras do imperialismo.
O senhor fala em seu livro sobre como os intelectuais à direita “saem na frente” nesta batalha ideológica porque têm um aparato midiático a seu favor. Quais os caminhos devem trilhar aqueles que permanecem convictos às causas justas?
AB – Hoje temos as redes sociais como uma forma alternativa de se fazer conhecer, mas qualquer bobagem que Varga Llosa faz é reproduzida por pelo menos 300 jornais. Isso é algo absolutamente inalcançável. Porém as coisas estão mudando, e devemos manter viva a esperança. Estamos numa batalha muito desigual, mas como as coisas que estamos dizendo são verdade, ao fim e ao cabo a verdade aparece porque eles não podem tapar a sol com a peneira.
Nosso papel é dizer a verdade e denunciar a mentira, mesmo que não tenhamos um grande aparato midiático, mas cada vez mais temos meios alternativos. Por isso tenho confiança que vamos sair deste mal trecho em que se encontra a América Latina. Perdemos tempo, começamos tarde, Fidel recomendou que começássemos esta batalha na década de 90 e nós começamos 15, 20 anos depois. Burrice!
Temos que dar um empurrão nos intelectuais brasileiros para que parem de achar que Bolsonaro representa um retorno à ditadura de 64, tenho visto um pouco este temor e têm que parar já com isso e convocar as pessoas para que saiam às ruas. É interessante o que estão fazendo Caetano Veloso e Chico Buarque porque através das artes e da música estão avançando mais do que os que se dedicam a escrever. Talvez este seja um bom caminho.
Os tentáculos dos EUA para manipular a opinião pública são muitos e um deles são as produções culturais de massa. Atualmente, por exemplo, uma série sobre Chernobyl tem tido muita audiência. Como o senhor vê estas narrativas supostamente neutras difundidas nas plataformas de streaming?
AB – A guerra híbrida é uma realidade. A lawfare, a judicialização da política, o controle dos meios de comunicação, tudo isso passa a ser absolutamente fundamental. Eu vejo com muita preocupação. Chernobyl no Netflix é um caso perfeito para ilustrar. Eles mostram a degradação moral e política da União Soviética. O objetivo é deixar claro que a União Soviética hoje se chama Rússia. Mas esta série oculta um dado essencial: quando toda a Europa e os EUA lavavam as mãos com relação às vítimas de Chernobyl, houve um país pobre e subdesenvolvido chamado Cuba que atendeu mais de 24 mil crianças atingidas por este acidente nuclear em pleno período especial – fase mais crítica da economia cubana, no começo dos anos 90.
Eu sou o presidente honorário da Efac (Encontro Fraternal Argentino Cubano), através desta instituição estamos terminando um documentário chamado Tarará, que é o nome do hospital onde foram atendidas as crianças de Chernobyl. O objetivo é basicamente contrapor a história difundida pelo Netflix que não diz a verdade sobre o acidente e tampouco menciona o que ainda está acontecendo. Este reator 4 que explodiu ainda segue trabalhando e emitindo radioatividade e a cobertura que fizeram sobre isso é de que a União Europeia não tem dinheiro para reparar isso porque são pelo menos 100 milhões de euros para fazê-lo e os ”miseráveis governos europeus” não querem colocar um peso e querem que a Ucrânia, ou a Rússia, assumam isso sozinhos, e se esse reator chegar a romper vamos ter um Chernobyl novamente. Isso não se fala na série da Netflix e o perigo está aí.
Não podemos evitar que eles digam mentiras, o que nós temos que fazer é dizer a verdade. Uma coisa que me incomoda muito com o governo de Lula no Brasil é que não fez nenhum esforço sério para mexer na comunicação. O governo brasileiro tinha que ter uma rede de comunicação própria e não depender da Rede Globo como aconteceu com Dilma que toda vez que precisava fazer uma declaração ganhava uma migalha de dez minutos antes da novela das 8. Estamos muito mal nesta batalha, o imperialismo é muito criativo. Segundo Chomsky, é o maior projeto de dominação da história. Se nós não reagirmos a tempo teremos problemas graves. É imenso nosso desafio nesta guerra ideológica.
Se, antes, suspeitava-se que a Lava Jato era um grupo político com articulação com membros do Ministério público, ou seja, disfarçado de judiciário, com um juiz que manipulava para influenciar o jogo político e mudar a história política do país, agora, com a certeza, o que mais falta?
As conversas “secretas” intensamente divulgadas pelas redes sociais e até mesmo pela grande mídia, escancaram que a tão venerada Lava Jato, na verdade, atuava marginal à lei. Tudo em nome do combate à corrupção. Foram tão afoitos que saíram atropelando princípios jurídicos básicos e arrombando o estado de direito, de forma a não ter contestação de tão límpidas que são as provas divulgadas.
A Lava Jato, sem o menor pudor e com a certeza da impunidade, usou indevidamente o aparato jurídico para atender interesses políticos. O Código de Ética do Ministério Público, o estatuto da magistratura e a Constituição foram todos burlados. É um caso claro de corrupção.
Da mesma forma, usaram o poder do Estado para interferir nas eleições, o que também está explícito nas conversas entre procuradores. Faltando 12 dias para a eleição, os usurpadores traçaram estratégias para impedir a entrevista de Lula e dificultar a vitória de Haddad.
Vejam o diálogo abaixo:
Acreditava-se que Moro trabalhava como linha auxiliar da acusação, mas ficou claro que ele era o chefe da Lava Jato. Ele dava broncas, cobrava ações e recomendou a Dallagnol que enquadrasse uma procuradora que apresentou mau desempenho nas audiências.
Caravana Lula Livre, comandada pelo ex-ministro da Educação e pela presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann, está em Santarém, Pará.
Comandada pelo ex-ministro da Educação, Fernando Haddad (PT) e pela deputada federal e presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann, a Caravana Lula Livre chegou nesta sexta-feira (24) em Santarém, no Pará.
Ambos participaram de um ato em defesa da educação, na Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA). Em discurso, Haddad ressaltou a relevância das práticas de inclusão dos governos do PT. “A imprensa dizia que nós, com a política de colocar os negros e pobres na universidade, íamos acabar com a qualidade. Falavam que era um lugar de mérito e que não podia entrar qualquer um”, destacou.
“Vocês mostraram para essa elite do que são capazes. Do que foi o dia 15 de maio. Eles acharam que as ruas e a bandeira eram deles. Vocês demonstraram que tem um projeto de país muito mais sofisticado que eles. Eles falavam que a gente ia colocar gente sem inteligência e capacidade na universidade, mas foram eles que colocaram um burro na presidência, que só quer armar a população”, acrescentou Haddad.
O ex-ministro da Educação também ressaltou a importância da luta pela liberdade do ex-presidente Lula, outro objetivo da caravana.
“Fazemos justiça para todos, mas também para cada um. E se tivermos um injustiçado, temos que olhar para ele. E hoje, infelizmente, temos um preso político nesse país, que é o ex-presidente Lula”, afirmou.
Haddad mencionou, ainda, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quinta (23), de criminalizar a homofobia. “Nosso Brasil é o Brasil que se expressou pela decisão de ontem no STF, de que não vamos aceitar nenhuma descriminação ou preconceito”.
Gleisi Hoffmann também destacou a importância da luta pela educação. “Uma das coisas mais importantes é que mudamos o perfil do ensino universitário brasileiro. Hoje, 70% dos alunos vêm de família de baixa renda e isso graças à força da educação da escola pública, que foi importante para que o filho do trabalhador, filho daqueles que dão duro para construir esse país, dos negros, da população indígena pudessem chegar a universidade”, disse Gleisi.