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New York Times denuncia crescente o autoritarismo de Bolsonaro.

Com a economia aos cacos, rumo a uma tragédia como a Argentina de Macri, o Brasil de Bolsonaro é matéria do New York Times, que acusa a besta fera brasileira de tentar liquidar com direito à oposição e liberdade de expressão no país.

Vendo a crescente onda de críticas a sua fracassada política econômica, Bolsonaro insulta jornalistas, como denuncia o NYT: “para Bolsonaro o jornalismo é um ofício criminoso e os políticos e ativistas que o criticam são considerados inimigos do Estado”.

O jornal ainda denuncia o uso constante de “notícias falsas, a difamação dos adversários do presidente, os ataques a jornalistas, as declarações desde o Palácio do Planalto que incentivam o ódio e as reações dos seguidores mais radicalizados de Bolsonaro.

Na avaliação do NYT, a conduta de Bolsonaro frente à Presidência da República, “está provocando um clima de perseguição e violência insano para uma democracia“, e ainda reforça o risco, cada vez maior, que esta ditadura sutil passe a ser plena.

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Crianças da Maré reagem contra a política de extermínio do genocida Witzel.

O genocida Witzel quer usar como degrau político, o sangue de crianças e jovens negros das favelas do Rio como mostra reportagem do Globo.

“Um dia eu estava no pátio da escola fazendo educação física. De repente, o helicóptero passou dando tiro para baixo. Aí, todo mundo correu para o canto da arquibancada. Quando passou o tiro, a gente correu para dentro da escola até minha mãe me buscar. Quando deu mais tiro, eu estava em casa”, escreve uma criança, moradora do Complexo da Maré, Zona Norte do Rio. A carta está entre as mais de 1.500 que foram entregues por moradores da favela ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) nesta segunda-feira. Eles pedem a volta de uma Ação Civil Pública (ACP) que regulamenta as operações policiais no local. A ação foi suspensa em junho deste ano.

A coordenadora de comunicação da ONG Redes da Maré, Dani Moura, explica que o projeto começou com uma reunião com integrantes da organização. Depois de eles entrarem em contato com parceiros e escolas, foram atrás dos moradores para explicar o que significa a Ação Civil Pública e por que era importante mostrar o que eles vivem.

— O objetivo é tentar sensibilizar os juízes, mostrando o que os moradores sentem e a vivência que temos — explica Dani. — Ter grupos ilícitos e criminosos não pode ser uma desculpa para que os moradores da Maré não tenham direito à segurança pública.

Em junho de 2019, uma sentença da juíza Regina Lucia Chuquer de Almeida Costa Catro, da 6ª Vara da Fazenda Pública da Capital, suspendeu a ACP, que foi requerida em 2016 pela Defensoria Pública estadual após uma operação em junho daquele ano, que terminou com um homem morto e outras seis pessoas baleadas. Na ação, os defensores cobravam mudanças para regulamentar as operações policiais na Maré. Entre outras coisas, era solicitada a presença obrigatória de ambulâncias nas incursões, instalação de câmeras e GPSs nas viaturas e que um protocolo de comunicação fosse estabelecido entre as autoridades de segurança pública e diretores de unidades de ensino e de saúde.

Em 2017, a Justiça concedeu liminar garantindo que essas diretrizes fossem cumpridas. Além disso, duas Instruções Normativas foram publicadas no Diário Oficial acerca do assunto, uma delas em outubro, durante a Intervenção Federal, quando o então secretário de segurança, general Richard Nunes, determinou, por exemplo, que as operações respeitassem horários de maior fluxo de pessoas, em geral no início e no fim do expediente escolar, e o impedimento de disparos em rajadas de helicópteros.

Leia algumas das mais de 1.500 cartas:

“Meu irmão morreu por causa dos policiais”

“Boa tarde. Eu queria que parassem as operações porque muitas famílias serão mortas. Agora, eu estou sem quarto porque vocês destruíram na operação. Todo mundo na minha escola chora, meu irmão morreu por causa dos policiais e eles bateram no meu primo. […] Muito obrigado por ter lido minha carta”.
“Não dá para brincar muito”

“O ruim das operações nas favelas é que não dá para brincar muito. E também morrem moradores nas comunidades. Também têm muita violência”.
“Eles têm que respeitar os horários que as crianças estão na escola”

“Bom… quando tem operação eu não posso ir a lugar nenhum, tenho que ficar no banheiro da minha casa. Quando tem operação e o helicóptero passa atirando para baixo, minha tia vai para minha casa porque, se não, o tiro pode bater lá. É muito ruim… Eles têm que respeitar os horários que as crianças estão na escola ou até mesmo no curso. A maioria das crianças sai 15h, 15h30. Eles podiam entrar 16h e sair 19h ou 20h. Também acho que eles não podem entrar de madrugada porque tem gente que vai trabalhar ou chegar de madrugada”.

“Uma vez deu tanto tiro que me escondi atrás da maquina de lavar”

“(O que) Eu tenho a dizer é que as operações matam muita gente. E essas operações são muito tristes. Uma vez minha mãe saiu para ver minha vó e deu tanto tiro que me escondi atrás da máquina de lavar. É isso que eu tenho a dizer.”

“Não gosto do helicóptero”

“Eu não gosto do helicóptero porque ele atira para baixo e as pessoas morrem”
Criança faz desenho e escreve carta ao TJ dizendo que:
Criança faz desenho e escreve carta ao TJ dizendo que: “não gosta do helicóptero porque ele atira para baixo e as pessoas morrem” Foto: Reprodução

“Estou escrevendo esta carta com uma caneta e não com um fuzil”

“Existem crianças e jovens dentro da comunidade que sonham em se formar médicos, advogados, professores, educadores esportivos, mas esses sonhos são interrompidos quando as ações policiais suspendem suas aulas. Parem e pensem se seus filhos passassem pela mesma situação todos os dias que a ‘bomba estoura’. Lembrem-se que nas comunidades não existe uma ‘fábrica de bandidos’. Cá estou eu escrevendo esta carta com uma caneta e não com um fuzil”.

“Queremos paz na Maré”

“Gostaria que mudasse a forma que eles entram na comunidade. Tenho pavor de escutar o barulho do helicóptero, as crianças se escondem atrás dos cômodos da casa com medo, a forma de bater na nossa residência já é assustadora. Batem, quase derrubam a porta, fazem uma zona nas casas dos moradores que estão trabalhando e, até mesmo quando nós estamos em casa, somos refém desse esculacho que fazem com a gente que mora na favela. Queremos paz na Maré”.

Por nota, a Polícia Militar disse que: “Todas as operações desencadeadas pela Corporação são precedidas por planejamento e seguem rigorosos protocolos de atuação, sempre com objetivo de preservar vidas”. E ressaltou que, em relação ao Complexo da Maré, “Uma área que abriga 16 comunidades que sofrem influência de facções criminosas rivais, as ações exigem um planejamento prévio ainda mais minucioso”. A PM também informou que, de acordo com dados do Instituto de Segurança Pública, houve redução no número de homicídios na região da Maré. Por fim, disse que “Nos sete primeiros meses do ano foram apreendidas quase 200 armas e 10 toneladas de drogas”.

Por nota, o Tribunal de Justiça informou que as cartas foram recebidas, mas que não podem interferir em decisões judiciais. O TJ esclareceu que recursos devem ser apresentados em instância superior.

Algumas das 1.500 cartas

Em carta, criança diz que quarto foi destruído em operação na Maré Foto: Reprodução

Criança moradora da Maré diz que:

Criança que mora no Complexo da Maré reclama da violência em carta Foto: Reprodução

Criança diz que se escondeu atrás de máquina de lavar durante tiroteio Foto: Reprodução

Criança faz desenho e escreve carta ao TJ dizendo que:

 

 

*Com informações do Globo

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Vídeos Haddad com as Margaridas – Mais de 100 mil mulheres: Marcha das Margaridas paralisa Brasília

Marcha reúne mulheres de movimentos sociais na luta em defesa de temas como práticas agroecológicas, políticas de educação e saúde

Trabalhadoras rurais de todo país deram início, na manhã desta quarta-feira (14), à Marcha das Margaridas, manifestação que ocorre desde 2000 reafirmando a defesa de temas voltadas ao campo. A passeata ocorre entre o Pavilhão do Parque da Cidade e o Congresso Nacional. Organizadores estimam público de 100 mil pessoas, o que acabou paralisando o Eixo Monumental na capital.

“Estamos aqui para reivindicar aquilo que é nosso por direito, um país com soberania, justiça e segurança para todas, mas principalmente para as mulheres do campo, da floresta e das águas”, explicou Mariana Janeiro, filósofa, líder RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade) e ativista feminista.

De acordo com Mônica Olinto, secretária-executiva da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais), a Marcha também reafirma “a defesa de temas como práticas agroecológicas, políticas de educação e saúde, combate à violência de gênero e Previdência Social, hoje no centro da principal queda de braço no Congresso Nacional”.

Mariana comentou que este ano o ato realiza um marco histórico, pois conta com a participação de diversas lideranças femininas indígenas. “Grandioso e histórico, é primeira vez que isso acontece em um momento de retrocesso. Então, a gente tem que se acirrar e se juntar nas trincheiras nas fileiras da luta”, completou Mariana.

A última segunda-feira (12) marcou os 36 anos do assassinato de Margarida Maria Alves, símbolo da maior ação de mulheres da América Latina. Por essa razão, milhares de Margaridas de todo o Brasil e de outros 26 países participam da marcha na Esplanada.

O grupo deixou o Pavilhão do Parque da Cidade por volta das 7h30. De lá, seguiu pelo Eixo Monumental, onde chegou a ocupar todas as faixas da via S1. De acordo com Mariana, desde às 5h da manhã já havia pessoas iniciando a mobilização para fazer essa caminhada do Parque do Pavilhão até a Praça dos Três Poderes.

Assista:

https://youtu.be/znCQCgv1wY4?t=2

*Com informações da Forum

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Por que Moro não tinha interesse nos telefones de Cunha, mas no iPad do neto do ex-presidente Lula?

Por Kennedy Alencar

O ministro da Justiça, Sergio Moro, deve explicações ao país por ter orientado os procuradores da força-tarefa da Lava Jato a não apreender os celulares de Eduardo Cunha quando o peemedebista foi preso em 2016.

Reportagem em parceria do “Intercept Brasil” com o “Buzzfeed” trouxe essa revelação. Ora, por que não havia interesse em apreender os celulares? Em todas as fases da Lava Jato, suspeitos eram acordados logo cedo e deveriam entregar os seus celulares de imediato.

Em março, quando entrevistei por telefone Michel Temer no dia da prisão dele, o ex-presidente teve de encerrar a ligação para entregar seu aparelho à Polícia Federal.

Por que Moro não tinha interesse nos telefones de Cunha, mas no iPad do neto do ex-presidente Lula?

Moro é uma figura pública. Ganhou força política e aceitou ser ministro de Bolsonaro pela exposição que a Lava Jato lhe deu. Ele precisa dar explicações ao público. Essa estratégia de desacreditar a autenticidade dos diálogos que compõem o arquivo do “Intercept Brasil” já não se sustenta.

Além do “Intercept Brasil”, outros veículos de comunicação importantes, como “Folha de S.Paulo”, “El País”, “Veja”, “UOL” e agora o “Buzzfeed” já averiguaram os arquivos e constataram a sua autenticidade. Ou todos esses veículos são inimigos da Lava Jato e querem impedir o combate à corrupção no Brasil? Esse é um argumento sério que deve ser usado por uma autoridade pública?

Pelos critérios que Moro e o procurador Deltan Dallagnol usaram na Lava Jato, eles deveriam estar respondendo a eventuais inquéritos, denúncias e processos. Órgãos correcionais deveriam ter adotado medidas.

Moro divulgou em março de 2017 um grampo de conversa da então presidente Dilma com o ex-presidente Lula que havia sido captado após o prazo legal dado para a intercepção. Ele discutiu com Dallagnol o risco legal de divulgar, mas falou depois que valeu a pena. Ouviu reprimenda do então relator da Lava Jato no STF, Teori Zavascki, que considerou a divulgação ilegal. Pediu “excusas”.

Agora o país tem de fechar os olhos para o conteúdo da “Vaza Jato” que expõe o método de poderosos, algo que Moro achava bom quando não era o alvo? O jornalismo tem de valer para todos. A lei tem de valer para todos, inclusive para os aplicadores do direito, que não podem se comportar como justiceiros.

Essa é a encruzilhada: seguir o caminho de uma democracia plena ou de uma república de bananas. Nossas instituições públicas e da sociedade civil e nosso sistema de freios e contrapesos precisam escolher qual trilha seguir.

Boa comparação

Se tem de apurar o que hackers fizeram, tem de investigar o conteúdo das conversas de Moro, Dallagnol e procuradores. Há um lado bom da Lava Jato, mas existe outro sombrio que a opinião pública tem o direito de saber. Essa conversa de que o que foi revelado não tem nada demais é para boi dormir.

O advogado Edson Alfredo Smaniotto já foi desembargador, juiz e promotor. Portanto, já julgou, acusou e defendeu. É também professor de direito penal.

Eis a frase de Smaniotto sobre a importância de um julgamento no qual a defesa tem chance, algo que não aconteceu no julgamento de Lula por Moro no caso do apartamento no Guarujá.

“A imparcialidade é essencial à atividade do juiz. Se ele não for imparcial, é como se não fosse juiz. É como se fosse um padre que reza a missa sem acreditar em Deus. Não vale nada a sua oração”.

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Babando de ódio, Bolsonaro xinga candidato a presidente da Argentina de “bandido” e governadores nordestinos de “cocô”

Depois do Financial Times jogar a toalha na Argentina: “It is game over for Argentina’s President Mauricio Macri” (‘o jogo acabou p/ Maurício Macri…’) considerando a derrota não apenas irreversível, mas humilhante, no Brasil em ataque de ira santa, Bolsonaro voltou a quebrar o decoro da presidência da República ao insultar o povo argentino e os prováveis futuros governantes de um país que é o maior importador de produtos industriais do Brasil. “Bandidos de esquerda começaram a voltar ao poder”, disse ele, no Piauí, onde também chamou governadores nordestinos de “cocô”. Militares tentaram fazer com que ele se calasse, mas Bolsonaro se mostra insano e incontrolável.

Segundo a agencia (Reuters) Ensandecido, Bolsonaro disse nesta quarta-feira que “bandidos de esquerda” começam a voltar ao poder na Argentina, em referência ao resultado das primárias presidenciais no país vizinho, em que o presidente Mauricio Macri, aliado de Bolsonaro, foi derrotado por ampla margem por Alberto Fernández, que tem como candidata a vice a ex-presidente Cristina Kirchner.

Em evento na cidade de Parnaíba, no Piauí, Bolsonaro também disse que a “turma vermelha” será varrida do Brasil nas próximas eleições e que a Argentina começa a trilhar o caminho da Venezuela.

“Olha o que está acontecendo com a Argentina agora. A Argentina está mergulhando no caos. A Argentina começa a trilhar o rumo da Venezuela, porque, nas primárias, bandidos de esquerda começaram a voltar ao poder”, disse o presidente no discurso, transmitido ao vivo em uma rede social.

“Nas próximas eleições, nós vamos varrer essa turma vermelha do Brasil”, afirmou. “Nós juntos vamos varrer a corrupção e o comunismo do Brasil.”

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Saúde

Vídeo: Gatilho para o suicídio; quando a polícia adoece

Epidemia dentro de quartéis e delegacias, as doenças mentais são gatilho para suicídio de responsáveis pela segurança pública.

Uma bala alojada na medula tirou não apenas o movimento das pernas mas também a vontade de viver do soldado reformado da Polícia Militar de São Paulo (PMSP) Júlio César da Silva. Há 15 anos, ao tentar evitar um assalto, ele entrou em confronto com bandidos. Foi baleado em sua última missão oficial como agente da lei, pois o dano irreversível na coluna o deixou dependente de cadeira de rodas para sempre.

O diagnóstico de paraplegia veio acompanhado de uma depressão profunda. Trancado em um quarto escuro, sem se alimentar adequadamente e dormindo somente à base de fortes remédios, ele tomou a decisão radical de se matar. Com a arma em punho apontada para a têmpora, cão acionado e dedo no gatilho, Júlio César desistiu ao lembrar da filha, à época com 1 ano e 8 meses.

“Não gosto de recordar dessa passagem da minha vida. Mas estou aqui para provar que é possível superar esse sofrimento terrível”, declara o praça. Ele, além de reformado na PM paulista, dá expediente no almoxarifado de uma empresa de transporte.

Ao mergulhar em um estado de prostração que quase o levou ao autoflagelo, Júlio César ingressou nos quadros de uma tropa formada por milhares de policiais país afora que adoece silenciosamente. Tabu nas forças de segurança, a depressão nos quartéis e nas delegacias é mais associada à fragilidade do que tratada como doença.

Com vergonha de pedir ajuda, muitos agentes, praças, oficiais e inspetores das mais diversas instituições ligadas ao braço armado do Estado não conseguem vencer o mal sozinhos e acabam se matando.

 

Entre 1999 e 2018, cometeram suicídio 47 agentes e delegados da Polícia Federal. Se fosse um país, a instituição estaria nas primeiras posições do ranking de suicídios, considerando a quantidade de óbitos dessa natureza proporcionalmente comparada ao efetivo, de acordo com o estudo O Trabalho e a Saúde dos Policiais Federais: Análise Clínica do Prazer e do Sofrimento, encomendado pelo Sindicato dos Policiais Federais no DF (Sindpol/DF) a duas psicólogas da Universidade de Brasília (UnB).

Segundo o Ministério da Saúde, no Brasil, são 5,8 suicídios a cada grupo de 100 mil habitantes. Somente na PF, a média sobe para 36,7. No mundo, 14 pessoas se matam a cada 100 mil, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS).

Estresse, desestímulo, jornada excessiva de trabalho e perseguição eram queixas presentes nos discursos de agentes e delegados da corporação que decidiram colocar um ponto-final à própria existência. O agente Eduardo Santana Moreira se encaixa nessa estatística. Em 2015, aos 55 anos, ele vestiu uma camiseta com os dizeres “SOS Policial” e atirou na própria cabeça, dentro da unidade da PF onde estava lotado, em um shopping de Belo Horizonte (MG).

Embora o disparo tenha destruído o palato, os dentes, a língua e a mandíbula, Eduardo milagrosamente permaneceu vivo, em estado vegetativo, até ter o óbito declarado em 19 de setembro de 2016. Para a família, faltou sensibilidade da corporação.

“A PF só entrou em contato comigo na semana do ocorrido porque queriam entender os motivos que o levaram a fazer aquilo. Ele falava muito da falta de acompanhamento psicológico aos servidores, chegou a ter o uso da arma suspenso, mas devolveram”, conta a viúva, Kátia Aparecida Moreira, 52. A filha de Eduardo, Camila Menezes Moreira, 24, tatuou o nome do pai no braço. Ao olhar a assinatura eternizada na pele, ela lembra da última mensagem recebida por ele e não consegue segurar as lágrimas: “Ele me pediu desculpas e disse que me amava”. Deixar recados de despedida é uma atitude relativamente comum entre suicidas.

O comportamento de Eduardo Santana Moreira seguiu o script da maioria das pessoas que se mata, mas raramente é percebido por quem não trabalha na área da psicologia.

“Segundo estudos, quanto mais adversidades no ambiente de trabalho, maior é a incidência de doença mental e, consequentemente, a predisposição para o suicídio. No ambiente policial, mesmo treinados, agentes e militares são submetidos a situações que os levam ao estresse pós-traumático. Associado a outros fatores, isso pode evoluir para a vontade de querer se matar”, destaca a presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), Carmita Abdo.

“O problema se torna maior porque as pessoas em volta do paciente têm dificuldade de entender a dimensão da doença”, complementa a docente.

Uma pesquisa da Fundação Getulio Vargas (FGV) publicada em outubro de 2016, intitulada Expectativa de Vida do Policial Rodoviário Federal, do Policial Federal e do Policial Civil do Distrito Federal, traz dados alarmantes sobre o estado mental dos homens e das mulheres responsáveis por zelar pela integridade dos cidadãos brasileiros.

Quase 95% dos entrevistados disseram ter estresse ocupacional, sendo 39% em grau elevado. Nas três forças mencionadas, 36% alegaram sofrer de algum tipo de doença mental. Ao considerar apenas o recorte da Polícia Civil do DF, esse índice sobe para 42%.

 

*Matéria completa no Metrópoles

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Vídeo explica como Deltan Dallagnol articulou clandestinamente o processo contra Lula

Como o procurador Deltan Dallagnol articulou clandestinamente o processo contra o ex-presidente, resultando em sua prisão sem provas concretas.

Condenado a uma pena de 12 anos por suposto recebimento de propina da empreiteira Odebrecht, caso Lula é marcado por controvérsias e injustiças. Nesta terça-feira (13), os advogados do ex-presidente entraram com habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a suspeição dos procuradores da Lava Jato de Curitiba e a liberdade plena do ex-presidente.

A defesa de Lula sempre sustentou que ele foi condenado sem provas. Com as recentes denúncias do site The Intercept, fica claro que houve uma articulação por parte do procurador chefe da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, com os demais procuradores e o então juiz do caso, Sérgio Moro, para embasar a condenação de Lula.

O vídeo a seguir, publicado no canal do YouTube da Fórum, explica como o procurador Deltan Dallagnol articulou clandestinamente o processo contra Lula, resultando em sua prisão sem provas concretas.

Assista:

 

 

*Com informações da Forum

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Com a Netflix a guerra híbrida é uma realidade

Uma entrevista com
Atilio Boron

Sociólogo esclarece o drama pré-eleitoral na Argentina e relata como as direitas latino-americanas atuam com as forças imperialistas para manter a divisão dos povos no século XXI.

sociólogo argentino Atilio Boron é um dos intelectuais marxistas mais ativos da América Latina hoje. Seus artigos e livros contribuem para o debate ideológico dos defensores de Nuestra América. Em conversa com Jacobin Brasil, se mostrou otimista com os rumos da política no continente, vê grandes chances do retorno do kirchnerismo na Argentina e uma pronta derrota de Bolsonaro no Brasil. Nesta entrevista, Boron trata de sua mais recente obra, O Feiticeiro da Tribo – Mario Vargas Llosa e o Liberalismo na América Latina (2019), que será publicada em breve no Brasil pela editora Autonomia Literária, onde desconstrói as referências liberais do autor peruano que jamais deveria ter abandonado a literatura para se tornar analista político. Guerras Híbridas, Chernobyl, Netflix, Unasul, realismo mágico, perspectivas políticas, nada passa despercebido aos olhos deste que nos garante: antes de qualquer coisa, é preciso vencer a batalha ideológica.

O kirchnerismo tem chances de voltar ao poder nas eleições presidenciais deste ano na Argentina?

AB – Definitivamente, há possibilidades reais de que o macrismo seja derrotado. De toda forma, é necessário ser cuidadoso porque noto em muitos companheiros, tanto na Argentina quanto no Brasil, um diagnóstico muito economicista da crise. Pensam que diante da clara intensificação da pobreza e do desemprego, com a bancarrota de muitas empresas pequenas e médias, a inflação, que com tudo isso as pessoas automaticamente votarão em uma alternativa ao macrismo. É provável, mas não é certo que as coisas aconteçam assim. Muita gente ainda pensa que, apesar desta crise econômica, as promessas de governo Macri podem ser cumpridas num próximo turno presidencial. Há muita gente neste país que foi conquistada pela “ideologia da festa”. Ou seja, a crença de que na houve uma festa populista na Argentina nos tempos dos Kirchners e chegou o momento de pagar a conta.

Esta é uma narrativa da grande mídia?

AB – É uma narrativa da mídia que tem tido muito êxito não só na Argentina, mas em grande parte da América Latina. No Brasil se escuta algo parecido. É uma coisa séria que pode ser um obstáculo ao triunfo do kirchnerismo. Minha segunda consideração é: o kirchnerismo 2.0 – para usar a linguagem da informática – não é o mesmo que o Kirchnerismo 1.0. Alberto Fernández não é Cristina Fernández Kirchner, é um homem muito mais moderado. Evidentemente terá o apoio de Cristina no Senado, se chegar a ganhar, mas este é um regime presidencialista onde por mais que haja uma grande líderança política como Cristina no Senado – salvo que ela saia a organizar o campo popular, coisa que ainda não tem feito – a pressão do parlamento sobre Alberto Fernández não vai ser suficiente para impulsionar políticas mais radicais.

Por exemplo, Alberto Fernández não está disposto a reinstalar a Lei de Meios que foi revogada por Macri. Alberto Fernández tem uma posição pelo menos ambígua em relação à Venezuela, não está a favor de Juán Guaidó, mas ao mesmo tempo não deixa de falar que há uma ditadura ou uma situação de violação dos Direitos Humanos por lá. Alberto Fernández acredita que a Argentina deve voltar aos seus alinhamentos internacionais tradicionais com os Estados Unidos. Tudo isso evidentemente não era a versão do kirchnerismo 1.0. Mas um setor importante da esquerda argentina está convencido de que não podemos apostar numa fórmula que vá perder para Macri. Se nossa opção for votar no demônio, primeiro elegemos o demônio, depois nos encarregamos de saber o que fazer com ele. O mais importante é acabar com o inimigo principal que está produzindo este verdadeiro holocausto social na Argentina.

No Brasil, onde a esquerda errou ao não apostar todas as fichas em uma só candidatura nas eleições presidenciais?

AB – Eu acredito que este é o erro tradicional das esquerdas em todo o mundo. A direita sabe muito bem o que defende e raramente se equivoca. Além disso, o imperialismo também raramente comete um erro ao identificar o adversário. Já nós, da esquerda, como não temos uma situação de privilégio para defender, e temos que debater planos alternativos para superar o capitalismo, é muito fácil que haja dispersão de votos. E ainda há setores da esquerda que subestimam o imperialismo de forma surpreendente. Aqui na Argentina os setores muito radicalizados não têm a menor noção do que significa o imperialismo e o que significa realmente a dominação capitalista. A partir de um diagnóstico muito abstrato, dizem que Macri e Fernández são dois políticos burgueses. Isso é óbvio. Mas Hitler também era um político burguês, bem como os sociais-democratas alemães, e se comprovou que havia diferenças. Um deles mandou 6 milhões de judeus ao holocausto e desencadeou a Segunda Guerra Mundial, enquanto o outro teria feito uma política muito modicamente reformista, mas não teria produzido esta tragédia. Então existe esta incapacidade de diferenciar as matizes entre um político burguês capaz de produzir um holocausto e um político burguês que vai fazer uma política moderada de reformas sociais. Acredito que no Brasil aconteceu exatamente o mesmo. Claro que Haddad não era Che Guevara e Manuela não era Rosa Luxemburgo.

Este é um tema que Fidel Castro falou muito: é a consciência possível. Ou seja, até que ponto o povo brasileiro está disposto a defender uma proposta revolucionária socialista radical? Com este monopólio dos meios de comunicação, esta enorme vitória ideológica da direita não somente na América Latina, mas em todo o mundo… Há uma população mobilizada disposta para receber esta mensagem e sair a lutar hoje pelo socialismo e pela revolução? Não há! Então se não há, estamos em um processo de construção, temos que ir fazendo aos poucos. Temos que fazer aquilo que Frei Betto chama de “alfabetização política do povo”. E este processo de alfabetização política não foi feito pelas forças progressistas na América Latina.

Com os sucessivos golpes que sofremos nos últimos anos, em Honduras, Paraguai e Brasil, o ciclo progressista está frágil, apesar de alguns países ainda resistirem, como a Venezuela e a Bolívia. Mais recentemente o México passou a integrar este quadro. Se Evo Morales for reeleito e o kirchnerismo voltar ao poder, pode começar uma nova fase da esquerda no continente?

AB –

O ciclo progressista está fraco, mas não morreu. Como você disse, o México se incorpora quase 20 anos depois porque López Obrador tem mais sintonia com Evo, Lula ou Cristina que com Macri ou Bolsonaro. Ou seja, houve retrocessos grandes em países importantes como Argentina e Brasil, mas vai ser possível recuperar de alguma forma a marcha. E nem a Argentina, nem o Brasil, demonstraram até agora ser capazes de estabilizar um processo de reorganização reacionária do capitalismo.

No caso argentino, Macri tem chances muito grandes de perder a eleição. No Brasil, a verdadeira comoção social, econômica e política, coloca o país quase como um ‘Estado canalha’ porque, depois das revelações do The Intercept, Lula teria que ter sido imediatamente posto em liberdade. O Supremo Tribunal do Brasil está discutindo algo que nos Estados Unidos, ou na França ou na Alemanha, teria provocado imediata liberação de Lula. O ciclo progressista tem problemas? Sim! Está morto? Não! O novo ciclo da direita surgiu com força? Não!

Assim como Lula, Cristina Kirchner e Rafael Correa também foram vítimas de lawfare. Os vazamentos do Intercept, ao trazer à tona as inconsistências deste processo brasileiro, podem colocar em xeque o “método Lava Jato” que foi usado em outros países para perseguir lideranças políticas?

AB – Os Estados Unidos decidiram substituir os velhos golpes militares por golpes chamados “brandos”, mas que na verdade são muito violentos. Estes golpes se apoiam em três dispositivos. Primeiro, o controle quase absoluto da imprensa que desempenha um papel fundamental. Segundo, os juízes e os procuradores são treinados durante muito tempo pelos Estados Unidos nos cursos de boas práticas e as consequências disso Sérgio Moro mostrou de forma clara ao condenar Lula não pelas evidências, mas por suas convicções – isso significa um salto para trás de mais de dois séculos na história do Direito moderno. E, em terceiro lugar, estão os legisladores corruptos que também são convidados periodicamente a fazer cursos de boas práticas nos EUA. Este é o tripé que acabou com Manuel Zelaya, Fernando Lugo e Dilma Rousseff.

Há um dado muito interessante: no caso de Lugo e Dilma houve a mesma diretora da orquestra que foi Liliana Ayalde [embaixadora norte-americana]. Liliana Ayalde esteve no Paraguai, montou a operação e foi embora, em seguida retornou como embaixadora no Brasil, em 2013, para fazer exatamente a mesma coisa. Ou seja, é uma pessoa especializada em produzir este tipo de golpe brando.

Os Estados Unidos hoje optam por este tipo de ação que tem um resultado muito mais conveniente porque não é mais necessário apelar à figura odiosa de um militar com a cara de Augusto Pinochet, ditador no Chile entre 1973 e 1990, ou Castelo Branco, ditador no Brasil entre 1964 e 1967.

Então sim, vão aplicar este modelo em toda a América Latina, não só onde esteve a Operação Lava Jato, mas vão aplicá-lo até mesmo em países onde a Odebrecht não esteve presente executando obras públicas. E não se esqueça de uma coisa, toda esta ofensiva não foi destinada apenas a acabar com líderes incômodos para os Estados Unidos, mas também para tirar do jogo a maior empresa latino-americana de construção de obras públicas que era a Odebretch, em favor de empresas americanas como a Halliburton Construction e outras. Não podemos pensar que isso é só um problema político, é também um interesse econômico em acabar com estes governos e abrir espaço para as empresas americanas que vão começar a fazer agora o que a Odebrecht fazia.

Na esteira dos desmontes, há um projeto em curso para desarticular a Unasul e o Brasil tem tido um papel importante neste processo.

AB – A Unasul, originalmente, foi um projeto de Fernando Henrique Cardoso, depois foi retomada e redefinida por Hugo Chávez que atraiu Lula e Néstor Kirchner e gerou uma proposta totalmente diferente. Mas a Unasul é um projeto fundamental para os nossos países, inclusive para o Brasil, e vem de muito longe. O cientista político brasileiro Hélio Jaguaribe tinha uma tese fundamental: segundo ele, ”o Brasil não consegue sozinho”. Quando todos nós pensávamos que o Brasil, poderia se destacar sozinho por suas dimensões, ele dizia que apesar disso, o atraso tecnológico e social do Brasil faz com que a união dos países da América Latina seja absolutamente necessária para potencializar a todos. O Brasil é um país que precisa da energia que sobra da Venezuela, precisa da alimentação que sobra da Argentina, dos minerais do Chile e do Peru, então ele tinha a tese de formar um polígono de resistência. A Unasul vem deste conceito, por isso Fernando Henrique propose Hugo Chávez redefiniu-a, em função da nova realidade do século 21.

Agora, uma das primeiras coisas que o governo Macri fez foi enfraquecer a Unasul. Ou seja, retirar-se, subestimar apoio. E por fim, o supremo traidor da política latino-americana, Lenín Moreno, presidente do Equador, colocou os últimos pregos no ataúde da Unasul. Isso evidentemente reflete o sucesso de um objetivo antigo da Política Externa dos Estados Unidos para o qual qualquer processo de integração sul-americano soa como uma ameaça à hegemonia imperialista.

Toda união dos países de baixo significa enfraquecer o poder imperialista na região. Então não é casualidade que governos absolutamente subordinados aos Estados Unidos, como Macri, Bolsonaro, Sebastián Piñera [Chile], Iván Duque [Colômbia], que são maus governos da América Latina, tenham atacado a Unasul. Obviamente a direita tem muito claro que é preciso manter a divisão dos povos da América Latina. Mas nós vamos ressuscitar a Unasul, e vamos fazê-la melhor, é uma questão de tempo apenas.

Para as gerações que já cresceram nestes países no período progressista e ingressaram na universidade através das políticas públicas, reverter o atual cenário soa como uma tarefa muito difícil. Mas falando contigo, me parece que está bastante otimista…

AB – O Brasil vai dar certo, não há dúvidas sobre isso! Mas é preciso se dar conta que os processos históricos não são lineares. Agora estamos num retrocesso, mas isso vai dar lugar a uma superação. O Brasil não está condenado a ter um governo vergonhoso como o de Bolsonaro. Precisamos nos preparar para a mudança, fazer um exercício de autocrítica, se perguntar por que o Brasil chegou até aqui, reconhecer que houve erros. Houve erros na questão do PT que explicam o desenlace de toda essa situação crítica até chegar em Bolsonaro. Mas o Brasil é um país com imensos recursos e se conseguir organizar a grande massa popular, ainda que parcialmente, poderá recuperar o rumo. Só não pode perder a esperança, a história é assim. O Brasil não está voltando para o ano de 1964, apesar das promessas de voltar à ditadura.

O lema “Lula Livre” é uma agregação social e política muito importante. Mas há novos líderes surgindo, muito capazes, que ainda não se lançaram com tudo para organizar um movimento social e político renovador e isso faz falta. Me preocupa não ver Fernando Haddad cumprindo um papel importante que deveria agora. É uma pessoa muito inteligente, com muita experiência, mas não o vejo agora no primeiro plano da luta política, o vejo fechado nas Universidades como professor. Eu creio que Haddad tem enorme potencial de ser um dos polos de aglutinação da sociedade brasileira. Manuela D’Ávila também é uma pessoa que tem um enorme potencial de liderança. E há outros líderes que não podem ser subestimados, Ciro Gomes não é um personagem qualquer, é um homem que tem um discurso e uma capacidade de interpretação importante; João Pedro Stédile é um fenomenal líder de massas, Guilherme Boulos também. Há toda uma camada de líderes que são uma promessa de que o Brasil pode dar um salto.

Eu entendo a situação de todos eles porque o fenômeno de Bolsonaro era algo totalmente imprevisível. Mas foi uma operação maestra do imperialismo e inclui a famosa facada que, cada vez levanta mais suspeitas de ter sido uma operação cinematográfica. Há suspeitas de que houve cumplicidade dos médicos – que precisam ser denunciados – pois afirmaram que Bolsonaro não poderia participar dos debates quando ele estava claramente em condições de participar. Foi uma conspiração entre os meios de comunicação, os médicos, os juízes e os procuradores que impediram Bolsonaro de ir aos debates porque se ele tivesse ido em apenas um debate com Haddad teria sido um papelão universal e ninguém teria votado nele. Então creio que devemos ter esperança que o Brasil vai encontrar rapidamente seu rumo e o tempo passa rápido. A deterioração de Bolsonaro está nítida, as pesquisas mostram que é o presidente mais impopular nos primeiros seis meses da história do país.

Em seu livro, que em breve será lançado no Brasil, você apresenta Vargas Llosa como um grande romancista que infelizmente usa sua impressionante capacidade com as palavras para manipular a opinião pública e defender o neoliberalismo. Quem é este “Feiticeiro da Tribo”?

AB – A meu ver, Vargas Llosa é hoje o principal propagador do neoliberalismo no mundo. Não só nos países de língua hispânica e portuguesa, mas também nos EUA, na Inglaterra em parte da Europa. Seus artigos publicados periodicamente no El País são reproduzidos em mais de 300 jornais somente na América Latina e no Caribe. É um homem muito hábil, tem um manejo extraordinário da linguagem, seu espanhol é límpido, muito claro, musical, agradável, mas ele o tem colocado a serviço dos piores interesses do imperialismo.

Originalmente Vargas Llosa veio da esquerda, como mostro em meu livro. Ele foi militante de uma célula clandestina do Partido Comunista do Peru e provocou toda esta transformação que passa de uma esquerda marxista dura, à qual ele foi fiel até o ano de 1971. A Revolução Cubana contou com o apoio dele desde 1959 até meados de 1971 e depois lentamente ele foi se afastando, não foi uma ruptura brusca. Mas tem tido um impacto imenso.

No livro “O Chamado da Tribo”, que eu critico, ele aborda os fundamentos teóricos onde está embasada sua concepção liberal. O que eu faço em minha obra, O Feiticeiro da Tribo, é examinar um a um os sete autores fundamentais sobre os quais ele se apoia – Adam Smith, José Ortega y Gasset, Raymond Aron, Friedrich Von Hayek, Karl Popper, Isaiah Berlin, e Jean-François Revel – e mostro as inconsistências.

Capítulo a capítulo mostro que não há nem boa análise empírica, nem argumentação teórica correta. E no último critico a ideia inicial de que liberalismo e democracia são duas caras da mesma moeda. Isso é absolutamente falso. O liberalismo é intrinsecamente inconciliável com a democracia porque como expressão ideológica do capitalismo significa fundamentalmente o individualismo e o princípio da ganância como condutor da organização da vida social. Já a democracia se organiza sobre a base de justiça e igualdade. Portanto são duas instituições que vivem em choque permanente: quanto mais liberalismo existir, menos democracia vamos ter.

Portanto, termino o livro com este capítulo de reflexão mais teórica questionando o que Varga Llosa defende. Claro que ele o diz num espanhol encantador, por isso o chamo de “feiticeiro”. Ele engana com seu jogo de palavras. E aí aproveito uma frase que ele mesmo usa para falar sobre sua tarefa como escritor, ele diz: ”um novelista é um senhor que diz mentiras que parecem verdades”. Isso é o que ele faz em sua obra de ensaios políticos, por isso há tantos ataques brutais contra López Obrador, contra Chávez, Correa, Evo, Cristina e Lula. Por que? Porque ele, como diz Noam Chomsky, é um “mandarim do império” e cumpre muito bem essa função.

A partir da perspectiva brasileira, tenho a sensação de que estamos de costas para a América Latina, apenas a literatura, em especial o boom do realismo mágico do qual Vargas Llosa é um dos precursores, conseguiu atravessar esta fronteira. Isso é um projeto? Seu livro pode contribuir para quebrar esta barreira?

AB – A classe dominante brasileira é uma das mais experimentadas e tem sido muito inteligente e muito perversa em blindar o Brasil e mantê-lo fora da América Latina. Um grande sociólogo e economista brasileiro, Ruy Mauro Marini, dizia que o projeto da direita brasileira é ser o subimpério. É justamente isso, mas este é um projeto mesquinho para um país como o Brasil. Impedir que sua população sequer saiba o que acontece com os vizinhos é uma forma de reforçar sua dominação interna e ao mesmo tempo apostar todas as fichas de que o Brasil será grande nas mãos dos Estados Unidos. Pobrezinho! Os Estados Unidos vão esmagar qualquer país que de alguma forma possa crescer tanto a ponto de ser uma ameaça a seus interesses. Nunca vão permitir que o Brasil seja a grande potência que está destinado a ser, sobretudo se o Brasil seguir se submetendo às regras do imperialismo.

O senhor fala em seu livro sobre como os intelectuais à direita “saem na frente” nesta batalha ideológica porque têm um aparato midiático a seu favor. Quais os caminhos devem trilhar aqueles que permanecem convictos às causas justas?

AB – Hoje temos as redes sociais como uma forma alternativa de se fazer conhecer, mas qualquer bobagem que Varga Llosa faz é reproduzida por pelo menos 300 jornais. Isso é algo absolutamente inalcançável. Porém as coisas estão mudando, e devemos manter viva a esperança. Estamos numa batalha muito desigual, mas como as coisas que estamos dizendo são verdade, ao fim e ao cabo a verdade aparece porque eles não podem tapar a sol com a peneira.

Nosso papel é dizer a verdade e denunciar a mentira, mesmo que não tenhamos um grande aparato midiático, mas cada vez mais temos meios alternativos. Por isso tenho confiança que vamos sair deste mal trecho em que se encontra a América Latina. Perdemos tempo, começamos tarde, Fidel recomendou que começássemos esta batalha na década de 90 e nós começamos 15, 20 anos depois. Burrice!

Temos que dar um empurrão nos intelectuais brasileiros para que parem de achar que Bolsonaro representa um retorno à ditadura de 64, tenho visto um pouco este temor e têm que parar já com isso e convocar as pessoas para que saiam às ruas. É interessante o que estão fazendo Caetano Veloso e Chico Buarque porque através das artes e da música estão avançando mais do que os que se dedicam a escrever. Talvez este seja um bom caminho.

Os tentáculos dos EUA para manipular a opinião pública são muitos e um deles são as produções culturais de massa. Atualmente, por exemplo, uma série sobre Chernobyl tem tido muita audiência. Como o senhor vê estas narrativas supostamente neutras difundidas nas plataformas de streaming?

AB – A guerra híbrida é uma realidade. A lawfare, a judicialização da política, o controle dos meios de comunicação, tudo isso passa a ser absolutamente fundamental. Eu vejo com muita preocupação. Chernobyl no Netflix é um caso perfeito para ilustrar. Eles mostram a degradação moral e política da União Soviética. O objetivo é deixar claro que a União Soviética hoje se chama Rússia. Mas esta série oculta um dado essencial: quando toda a Europa e os EUA lavavam as mãos com relação às vítimas de Chernobyl, houve um país pobre e subdesenvolvido chamado Cuba que atendeu mais de 24 mil crianças atingidas por este acidente nuclear em pleno período especial – fase mais crítica da economia cubana, no começo dos anos 90.

Eu sou o presidente honorário da Efac (Encontro Fraternal Argentino Cubano), através desta instituição estamos terminando um documentário chamado Tarará, que é o nome do hospital onde foram atendidas as crianças de Chernobyl. O objetivo é basicamente contrapor a história difundida pelo Netflix que não diz a verdade sobre o acidente e tampouco menciona o que ainda está acontecendo. Este reator 4 que explodiu ainda segue trabalhando e emitindo radioatividade e a cobertura que fizeram sobre isso é de que a União Europeia não tem dinheiro para reparar isso porque são pelo menos 100 milhões de euros para fazê-lo e os ”miseráveis governos europeus” não querem colocar um peso e querem que a Ucrânia, ou a Rússia, assumam isso sozinhos, e se esse reator chegar a romper vamos ter um Chernobyl novamente. Isso não se fala na série da Netflix e o perigo está aí.

Não podemos evitar que eles digam mentiras, o que nós temos que fazer é dizer a verdade. Uma coisa que me incomoda muito com o governo de Lula no Brasil é que não fez nenhum esforço sério para mexer na comunicação. O governo brasileiro tinha que ter uma rede de comunicação própria e não depender da Rede Globo como aconteceu com Dilma que toda vez que precisava fazer uma declaração ganhava uma migalha de dez minutos antes da novela das 8. Estamos muito mal nesta batalha, o imperialismo é muito criativo. Segundo Chomsky, é o maior projeto de dominação da história. Se nós não reagirmos a tempo teremos problemas graves. É imenso nosso desafio nesta guerra ideológica.

 

 

*Do Jacobin Brasil

 

 

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Vazamento: Dallagnol se recusou a receber prêmio ao lado de Bolsonaro para não queimar o filme da Lava Jato

O coordenador da Lava Jato no Ministério Público no Paraná, Deltan Dallagnol, rejeitou receber um prêmio ao lado do hoje presidente Jair Bolsonaro (PSL) e “outros radicais de direita”, segundo revelam mensagens privadas de integrantes da força-tarefa enviadas por fonte anônima ao site The Intercept Brasil e analisadas em parceria com o UOL. A ideia era não se vincular a bandeiras político-ideológicas, de acordo com nota enviada à reportagem (veja abaixo), como as do ex-capitão do Exército que hoje sugere que Deltan seja um “esquerdista tipo PSOL”.

O prêmio em questão foi o “Liberdade 2016”, concedido no Fórum Liberdade e Democracia, organizado pelo Instituto de Formação de Líderes de São Paulo, em 22 de outubro daquele ano no Transamérica Expo Center.

Em mensagem publicada em 5 de outubro no grupo Filhos do Januário 1, que reúne procuradores do MPF no Paraná, o coordenador da força-tarefa havia dito que iria receber o prêmio:

“Vou receber porque me parece positivo para a LJ, mas vou pedir para ressaltarem de algum modo, preferencialmente oifical, que entregam a mim como símbolo do trabalho da equipe”. As mensagens divulgadas preservaram a grafia usada no aplicativo.

Três dias antes do evento, Deltan foi aconselhado por um assessor da força-tarefa a não participar para evitar que associasse a imagem da Lava Jato à do então deputado federal, que participaria de uma mesa durante o evento.

tudo o que vc e a FT não precisam é serem “associados” ao Bolsonaro. é a mesma coisa que receber prêmio do Foro de BSB. estou quase implorando.

Enquanto conversava pelo aplicativo com o assessor, Deltan mudou de opinião e avisou na madrugada do dia 20 o grupo Filhos de Januário 1 que não iria à premiação, por contar “com Jair Bolsonaro como um dos vários palestrantes e com homenagem a um vereador de SP [Fernando Holiday, do DEM-SP] que foi um dos líderes do impeachment”.

Além do atual presidente e de Holiday, o evento teve a presença da senadora Ana Amélia (PP-RS), candidata a vice-presidente em 2018 na chapa de Geraldo Alckmin (PSDB). O promotor Roberto Livianu, presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, recebeu o prêmio em São Paulo dois dias depois do aviso de Dallagnol e postou imagem no Twitter.

Bolsonaro foi recebido na mesa de debates por Helio Beltrão, presidente do Instituto Mises Brasil, de orientação liberal, enquanto a plateia gritava: “Mito, mito”. Duas semanas depois, Deltan pediu para outro assessor do MPF relacionar os prêmios recebidos pela Lava Jato, com detalhes da premiação, mas com menos destaque para outros, como o do Instituto de Formação de Líderes de São Paulo.

Entre 3 e 6 de dezembro de 2016, a força-tarefa recebeu dois troféus, o da Conferência Internacional Anticorrupção, no Panamá, e o Innovare, em Brasília. No dia 7, Roberson Pozzobon disse em mensagem no grupo do Telegram ter recebido o prêmio entregue a Roberto Livianu. Para o procurador, já poderia ser anotada uma marca no livro dos recordes, o Guinness Book. Em resposta, recebeu um comentário de Deltan:

Esse é aquele em que ele nos representou quando cancelei a ida para SP porque é um instituto liberal e estariam lá Bolsonaro e outros radicais de direita … guiness !! Kkkk kkkk

“Não vai replicar vídeo do Bolsonaro”

Não foi a única vez que procuradores da força-tarefa se mostraram avessos ao presidente Jair Bolsonaro. Em 21 de abril de 2017, Deltan envia um vídeo e pergunta aos colegas do grupo Filhos do Januário 1 se poderia compartilhar, pois havia políticos. “São de diferentes partidos em tese”, disse à 0h29. Laura Tessler achou melhor não.

Orlando Martello responde que sim porque o conteúdo tinha a ver com a bandeira da força-tarefa, possivelmente tratando de combate à corrupção. “É bom que os políticos vejam q todos q apoiarem esta causa terão propaganda positiva nossa”, disse Martello. “O importante é a mensagem.” Paulo Galvão diz que isso dependeria de quais políticos estavam no vídeo. Às 8h43, ele afirmou.

Quaissão os políticos? Não vai replicar vídeo do bolsonaro pelamor

Martello responde que seriam o senador Romário (PSB-RJ) e os deputados federais Jean Wyllys (PSOL-RJ) e Tiririca (PL-SP).Mesmo sem Bolsonaro, nenhum vídeo com políticos foi divulgado por Deltan em suas redes sociais no Twitter e no Facebook nos dias seguintes.

Sem filiação a nenhum partido político, Deltan foi chamado por uma página de apoiadores de Bolsonaro de “esquerdista tipo PSOL”. O perfil de Bolsonaro no Facebook compartilhou esta publicação no último sábado (10).

Dirigente do instituto trabalha no governo Hoje, ao menos um dirigente do Instituto de Formação de Líderes (IFL) trabalha no governo Bolsonaro. Mas o presidente da entidade, o empresário Georges Ebel, nega apoio ou antagonismo candidatos ou governos. Ele diz que a instituição não é nem de direita, nem de esquerda.

Segundo ele, Deltan informou que tinha problemas de agenda e que, “infelizmente”, esses cancelamentos de última hora não são incomuns. “Jair Bolsonaro foi convidado a um debate de ideias, nada programático”, afirmou Ebel à reportagem.

Ebel afirmou que os manifestantes bolsonaristas que gritavam “Mito” eram “poucos” na plateia.

“O Instituto tem posição completamente apartidária”, afirmou.

 

*Do Uol

 

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Como o Youtube se tornou um celeiro da nova direita radical

Resolvi fazer um experimento. Com um navegador recém instalado, abri o YouTube e cliquei em um vídeo sobre as máquinas de forjamento de martelo mais rápidas e pesadas que existem. Deixei o sistema rodar mais 13 vídeos na sequência, assistindo aos vídeos, sem deixar likes ou fazer login. A ideia era ver quais eram as sugestões que o YouTube recomendava depois do primeiro.

Após passar por vídeos de halterofilismo, corte de árvores e muitos anúncios de ferramentas pesadas, equipamentos e carne para churrasco e outros, o YouTube me recomendou um vídeo sobre como fazer munição para uma arma semi-automática.

As recomendações e os anúncios, voltados para quem exalta o estilo de vida do Rambo, mostram que os algoritmos entenderam que, porque eu cliquei em um único vídeo de máquinas pesadas, eu sou homem e gosto de armas e churrasco.

Essas conexões que os algoritmos fizeram vêm dos dados que o YouTube analisou sobre meu comportamento no site e sobre os vídeos com os quais interagi, seja clicando sobre o vídeo, pausando, aumentando o volume ou até mexendo o mouse sobre as recomendações. Tudo é monitorado. As métricas que escolhem quais vídeos serão recomendados são baseadas, principalmente, na possibilidade de um vídeo ser assistido pelo usuário. Ela faz parte de um mecanismo sofisticado de inteligência que tem um objetivo principal: fazer com que você passe o máximo de tempo possível no YouTube.

Como conteúdos extremistas naturalmente chamam mais atenção, a plataforma cria uma bolha conectando vídeos bizarros. Assim, usuários mergulham cada vez mais fundo num assunto. Não por acaso, da fabricação de martelos eu fui levada pelo algoritmo para um vídeo sobre munição e armas em apenas 13 passos. A mesma coisa acontece com vídeos relacionados à política.
Recomendação ao extremo

Em 2015, os usuários do YouTube subiam 400 horas de vídeo por minuto. A maior parte desse conteúdo é criada de forma amadora. No site, usuários de todo o mundo gastam mais de um bilhão de horas assistindo a vídeos todos os dias.

Apesar de ter um serviço de assinaturas, o YouTube Premium, o serviço ganha dinheiro mesmo é com anúncios. Para sustentar a infraestrutura necessária – e garantir que o modelo continue crescendo – o site precisa ser gigante. Como na velha TV aberta, quanto mais pessoas assistindo a um programa, mais gente vê os comerciais durante os intervalos.

Para manter o interesse das pessoas nos canais – e garantir que elas sejam expostas a mais e mais anúncios –, a plataforma usa algoritmos para organizar o conteúdo e circular vídeos novos, gerando uma demanda diária por novo material. Esses algoritmos usam uma combinação de dados para recomendar vídeos que visam, literalmente, prender e viciar as pessoas.

Quando o sistema de recomendações foi lançado, em 2010, ele deu resultados imediatos: começou a ser responsável por 60% dos cliques dos usuários, segundo artigo científico escrito pelos cientistas do Google no mesmo ano.

Em 2015, com a liderança do time Google Brain, a empresa começou usar aprendizado de máquina – conhecido em inglês como machine learning – para melhorar o sistema de recomendações. Em 2017, o YouTube começou a rodar tudo sobre uma sofisticada plataforma de inteligência artificial, o Tensorflow.

Estava completa a transição para um sistema que aprende sem ser “supervisionado” por humanos – tecnologia também chamada de unsupervised deep learning, ou aprendizado profundo sem supervisão. Esses algoritmos escolhem quais vídeos vão para a barra de recomendados, quais aparecem na busca, qual vídeo toca a seguir quando no modo reprodução automática (o autoplay) e também montam a homepage dos usuários no YouTube. Sim, cada vez que você abre sua home ela está diferente. Ela foi customizada pelas máquinas para que você assista mais e mais vídeos.

Para tomar as decisões por você, os algoritmos associam significados que eles mesmos aprendem em etapas, de modo a filtrar e combinar categorias para chegar em um conjunto de vídeos ou anúncios para recomendar. Primeiro, dão um significado para um vídeo segundo suas características. Depois, combinam esse significado com mais dados, como por exemplo a quantidade de horas que um usuário gasta assistindo determinados vídeos com significados semelhantes. As categorias vão sendo combinadas pelos algoritmos para encontrar as recomendações que o usuário tem mais possibilidade de clicar e assistir:

O site gera essas recomendações a partir das suas interações, nas informações dos vídeos e nos dados dos usuários. Isso engloba tudo que você faz no navegador: parar o vídeo, colocar o mouse por cima de determinada imagem, aumentar ou diminuir o volume, quais abas você está navegando quando está vendo vídeos, com quem você interage nos comentários e que tipo de comentários faz, se deu like ou dislike e até mesmo a taxa de cliques em recomendações etc.

Como a interação não é só baseada em likes, o YouTube valoriza também os comentários, atribuindo valores de positivo e negativo às conversas. Por causa disso, o feedback do usuário sobre o vídeo é avaliado e pesa na fórmula que calcula a possibilidade da pessoa assistir aos outros vídeos. Mesmo sem dar like, você entrega os seus dados e tem sua interação monitorada o tempo todo.

Os autores dos vídeos sabem muito bem como funciona essa lógica. Os anunciantes também. Os youtubers têm à sua disposição a plataforma para criadores do YouTube, o YouTube Studio, que fornece métricas e informações sobre a audiência. Assim, existe um incentivo para os produtores fazerem vídeos cada vez mais extremos e bizarros para prender a audiência o máximo possível. Isso explica um pouco a obsessão da internet pela banheira de Nutella, e também ajuda a entender como se elegeram tantos youtubers interconectados nas últimas eleições.

Como conteúdo radical dá dinheiro, por conta dos anúncios, extremistas usam também outras ferramentas para incentivar a formação de bolhas e atrair cada vez mais gente. No Brasil, donos de canais de conteúdo extremo e conspiratório, como a Joice Hasselmann, por exemplo, costumam divulgar seu número do WhatsApp, viciando as pessoas em seus conteúdos com base na exploração dessa relação de proximidade ou intimidade.
Redes de extrema-direita

Enquanto o Google terminava a transição da sua tecnologia no YouTube, surgiram denúncias sobre como vídeos de conteúdo extremo começaram a ganhar audiência na plataforma – muitos deles, inclusive, recomendados a crianças. Em 2017, pesquisadores descobriram uma rede de produtores de conteúdo que fazia vídeos com conteúdo bizarro para crianças: afogamentos, pessoas enterradas vivas e outros tipos de violência eram empacotados com música e personagens infantis.

Alguns pesquisadores, como a americana Zeynep Tufekci, escreveram sobre como o YouTube estava lhe recomendando conteúdos da extrema direita americana após ela ter visto um único vídeo de Donald Trump. No Brasil não é diferente. Basta assistir a um vídeo de extrema direita que as recomendações vão garantir que você se aprofunde cada vez mais no ódio:

A radicalização acontece muito mais à direita do que à esquerda. Primeiro porque os produtores de conteúdo conservadores souberam bem agregar pautas polêmicas e teorias conspiratórias que já faziam sucesso na internet, como o criacionismo. Além disso, há uma coerência em suas pautas – os assuntos em comum ajudam a alavancar a audiência de forma mútua. Já a esquerda, além de ter uma pauta mais fragmentada que nem sempre se conversa – há o feminismo, a luta antirracista, os marxistas etc –, não conseguiu surfar a onda das polêmicas de internet.

Guillaume Chaslot, que é ex-funcionário do Google e hoje trabalha em uma fundação para a transparência de algoritmos, tem argumentado desde 2016 que a plataforma de recomendações do YouTube foi decisiva nas eleições de Trump, espalhando notícias falsas e teorias da conspiração. Segundo ele, o algoritmo vendido como neutro pelo Google ajudou a garantir audiência para vários vídeos conspiratórios, como um em que Yoko Ono supostamente admitiria ter tido um caso com Hillary Clinton nos anos 1970 e outro sobre uma falsa rede de pedofilia operada pelos Clinton.

O impacto desse tipo de conteúdo, porém, não é fácil de ser medido – a fórmula dos algoritmos é mantida em segredo pela empresa, ou seja, não dá para saber exatamente quais são os critérios que determinam o peso de cada característica no processo de decisão sobre qual vídeo indicar.

Esse sistema cria uma rede interligada – que, em conjunto, fica mais poderosa. Analisando mais de 13 mil canais de extrema direita no YouTube, Jonas Kaiser, pesquisador do Berkman Klein Center de Harvard, percebeu que elas estão conectadas internacionalmente dentro do YouTube, especialmente por conta do compartilhamento de vídeos com idéias extremistas. É uma rede fértil para circular a ideia de que políticas afirmativas para negros são parte de uma conspiração para acabar com a raça branca ocidental, por exemplo, o delírio de que vacinas são parte de um plano para acabar com determinadas populações em um experimento ou até a história de que as eleições brasileiras estariam em risco por uma suposta fraude nas urnas eletrônicas.

Os dados levantados por Kaiser mostram que o esquema de recomendação do YouTube “conecta diversos canais que poderiam estar mais isolados sem a influência do algoritmo, ajudando a unir a extrema direita”, ele escreve.

Não é por acaso que o teor conspiratório dos vídeos dos EUA é bem parecido com as redes de outros países: quase sempre envolve vacinas, terraplanismo, pedofilia e uma suposta organização internacional de esquerda sedenta por tomar o poder.

No Brasil, o cenário não é muito diferente. Temos a nossa própria rede de influenciadores de extrema direita, catapultados para a fama com a ajuda do algoritmo do YouTube. Nando Moura, com quase três milhões de seguidores, já fez vídeos defendendo a existência da cura gay. Outro influenciador, Diego Rox, defende para seus quase um milhão de seguidores a existência da Ursal. Todos recomendados por Jair Bolsonaro, que se beneficia da popularização de teorias conspiratórias de extrema direita.

Recentemente o Google reconheceu o problema. A empresa disse que passaria a sinalizar vídeos que espalhassem desinformação e exibiria, junto com eles, conteúdo da Wikipedia, em uma medida que pareceu um pouco desesperada. E não ataca a raiz do problema: seu modelo exploratório de negócios, uma herança da televisão.

A verdade é que o YouTube é um grande laboratório de machine learning, onde os seres humanos são as cobaias. Resta saber qual é o real impacto do experimento no exercício da liberdade de escolha e expressão. O problema é que eu desconfio que algo não está dando muito certo.

 

Por Yasodara Córdova

*Do Intercept Brasil