O painel independente criado para investigar a resposta da OMS (Organização Mundial da Saúde) à pandemia de covid-19 anuncia que também irá avaliar governos nacionais. O Brasil, segundo a coluna apurou, será um dos casos principais a serem considerados, por conta do número elevado de óbitos e de contaminações.
De acordo com uma das lideranças do processo, a ex-primeira-ministra da Nova Zelândia, Helen Clark, uma das perguntas a ser colocada aos governos é direta: “como as evidências científicas foram usadas”.
Segundo negociadores ouvidos pela coluna, a iniciativa promete causar constrangimentos entre certos governos, entre eles o do Brasil.
Oficialmente, não há nada que obrigue um país a colaborar com os investigadores. Mas, para a credibilidade do Brasil, uma recusa em cooperar com o comitê que ele mesmo pressionou para que fosse criado poderia ser um golpe forte para um país cuja imagem já convive com o descrédito no exterior.
A decisão de investigar a OMS havia sido incentivada pelo governo de Donald Trump, que acusou a agência de não dar uma resposta à altura da pandemia.
O Brasil foi um dos países que, rapidamente, se somou à proposta americana e pressionou por uma investigação. Jair Bolsonaro ainda tentou incluir no novo órgão criado para realizar o trabalho o ex-ministro da Saúde, Nelson Teich, mas a candidatura foi rejeitada.
A relação OMS-China
Entre os membros do comitê, a percepção é de que um esforço significativo será destinado a entender como foi a relação entre a China e a OMS, principalmente diante das acusações de que a agência teria poupado Pequim de críticas. Emails internos, comunicações e documentos serão avaliados.
“Alguns países lidaram bem com o vírus e deveríamos perguntar o que podemos aprender com eles”, disse Ellen Johnson-Sirleaf, ex-presidente da Libéria e copresidente do painel de investigação.
“Adotaram a máscara universal nos cuidados de saúde e em contextos comunitários, investiram na descoberta de casos, testes, rastreio e capacidades dos sistemas de saúde pública baseados na comunidade, e prepararam os seus sistemas de saúde para lidar com o surto nos casos covid-19”, completou.
Entre as perguntas que serão feitas aos países, a ex-premiê Clark aponta para três delas:
– Como foram definidas estratégias nacionais e subnacionais, e como é que as estratégias para limitar o surto evoluem com o tempo?
– Como têm sido utilizadas as provas científicas ao longo deste processo?
– Como evoluíram as estratégias à medida que se tornaram disponíveis novas provas?
Relembrando o presidente na pandemia
– Ao longo de semanas, Bolsonaro fez questão de minimizar a gravidade da crise. No dia 9 de março, ele declarou que o alerta geral estava “superdimensionado”. Dois dias depois, ele apontou que “outras gripes mataram mais”.
– No dia 17 de março, ele chamou a situação de “histeria” e, três dias depois, a qualificou de “gripezinha”. Durante aquele mês, Bolsonaro ainda acusaria governadores e a imprensa de estarem “enganando” o povo e alertou que “tudo mundo vai morrer um dia”.
– No dia 12 de abril, ele anunciou ainda que o vírus estava “indo embora”. E, no final daquele mês, ainda disse que “não era coveiro” e completou com uma frase, dias depois, ao ser questionado sobre o número elevado de mortes: “e daí?”.
Comitê vai solicitar reuniões com representantes dos países
Mas não serão apenas suas frases que serão avaliadas. O que o comitê quer saber é se as decisões do Ministério da Saúde e do governo levaram em conta as recomendações da ciência e da OMS, ou se as considerações foram outras.
Isso incluirá o exame se houve incentivo para evitar aglomerações, se houve uma comunicação com a população sobre os reais riscos e se líderes políticos deram exemplo.
Para avaliar o Brasil e outros países, o comitê solicitará reuniões com os representantes de cada um dos países, além de documentos e estratégias nacionais.
*Jamil Chade/Uol
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