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Gilmar Mendes sobre a Lava Jato: “essa gente no poder, certamente fecharia o Congresso e o Supremo”

O ministro ainda lembrou: “quem defendia o uso de prova ilícita até ontem eram os lavajatistas. Nas dez medidas [de combate à corrupção], estava lá que a prova ilícita de boa-fé deveria ser utilizada”.

No dia seguinte da abertura da CPI da Lava Jato, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, deu entrevista ao UOL, com diversas declarações importantes sobre a Lava Jato, que pode dar um vislumbre de como votará nos processos que devem nortear o destino da operação da República de Curitiba. Na entrevista, Mendes de mostrou contrário à CPI da Lava Toga, por ser considerada inconstitucional, já que seria um ingerência de um poder da República sobre outro. Segundo ele, certamente cairia no STF.

Com relação a Moro, Deltan Dallagnol e as denúncias do The Intercept, Mendes advertiu: “as pessoas percebem que esse promotor não está atuando de maneira devida. Esse juiz não está atuando de maneira devida. Se nós viermos a anular ou não esses julgamentos, o juízo que está se formando é o de que não é assim que a Justiça deve funcionar. Que isso é errado, que essas pessoas estavam usando as funções para outra coisa. Isso ficou cada vez mais evidente”, concluiu.

“Nós aprendemos, vendo esse submundo, o que é que eles faziam. Delações submetidas a contingência, ironizavam as pessoas, perseguiam os familiares para obter o resultado em relação ao verdadeiro investigado, tudo isso que nada tem a ver com o Estado de Direito. Vamos imaginar que essa gente estivesse no poder Executivo, o que que eles fariam? Certamente fechariam o Congresso, fechariam o Supremo”, afirmou Mendes.

Para Mendes, “devemos estar atentos e, a cada sinal, especialmente partindo de pessoas com responsabilidade institucional, devemos criticar ou mesmo reprimir. Clamar pela restauração do regime militar é um crime contra a democracia, contra a segurança nacional”.

Ao admitir o uso de provas ilícitas, se referindo às revelações do The Intercept, o ministro lembrou: “quem defendia o uso de prova ilícita até ontem eram os lavajatistas. Nas dez medidas [de combate à corrupção], estava lá que a prova ilícita de boa-fé deveria ser utilizada”, encerrou.

 

*Com informações do A Postagem/Forum

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Puxa-saco contumaz, Dallagnol defende Aras e é bombardeado por colegas do Ministério Público

Procuradora Monique Cheker disse ver a mensagem do colega com lamento e que a luta da Ministério Público era pela lista tríplice para escolha da PGR.

O chefe da Lava-Jato de Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol, enviou uma mensagem nesta sexta-feira na rede interna do Ministério Público Federal (MPF) defendendo o nome do subprocurador-geral Augusto Aras para o comando da Procuradoria-Geral da República (PGR). A mensagem dele foi revelada pela colunista Bela Megale, do jornal O Globo . Logo depois disso, outros membros do órgão passaram a criticar seu discurso. Entre eles, a procuradora Monique Cheker, próxima de Deltan.

Deltan escreveu que se colocou “diversas vezes em apoio à lista tríplice” mas que “é hora de trabalhar pelo MPF”.

“A atuação da Lava Jato, especialmente, depende de permanente coordenação entre instâncias, inclusive entre primeira e PGR. É importante o trabalho conjunto para continuar expandindo as investigações para responsabilizar criminosos e recuperar recursos, dentro da nossa atribuição”, escreveu Deltan.

Ele relatou que conversou ontem por telefone com Aras, que “expressou seu compromisso de manter e até fortalecer o trabalho das forças-tarefas”.

“Nesse contexto, como disse ao Dr. Aras no contato, entendo que foi importante sua iniciativa de convidar para continuarem na Lava Jato os colegas Hebert, Victor, Clara, Alessandro e Luana, assim como o convite para que Thamea a integre. São excelentes profissionais e ficarei contente se integrarem a equipe na PGR”, escreveu Deltan.

Em resposta a Deltan, Monique Cheker escreveu que viu a mensagem do colega com “grande lamento”. Cheker disse que a escolha do procurador-geral por meio da lista seria uma garantia mínima e que sua defesa é que seria “trabalhar pelo MPF”.

“A Lista Tríplice caiu de vez mesmo. Não há embate com qualquer indicado ou nomeado mas infelizmente a Lista Tríplice é uma garantia mínima e, independente da indicação, nada obsta que a ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) permanecesse em sua defesa pública. O que é “trabalhar pelo MPF”? Ao que pensei, a lista seria trabalhar pelo MPF. Ou alguém vendeu algo estranho, desde que entramos na carreira”, escreveu a procuradora.

Cheker disse ainda que também se preocupava com o fato de “em nome de uma obrigação do PGR (manter uma força tarefa que está trazendo relevantes benefícios ao país), haja um motivo para elogios públicos”. E completou: “quando a obrigação vira favor, há algo que precisamos refletir”.

Ainda criticando a mensagem de Deltan, a procuradora se despediu dizendo que “o tempo dirá se a opção que fazemos hoje (desmotivar a publicidade pela lista) será ‘trabalhar pelo MPF'”.

 

 

*Com informações do Último Segundo

 

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STF prepara sequência de julgamentos decisivos para Moro e a Lava Jato

Ações que debatem o uso de dados de órgãos de controle e a suspeição do ex-juiz podem voltar à pauta da Corte em outubro.

O Supremo Tribunal Federal (STF) prepara para outubro uma série de julgamentos que, em suma, podem tornar sem efeitos decisões do ex-juiz e atual ministro da Justiça, Sérgio Moro, e da força-tarefa da Operação Lava Jato, coordenada pelo procurador Deltan Dallagnol. A informação é da Folha de S. Paulo.

O presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, indicou aos colegas estar disposto a levar ao plenário no próximo mês as ações que questionam a constitucionalidade das prisões após condenação em segunda instância, uma das principais bandeiras da Lava Jato, além da discussão que anulou a sentença imposta por Moro a Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras e do Banco do Brasil. Ministros avaliam que a provável inclusão dos temas na pauta do plenário sinaliza que, hoje, já haveria maioria a favor das teses contrárias à Lava Jato. ​

Além disso, Toffoli admitiu a possibilidade de antecipar o debate sobre uso de dados detalhados de órgãos de controle, como o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Receita Federal e Banco Central, sem autorização judicial. Inicialmente, o tema estava previso para voltar à pauta em 21 de novembro.

Também em outubro, Gilmar Mendes pretende retomar o julgamento da alegada suspeição do ex-juiz. Os magistrados vão voltar a discutir um pedido de habeas corpus formulado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que alega falta de imparcialidade de Moro na condução do processo do tríplex de Guarujá (SP). Se a solicitação for aceita, a sentença pode ser anulada e o caso voltaria aos estágios iniciais, o que tiraria Lula da cadeia.

 

 

*Com informações do Metro1

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Vaza Jato – Vazamento seletivo de grampo: Ódio e perseguição de Moro e procuradores a Lula comprovam sua inocência

PF gravou 22 telefonemas do ex-presidente após ordem para interromper escuta que revelou diálogo com Dilma em 2016.

Conversas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) gravadas pela Polícia Federal em 2016 e mantidas em sigilo desde então enfraquecem a tese usada pelo hoje ministro Sergio Moro para justificar a decisão mais controversa que ele tomou como juiz à frente da Lava Jato.

Em 16 de março de 2016, cinco horas depois de mandar interromper a escuta telefônica que autorizara no início do cerco da operação ao líder petista, Moro tornou público um diálogo em que a então presidente Dilma Rousseff tratou com Lula de sua posse como ministro da Casa Civil.

A divulgação do áudio de 1min35s incendiou o país e levou o Supremo Tribunal Federal a anular a posse de Lula, às vésperas da abertura do processo de impeachment e da deposição de Dilma. Para a Lava Jato, o telefonema mostrava que a nomeação de Lula como ministro tinha como objetivo travar as investigações sobre ele, transferindo seu caso de Curitiba para o STF.

Mas registros inéditos obtidos pela Folha e analisados em conjunto com o site The Intercept Brasil indicam que outras ligações interceptadas pela polícia naquele dia, mantidas em sigilo pelos investigadores, punham em xeque a hipótese adotada na época por Moro, que deixou a magistratura para assumir o Ministério da Justiça no governo Jair Bolsonaro (PSL).

A reportagem teve acesso a anotações dos agentes que monitoraram Lula, com resumos de 22 conversas grampeadas após a interrupção da escuta em março de 2016. Elas foram gravadas porque as operadoras de telefonia demoraram a cumprir a ordem de Moro e o sistema usado pela PF continuou captando as ligações.

Os diálogos, que incluem conversas de Lula com políticos, sindicalistas e o então vice-presidente Michel Temer (MDB), revelam que o petista disse a diferentes interlocutores naquele dia que relutou em aceitar o convite de Dilma para ser ministro e só o aceitou após sofrer pressões de aliados.

O ex-presidente só mencionou as investigações em curso uma vez, para orientar um dos seus advogados a dizer aos jornalistas que o procurassem que o único efeito da nomeação seria mudar seu caso de jurisdição, graças à garantia de foro especial para ministros no Supremo.

As anotações mostram que Lula estava empenhado em buscar uma reaproximação com Temer e o MDB e indicam que seus acenos eram bem recebidos pelo vice-presidente, na época visto como fiador da transição para o novo governo que seria formado se Dilma fosse afastada do cargo.

A PF escutou duas conversas de Lula e Temer. Na primeira, eles marcaram uma reunião para o dia seguinte, e Lula disse a Temer que a rejeição enfrentada pelos políticos numa recente manifestação pró-impeachment mostrava que o avanço da Lava Jato criara riscos para todos os partidos, não só o PT.

Na segunda ligação, após discutir a situação de um aliado do vice-presidente no governo, o petista prometeu ser um parceiro e disse que eles deveriam atuar como “irmãos de fé”. Segundo as anotações dos agentes da PF, Temer respondeu a Lula dizendo que “sempre teve bom relacionamento” com ele.

Embora os registros mostrem que os policiais prestaram atenção a todas as conversas do ex-presidente, o telefonema de Dilma foi o único que a PF anexou aos autos da investigação sobre Lula nesse dia antes que Moro determinasse o levantamento do sigilo do processo.

Mensagens que integrantes da Lava Jato trocaram no aplicativo Telegram, obtidas pelo Intercept e analisadas em conjunto com a Folha, mostram que um dos policiais na escuta alertou os investigadores para o telefonema de Dilma assim que ouviu a ligação e foi instruído a produzir um relatório.

Não foi o que ocorreu com as outras conversas. O mesmo agente usou o Telegram para avisar que Lula também falara com Temer e fez um resumo do primeiro diálogo entre eles, com duas horas de atraso. Nenhum dos investigadores que participava do grupo reagiu à informação no Telegram.

O material examinado pela Folha e pelo Intercept mostra que o grampo permitiu que a Lava Jato soubesse do convite de Dilma a Lula com uma semana de antecedência e usasse o tempo para preparar junto com Moro o levantamento do sigilo da investigação e das escutas telefônicas.

No dia 9 de março, quando havia apenas especulações sobre o assunto na imprensa, o agente Rodrigo Prado ouviu Lula confirmar que recebera o convite, numa conversa com o ex-ministro Gilberto Carvalho. O policial alertou os outros investigadores no Telegram dez minutos depois.

9.mar.2016

Rodrigo Prado16:02:49 Ela ofereceu mesmo pra ele

16:03:07 E ele esta pensando

16:03:07 Talvez aceite

16:04:01 Nao só por causa da LJ mas para salvar o Governo dela

16:04:33 Cai isso numa conversa dele com Gilberto Carvalho

O áudio anexado aos autos pela PF mais tarde sugere que Lula ainda tinha dúvidas sobre a ideia e temia que sua ida para o governo fosse associada a uma tentativa de escapar da Lava Jato. Para os investigadores, porém, não havia dúvida de que o objetivo dos petistas era exatamente esse.

Desde o início da escuta telefônica, em 19 de fevereiro, várias conversas interceptadas haviam mostrado que Lula e seus aliados estavam preocupados com o avanço das investigações, temiam que ele fosse preso e buscavam apoio de autoridades do governo e ministros de tribunais superiores.

A força-tarefa à frente do caso em Curitiba acompanhou de perto a interceptação. No dia em que soube do convite de Dilma, o procurador Deltan Dallagnol, coordenador do grupo, pediu um CD com todos os áudios. “Estou sem nada pra ouvir no carro”, disse no Telegram, em tom de brincadeira.

9.mar.2016

Deltan Dallagnol 19:25:19 Igor consegue pra mim CD ou DVD com todos os áudios do 9 e a análise dos que tiver? Estou sem nada pra ouvir no carro rsrsrs

Igor Romário de Paula 19:45:20 Sim… amanhã, ok!?

Deltan 19:59:45 emoji sinal positivo

9 Referência pejorativa a Lula, que perdeu um dedo da mão esquerda quando operário

10.mar.2016

Deltan 00:20:56 Igor falei com o pessoal e parece que recebemos só os de destaque e não temos os daqueles em volta que podem ser importante para indicar riscos à segurança e a condução… Consegue os áudios completos e relatórios por favor?

[…]

Igor 21:19:23 O cara vai ser mesmo ministro

Deltan 21:21:06 Januário vem pra cá pra discutirmos o que fazer com o procedimento em sigilo

21:21:14 ele ia te ligar creio agora

Igor 21:26:42 Chego aí em 15 minutos…

Para os investigadores, havia uma oportunidade para levantar o sigilo da investigação, revelando o conteúdo das conversas de Lula, antes que sua nomeação como ministro obrigasse Moro a encaminhar o caso a Brasília e a força-tarefa de Curitiba perdesse o controle sobre a investigação.

As mensagens obtidas pelo Intercept mostram que o assunto foi discutido com o juiz, que pediu relatórios com transcrições dos diálogos considerados mais relevantes. Em 15 de março, na véspera da nomeação de Lula, a polícia anexou aos autos da investigação três relatórios e 44 arquivos de áudio.

19:49:46 Prado e demais colegas da análise: Teríamos condições de apresentar os três relatórios de interceptação amanhã de manhã, com tudo o que tem de relevante nos dois períodos até o momento? (pergunto porque sei que vcs estavam com eles praticamente prontos)

14.mar.2016

Prado 20:24:45 Luciano: amanha de manha nao seria possivel. Sao 41 ligacoes no relatorio. Ainda faltam algumas mesmo fazendo mutirao de transcricao. Acho que conseguimos ate o final do dia de amanha.

20:25:15 Voces pensam em eprocar isso quando?

20:26:44 Se for uma emergencia, fechamos o relatorio do jeito que esta, mas muitas ligacoes so estao com resumo. E o Russo pediu expressamente que todas fossem transcritas.

20:27:16 Estamos tentando fazer o melhor possivel, porque esse relatorio vai fazer um strike em BSB

Flores 20:28:57 Estamos vendo essa questão da oportunidade… parece que já está confirmada a aceitação dele para Casa Civil

Lula aceitou o convite de Dilma na manhã do dia 16. Enquanto os dois conversavam no Palácio da Alvorada, procuradores se reuniram com Moro em Curitiba para discutir o levantamento do sigilo, e Deltan, que estava em Brasília, foi à Procuradoria-Geral da República obter aval para a iniciativa.

Moro mandou interromper a escuta telefônica às 11h12, depois que a imprensa confirmou a nomeação de Lula. Num despacho sucinto, o juiz disse que o grampo se tornara desnecessário após as buscas realizadas duas semanas antes, quando Lula fora levado à força pela PF para depor em São Paulo.

A demora das operadoras de telefonia para executar a ordem de Moro em 16 de março permitiu que os investigadores continuassem escutando as conversas de Lula por cinco horas. Com o sistema usado pela PF, as ligações são desviadas automaticamente para os computadores da polícia pelas operadoras.

A primeira pessoa com quem o ex-presidente falou após o encontro com Dilma foi sua assessora Clara Ant, segundo as anotações feitas pelos agentes na escuta. Lula confirmou sua nomeação como ministro, mas indicou que estava desconfortável com a situação.

“Diz que acabou de se foder. LILS diz que ficaram discutindo até meia-noite. LILS tem mais incerteza do que certeza. LILS diz que não tem como escapar ‘dela’”, resumiu o agente que estava na escuta, identificando Lula sempre pelas iniciais de seu nome completo.

Os registros obtidos pela Folha mostram que o ex-presidente manifestou o mesmo incômodo ao falar com seu advogado Cristiano Zanin Martins, o ex-ministro Franklin Martins, o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, e dois jornalistas de sua confiança.

O tom foi outro nas conversas com políticos. As anotações da PF indicam que Lula expressou a todos entusiasmo com sua ida para o governo, apostando em sua capacidade de recompor a base de apoio a Dilma no Congresso e promover mudanças na política econômica.

Ao deputado José Guimarães (PT-CE), então líder do governo na Câmara, avisou que estava disposto a conversar até com Eduardo Cunha (MDB-RJ), que rompera com Dilma após assumir a presidência da Casa e liderava as articulações para acelerar o processo de impeachment.

Lula iniciou a conversa com Temer dizendo que queria mudar sua relação com o Palácio do Planalto, do qual o vice se afastara após desentendimentos com Dilma. O tom foi amistoso. “[Lula] Pede para preparar o uísque e o gelo”, anotou o agente da PF, depois que eles combinaram o encontro no dia seguinte.

O líder petista compartilhou com Temer sua preocupação com as manifestações pró-impeachment que tinham ocorrido pouco antes, no domingo, 13 de março. Uma multidão fora às ruas em São Paulo para demonstrar sua insatisfação com os políticos e seu apoio a Moro e à Lava Jato.

“Ninguém ganhou com a manifestação de domingo”, disse Lula a Temer, segundo os registros da PF. “Quem ganhou foi o combate à corrupção expressado na figura do MORO. Diz que esse combate à corrupção foi sempre um alimento para golpistas no mundo inteiro.”

“Quem ganhou foi a negação da política”, acrescentou o ex-presidente. “A classe política tem que se unir para recuperar o seu espaço.”

Minutos depois, Temer telefonou a Lula para falar do deputado Mauro Lopes (MDB-MG), que Dilma nomeara ministro da Aviação Civil. O vice temia que a indicação fosse vista como afronta pelo partido, que ainda não desembarcara do governo, mas vetara a ocupação de novos cargos no primeiro escalão por seus filiados.

Lula prometeu tratar do assunto com Dilma. “LILS quer ser o parceiro de TEMER para reconstruir a relação com PMDB. LILS quer ser irmãos de fé”, anotou o agente na escuta, de acordo com os registros obtidos pela Folha. “TEMER diz que sempre teve bom relacionamento com LILS.”

12h47

Michel Temer (MDB), então vice-presidente: “Diz que vão conversar amanhã. TEMER está em SÃO PAULO. LILS quer saber se o uísque está lá ainda. Diz que TEMER tomou um pouco. LILS quer conversar com TEMER porque aceitou a CASA CIVIL. TEMER diz que precisam conversar. LILS diz que quer mudar a relação de TEMER com o PALÁCIO. Marcam às 19 horas em SÃO PAULO. Pede para preparar o uísque e o gelo. LILS diz que aceitou porque há uma possibilidade de animar o país. LILS diz que ficou preocupado com a manifestação de domingo. Diz que ninguém ganhou com a manifestação de domingo. Diz que quem ganhou foi o combate à corrupção expressado na figura do MORO. Diz que esse combate à corrupção foi sempre um alimento para golpistas no mundo inteiro. E quem ganhou foi a negação da política. O que fizeram com a MARTA, com o AÉCIO, com o ALCKMIN. Diz que a classe política tem que se unir para recuperar o seu espaço. LILS diz que vai restabelecer a relação carinhosa entre seres humanos nesse país.”

12h58

Michel Temer: “[Temer] Diz que está muito preocupado com MAURO LOPES assumir antes de resolver essas questões. Fala da história da afronta. Tem que esperar mais uns dias. LILS diz que tentou falar com ela. Ela está em reunião. LILS quer ser o parceiro de TEMER para reconstruir a relação com PMDB. LILS quer ser irmãos de fé. Se coloca à disposição. Quer harmonizar isso. TEMER quer trazer algumas pessoas para a relação deles. TEMER vai chamar PADILHA. LILS diz para chamar. TEMER diz que sempre teve bom relacionamento com LILS.”

Dilma telefonou às 13h32. Avisou Lula que mandara um assessor lhe entregar o termo de posse para que tivesse o documento em mãos “em caso de necessidade”. O ex-presidente assentiu e os dois desligaram. Lula acertara com Dilma que só tomaria posse na semana seguinte, no dia 22.

As mensagens obtidas pelo Intercept mostram que o impacto dessa conversa foi imediato entre os investigadores, ao contrário dos outros telefonemas. “Estao preocupados se vamos tentar prende-lo antes de publicarem no DOU a nomeacao do Lils”, escreveu Prado no Telegram.

O procurador Athayde Ribeiro da Costa concordou com a interpretação: “já é calro. mais isso demonstra ainda mais o desvio de finalidade da nomeação”. As mensagens foram reproduzidas com a grafia encontrada nos arquivos recebidos pelo Intercept, incluindo erros de português e abreviaturas.

A PF anexou aos autos o áudio com a conversa de Dilma e Lula e o relatório com sua transcrição às 15h37. O Ministério Público já se manifestara a favor da retirada do sigilo da investigação, antes mesmo de tomar conhecimento do diálogo. Moro ainda não tinha tomado uma decisão.

16.mar.2016

Prado 13:44:48 Senhores: Dilma ligou para LILS avisando que enviou uma pessoa para entregar em maos o termo de posse de LILS. Ela diz para ele ficar com esse termo de posse e só usar em “caso de necessidade”…

13:45:26 Estao preocupados se vamos tentar prende-lo antes de publicarem no DOU a nomeacao do Lils

Flores 14:26:31 Prado, transcreve literalmente tudo sem comentários. Faz uma informação em complemento ao relatório de pessoas com foro. Estou voltando pra SR pra carregar no eproc com áudio

[…]

Athayde Ribeiro da Costa 14:27:39 já é calro. mais isso demonstra ainda mais o desvio de finalidade da nomeação

Flores 14:29:50 Isso

[…]

Prado 14:53:26 To zerando

14:53:30 Tem muita ligacao

14:54:46 Falou com Temer… Lils Disse que ficou muito preocupado com as manifestacoes nas ruas domingo… Porque sao anti-politicas… E que ele precisa unir todos os politicos novamente para recuperarem o lugar deles…

Registros no sistema eletrônico de acompanhamento dos processos da Justiça Federal mostram que o juiz examinou com atenção os áudios anexados pela PF. Ele determinou a exclusão dos arquivos de duas conversas com advogados de Lula, argumentando que envolviam sigilo profissional.

Moro decidiu levantar o sigilo dos autos às 16h19. A GloboNews noticiou a decisão às 18h32 e revelou que Dilma fora grampeada. Uma cópia da transcrição do diálogo que a presidente tivera com Lula naquela tarde foi lida ao vivo.

Depois que a notícia entrou no ar, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima foi o primeiro a avisar os colegas, num grupo que reunia vários procuradores de Curitiba no Telegram. “Ótimo dia rs”, escreveu Deltan. “[M]Eu Deus!!!”, disse Orlando Martello. “O mundo caiu”, afirmou Athayde.

Em Brasília, manifestantes se aglomeraram na frente do Palácio do Planalto para protestar contra o governo. No plenário da Câmara, deputados da oposição pediram a renúncia de Dilma e chamaram Lula de ladrão, aos gritos, antes que a sessão fosse encerrada em meio a tumulto.

O procurador Eduardo Pelella, chefe de gabinete do então procurador-geral Rodrigo Janot, chamou Deltan para entender o que acontecera. Ele dera seu aval ao levantamento do sigilo da investigação pela manhã, mas não fora avisado de que a Lava Jato tinha grampeado a presidente da República.

“Parece que foi hoje cedo”, disse Deltan, que passara o dia em reuniões em Brasília, mas em contato com os colegas de Curitiba pelo Telegram. “Tudo que sabemos é o que está nos relatórios que te entreguei”, acrescentou, referindo-se as transcrições feitas pela PF antes da conversa de Dilma.

16.mar.2016

Carlos Fernando 18:40:09 Tá na globo news

Deltan 18:52:42 Ótimo dia rs

Orlando Martello 18:53:19 O q está na globo news? Os áudios?

Athayde 18:53:37 Tudo

Jerusa Viecili 18:53:40 Isso

Orlando 18:53:59 Eu deus!!! Rs

Athayde 18:54:11 O mundo caiu

Deltan 18:59:54 Caros vamos descer a lenha até terça

19:00:02 por cautela falei com Pelella e deu ok

16.mar.2016

Eduardo Pelella 19:17:38 Vcs sabiam do áudio da Dilma?

19:17:59 Moro não menciona na decisão. E a gente não falou sobre isso

Deltan 19:22:57 Não

19:23:04 Parece que foi hoje cedo

Pelella 19:23:12 hoje cedo?

Deltan 19:23:13 Os relatórios foram fechados ontem

Pelella 19:23:17 Putz!

Deltan 19:23:22 Ouvi alguém falar que foi hoje cedo

Pelella 19:23:27 Não estão nos relatórios?

19:23:35 Caralhooo!!!

19:23:38 Vou ler aqui

Deltan 19:23:38 Relatórios são de ontem

19:23:54 Foram revisados hoje antes de juntar

19:23:59 Para não ter nada pessoal

19:24:12 Tudo que sabemos é o que está nos relatórios que te entreguei

As mensagens obtidas pelo Intercept indicam que no fim da noite os procuradores se deram conta de que havia dúvidas sobre a legalidade das decisões de Moro naquele dia. Eles começaram a debatê-las no Telegram enquanto acompanhavam o desenrolar de manifestações contra o PT em São Paulo e outras cidades.

Dilma e os advogados de Lula questionaram as decisões do juiz, argumentando que sua conversa não poderia ter sido grampeada se Moro já tinha determinado o fim da escuta, nem os autos poderiam ter sido divulgados sem que o STF tivesse sido alertado para as citações a ela e a outras autoridades com foro especial.

“Estou preocupado com moro! Com a fundamentação da decisão”, disse o procurador Orlando Martello no Telegram. “Vai sobrar representação para ele.”

“Vai sim”, respondeu Carlos Fernando. “E contra nós. Sabíamos disso.” Para Laura Tessler, o apoio da opinião pública garantiria proteção à Lava Jato: “a população está do nosso lado…qualquer tentativa de intimidação irá se voltar contra eles”. Carlos Fernando recomendou: “Coragem… Rsrsrs”.

Após compartilhar com o grupo vídeos de uma manifestação que estava ocorrendo na Avenida Paulista, em São Paulo, Martello sugeriu que todos os integrantes da operação renunciassem aos cargos se algo acontecesse com Moro. Laura sugeriu que a melhor resposta seria mover uma ação contra Lula e pedir sua prisão.

Para Andrey Borges de Mendonça, seria difícil defender a divulgação da conversa de Dilma por causa do horário em que ocorrera, mas a maioria discordou. “O moro recebeu relatório complementar e o incorporou”, disse Carlos Fernando. “Nesta altura, filigranas não vão convencer ninguém.”

Deltan entrou tarde na discussão e se alinhou com Carlos Fernando. “Andrey No mundo jurídico concordo com Vc, é relevante”, disse. “Mas a questão jurídica é filigrana dentro do contexto maior que é político.”

Mendonça disse concordar com o chefe da força-tarefa, mas insistiu. “Isso tera q ser enfrentado muito em breve no mundo juridico”, escreveu. “O estrago porem esta feito. E mto bem feito”. Era tarde, e os outros integrantes do grupo não se manifestaram mais sobre o assunto.

16.mar.2016

Orlando 21:05:53 Estou preocupado com moro! Com a fundamentação da decisão. Vai sobrar representação para ele.

Carlos Fernando 21:06:48 Vai sim. E contra nós. Sabíamos disso.

Orlando 21:09:14 Ele justificou em precedentes stf a abertura dos áudios?

Laura Tessler 21:09:25 Acho que não…já chagaram ao limite da bizarrice…a população está do nosso lado…qualquer tentativa de intimidação irá se voltar contra eles

Carlos Fernando 21:18:01 Coragem… Rsrsrs

[…]

Orlando 21:19:20 Se acontecer algo com moro renúncia coletiva de MPF, pf e RF

[…]

Carlos Fernando 21:19:48 Por mim, ok

21:20:07 Adoro renunciar… Rsrsrs

Laura 21:20:28 Renúncia coletiva nada….denúncia é pedido de prisão!!!!

21:21:20 Hahahhahahaha

Carlos Fernando 21:21:21 Laura é xiita.. Rsrsrs

A transcrição das mensagens manteve a grafia original dos arquivos obtidos pelo The Intercept Brasil

Moro não fez nenhuma menção à conversa de Dilma e Lula na decisão que levantou o sigilo dos autos. No dia seguinte, em novo despacho, afirmou que não tinha prestado atenção no diálogo anexado aos autos. “Não havia reparado antes no ponto, mas não vejo maior relevância”, escreveu.

A resposta chegou cinco dias depois, em despacho do ministro Teori Zavascki, relator dos casos da Lava Jato no STF. Ele suspendeu as decisões de Moro e mandou que enviasse os autos da investigação sobre Lula a Brasília, observando que o sigilo fora levantado “sem nenhuma das cautelas exigidas em lei”.

Ao explicar sua conduta uma semana mais tarde, Moro disse a Teori que não tivera intenção de provocar “polêmicas e constrangimentos desnecessários” e pediu “respeitosas escusas”, mas não reconheceu nenhum erro na condução do processo.

Junto com os autos, Moro enviou a Teori um CD com todos os diálogos interceptados pela polícia, afirmando que mantivera em sigilo apenas conversas pessoais, com advogados ou que “simplesmente não têm conteúdo jurídico-criminal relevante”.

Finalmente, em junho, Teori anulou as decisões de Moro e o repreendeu, afirmando que ele usurpara as atribuições do Supremo ao tratar a conversa de Dilma e Lula como válida, divulgar diálogos dela e de outras autoridades com foro na corte e fazer juízo de valor sobre sua conduta sem ter competência legal para tanto.

Mas os efeitos das decisões de Moro eram irreversíveis. Com base nas conversas divulgadas pelo juiz, o ministro Gilmar Mendes, do STF, anulou a posse de Lula dois dias depois, em 18 de março. Com o aprofundamento da crise política, a Câmara aprovou a abertura do processo de impeachment em abril e afastou Dilma do cargo.
Lula conversa ao telefone no dia em que foi gravado pela PF, em cena registrada no documentário ‘Democracia em Vertigem’
Lula conversa ao telefone no dia em que foi gravado pela PF, em 2016, em cena registrada no documentário ‘Democracia em Vertigem’ – Reprodução

OUTRO LADO

O ministro da Justiça, Sergio Moro, disse que não soube dos telefonemas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que a Polícia Federal grampeou e manteve sob sigilo em 2016, quando era o juiz à frente das ações da Lava Jato em Curitiba.

“O atual ministro teve conhecimento, à época, apenas dos diálogos selecionados pela autoridade policial e enviados à Justiça”, afirmou o Ministério da Justiça, por meio de nota.

“Cabe à autoridade policial fazer a seleção dos diálogos relevantes do ponto de vista criminal e probatório”, afirmou. “Diálogos que não envolvam ilícitos não são usualmente selecionados.”

Embora as mensagens obtidas pelo Intercept indiquem sua presença em reuniões com integrantes da Lava Jato para tratar das escutas, Moro disse não saber se os procuradores também participaram da seleção dos áudios divulgados.

“Se o Ministério Público Federal também participou da seleção, o ministro da Justiça desconhece, mas, se ocorreu, isso seria igualmente lícito”, afirmou.

Moro disse que suas razões para tornar públicos os telefonemas de Lula estão expostas em suas decisões como juiz, e acrescentou que todo o material foi enviado depois ao Supremo Tribunal Federal.

O ministro reafirmou que não reconhece a autenticidade das mensagens recebidas pelo Intercept, cujo vazamento é objeto de uma investigação conduzida pela Polícia Federal.

Em nota, a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba disse que cabe à polícia selecionar as interceptações relevantes para as investigações e que “não houve seleção de áudios pelas autoridades quando do levantamento do sigilo” do caso de Lula.

“Havendo áudio ou qualquer outra prova de conduta ilícita por parte de pessoas com prerrogativa de foro, a Procuradoria-Geral da República ou outra autoridade competente é comunicada, sem exceção”, afirmou.

“Não havendo indícios de crimes, os áudios são posteriormente descartados, conforme previsto na legislação, com a participação da defesa dos investigados”, acrescentou. “Neste contexto pode ter havido a captação fortuita de diálogos de eventuais outras pessoas não investigadas.”

“As conversas que não revelaram, na análise da polícia, interesse para a investigação, permaneceram disponíveis para a defesa, que tem o direito de informá-las nos autos e utilizá-las”, observou.

A força-tarefa acrescentou que seu coordenador, o procurador Deltan Dallagnol, “não conseguiu acompanhar diretamente os acontecimentos daquela tarde” porque passou o dia em Brasília, com muitos compromissos.

A Polícia Federal não quis fazer comentários sobre a seleção dos áudios que anexou aos autos da investigação em 2016.

Em nota na época, a PF observou apenas que a interrupção de interceptações telefônicas depende do cumprimento da ordem judicial pelas operadoras de telefonia, e que todas as ligações gravadas foram encaminhadas à Justiça para que definisse seu destino, não só as que foram anexadas aos autos.

A polícia afirmou que as investigações sobre o vazamento das mensagens da Lava Jato ainda não foram concluídas. “A Polícia Federal analisa as circunstâncias da obtenção de dados, referentes a trocas de mensagens privadas, por terceiros”, disse. “O teor de tais mensagens não é objeto da investigação.”

O procurador Eduardo Pelella, que era chefe de gabinete do procurador-geral Rodrigo Janot, disse que “tomou conhecimento dos fatos a partir do que foi informado pelos colegas de primeiro grau”, e que Janot “aconselhou que fosse seguido o padrão de atuação da força-tarefa em casos semelhantes”.

Informado das anotações da PF sobre suas conversas com Lula em 16 de março de 2016, o ex-presidente Michel Temer disse que reconhece os diálogos, e que nunca soube que tinha sido grampeado naquele dia.

 

 

*Do ET Urbis Magna

 

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Requião ao procurador que o chamou de “inimigo”: “Wladimir Aras me causa nojo!”

Requião se mostrou indignado com os comentários feitos pelas costas.

“Me causa nojo”, foi o que o ex-senador Roberto Requião (MDB-PR) disse ao tomar conhecimento das mensagens do procurador Vladimir Aras divulgadas na última reportagem da Vaza Jato. Em conversa com Deltan Dallagnol, Aras defende a candidatura do coordenador da Lava Jato para o Senado Federal e chama Requião e a presidenta nacional do PT e então senadora pelo Paraná, Gleisi Hoffman, de “inimigos”.

Requião se mostrou indignado nas redes sociais, comentando que Aras estava sempre no seu gabinete enquanto operava contra ele pelas costas. “E o tal de Aras, muito simpatico, me visitava no gabinete, enquanto operavam contra minha imagem com insinuações, calúnias, infamias etc, etc… Me causa nojo!”, desabafou.

Ao defender a candidatura de Dallagnol ao senado, Aras classificou Requião e Gleisi como “inimigos”. “Você tem de pensar no Senado. Você se elege fácil e impede um dos nossos inimigos no Senado: Requião ou Gleise caem”, disse.

O medebista era alvo de frequentes críticas pelos membros da Lava Jato por ter sido um dos autores da Lei de Abuso de Autoridade, aprovada no Congresso em agosto deste ano, mas também dialogava com os membros do MPF e chegou a recuar em alguns pontos do texto apresentado ao Senado.

A revelação fez Aras ocultar o conteúdo de seu Twitter. O procurador é o nome favorito de Dallagnol e do ministro da Justiça, Sérgio Moro, para ocupar a cadeira da Procuradoria-Geral da República (PGR). Usuários da rede social acreditam que o procurador escondeu as publicações para apagar as que forem comprometedoras.

 

*Com informações da Forum

 

 

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As manobras políticas da Lava Jato contra Gleisi e Requião em prol do candidato ao senado, Deltan Dallagnol

A íntegra da matéria

O procurador Deltan Dallagnol considerou durante mais de um ano se candidatar ao Senado nas eleições de 2018, revelam mensagens trocadas via Telegram e entregues ao Intercept por uma fonte anônima. Num chat consigo mesmo, que funcionava como espaço de reflexão do procurador, ele chegou a se considerar “provavelmente eleito”. Também avaliou que a mudança que desejava implantar no país dependeria de “o MPF lançar um candidato por Estado” — uma evidente atuação partidária do Ministério Público Federal, proibida pela Constituição.

As mensagens indicam, ainda, que a candidatura não era meramente um plano pessoal de Dallagnol, mas, diante de um “sistema político derrubado”, um desejo de procuradores que ia além da Lava Jato e do Paraná. Em mais de um momento, ele afirma que teria apoio da força-tarefa caso decidisse concorrer, o que indica que isso foi tema de debates internos.

O procurador também dá a entender ter tratado da candidatura com figuras como o jurista Joaquim Falcão, professor da Fundação Getúlio Vargas no Rio de Janeiro, ex-presidente da Fundação Roberto Marinho e membro da Academia Brasileira de Letras.

Apesar de ver a política como “algo que está no meu destino”, Dallagnol decidiu no final de 2017 permanecer procurador da República, mas não abandonou a ideia de ver seu retrato nas urnas eletrônicas.

“Tenhoapenas 37 anos. A terceira tentação de Jesus no deserto foi um atalho para o reinado. Apesar de em 2022 ter renovação de só 1 vaga e de ser Álvaro Dias, se for para ser, será. Posso traçar plano focado em fazer mudanças e que pode acabar tendo como efeito manter essa porta aberta”, escreveu, em 29 de janeiro de 2018, numa longa mensagem enviada para ele mesmo.

A referência é ao senador paranaense Alvaro Dias, do Podemos, aliado da Lava Jato e poupado pelas investigações da operação, cujo mandato termina em 2022. Dallagnol havia recebido um convite para ser candidato ao Senado naquele mês — justamente pelo partido de Dias — entregue por outro procurador da Lava Jato, Diogo Castor de Mattos. Poucos dias depois, fez a longa ponderação em que pesava os prós e contras de uma aventura política, também em um texto que enviou pelo Telegram para si próprio.

Na reflexão, ele se via dividido entre três opções. A primeira era se candidatar ao Senado, pois julgava que seria “facilmente eleito” e via “circunstâncias apontando possivelmente nessa direção”, entre elas o fato de que “todos na LJ apoiariam a decisão” de apresentar seu nome aos eleitores, em suas próprias palavras.

Ainda assim, o procurador via “risco para a Lava Jato porque muitas pessoas farão uma leitura retrospectiva com uma interpretação de que a atuação desde sempre foi política”. “Pior ainda, pode macular mais do que a Lava Jato, mas o movimento anticorrupção como um todo, que pode parecer politicamente motivado. Por fim, a candidatura pode macular as 10+ como uma plataforma pessoal ou de Deltan para eleição, retirando aura técnica e apartidária”, preocupou-se.

“Há ainda quem leia que uma atuação simbólica como a de Randolfeé inócua (como Josias de Souza), embora eu discorde (com Michael Mohallem). Além disso, ainda que seja algo que está no meu destino, como Joaquim Falcão disse, sair agora seria muito arriscado e não produtivo em comparação com outras opções”, prosseguiu Dallagnol.

Ao Intercept, Josias de Souza e Mohallem confirmaram que tiveram conversas com Dallagnol no teor mencionado pelo procurador em sua reflexão. Falcão não foi encontrado para comentar.

A segunda opção colocada pelo procurador para si mesmo era prosseguir na carreira no Ministério Público Federal. “Lutar pela renovação enquanto procurador: mantém a credibilidade, mas perde a intensidade que seria necessária”, avaliou. “Precisaria me dedicar bastante a isso e me programar. Para aumentar a influência, precisaria muito começar uma iniciativa de grupos de ação cidadã. Dois pilares seriam: grupos de ação cidadã em igrejas e viagens. Tem um risco de CNMP, mas é pagável, cabendo fazer uma pesquisa de campanhas públicas (de órgãos) de voto consciente, para me proteger.”

Por fim, a terceira possibilidade analisada por Dallagnol em janeiro de 2018 era deixar a carreira de procurador sem abraçar a política partidária. “Lutar pela renovação enquanto cidadão, pedindo exoneração: esta seria a solução ideal pela perspectiva da credibilidade (não seria político, mas ativista) e de intensidade (“Não vote em Fulano). Perderia um pouco de credibilidade e visibilidade, por deixar a posição pública de coordenador da operação. Não teria riscos de corregedoria. Poderia me dedicar integralmente às 10+”, calculou.

Afinal, por enxergar “riscos concretos à causa anticorrupção”, Dallagnol decidiu ficar no MPF, embora não tenha descartado concorrer em 2022. Até lá as condições para que procuradores possam disputar eleições podem mudar, graças a uma iniciativa da associação de classe que busca garantir a eles o direito de serem candidatos sem abandonarem os cargos no Ministério Público.

‘AJUDA SE O MPF LANÇAR UM CANDIDATO POR ESTADO’

primeira menção à aventura política de Deltan Dallagnol no Telegram surgiu em meados de dezembro de 2016, numa conversa entre ele e o procurador Vladimir Aras, que trabalhava em Brasília. Aras é próximo de Dallagnol, e foi apoiado por ele como sucessor de Raquel Dodge na PGR.

“Vc tem de pensar no Senado”, escreveu Aras, então chefe da Secretaria de Cooperação Internacional da Procuradoria Geral da República. A resposta de Dallagnol deixou claro que o tema não era novidade nas conversas entre os procuradores. Eram tempos em que a Lava Jato se sentia ameaçada. Dois dias antes, em uma audiência, os advogados de Lula haviam discutido com Sergio Moro, afirmando que ele estava atuando como “acusador principal”, e não como juiz.

Em resposta, a associação de juízes federais publicou nota repudiando o que chamou de estratégia dos advogados de Lula para afastar Moro da Lava Jato. No dia seguinte à publicação da nota — e horas após a conversa entre Aras e Dallagnol –, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, publicou um comunicado interno dizendo que a Lava Jato “desagrada parte da estrutura de poder”.

Em meio a isso tudo, Aras sugeriu que Dallagnol buscasse uma vaga no Senado, tirando de lá políticos que via como “inimigos” da Lava Jato.

14 de dezembro de 2016 – Chat privado

Vladimir Aras – 10:30:29 – Vc tem de pensar no Senado
Deltan Dallagnol – 12:58:02 – Obrigado pelo incentivo, mas vejo muitos poréns
Aras – 13:09:38 – Vc se elege fácil e impede um dos nossos inimigos no Senado: Requiaoou Gleisecaem
Dallagnol – 13:29:56 – Não resolve o problema. Ajuda se o MPF lançar um candidato por Estado. Seria totalmente diferente e daria trabalho, mas pode ser uma das estratégias para uma saída.
Dallagnol – 13:30:22 – No PRnão precisaria ser eu rs, mas eu apoiaria fortemente essa rede de candidatos
Dallagnol – 13:30:44 – Ou pensamos alguma saída maluca, ou estamos ferrados
Aras – 13:45:12 – Vc e Moro

Aras – 13:45:14 – Ou Carlos

‘GANHA MENOS, TEM MENOS FÉRIAS, FICA TOMANDO PEDRADA’

Meses depois, no começo de 2017, a possível candidatura se espalhou pelos corredores do Ministério Público Federal. A procuradora Luciana Asper, do Distrito Federal, voluntária da campanha pelas dez medidas, abordou Dallagnol em março daquele ano. Ele desconversou — mas não negou.

1º de março de 2017 – Chat privado

Luciana Asper Valdir – 10:41:42 – Tem alguma chance de vc se candidatar a senador?? Alguns estão me perguntando.
Deltan Dallagnol – 11:49:16
Dallagnol – 11:49:22 – Valeu Lu!
Dallagnol – 11:50:43 – Não tem urgência, vou aguardar então, obrigado!
Dallagnol – 11:57:18 – Eu não gostaria, sendo sincero, por uma série de razões. Não é meu perfil, é uma turbulência na vida familiar, ganha menos, tem menos férias, fica tomando pedrada na vitrine num jogo de menitras, correria um risco grande ao me desligar do MPF, tem a questão da LJ etc. Contudo, tem muitas pessoas que respeito muito que estão incentivando, inclusive o pessoal da LJ. Hoje, descogito, e essa é a melhor resposta para quem pergunta, até para não expor o caso. A verdade é que quero em minha vida, em primeiro lugar, servir a Deus, e a Bíblia coloca que a vida do cristão é como o vento, que não sabe para onde vai. Se um dia decidir tentar, é porque entendi que é o melhor modo de servir a Deus e aos homens e por puro espírito público, porque vontade não tenho, Lu. Qual a sua impressão?
Luciana Asper Valdir – 13:48:35 – Entendo vc perfeitamente! Penso exatamente como vc. E confio plenamente que Deus o guiará em todos os caminhos. Vc ouvirá a voz Dele e Ele te colocará onde Ele precisa para continuar no caminho de restauração do que deveria ser está nação que Ele agraciou com tantas bênçãos e foi tão maltratada pelos líderes até hj. Eu confesso que peço todos os dias a Deus para colocar o poder neste país nas mãos dos filhos Dele, verdadeiros cristãos que queiram dar a prosperidade planejada para este Brasil. Falta liderança do bem em todos os cantos. Vc já fez alguma escola no Mpf. Precisamos de um novo congresso sem duvida. Difícil avançarmos com o que vemos por lá. Precisamos de lideranças em todos os cantos! Deixa Deus te guiar que Ele saberá exatamente onde vc deve estar!
Dallagnol – 14:02:12 – Valeu Lu. Quando lembrar, ore por favor pelas decisões que tomamos aqui.
Luciana Asper Valdir – 14:40:25 – Sim. Sempre!

‘NÃO DESCARTO, MAS NÃO CONSIDERO COMPLETAMENTE’

Em julho daquele ano, o boato chegou à procuradora Anamara Osório, que enviou via Telegram a seguinte mensagem a Dallagnol: “Delta!!!! Você senador para já!! Vamos falar disso?! O que vc precisa? Hehe”. O chefe da Lava Jato não respondeu.

As conversas indicam que Osório comentou o assunto com a procuradora Thaméa Danelon, à época integrante da Lava Jato em São Paulo.

Com Danelon, de quem é mais próximo, no entanto, Dallagnol foi bem mais aberto.

9 de setembro de 2017 – Chat privado

Thaméa Danelon – 20:08:58 – Oi amigo. Vc vai sair para senador ano q vem?
Danelon – 20:13:06 – Anamara acabou de me falar!
Deltan Dallagnol – 23:34:45 – Não que eu saiba rs
Dallagnol – 23:35:21 – A fonte deve ser o Reinaldo Azevedo rs
Dallagnol – 23:35:39 – Tem muita gente incentivando, mas por enquanto acho que não é o caso

A conversa entrou madrugada adentro.

10 de setembro de 2017 – Chat privado

Thaméa Danelon – 01:47:47 – Parece q saiu na globonews
Danelon – 01:47:55 – A Anamara me confirmou Tb.
Danelon – 01:48:05 – Mas se não quiser falar ok
Danelon – 01:48:11 – Mas vc terá sempre meu apoio
Deltan Dallagnol – 10:50:37 – Valeu Tamis. Não descarto, mas não considero completamente. Jamais falaria com partido agora, seria de idiotice total. Exporia a LJ. O que Cristiana Lobo disse é que “corre em Curitiba como certo que…”. Mas é um boato falso. Jamais falei com o Álvaro Dias ou pessoas ligadas a ele sobre esse assunto.

Num grupo chamado Trinca de três, que reunia o executivo de planos de saúde Fabio Oliveira e o advogado Hadler Favarin Martines, fundadores do Instituto Mude e frequentadores da mesma igreja batista de Dallagnol em Curitiba, a candidatura também foi discutida.

1º de novembro de 2017 – Grupo Trinca de três

Fabio Oliveira – 13:16:25 – Manos, seguinte. Ontem almocei com o Campagnoloe foi uma conversa muito produtiva. Ele mesmo falou que tanto ele quanto eu e o Deltan estamos vivendo situações familiares/profissional muito parecidas. Em relação a uma possível candidatura dele, minha e tua, ele disse que o ideal seria começar um processo de exposição. Com isso em mente, ele convidou o Mude para falar no evento do dia 23 em Foz. Massa né?
Oliveira – 13:18:36 – Resolvi trocar uma ideia com vocês (tirando a situação da SUPRIMIDO um pouco de foco) pra ver o que vocês acham e também pq fui ver preço de passagem e está na casa dos 2k. O Campagnolo adiantou que o hotel ele consegue para mim mas passagem não. Pensei em ir até de carro, se for o caso.
Oliveira – 13:22:03 – Lembrando que o Deltan também falará no mesmo evento.

Eleito presidente da Federação da Indústria do Paraná, a Fiep, com o apoio do antecessor, Rodrigo Rocha Loures, pai do deputado Rodrigo da Rocha Loures, o “homem da mala” de Michel Temer, e filiado ao PRB, atual Republicanos, braço político da Igreja Universal, Edson Campagnolo foi cotado para ser candidato a vice-governador do Paraná em 2018.

Há algumas semanas, um vice-presidente da Fiep, a federação das indústrias do Paraná, o acusou de fazer pagamentos ilegais a si mesmo enquanto comandava a entidade, segundo reportagem do UOL. Ele negou. À época das conversas, porém, a acusação não era pública.

Foi justamente a Hadler Martines, que no Linkedin se identifica como sócio da multinacional de consultoria e auditoria empresarial PwC no Brasil, que Dallagnol comunicou sua decisão de não se candidatar, no fim de 2017.

18 de dezembro de 2017 – Chat privado

Deltan Dallagnol – 22:36:55 – Grande Hadler, após muita reflexão, oração, ouvir muitas pessoas e chegando a um nível de convicção pessoal e fé bastante alto quanto ao que é melhor pensando em termos de movimento anticorrupção, ontem me antecipei ao meu deadline auto-imposto (tinha me colocado um deadline no fim de janeiro) e decidi não vou sair do MPF em 2018. Posso contar mais detalhes quando conversarmos pessoalmente, mas quis adiantar isso em primeira mão para Vc.

A resposta viria no dia seguinte.

19 de dezembro de 2017 – Chat privado

Hadler Favarin Martines – 21:14:41 – Fala Delta! Cara, você terá meu apoio independente da decisão que tomar. Concordo que uma candidatura neste momento poderia envolver muitos riscos e no MPF você ainda tem muito a contribuir. Pessoalmente, acho que você é uma das maiores lideranças jovem do Brasil e isso poderá abrir grandes portas no futuro. Quem sabe num futuro próximo um cargo político possa ser interessante. Deus te abençoe! Conte comigo. Abs
Deltan Dallagnol – 22:45:49 – Valeu irmãozinho pelo apoio e incentivo sempre. Sem Vocês seria uma brasa longe do fogo. Que possamos incendiar, juntos, corações, por mudanças. Grande abraço

‘VC FICOU MAIOR DO QUE O CARGO DE PROCURADOR’

Joel Malucelli é figura notória no Paraná. Já foi nome de time de futebol, é dono de um banco, o Paraná Banco, de empresas de comunicação — possui as retransmissoras das concorrentes Bandnews FM e da CBN em Curitiba e a principal fatia da TV Band na capital do estado — e de uma empreiteira que leva seu nome e lhe colocou na mira da Lava Jato. Só não foi preso, em setembro de 2018, porque estava na Itália.

Meses antes, porém, em janeiro, Malucelli — também presidente do Podemos no Paraná e suplente do senador Alvaro Dias — abordou o procurador Diogo Castor de Mattos num clube de elite de Curitiba e lhe pediu seu número de celular. Sem conhecer os dilemas íntimos de Deltan Dallagnol ou as decisões que ele já comunicara aos amigos próximos, desejava lhe fazer uma proposta.

16 de janeiro de 2018 – Chat privado

Diogo Castor de Mattos – 20:06:32 – Oi Diogo, você poderia ver com o Dalagnol se ele aceitaria ser candidato ao Senado pelo Podemos?? O convite também partiu do Alvaro Dias! Abr Obr Joel Malucelli Pres do partido
Castor de Mattos –20:06:41 – Posso responder?

17 de janeiro de 2018 – Chat privado

Deltan Dallagnol – 13:59:25 – Ele te mandou do nada ou Vcs costumam conversar?
Dallagnol – 13:59:40 – Se costumam conversar, responda sim
Dallagnol – 13:59:55 – Diga que falou comigo e que hoje eu não penso em concorrer nas eleições
Dallagnol – 14:00:16 – Mas agradeço muito considerarem meu nome, o que recebo como um reconhecimento da importância da causa anticorrupção
Diogo Castor de Mattos – 14:01:12 – Falei uma vez na vida
Castor de Mattos –14:01:26 – Mas ele joga tênis no clube.. se sentiu amigão

Em fevereiro, outro cabo eleitoral de Dallagnol recebeu a ducha de água fria: Vladimir Aras. O procurador sondou o chefe da força-tarefa um dia depois de Dallagnol criticar o Congresso em seu Twitter: “Se cabem buscas e apreensões gerais nas favelas do Rio, cabem também nos gabinetes do Congresso”, escreveu. “Aliás, as evidências existentes colocam suspeitas muito maiores sobre o Congresso, proporcionalmente, do que sobre moradores das favelas, estes inocentes na sua grande maioria”.

21 de fevereiro de 2018 – Chat privado

Vladimir Aras – 23:29:51 – Tá firme na candidatura?
Deltan Dallagnol – 23:47:20 – Oi Vlad, sou candidato hoje apenas a cabo eleitoral seu para PGR!
Aras – 23:48:00 – Hahahaha
Dallagnol – 23:48:06 – Algo que fiz te deu essa impressão? Pergunto porque to indo na direção contrária. Lutar pela causa anticorrupção a partir de onde estou
Aras – 23:48:07 – Resposta de candidato da zorra hahahah
Dallagnol – 23:48:14 – Hahaha
Aras – 23:48:36 – Por causa de suas declarações sobre o congresso e pelo lançamento da campanha. Muita gente especulando isso
Dallagnol – 23:50:40 – Pode ser assertivo em sentido contrário. Na verdade, o meu tt expõe a diferença de tratamento entre poderosos e vulneráveis. É incogitavel no Congresso, mas cogitavel nas favelas, mesmo quando a mesma lógica está presente. Essa mesma diferença vemos na análise pela Justiça de prisões etc. Foi só uma ironia ao sistema de justiça que privilegia uns e prejudica outros. Tinha recém retuitado suas colocações sobre esse assunto, mto pertinentes
Aras – 23:51:00 – Eu vi
Aras – 23:51:07 – Não é minha interpretação
Aras – 23:51:17 – São colegas e pessoas de fora da carreira especulando
Aras – 23:51:30 – Já que abril vem chegando
Dallagnol – 23:52:31 – Nem lembrava disso mais rs. Vc está cogitando?
Dallagnol – 23:52:53 – Vc seria um excelente deputado ou senador pela BA
Dallagnol – 23:53:33 – E se tudo der errado Vc tem muita entrada. Conseguiria lugar no mercado fácil
Aras – 23:56:13 – Não
Aras – 23:56:17 – Já pensei nisso antes
Aras – 23:56:20 – Agora não
Aras – 23:56:31 – Isso é uma possibilidade
Aras – 23:56:40 – Mas não está na hora para mim
Aras – 23:56:52 – Mas nunca descarto no futuro
Dallagnol – 23:59:03 – Eu não descarto também (assim como não descarto varias outras coisas), mas hoje minha saída, a meu ver e salvo alguma mudança radical de cenário, mais prejudicaria a causa anticorrupção do que ajudaria
Dallagnol – 23:59:28 – Pelas pesquisas, estaria eleito, mas tem muito mais coisa importante em jogo

O papo continuou, com uma confidência de Dallagnol: a força-tarefa da Lava Jato apoiaria em peso sua candidatura.

22 de fevereiro de 2018 – Chat Privado

Deltan Dallagnol – 00:00:15 – (apesar do apoio da FT a qq que fosse a decisão)
Vladimir Aras – 00:16:13 – No seu lugar eu iria! Já te disse isso. Aliás, vc deve lembrar que te digo isso há muito tempo hahaha
Aras – 00:16:58 – Acho que não haveria prejuízo à causa anticorrupção. Vc ficou maior do que o cargo de procurador
Deltan Dallagnol – 00:24:19 – Valeu pela força, Vlad! Um dia te conto melhor a reflexão pessoalmente.
Aras – 00:26:36 – Ok falou Amigo

No início de agosto de 2018, a Associação Nacional dos Procuradores da República, que atua como um sindicato da categoria, foi à justiça brigar pelo direito de que membros do Ministério Público Federal possam se filiar a partidos políticos e disputar eleições sem precisar abrir mão de seus cargos. Atualmente, isso é vedado a eles e a membros do poder Judiciário pela Constituição.

Não há, nas conversas do Telegram, indícios de que a medida da ANPR tenha sido tomada para favorecer uma hipotética candidatura de Deltan Dallagnol — para que pudesse disputar as eleições de 2018, ele teria de deixar o MPF até abril daquele ano.

Ainda assim, a ação foi bastante discutida num dos grupos que os procuradores mantinham no Telegram, chamado BD. Sem conhecer os planos de Dallagnol e da Lava Jato para uma eventual candidatura do chefe da força-tarefa ao Senado, alguns se preocupavam que a ação pudesse causar desgaste à categoria e justificar o discurso de que o ex-presidente Lula é um preso político, ecoado por aliados do petista.

3 de agosto de 2018 – Grupo BD

Janice Ascari – 08:41:07 – A medida valeria também para juízes de todo o país. A ANPR pede ainda que, numa medida cautelar, o STF autorize procuradores e promotores a participarem inclusive das eleições deste ano. Para isso, bastariam se licenciar dos cargos. Pelas regras em vigor, se quiserem se candidatar a cargos eletivos, procuradores e promotores são obrigados a se demitirem. A ADI foi protocolada em nome da ANPR pelo advogados Rodrigo Mudrovitsch e passou a tramitar com o número 5985. No documento, o advogado pede que o STF declare inconstitucional o parágrafo 5º, inciso II, alínea “e” do artigo 128 da Constituição. Pelo trecho do artigo, membros do Ministério Público não podem “exercer atividade político-partidária”. O mesmo tipo de restrição impede candidaturas de magistrados. Mudrovitsch entende ainda que, mesmo antes de examinar o mérito da questão, o STF poderia conceder uma medida cautelar para evitar eventuais prejuízos a procuradores e promotores que queiram participar das eleições em outubro.
Ascari – 08:43:43 – Matéria dO Globo sobre a ação da ANPR Então valeria para Eleições 2018
Rodrigo Tenório – 08:54:27 – Não valerá Janice, por conta doa prazos de desincompatibilizacao. Colegas teriam q ter se afastado bem antes da propositura da acao
Lauro Cardoso – 08:54:56 – Com todo respeito, não achei oportuna a ação nesse momento conturbado. Minha opinião não vale muito, mas pode despertar dúvidas sobre nossos propósitos, ainda mais considerando o atual discurso, injustificado obviamente, de que Lula é um preso político.
Rodrigo Tenório – 08:55:44 – O único desincompatibilizado é Mario Lucio?
Roberto Dassié – 09:07:09 – https://painel.blogfolha.uol.com.br/2018/08/03/ala-do-stf-critica-acao-da-anpr-que-tenta-viabilizar-candidatura-de-procuradores/
José Robalinho Cavalcanti – 09:09:45 – Não valeria porque não pedimos alteração de nada na legislação eleitoral. Quem não se desincompatibilizou não pode se candidatar O jornal está errado
Cavalcanti – 09:10:01 – E eu expliquei isso ontem a n jornalistas
Cavalcanti – 09:12:13 – Como disse Rodrigo tomamos o cuidado de esperar o fim do prazo Lauro. Momento bom nunca haveria. Rs A questão eh polêmica. Em outros momentos seria por outros fatores como o congresso. Ah: o CNPGontem votou por unanimidade apoio público à iniciativa – que só teve aplausos – e deve ir também ao processo. Hoje a CONAMPdeve fazer o mesmo
Cavalcanti – 09:13:42 – Sim
Cavalcanti – 09:13:52 – No mpf. Mas há outros casos
Dassié – 09:14:12 – Robalinho, pq conamp não assinou a inicial?
Cavalcanti – 09:14:16 – Mas não falo com Mario Lúcio já Semanas.
Cavalcanti – 09:16:19 – Por n motivos/ eh mais lenta e o advogado eh nosso e decidimos rapirdo Rs E aliás ela vai discutir hoje o que fazer. Agora. Não vou adiantar. Mas Victor estação breno comigo na reunião do Cnpg e participou do apoio geral
Cavalcanti – 09:16:54 – E me disseram que talvez ele tenha desistido o que deixa zero de pessoas atingidas no mpf rs Não afeta as atuais eleições
Cavalcanti – 09:17:06 – Gente tenho reunião aqui. Ab
Cavalcanti – 09:19:02 – ok! Obrigado
Cavalcanti – 09:21:24 – Não por isso Roberto. E não esqueçam que a tese está em absoluta sintonia com s posição admistrativa de nossa pgr e nosso ex pgr – ambos liberaram Mario Lúcio – e com a manifestação da procuradoria eleitoral no tse
Hélio Telho – 11:14:15 – Que eu saiba, no MPF, é. Não sei nos demais ramos
Cavalcanti – 11:14:24 – Isso
Telho – 11:14:42 – A FsPacertou
Cavalcanti – 11:16:20 – Foi uma das que falou comigo

A ação direta de inconstitucionalidade 5985, proposta pela ANPR, está parada desde fevereiro passado no gabinete do ministro Marco Aurélio Mello — por ser um tema regido pela Constituição, cabe ao STF tratar do caso. Em pareceres enviados ao Supremo, o Senado e a Advocacia-Geral da União já disseram ser contra a proposta.

Ainda assim, se o STF eventualmente acatar o que a associação dos procuradores deseja, Dallagnol, Aras e juízes como Marcelo Bretas poderão se colocar como opção ao eleitorado sem o risco de perder os salários e mordomias das carreiras — como o generoso auxílio-moradia pago mesmo a quem já possui casa própria. Nesse caso, o Partido Social Liberal de Jair Bolsonaro provavelmente terá em 2022 o rival que Dallagnol projetou no Telegram: o Partido do MPF. Ou, quem sabe, o Partido da Lava Jato.

Ao Intercept, Michael Mohallem, pesquisador do Programa de Transparência Pública da FGV no Rio, confirmou que conversou com Deltan Dallagnol a respeito de uma eventual candidatura do procurador ao Senado.

“Eu tinha um projeto de pesquisa da Transparência Internacional e ele por vezes participou de algumas reuniões, como colaborador. Me lembro, antes de alguns desses encontros, dele comentar não da intenção de se candidatar, mas numa possibilidade vaga. Objetivamente, sim, em algum momento ele comentou sobre a possibilidade [de ser candidato ao Senado]”, relatou Mohallem.

“Não sei dizer a data, mas foi bem antes das eleições do prazo legal para ele sair da carreira. Eu conheci Deltan naquele período, não é um amigo, um conhecido de longa data. Ele não tinha liberdade para eu aconselhá-lo a sair ou não [candidato]. E não me lembro dele perguntar qual minha opinião [a esse respeito], mas mais sobre impactos a Lava Jato, como eu pesquiso corrupção. Ele não queria impactos negativos para a operação”, ele disse.

“Ele [Dallagnol] não falou em ser candidato, claramente, mas em ter procuradores [concorrendo] na eleição do ano que vinha. Até fui atrás, mas não apareceram. Foi após uma entrevista em vídeo, feita na [sede da] Procuradoria [Geral da República], em Brasília, em outubro de 2017. Após a entrevista, os cinegrafistas estavam desmontando os equipamentos e houve essa rápida conversa”, relembrou o jornalista Josias de Souza.

“Ele disse que às vezes tinha a impressão de que tinha de haver procuradores no Congresso, que a coisa daí talvez caminhasse. Seria um erro capital, eu falei, porque vocês como procuradores realizam um trabalho meritório. Se vão para o Senado, primeiro comprometem esse trabalho e, em segundo lugar, lá gente muito bem intencionada, e citei o exemplo de Ranfolfe [Rodrigues], não tem retaguarda partidária, e tem atuação que não resulta na concretização das boas intenções”, prosseguiu o colunista do UOL.

Também ligado à FGV Rio, Joaquim Falcão está em viagem ao exterior e não foi localizado para falar, informou a assessoria da instituição. O espaço está aberto para a manifestação dele.

Pedimos, novamente, uma entrevista a Dallagnol para que o procurador falasse sobre suas ambições políticas. Ele voltou a se recusar e preferiu responder via assessoria: “O procurador Deltan Dallagnol se lembra de ter feito reflexões sobre esse assunto, mas não vai comentar pensamentos ou cogitações de caráter íntimo. As mensagens são oriundas de crime cibernético e têm sido usadas fora do contexto para acusações falsas”.

Ao contrário do que acusa o procurador, o Intercept lembra que o arquivo da Vaza Jato foi entregue por uma fonte anônima, o que é lícito e legítimo no jornalismo, e que trabalha para que elas sejam reportadas dentro do contexto adequado. Clique aqui para saber mais sobre os critérios editoriais do Intercept que levaram à publicação das mensagens.

“A troca de mensagens expostas se deu no nível pessoal e informal. Tais conjecturas jamais foram levadas ao Conselho ou diretoria do Mude e se tivessem sido levadas não seriam apoiadas. O Mude não tem e nunca teve intenção de apoiar ou lançar candidatos de qualquer matriz ideológica”, disseram, em nota, Patricia Alves Fehrmann e Gisele Jansen, respectivamente diretora-executiva e vice-presidente do Instituto Mude.

 

*Do Intercept Brasil

 

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Dallagnol e a BaladaJato organizada pela empresária que aparece nos vazamentos do Intercept

Na segunda-feira, dia 2, em parceria com a Agência Pública, o Intercept revelou que Dallagnol atuou diretamente para levar grandes empresários a financiar o “Instituto Mude – Chega de Corrupção”.

Trata-se de uma organização não-governamental que nasceu para coletar assinaturas em favor das dez famosas dez medidas contra a corrupção.

Dallagnol era uma espécie de diretor informal da coisa.

Em setembro de 2016, a co-fundadora do Mude, Patricia Fehrmann, escreveu o seguinte em um chat:

Olha a Rosangela Lyra na área gente: Oi Patricia acho que consegui 2 mega hiper Empresários, nao querem ver a palestra necessariamente mas dar um alo Lava Jato, para Deltan, e seria importante ter alguem do Mude junto pra explicar rapidamente o que precisamos, eles nao gostam de “perder” tempo entao precisa ser objetivo e rapido ok? Ela está falando sobre terça na Casa do Saber

Dallagnol responde: Bora.

Rosangela é ex-representante da Dior no Brasil e a palestra aconteceu no dia 13 de setembro daquele ano.

Ela ficou famosa nos protestos pelo impeachment, quando fez parte daquela fauna que aparecia em carros de som na Paulista de dia e tomando champanhe à noite nos Jardins.

Ex-sogra do volante Kaká, do São Paulo e da seleção brasileira, disputava os holofotes com a filha Caroline Celico.

Já conhecia Deltan de outros carnavais.

Em outubro de 2015, Rosangela organizou uma tal “Balada Contra Corrupção”, cuja estrela era Deltan, o Wesley Safadão da força tarefa.

A Veja São Paulo cobriu assim a soirée:

A noite de quarta (21) seria comum na Casa 92, balada que reúne mauricinhos e hipsters em Pinheiros. Carros de luxo esperavam sua vez no valet e muita gente bem vestida aguardava na fila para entrar no espaço.

Mas, ao contrário dos jovens habitués, quem compareceu ao evento de ontem foi um público ligeiramente mais velho, composto majoritariamente pela alta sociedade paulistana.

Estavam ali, claro, para beber champanhe, cerveja e suco de cranberry e lichia. A confraternização, no entanto, ia além. A festa, organizada pela empresária Rosângela Lyra, era uma balada contra a corrupção.

Para conseguir o ingresso, cada um teve que levar um papel com pelo menos dezesseis assinaturas em prol das “Dez medidas contra a corrupção”, iniciativa do Ministério Público Federal do Paraná para pressionar o Congresso por leis mais rígidas contra desvios de conduta dos políticos.

Os convidados não só atingiram a meta como dobraram a meta: houve gente que chegou com sacolas repletas de fichas preenchidas. Só a jornalista Lúcia Sauebronn conseguiu 400 nomes. “Fui pra Oscar Freire, para o Ibirapuera, pedi até no meu cabelereiro”, contou.

Por volta das 23 horas, com a casa cheia, chegou a “presença vip” da noite: o procurador da República Deltan Dallagnol, um dos coordenadores da força-tarefa que investiga a Operacão Lava-Jato no Ministério Público Federal do Paraná. Tímido e low profile [N.R.: imagine se não fosse], foi tratado como celebridade pelos presentes e não conseguia dar um passo sem posar para fotos e receber os parabéns pelo trabalho.

“Deltan, cadê você, eu vim aqui só pra te ver”, gritava Celine Carvalho, autointitulada “mãe” do Pixuleco, o boneco inflável do ex-presidente Lula. “Não, não viemos só para vê-lo, viemos para entregar as assinaturas que ajudamos a recolher”, rebateu Rosângela, visivelmente incomodada com a histeria em torno do procurador.

O discurso de Dallagnol na festa seria feito no quintal ao ar livre, onde a maioria estava acomodada, mas foi só o procurador pôr os pés na Casa 92 que um pé d’água começou a cair em São Paulo.

Procurando solução, Rosângela o levou para debaixo de um toldo, mas nada feito: a chuva engrossou mais e mais e o público começou a se dispersar, procurando se proteger do aguaceiro. (…)

Já com os sapatos encharcados, o procurador finalmente migrou para uma área fechada da balada e fez seu discurso. “Vocês acordaram cedo, estão cansados, tem chuva lá fora. São circunstâncias adversas que podem ser comparadas com as do nosso país hoje. O que precisamos é de pessoas como vocês, dispostas”, disse.

Fã de carteirinha, a empresária Sandra Koraicho já tinha ouvido outra palestra do procurador e o considera uma espécie de guru. “Quando ele fala, dá uma paz, uma esperança. Você sai outra pessoa.”

Segundo Rosângela Lyra, mais de 20 000 assinaturas foram entregues ao procurador na noite de ontem – a Procuradoria do Paraná já tem 400 000 signatários e precisa chegar a 1,5 milhão para enviar o documento para o Legislativo.

 

*Com informações do DCM

 

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Vaza Jato mostrará nesta segunda-feira conflito de interesses na captação de recursos para o instituto de Dallagnol

Dallagnol teria fundado o Instituto Mude, criado para levantar a bandeira das 10 Medidas contra a Corrupção e que seria dirigido “nas sombras” por ele.

A Agência Pública é mais um veículo que se junta ao The Intercept Brasil nas reportagens da Vaza Jato. O anúncio foi feito pelo Twitter da Pública, que adiantou que ainda nesta segunda-feira (2) deve divulgar reportagem sobre o conflito de interesses na captação de recursos por um instituto fundado por Deltan Dallagnol.

“A Agência Pública é o mais novo veículo parceiro do The Intercept Brasil na Vaza Jato. Nesta segunda revelaremos conflito de interesses na captação de recursos para instituto fundado por Deltan Dallagnol”, publicou.

Dallagnol teria fundado o Instituto Mude, criado para levantar a bandeira das 10 Medidas contra a Corrupção e que seria dirigido “nas sombras” por ele, para se posicionar sobre a substituição no STF sem aparecer para “não se queimar”. A organização, no entanto, estaria sendo usada para municiar grupos de direita e sites alinhados, como o Antagonista, para atacar inimigos da Lava Jato.

 

*Com informações da Forum

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Pisado, triturado e cuspido pelo STF, Moro, sem utilidade, vira pano de chão de Bolsonaro

Ministro da Justiça é derrotado pelo Supremo e enrola-se nas próprias ambições.

Os superpoderes do ministro Sérgio Moro se esvaem a olhos vistos. Por razões insondáveis, uma parcela significativa da população continua a apoiar sua permanência no governo – 52%, segundo a pesquisa CNT/MDA divulgada na segunda-feira 26. Mas o entusiasmo com o ex-juiz e a Lava Jato anda mais frio do que o inverno na Sibéria. Uma leve maioria (42,2% contra 41,7%), de acordo com o mesmo levantamento, acredita que as revelações pelo site The Intercept Brasil de conversas privadas do magistrado e integrantes da força-tarefa comprometem a isenção da operação.

Parece pouco – e talvez seja –, mas o fato é que o escândalo da “Vaza Jato” tem o efeito de uma criptonita amarrada à cintura do herói curitibano. Moro arrasta-se por Brasília, de derrota em derrota, e depende cada vez mais da sobrevida subserviente oferecida por Jair Bolsonaro. Inversão curiosa de posições: Super-Moro, um dos fiadores da vitória eleitoral da versão brasileira de Lex Luthor, só respira politicamente por causa do beneplácito do superior.

Este, aliás, aproveita as oportunidades para cobrar a fatura. Após a tentativa de ingerência do Palácio do Planalto na Polícia Federal e o anúncio de corte de verbas que inviabilizam o trabalho do Ministério da Justiça, sem falar no esforço mínimo feito pelo Executivo na aprovação do pacote “anticrime” do ex-juiz, Moro ensaiou uma rebelião. Ensaiou. A imagem final foi outra, de quase genuflexão, representada pela foto em que, claramente incomodado, o ministro bate continência para o presidente. E pela seguinte declaração de Bolsonaro: “Olha, tem carta branca, e eu tenho poder de veto em qualquer coisa, senão eu não sou presidente. Todos os ministros têm essa ingerência minha e eu fui eleito para mudar. Ponto final”. Assessores e amigos de Moro, relata a crônica política brasiliense, sugerem um pedido de demissão. O ex-juiz mede as consequências. Deixar o governo nestas condições representaria a morte prematura de suas ambições eleitorais.

Os tubarões sentem o cheiro de sangue, os abutres farejam a carniça… Não é diferente em Brasília. É inegável a relação direta entre o enfraquecimento de Moro e uma decisão inédita do Supremo Tribunal Federal. Na terça-feira 27, pela primeira vez desde o início da Lava Jato, a Segunda Turma da corte revogou por 3 votos a 1 uma decisão do ex-magistrado, a condenação de Aldemir Bedine, ex-presidente da Petrobras. Os ministros apontaram um erro fatal no processo: o acusado não teve o direito de se pronunciar por último e se defender das acusações de um delator. Moro havia imputado a Bendine 11 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, pena reduzida a 7 anos e 9 meses pela segunda instância. “O direito de a defesa falar por último decorre do direito normativo. Réus delatores não podem se manifestar por último em razão da carga acusatória que permeia as suas acusações. Ferem garantias de defesa os instrumentos que impeçam o acusado de dar a palavra por último”, afirmou em seu voto o ministro Ricardo Lewandowski. O processo retornará à primeira instância.

Gilmar Mendes, alvo preferencial da força-tarefa de Curitiba, aproveitou o julgamento para espinafrar a Lava Jato e fazer em público o mais contundente mea-culpa de um ministro do STF: “É um grande vexame e participamos disso. Somos cúmplices dessa gente. Homologamos delação. É altamente constrangedor”. Mendes foi além: “A República de Curitiba nada tem de republicana, era uma ditadura completa. Assumiram papel de imperadores absolutos. Gente com uma mente muito obscura. Que gente ordinária, se achavam soberanos”.

A defesa de Lula enxerga uma brecha na decisão do STF para um novo pedido de anulação dos processos do ex-presidente. O advogado Cristiano Zanin Martins aponta semelhanças entre a ação contra Bendine e os procedimentos que resultaram na condenação do petista no caso do triplex do Guarujá e do sítio em Atibaia. “Tal como Bendine, o ex-presidente Lula não teve a oportunidade da última palavra nos processos de Curitiba, após ter sido indevidamente acusado por delatores. Essa situação é incompatível com a garantia constitucional da ampla defesa.”

Há mais de 500 dias na prisão, Lula mantém a esperança na Justiça, embora esteja mais ou menos clara a existência de uma jurisprudência particular, à margem do Estado de Direito, na análise dos seus recursos. Enquanto aguarda, o ex-presidente é obrigado a lidar com a falta de escrúpulos da força-tarefa de Curitiba. A nova leva de revelações de The Intercept trouxe à luz uma faceta representativa do espírito que moveu o “combate à corrupção”: o ex-presidente não era encarado como um suspeito obrigado a prestar esclarecimentos à Justiça, mas um inimigo a ser eliminado, despido de qualquer humanidade.

Os procuradores, mostram as conversas pelo Telegram, tripudiaram das mortes da ex-primeira-dama Marisa Letícia e de Vavá, irmão do ex-presidente, e dos pedidos de Lula de comparecer aos enterros. Quando se soube do estado grave de Marisa, Deltan Dallagnol e Januário Palumbo travaram o seguinte diálogo:

Dallagnol: “Um amigo de um amigo de uma prima disse que Marisa chegou ao atendimento sem resposta, como vegetal”.

Palumbo: “Estão eliminando as testemunhas…”

Em outro momento, diante de uma notícia postada na rede social pelo colega Júlio Noronha, Jerusa Viecili ironiza: “Querem que eu fique para o enterro?”

Na ocasião do velório de Vavá, Antônio Carlos Welter mencionou o direito constitucional de Lula sair cadeia para o enterro e acabou repreendido por Palumbo: “O safado só queria passear e o Welter com pena”. Laura Tessler uniu-se a Palumbo: “O foco tá em Brumadinho… Logo passa… Muito mimimi”.

Sem mimimi, Lula reagiu ao teor das conversas. “Confesso que foi um dos mais tristes momentos que passei nessa prisão em que me colocaram injustamente. Foi como se tivesse vivido outra vez aqueles momentos de dor, só que misturados a um sentimento de vergonha pelo comportamento baixo a que algumas pessoas podem chegar”, declarou.

“Peço a Deus que os ilumine, que poupe suas almas de tanto ódio, rancor e soberba.”

Até o momento, apenas a procuradora Jerusa Viecili veio a público se redimir dos comentários. “Errei. E minha consciência me leva a fazer o correto: pedir desculpas à pessoa diretamente afetada, o ex-presidente Lula”, escreveu no Twitter.

O silêncio dos associados de Moro dá razão ao ministro Mendes. Que gente.

 

*Por Sergio Lirio/Carta Capital

 

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Se depois da entrevista de Dallagnol para o El País assumindo a veracidade das mensagens contra a família de Lula, o STF se acovardar, é a falência da justiça brasileira

Em uma das entrevistas mais detalhadas que concedeu desde o início da série de reportagens que expõe supostos diálogos entre membros da Lava Jato – incluindo o atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro – em mensagens de celular, o procurador-chefe da operação, Deltan Dallagnol, se diz vítima de “maldade” e “veneno”.

Mas, frente às acusações de insensibilidade e frieza de procuradores da força-tarefa – como Januário Paludo, que teria dito que “o safado só queria passear” quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu para ir ao enterro do irmão morto por um câncer, e Laura Tessler, que pediu “dose extra de paciência para a sessão de vitimização” quando a ex-primeira-dama Marisa Letícia sofreu um AVC -, Dallagnol relativiza.

Lava Jato ‘tem coisas que foram verdade’ e não deve ser totalmente anulada, diz Lula

“As pessoas têm que entender que essas conversas são conversas que você teria na mesa de casa com a família, são pessoas que estão trabalhando há cinco anos juntas, são amigas. São conversas que você tem com o círculo de intimidade, conversas que você fica à vontade para falar até alguma besteira, uma bobagem, para ser até certo modo irresponsável”, disse o procurador-chefe da Lava Jato em entrevista exclusiva à BBC News Brasil.

Em mais de uma hora de entrevista, ao mesmo tempo em que reconhece a veracidade de alguns vazamentos publicados pelo site The Intercept Brasil (“A gente foi hackeado, eles têm mensagens verdadeiras. Eu não posso atestar que tudo lá seja verdade, mas existem coisas lá que a gente lembra”), Deltan critica a falta de contexto que enxerga nas mensagens. (“Existe aí um foco em tentar sempre mostrar aquilo que pode gerar uma polêmica”).

Na quinta-feira, uma entrevista dada pelo procurador à BBC News Brasil em abril de 2017 (Lava Jato: ‘Não temos instrumento eficiente para identificar vazamentos’, diz Dallagnol) foi citada pelo Intercept em reportagem sobre mensagens que mostrariam que procuradores “vazaram” informações à imprensa com o intuito de estimular delações premiadas. No texto do site, o procurador Carlos Fernando Santos Lima diria: “Meus vazamentos objetivam sempre fazer com que pensem que as investigações são inevitáveis e incentivar a colaboração”.

Em 2017, Deltan disse que “agentes públicos não vazam informações”, o que é apontado pelo site como uma suposta mentira do procurador-chefe. Ele nega: “Eles mudam o significado de vazamento. Usam vazamento no significado de “furo”, de informação inédita”, diz. “Outra coisa é revelar informação que está sob sigilo judicial. Isso é crime, isso é errado, isso a gente nunca fez.”

Alvo de denúncias no Conselho Nacional do Ministério Público e escrutínio pelas divulgações de mensagens com colegas, Deltan afirma que a Lava Jato está sangrando. “Isso faz a operação sangrar. E quando a operação sangra, vêm os tubarões”.

Confira a entrevista completa:

BBC News Brasil – Há dois anos, o senhor me disse: “Nos casos em que apenas agentes públicos tinham acesso a dados, as informações da Lava Jato não vazavam”. Queria saber se o senhor mantém essa informação.

Deltan Dallagnol – Mantenho integralmente. Hoje (quinta-feira, 29), saiu uma reportagem nos acusando de vazamentos, mas tem um jogo semântico aí, de significado de palavras. A gente estava conversando em um contexto em que muita coisa sigilosa estava vindo a público porque delatores faziam colaborações com o Ministério Público, e depoimentos deles vinham a público ilegalmente.

Eu falei: “Olha, a gente não tem interesse em vazar”. Porque se eu quero que algo vá a público, basta eu pedir o levantamento do sigilo dos autos. O sigilo existe em favor das investigações. É o MP que traça a estratégia da investigação.

Hoje, em um jogo semântico, uma reportagem com base em supostas mensagens que a gente teria trocado quis dizer que a gente vaza informação e que eu teria mentido naquele momento. Mas aí eles mudam o significado de vazamento. Usam vazamento no significado de “furo”, de informação inédita, o que é ridículo porque quando você está conversando em uma entrevista como agora você pode fazer uma pergunta sobre algo que eu nunca falei para ninguém.

Se aquela informação não é sigilosa, eu posso falar para você. Isso é um furo, não é um vazamento. Aquelas supostas mensagens em que eles se basearam para dizer que havia vazamento não têm nada de vazamento, ainda que a gente considere que elas sejam verdadeiras. A gente não consegue recordar o que aconteceu há cinco anos e eu não consigo atestar que aquilo seja fato. Mas, ainda que seja fato, o que tem lá não é nada de informação que estava sob sigilo, eram informações que estavam em autos públicos combinadas com nossa estratégia de informação.

Eu falei “olha”… segundo a mensagem, eu teria falado, “olha, a gente cogita ou vai fazer um pedido de cooperação internacional para os EUA em relação a Bernardo Freiburghaus”. Essa é uma informação de estratégia sobre o futuro. Estava em sigilo? Não estava. Essa acusação de vazamento é muito grave, equivocada, absurda e maldosa, porque vazamento tem o sentido jurídico muito claro: colocar a público informação sigilosa. E, quando eu falo sobre uma estratégia futura nossa, essa informação nem tem como estar em sigilo judicial porque nem existem autos.

E é uma informação que a gente pode revelar de acordo com a estratégia de investigação. Naquele momento, estávamos investigando Odebrecht, pessoas que tiveram relacionamento com Bernardo Freiburghaus, e nos interessava que ele viesse colaborar com as investigações. Então interessava colocar publicamente a nossa estratégia para ele ver que ela era séria, consistente, que ia envolver outros países, e para avaliar dentro do cenário completo quais eram as melhores alternativas de defesa dele, inclusive a possibilidade de vir a colaborar.

Outra coisa é revelar informação que está sob sigilo judicial. Isso é crime, isso é errado, isso a gente nunca fez. E se você voltar à nossa entrevista, o contexto era esse. As informações levianas que diziam que a Lava Jato trabalha com vazamento de informações: isso é balela, mentira, falso. A gente nunca vazou.

BBC News Brasil – Uma das críticas que se fazia à Lava Jato naquela época é que a operação usaria a imprensa como forma de pressão para se conseguir delações ou avançar em investigações. Nos diálogos divulgados pelo Intercept Brasil, o procurador Santos Lima assumiria que vazava informações para a imprensa com o intuito de interferir em colaborações. A aspa que aparece ali seria a seguinte: “meus vazamentos objetivam sempre fazer com que pensem que as investigações são inevitáveis e incentivar a colaboração”. No grupo, não houve reação dos membros. Como vê a fala neste contexto?

Dallagnol – Vamos supor que essa fala aconteceu, tá? Eu não posso afirmar, mas vamos supor. Volta no contexto. Qual é a pergunta a que ele responde? O Orlando perguntou quem foi que adiantou a estratégia do caso Petrobras para a imprensa. E aí, o Carlos Fernando fala e ele usa esse termo equivocado “os meus vazamentos”.

“As minhas falas são feitas com o propósito de incentivar a colaboração.” Não era algo sigiloso, era uma estratégia de investigação. E aí está o giro semântico que os caras fazem para nos atribuir vazamentos. O que existiu ali, se existiu, foi um adiantamento de estratégia de investigação, que é o que o Orlando fala. De novo, posso adiantar estratégia de investigação? Posso. Não tem nada de ilegal, ilegítimo e ilícito nisso.

BBC News Brasil – Pode fazer isso para incentivar colaboração?

Deltan – Isso, não tem nada de errado nisso. Pelo contrário, é uma estratégia “fora da caixa”. Usada, correta e legítima. Digamos que eu esteja investigando um setor em que várias empresas corromperam o poder público e uma dessas empresas me procura para fazer uma delação premiada.

Só que eu não sei se essa empresa é a que mais tem a colaborar. Eu quero fazer esse acordo em benefício da sociedade, do interesse público, com aquela que tem mais informações relevantes a oferecer: provas sobre os crimes praticados, vídeos daquilo. Então, quero estabelecer uma concorrência. O que chamamos de Dilema do Prisioneiro. Quero que várias pessoas compitam pela colaboração para que a gente consiga fazer para a sociedade o melhor.

Então, não tem nada de errado eu buscar a imprensa e falar: olha, existe já a empresa buscando a colaboração. Eu não vou falar qual empresa. Vou falar: existe, sim, empresa buscando colaboração.

A imprensa divulga isso e isso gera uma corrida pela colaboração. O que acontece? Outras empresas vêm buscar essa colaboração e a gente vai escolher qual é a melhor para o interesse público. Veja que estou usando métodos legais e legítimos para atingir um fim de interesse público, sem nada de errado, sem vazamento. Estou adiantando uma estratégia e não tem nada de ilegal nisso.

BBC News Brasil – O jogo semântico a que o senhor se refere é usado pelo próprio procurador nessa conversa.

Deltan – É, eu acho que tem aí uma dubiedade de termos. Se você interpretar vazamento no sentido que eu usei na nossa conversa é no sentido de nunca passar informação sigilosa. O contexto em que estávamos conversando era que muitas colaborações premiadas negociadas sob sigilo estavam vindo a público. Qual era o contexto? A gente conversou e eu expliquei que a Lava Jato nunca vazou.

Se você interpretasse que a Lava Jato jamais deu furo, você poderia me falar naquela época: “Não, espera aí, você está me dando um furo agora. Algo que nunca falou a ninguém. Respondendo a uma questão que nenhum jornalista nunca fez”. Então, eu jamais falaria que a gente nunca deu um furo porque isso acontece toda semana. Furos acontecem e são normais, regulares e legítimos.

Depende do interesse do jornal. Vem um jornal e me pergunta sobre informações públicas, só que nenhum órgão de imprensa se interessou. Aí eu falo, explico aquilo. O jornal vai ter um furo. Nada de errado.

É evidente que eu estava falando que a gente não passou informação sob sigilo. E é isso que eles (Intercept Brasil) admitem na matéria. Eles colocam na matéria que não estão dizendo que o procurador passou informações que estavam sob sigilo. E aí ao mesmo tempo eles falam que eu menti? Isso é ridículo, é absurdo, é uma campanha difamatória, é maldade. Isso é veneno, tem veneno escorrendo no texto.

BBC News Brasil – De novo, quando o procurador Santos Lima diz que “os vazamentos objetivam sempre fazer com que as pessoas pensem que as investigações são inevitáveis e incentivar a colaboração”. Incentivar a colaboração. Mas, a colaboração, segundo determina a lei, é algo que deve ser espontâneo e partir do colaborador. Quando o procurador vaza, como disse Santos Lima…

Deltan – Calma, calma, vamos colocar no contexto. Vamos interpretar de acordo com o contexto. O Orlando tinha perguntado “quem passou a estratégia de investigação”. Ou seja, o futuro, o que a gente vai fazer, nada que esteja sob sigilo judicial. De novo, vamos contextualizar: o que se estava falando ali, assumindo a veracidade das mensagens, que é algo que eu não posso atestar, mas assumindo que aconteceu como está ali: se aconteceu, aconteceu no contexto de um furo.

BBC News Brasil – O ponto é: incentivar a colaboração. Quando se dá um furo para incentivar uma colaboração…

Deltan – Nada de errado.

BBC News Brasil – Não se está interferindo numa decisão espontânea?

Deltan – Não. Nada, nada de errado. É uma estratégia de atuação lícita e legítima. A colaboração deve ser voluntária, o que é diferente de espontânea. Espontânea é quando parte da própria pessoa, voluntária é quando a pessoa decide fazer por vontade própria. (O errado é) quando não existe voluntariedade. Quando existe coação.

Há dois tipos de coação: uma é a coação física – eu te agarro e te levo para algum lugar, você foi coagido. Outra é a coação moral – eu boto uma arma na sua cabeça e digo: “se você não fizer, eu vou te matar”. Não é uma coação física, é moral, eu estou ameaçando você de um mal grave.

A questão é: eu adotar estratégias legítimas e de divulgação de informações é uma forma de coação? Evidente que não. Se eu adoto um bloqueio de bens previsto em lei e que se enquadra naquela situação concreta, faço esse bloqueio e faço acusações pertinentes com base em fatos e provas e se isso gera um ambiente mais propício para a colaboração, isso é mérito da estratégia de investigação. A grande questão é: os atos eram legais, eu fiz o que está na lei? Se fiz, se não violei a lei, tudo é questão de estratégia de investigação.

A gente trabalhou com estratégia, a gente nunca escondeu isso, a gente trabalhou com estratégia de comunicação, sempre buscou ser transparente, prestar informações à sociedade, buscar o apoio da sociedade. Eu fazer isso é um exercício regular de direito da acusação, está dentro do nosso direito, do nosso dever, inclusive, de buscar trabalhar do melhor modo para produzir interesse público e alcançar resultados.

BBC News Brasil – Procurador, por que pedido de off nesse caso, uma vez que a informação era pública, dentro dessa estratégia que o senhor está descrevendo?

Deltan – Existem conversas com jornalistas feitas em on e em off, ambas são legítimas. Pessoas marcam aqui diariamente encontros com a nossa assessoria de comunicação para falar: “quero em on”, “quero em off”. Vem aqui alguém e quer fazer uma entrevista, como a que a gente está fazendo. Você vai veicular e vai dizer: Deltan disse isso, disse aquilo.

Agora, existem informações que a gente opta, por estratégia de comunicação, em não aparecer que foi Deltan que disse isso ou falou aquilo. A gente conversa com o jornalista em off, ou por estratégia dele ou nossa. Isso é comum, aceito, todo jornalista sabe que conversas em off são legítimas. O que não pode acontecer em on ou off é passar informação em sigilo, e é isso que eu te disse que nunca aconteceu e reafirmo. Mas eles têm lá anos… A gente foi hackeado, eles têm mensagens verdadeiras.

Eu não posso atestar que tudo lá seja verdade, mas existem coisas lá que a gente lembra que aconteceram, temas que a gente lembra que conversou. Se de tudo que a gente conversou, um milhão de mensagens segundo a Veja, e eles tiram dois trechinhos que não falam nada de sigiloso para querer distorcer e dizer que a gente vazou, ah, dá licença, né? Vamos falar de algo mais útil.

BBC News Brasil – Sobre o que o senhor falou como coação moral. Quando um procurador diz que as suas contribuições para a imprensa, ou os seus vazamentos, como ele disse, acontecem para incentivar colaborações, para que as pessoas pensem que as investigações são inevitáveis, isso de alguma maneira não está coagindo essas pessoas a colaborarem? Não é uma interferência no processo natural? O senhor se refere a isso como uma ‘estratégia fora da caixa’. Qual é a linha tênue entre estratégia fora da caixa e coação?

Deltan – Ricardo, você está me fazendo perguntas, certo? Você está me coagindo a responder?

BBC News Brasil – Não, estou deixando o senhor à vontade para respondê-las.

Deltan – Isso, você está me incentivando, a pergunta é um incentivo, é uma oportunidade. Mas qual é a linha tênue entre uma pergunta e você estar me coagindo? Você incentivar a pessoa, criar incentivos para a pessoa perceber o cenário é totalmente diferente de coagir. Em Direito a gente estuda coação física e coação moral. Física: você pegar a pessoa, obrigar a pessoa, pegar o braço da pessoa e obriga-la a atirar em outro dobrando o dedo dela. Coação moral: colocar uma arma na cabeça da pessoa e falar “faça isso ou eu te mato”. Você coloca uma ameaça, uma ameaça injusta.

Se você disser para a pessoa: “Se você praticar um crime, praticar corrupção, você vai ser preso”. Isso é uma coação. É uma ameaça que se está fazendo: “Você vai ser preso se praticar o crime”. Uma coação legal, legítima, devida, correta, que a lei estabelece. E é uma coação moral, porque isso influencia a vontade da pessoa que vai praticar o crime. A punição efetiva, adequada, dentro da lei é uma coação moral legítima.

Agora, a distinção não é existir coação moral ou não. A questão é: existem ações que podem ser coação legal ou ilegal. Se eu pegar alguém e fizer um questionamento, um interrogatório, e a pessoa responder, eu estou perguntando, não a estou coagindo a responder. Você pode dizer: “não, mas a pessoa está se sentindo desconfortável”. Não é, isso é legal. Agora, se a pessoa vai e tortura alguém, claro, isso é uma coação ilegal, ilegítima.

BBC News Brasil – Os exemplos que o senhor usa são bastante extremos, né? Botar uma arma na cabeça, torturar. A gente está falando de coisas mais sutis.

Deltan – Como perguntas. Isso. Eu não considero que você esteja me coagindo.

BBC News Brasil – Mas vejo uma diferença clara entre o que está acontecendo aqui, uma entrevista gravada, a gente conversando claramente, e uma informação passada em off para a imprensa sobre um terceiro. É diferente do que está acontecendo aqui, né?

Deltan – Isso. É uma informação legítima, legal, dentro da lei. Quando uma pessoa decide colaborar com a Justiça? Quando ela vê que a colaboração é melhor que a alternativa dela, que é responder ao processo judicial. A gente lida muito na negociação com o conceito de Batna (best alternative to the negociated agreement – melhor alternativa à solução negociada, em tradução livre). Um conceito muito conhecido no mundo dos negócios.

Quando um colaborador, um investigado, uma pessoa potencialmente criminosa decide colaborar? Quando ele fala: “Hm, a água está subindo. Existem investigações contra mim, processos suficientes e eu vou responder por isso, vou ser preso, existe uma atuação de órgãos internacionais para mim. Melhor eu colaborar”. Há dois jeitos de fazer a pessoa colaborar: ou você diminui a pena dele, aumenta benefícios. Ou você piora a alternativa dele.

A grande questão é: você jamais pode piorar a alternativa dele de modo ilegal. Não pode fazer uma prisão indevida, um bloqueio de bens indevido, uma acusação indevida, nada indevido, esse é o limite ético e legal. Agora, tudo o que você tem como instrumento legal para combater o crime organizado e a grande corrupção, você pode e deve usar contra aquela pessoa, estando presentes os requisitos legais.

É isso que a gente sempre fez como Lava Jato e força-tarefa. A gente sempre adotou a força da lei em relação a pessoas que praticaram crimes graves. Isso gera um ambiente em que a pessoa pode dizer: “Hm, melhor eu colaborar”. Isso foi feito em relação a todo mundo na operação Lava Jato.

Se a gente não atuasse de modo legal e íntegro, não só as nossas decisões seriam revisadas a cada instante, como as pessoas jamais iriam decidir colaborar. E mais, se a gente ultrapassasse a barreira legal, a pessoa não ia ver a colaboração como melhor saída, ela iria ver o recurso, o habeas corpus como melhor saída, porque a nossa atuação seria ilegítima. O que a gente fez foi atuar de forma legitima, correta, mas firme, que é o que todo brasileiro espera. Respeitando os direitos humanos de modo adequado, mas de modo firme, usando a força da lei para casos com a gravidade daqueles que a gente descobriu na Lava Jato.

BBC News Brasil – Qual impacto essa série de reportagens (do Intercept) e tudo que vem a reboque teve ou tem sobre a operação?

Deltan – Essas reportagens vêm e mordem a operação. Mordem e fazem a operação sangrar. Não têm alcance grande, vários veículos filtram, vários falam “olha, isso não é certo, não é devido, não vou divulgar”. Várias pessoas percebem que o que está ali é construído em cima de juízo de valor, tem uma pauta por trás, são editoriais, é ativismo e não reportagens, mas isso faz a operação sangrar. E quando a operação sangra, vêm os tubarões.

Que são pessoas que têm grande poder político, possibilidade de tomar ações contra a Lava Jato e a Lava Jato fica exposta a toda uma sorte de revezes como a recente lei de abuso de autoridade. Uma lei que precisava vir, mas não com o conteúdo que ela veio. É como vir uma lei ameaçando o direito ao sigilo de fonte. Essa lei de abuso de autoridade ameaça a independência de promotores e juízes em casos envolvendo poderosos.

BBC News Brasil – O presidente Bolsonaro inclusive já avisou que não deve vetar totalmente o projeto de lei de abuso de autoridade. Ele também anunciou que o orçamento da polícia federal deve vir mais diminuto no próximo ano. O presidente Bolsonaro também faria parte deste grupo de tubarões?

Deltan – Em relação à atuação do presidente em relação aos vetos, vamos esperar o que vai acontecer para a gente se manifestar. Existem dispositivos lá sobre os quais eu não vejo problema nenhum. Acho até positivos.

Agora, existem regras lá que impedem investigações legítimas contra pessoas poderosas e no meu entendimento devem ser vetadas.

BBC News Brasil – O corte no orçamento da Polícia Federal e o aceno do presidente em escolher alguém para a PGR que pense parecido com ele, e, portanto, eventualmente não respeitar a consulta aos procuradores, algo que sempre aconteceu, vai nesse sentido que o senhor descreve como tentativa de prejudicar o combate à corrupção no Brasil?

Deltan – Em relação à escolha do PGR, ela ainda não aconteceu. Minha sugestão é esperar ver o que vai acontecer. Já me manifestei em relação à importância de que seja escolhido alguém capaz, preparado com histórico de atuação testado e aprovado, o que é justamente o objetivo da lista tríplice. Em relação ao Ministério da Justiça, eu não tenho conhecimento suficiente e precisaria pesquisar para responder isso.

A questão é: quantos ministérios sofreram cortes? Qual foi o corte médio dos diferentes ministérios? Qual o corte no Ministério da Justiça e Segurança Pública? Esse corte, dentro das políticas essenciais à sociedade, saúde, educação, segurança etc., está sendo bem distribuído? O que é em grande medida uma avaliação política. Se tiver uma discrepância muito grande, eu poderia até eventualmente, tendo dados, me manifestar. Mas sem os dados seria irresponsável.

BBC News Brasil – Então sobre um eventual corte no orçamento da Polícia Federal, se vier de forma coerente com outros cortes em outras partes do governo, o senhor não vê como problema.

Deltan – Depende de quais cortes em quais áreas. Cortar verbas para financiamentos de grandes empresas no BNDES tem um peso. Cortar verba para uma atuação essencial de polícia e segurança pública tem outro peso. Cortar verbas para saúde, como atendimento essencial da população em hospitais tem um peso ainda muito maior. É muito mais sensível. Agora, se você insistir nessa questão eu poderia até dizer que você está me coagindo, viu? (risos) Dentro desse contexto que a gente vem conversando.

BBC News Brasil – O senhor fique à vontade para responder ou não.

Deltan – Assim como os réus ficam à vontade para responder ou não. Assim como o caso do Bernardo Freiburghaus, ele não colaborou com a Justiça. Essa é a maior prova de que essa questão de coação não faz qualquer sentido.

BBC News Brasil – A gente falou sobre PGR – o senhor não faz então questão que a lista tríplice seja respeitada, é isso?

Dallagnol – Acho muito importante que a lista tríplice seja respeitada. Ela é uma segurança que a gente tem de que a pessoa que está lá é isenta, independente, com um histórico de atuação provado e aprovado. Acho muito importante que seja respeitada, sim.

BBC News Brasil – Sinto o senhor bastante cuidadoso em fazer qualquer comentário em relação ao presidente.

Dallagnol – A minha atuação é técnica, nos processos. Se você me perguntar sobre Lava Jato, corrupção etc., eu falo com muita propriedade.

BBC News Brasil – Mas a gente está falando sobre corrupção e investigações…

Dallagnol – É, mas essa matéria, ela diz respeito à corrupção, mas diz respeito também a questões políticas. Eu não vou entrar no debate político, essa não é minha seara. A nossa atuação é técnica, é apartidária. Na última vez em que eu entrei nesse ponto, antes falavam que eu era de direita, agora falam que eu era de esquerda. A ideia de politização não favorece a Lava Jato, embora eu não tenha falado nada de errado e tenha feito uma avaliação sobre corrupção, como você mesmo mencionou, as pessoas começam a desenvolver teorias que é bom que se evite.

Inserir a Lava Jato nesse quadro de guerra política porque o nosso trabalho interessa a quem é de direita, de esquerda, de lado, de cima de baixo. Não importa a visão da pessoa, todo mundo tem o que fazer com os bilhões desviados pela corrupção no Brasil. Esse é o nosso foco. A gente tenta agregar e chamar todas as pessoas para essa causa, seja ela de direita, esquerda, cima, lado, conservador, liberal, progressista…

BBC News Brasil – O senhor está citando esse hexágono e me lembra que o filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, foi um dos que chamaram o senhor de esquerdista recentemente. Sobre o comentário específico do filho do presidente, o senhor tem alguma resposta?

Dallagnol – Eu prefiro não comentar.

BBC News Brasil – O senhor prefere deixar então Eduardo Bolsonaro semear essa ideia de que o senhor é financiado por ONGs de esquerda?

Dallagnol – Eu não vou comentar isso. Vou deixar para cada um olhar o passado, a história da nossa atuação e tirar suas próprias conclusões.

BBC News Brasil – O senhor e o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, foram muito expostos na chamada “Vaza Jato”, apareceram muito nesta série de reportagens. Vocês têm se conversado a respeito? Isso afetou a relação de vocês de alguma maneira?

Dallagnol – A gente conversou com o ministro Sergio Moro algumas vezes antes de ele sair da Lava Jato e depois, sobre temáticas de interesse da luta contra a corrupção. Não vejo como essas coisas que estão saindo possam afetar uma relação profissional, pública, e de contribuição para essa causa pública tão relevante.

BBC News Brasil – Essas conversas não devem mais estar acontecendo por aplicativos de mensagem, eu imagino.

Dallagnol – Olha, como acontecem as conversas não é o que importa. O que importa é o que acontece nas conversas e o grande ponto é esse: nossas conversas são profissionais e são com o objetivo de contribuir para a temática anticorrupção, com a avaliação de propostas feitas por ele, eventuais sugestões, eventuais preocupações com essa lei de abuso de autoridade que está passando e assim por diante.

BBC News Brasil – Essa série mostra o impacto pessoal da operação Lava Jato nos procuradores da força-tarefa. Segundo as reportagens, se as gravações ou vazamentos se confirmam, o senhor, por exemplo, teria ganhado muito dinheiro com palestras, fazendo palestras privadas sobre luta contra a corrupção. Deveria haver algum tipo regulação sobre o que pode ou não pode, e, se houvesse, o senhor deveria ter feito tantas palestras como fez, e para as empresas que fez?

Dallagnol – Essa regra existe, na verdade. Não é que não existe. Ela está na Constituição e fala que a única atividade que promotores e juízes podem desempenhar além da atividade do cargo público é a docência. E tanto o Conselho Nacional de Justiça quanto o Conselho Nacional do Ministério Público concordam que a docência engloba atividade de palestras e uma atividade de cidadania, de ensino, de construção de mensagens, passar informações de modo construtivo, construindo e edificando valores de visão de mundo das pessoas. Existe uma concordância em relação a isso. Essa atividade é constitucionalmente admitida, é admitida nos órgãos que regem a nossa profissão, é legítima. Já foi reconhecida no meu caso em 2017, o Conselho Nacional do MP examinou esta questão e disse que não tinha absolutamente nada de errado nesta atividade.

Eu presto essa atividade de modo remunerado e especialmente de modo gratuito. Na última matéria que saiu sobre isso, a Folha me perguntou quantas gratuitas eu fiz. Eu achei muito justa a pergunta por que ela dava o contexto. Eu falei que no último ano eu dei 34 palestras gratuitas, sendo que sete a cada 10 delas foram nas noites, fins de semana, feriados, férias. Ou seja, tempo em que eu poderia estar com a minha família, descansando, em lazer. Fiz isso porque eu acredito nessa atividade. Mas aí isso não saiu na matéria. Uma informação relevantíssima, a meu ver essencial, não foi incluída.

Outro aspecto – a matéria saiu com o enfoque de que Deltan abandona a filantropia. Nesse ano, já foram mais de 70 mil reais doados em filantropia. E todos os casos de doação desse ano aconteceram antes de começar essa Vaza Jato. Não foi algo que fiz porque isso veio a público. Aí falam assim: Deltan abandonou a filantropia. Na minha perspectiva, com todo o respeito ao trabalho dos jornalistas, a meu ver não está sendo retratado de modo mais completo, mais equilibrado. De novo, com todo o respeito à liberdade de imprensa, a escolherem e pautarem o que vão noticiar.

A Folha sempre tem esse perfil, e é um perfil legítimo de apontar o ponto preto no lençol branco, mas quando você foca naquilo que ela entende como ponto preto no lençol branco, isso passa para as pessoas uma mensagem distorcida. Se esquece do lençol. Então, de novo, a minha atividade de palestras, além de ser legal e legítima, em relação às remuneradas, se considerar tudo o que aconteceu desde 2016, mais de 50% do que recebi foi doado ou destinado a interesse público, teve uma destinação pública. Uma parte desse valor, 180 mil, estão reservados para investir especificamente na causa de corrupção. Isso está declarado no meu imposto de renda, tudo o que recebi está declarado. Eu poderia ficar com os recursos, não tem nada de errado, e ainda assim eu doo grande medida.

Aí você poderia me perguntar: isso deveria ser regulado mais a fundo, a questão da publicidade? Existem duas formas de controle em relação a isso. A primeira é a publicidade completa dessa informação. A segunda é prestar informação para a corregedoria. O nosso sistema é prestar à corregedoria, eu presto, informava periodicamente que realizava uma série de palestras, e me colocava à disposição para fornecer informações complementares. Esse é o modo de controle que a gente tem.

É legal? Sim. É legítimo? Sim. É moral? Sim, isso contribui para o debate público de ideias, para alcançar pessoas para uma causa de cidadania, de integridade, o que é positivo. E além de tudo isso, há destinação de grande parte dos valores para crianças que não têm lares, que foram retiradas das casas, pessoas com fome no nordeste, atividades de uma fundação como a Lia Maria Aguiar, crianças com câncer. Eu destinei em valores atualizados coisa de R$ 270 mil reais para crianças com câncer. Pergunta a essas crianças se essa atividade é boa e benéfica? É uma atividade econômica como qualquer outra, autorizada pela Constituição e que beneficia a sociedade em diferentes modos.

BBC News Brasil – O senhor disse que foram 34 palestras gratuitas de um ano para cá. Essa informação vai estar na nossa reportagem. E eu também queria saber quanto dinheiro o senhor ganhou em palestras pagas neste mesmo período.

Dallagnol – Essa é uma informação privada, de novo. Essa atividade é legal, legítima e privada. É a mesma coisa que eu perguntar qual é o seu salário.

BBC News Brasil – É que é conveniente divulgar o número de palestras gratuitas para defender o seu ponto ao mesmo tempo em que guarda esta outra informação. Parece contraditório.

Dallagnol – Não, não é contraditório. Essa é uma atividade privada, legítima, e eu não tenho nenhuma obrigação de oferecer essa informação, assim como você não é obrigado a fornecer o seu salário. O que eu posso dizer, em geral, só por uma questão de balanço geral, é que foram bem mais palestras gratuitas do que palestras remuneradas. Não só nesse período, mas se a gente somar todo o período desde 2015, 2016, o número de palestras gratuitas é bem maior que o de palestras remuneradas.

É bem maior mesmo, bem mais significativo. Isso mostra, de novo, o nosso compromisso com esse debate público, com essa discussão de ideias, com a construção da cidadania. Existem palestras remuneradas? Existem, sim. Em relação às remuneradas e aos favores, o que posso dizer de modo geral é que, se você pegar todos os valores que vieram, contando doações e tributos, eu fico com menos de 40% do valor desde 2016 até 2018, que é o período que eu já fechei com base nas declarações de IR.

BBC News Brasil – De fato, essa é uma informação privada. Mas como o senhor divulgou uma informação privada de número de palestras gratuitas, porque isso é positivo para a imagem do senhor, eu achei que faria sentido divulgar as demais. O senhor discorda?

Dallagnol – Eu acho que essa informação de que eu fiz bem menos remuneradas do que gratuitas é mais do que suficiente para que as pessoas tenham uma dimensão. É uma informação privada. É o mesmo que eu perguntar quanto você e seus colegas ganham. Ninguém sai perguntando para as pessoas quanto que o médico ganha, ou o profissional de saúde ganha.

BBC News Brasil – Eu não perguntei quantas palestras gratuitas o senhor fez, e o senhor me disse. Então…

Dallagnol – Eu disse por quê? Porque existe aí um foco em tentar sempre mostrar aquilo que pode gerar uma polêmica e não mostrar o que traz equilíbrio. E mais: o contexto não traz só equilíbrio, traz significado. Quando a pessoa sabe que o número de palestras gratuitas é muito maior que remuneradas, sabe que a maior parte das gratuitas eu faço com sacrifício do meu tempo pessoal, a pessoa passa a perceber: “Não, essa pessoa está engajada numa causa. Ela tem um propósito maior para estar fazendo isso”.

BBC News Brasil – Mas ao mesmo tempo, se o senhor me diz que ganhou 500 mil reais, ou 1 milhão de reais, ou 5 milhões de reais com palestras privadas, isso também poderia levar algumas pessoas a refletirem: “Nossa, a atividade da Lava Jato é muito rentável para os seus membros”.

Dallagnol – A atividade da Lava Jato não é rentável para os seus membros. Tenho processos contra mim pedindo mais de um milhão de reais, tem ação popular movida contra a gente aqui, uma série de representações contra nós no Conselho Nacional do MP, a gente ganha menos que os procuradores do outro lado da rua porque a gente não tem direito a verbas que outras pessoas que estão fora de outras forças-tarefas têm. Essa é a verdade, a gente tem uma remuneração menor.

BBC News Brasil – De que remuneração o senhor sente falta?

Dallagnol – Não é que sinta falta. Outros procuradores recebem verbas que a gente não recebe. Existem verbas por exemplo: quando alguém sai em férias e você se dispõe a cobrir o trabalho daquela pessoa você tem um acréscimo previsto em lei sobre o seu salário e a gente não recebe isso, porque a gente já é sobrecarregado com o nosso trabalho. A gente não tem como assumir o trabalho de nenhuma outra pessoa em férias. Então, comparativamente, você trabalhar numa força-tarefa é um decréscimo salarial. Mas ninguém fala desse outro lado, que eu tenho um processo contra mim pedindo mais de 1,2 milhão de reais nas costas e que eu posso vir a ser condenado. Eu não acredito que isso vá acontecer porque a gente não fez nada de ilegal, mas isso são compromissos que a gente vai assumindo. E ninguém fala disso.

Qual é o argumento que alguém poderia usar sob o aspecto de questionamento moral? “Você está recebendo isso em razão da sua visibilidade na Lava Jato”. Qual é a minha resposta: ainda que se retirem todos os meus méritos pessoais da minha competência profissional, ainda que você abstraia todos os meus méritos pessoais de estudos de assuntos, disposição, ainda que se tirem todos os méritos e você diga que esse é um fator aleatório, o que John Rawls coloca é que nenhuma atividade econômica deve ser impedida por causa disso. Pelo contrário, devem ser estimuladas e você resolve isso por tributação e por política pública. Você deve distribuir parte desses valores para outras pessoas. Então, mais de 30% via tributação foram para outras pessoas, para pessoas necessitadas, atendimentos em hospitais, para o que for que os tributos forem usados.

E grande parte dos valores ainda assim eu redistribuo para outras pessoas e trago outro benefício social por meio da filantropia, por meio de uma atividade beneficente. Esse é o quadro completo. Com toda a sinceridade, eu não consigo entender como procedentes os questionamentos que são feitos. Acho que existe no imaginário social um preconceito a ganhos econômicos lícitos, talvez um preconceito cultural, alguns sociólogos falam disso. Mas é uma atividade econômica lícita, legítima, não tem nada de errado e ela traz uma série de benefícios sociais.

BBC News Brasil – Os pontos que o senhor diz que não costumam aparecer estarão na nossa reportagem. O nosso objetivo é mostrar os dois lados. O senhor está reforçando muito um: o da filantropia, o do trabalho social, e não dá nenhuma informação sobre o outro, que é justamente…

Dallagnol – Mas o outro já saiu, está na Folha. Tem os valores, tudo. Minha atividade dos últimos anos está toda publicizada. Eu fui vítima de um crime, eu não preciso ficar me expondo mais ainda do que estou sendo exposto. Essa exposição já é injusta, é como se eu entrasse na sua vida, roubasse seu celular e seu computador e passasse a revelar coisas da sua vida. Veja que várias coisas que estão vindo a público, na minha perspectiva humilde, modesta e reconhecendo outras visões, não têm nem interesse público.

Qual é o interesse público sobre a possibilidade da construção ou não de um monumento para lembrar as pessoas que existem reformas? Essas são supostas conversas que vieram e foram publicadas e que, na minha opinião, não têm nenhum interesse público. Por que, se existiram essas conversas, não foi efetivada (a construção), e segundo porque não tem sombra de ilicitude nisso.

BBC News Brasil – O senhor acha que há interesse público nas conversas sobre a ideia de se abrir uma fundação ou instituto para palestras, algo que teria sido debatido entre o senhor e colegas, e a ideia eventual de usar esposas como capital social ou o nome dessas empresas para que os senhores pudessem trabalhar?

Dallagnol – Você está querendo dizer que seria ilegal abrir uma empresa?

BBC News Brasil – Não, estou fazendo uma pergunta mesmo. O senhor fala em exposição e a ideia não é expô-lo, é esclarecer.

Dallagnol – Não teve conversa de fundação, isso não teve. O que teve conversa, que foi divulgada, vamos colocar assim, essas supostas conversas, ainda que a gente dê crédito, conversa sobre criar uma empresa para gerenciar palestras ou cursos jurídicos, eventos, congressos. Se existiu isso, tem alguma sombra de ilicitude, ainda que as esposas figurem no contrato social e sejam administradoras? Não tem nada de errado.

BBC News Brasil – Não poderia estar no nome dos promotores, poderia?

Dallagnol – Pode! Aí que está. É uma informação incorreta que é difundida incorretamente e essa questão mostra ainda mais que as coisas estão sendo difundidas de modo errado. Promotores e juízes podem, sim, ser sócios, podem ser sócios de empresas. O que eles não podem ser é administradores. Eles podem ser sócios da esposa ou quem for.

BBC News Brasil – Desculpe, me refiro então à administração.

Dallagnol – Isso. Eles podem ser sócios, vários são, vários promotores são sócios de cursos jurídicos, têm a propriedade, podem inclusive ser sócios majoritários. O que não pode é ser sócio administrador, você não pode ficar assinando cheque, fazendo contabilidade, porque afinal de você tem outra atividade a desempenhar, a de procurador ou juiz. Não tem nada de errado você abrir e estar na empresa, ter a esposa na empresa ou qualquer outra pessoa que exerça essa função de administração. Quando saiu essa matéria, eu vi gente escrevendo que seriam laranjas. Releia as supostas mensagens, ainda que você admita que elas sejam verdadeiras, não tem nada de laranja.

BBC News Brasil – Eu estou sempre usando o futuro do pretérito, né, não estou admitindo.

Dallagnol – Mas ainda que a gente parta delas como pressuposto, eu não tenho como lembrar do que eu conversei há cinco anos em exatos termos. Eu não tenho padrão de comparação. Agora, se você me perguntar: existiu uma cogitação de abrir uma empresa? Existiu uma cogitação de abrir empresa. Cogitei inclusive abrir empresa antes, em razão das palestras que eu faço. Por que eu decidi não fazer em relação às palestras que eu faço ainda que você mudasse completamente a tributação para menor? Eu não fiz porque achei que fazendo como pessoa física seria muito mais transparente. E eu decidi não fazer.

Em outro momento, existiu uma conversa, que eu não sei se está retratada ou não, de abrir uma empresa para fazer alguns cursos jurídicos, como promotores e juízes têm empresas para isso. Se existisse essa empresa, seria totalmente dentro da lei. É infantil pensar que promotores, procuradores, ainda mais com o grau de exposição que temos, cogitar fazer uma coisa ilegal. Seria aberrante. Veja que se fosse feito uma empresa dessas, a gente exerceria uma função pedagógica. A gente eventualmente convidaria outros professores para dar aulas, o que é completamente legal, legítimo. Mas de novo nunca aconteceu. Não aconteceu porque a gente não tem tempo na Lava Jato para fazer isso. Se acontecesse, seria legal, legítimo, correto.

Olha que interessante… Quando saíram essas mensagens, saiu a publicação, falou-se que o objetivo nosso seria lucrar. Poucos dias depois saiu outro suposto diálogo com a minha esposa em que eu digo: “olha vou aceitar as condições para essa palestra porque justamente nosso objetivo com isso não é lucrar”. Nosso objetivo com isso não é lucrar. Então veja que quando eles colocam uma coisa, eles não colocam a outra coisa. Eles não dão a informação completa. E existiram várias outras contradições que vão surgindo.

Num determinado momento, eles falam que o intuito era perseguir o Lula. Com base nessas supostas mensagens. Em outro momento, eles vêm e falam que a gente decidiu não fechar o acordo de colaboração com o Antonio Palocci existindo quase 200 menções a Lula. Veja que contraditório. Se a gente tivesse algum intuito de perseguição, essa colaboração teria sido feita. Mas não fez porque a gente achou que não era adequado fazer por uma série de razões. Acho que não era suficiente a informação, que não estava suficientemente comprovada. Agora, se o nosso objetivo fosse criar vento, criar acusações políticas, gerar fatos, gerar alegações contra um determinado personagem, não faz sentido a gente não ter feito esse acordo. As informações são trazidas em matérias diferentes e não são contextualizadas. A questão é se eles têm essas supostas mensagens, por que não trazem tudo a público em conjunto? Para que as pessoas possam ter uma análise com contexto? O que eu falava é que a verdade é o todo. A parte você só compreende dentro de um todo maior.

Essa semana surgiram supostas mensagens com críticas que desumanizariam alguns dos procuradores. Espera aí, e todo o resto? E eu lembro que a gente conversou sobre isso em mensagens. A gente estava com medo de fazer busca e apreensão contra um determinado réu porque o filho tinha depressão. O filho tinha uma depressão profunda. A gente seguiu as redes sociais do filho, legitimamente, era aberta. A gente acompanhou a vida do filho, a gente fez uma série de análises para a gente ver se o filho não correria um risco de vida. Não poderia se suicidar, poderia fazer alguma besteira se a gente fizesse alguma ação contra o pai. Ou seja, tem um elemento humano forte; todo mundo tem uma atividade humana forte. Mas aí trazem um recorte para desumanizar, vilanizar.

BBC News Brasil – Você está se referindo às conversas sobre a família do ex-presidente Lula, imagino.

Dallagnol – Isso. Exatamente. Não consigo lembrar do que aconteceu. Aliás, essas supostas conversas, ainda que você tome como legítimas, não dizem respeito a mim especificamente, eu trouxe uma informação inicial referente a ela (Marisa Letícia) ter chegado em estado vegetal ao hospital, eu usei a expressão que o médico tinha me trazido. O que o amigo do amigo do médico tinha me trazido, “chegou com um estado vegetal”. Imagino que seja uma referência ao estado vegetativo. Essa expressão clínica, mas repassei a informação como recebi. Não estava nas conversas seguintes.

Agora, ainda que você suponha que aquilo que se seguiu seja verdadeiro, de novo, não posso afirmar, ainda que você suponha isso, é um recorte da realidade e não é trazido em conjunto com o resto. Se as pessoas querem retratar a verdade, elas tinham que trazer tudo isso à tona. Posso pegar uma frase tua da nossa entrevista, tirar de contexto para dizer que você tem uma visão ou outra para te sacanear. E as pessoas têm que entender que essas conversas são conversas que você teria na mesa de casa com a família, são pessoas que estão trabalhando há cinco anos juntas, são amigas.

São conversas que você tem com o círculo de intimidade, conversas que você fica à vontade para falar até alguma besteira, uma bobagem, para ser até certo modo irresponsável, para fazer brainstorming, para você lançar uma ideia sobre a qual você tem dúvida e para você construir a ideia ao longo do tempo.

BBC News Brasil – Sobre o caso que saiu, houve uma falta de cuidado, uma falta de humanidade na opinião do senhor?

Dallagnol – Não posso falar especificamente com conversas específicas que nem sei se aconteceram. Se ficar tratando disso, vai reforçar uma mensagem que considero injusta que foi trazida sobre essas pessoas. O que eu posso falar com a maior tranquilidade é sobre as pessoas que estavam ali. Posso falar que Januário é uma pessoa super humana. Que adotou já umas três, quatro crianças que não tinham um futuro e acolher na família dele. E aí essa pessoa está sendo vilanizada. Você acha isso justo? Você tomar uma pessoa que já adotou três a quatro crianças que estavam em situação de abandono, que não tinham família, que acolheu no lar dele, uma pessoa extremamente sensível, uma pessoa humana e você retira uma frase em contexto familiar, em contexto de família, que você sente até irresponsável para vilanizar essa pessoa, dizer que essa pessoa não tem coração, que essa pessoa é desumana?

Olha, isso é de uma superficialidade, sabe? De uma maldade? Quando você recebe um pedaço de informação, você olha só aquilo e às vezes você tem que avaliar o mundo pelo que você que recebeu. Mas de novo, vamos ao Januário Paludo. Digamos que ele tenha feito aquelas afirmações, aquilo lá, várias pessoas dizem “que cara frio”, “sem coração” etc. Aí você olha o resto da vida dele e vê que ele adotou três, quatro crianças, sem que ele precisasse fazer isso, nas quais ele está investindo não só a vida, mas recursos. Acolheu em uma família e está investindo a vida, o tempo dele nisso. Uma pessoa que investiu anos aqui na Lava Jato. Veja como as informações são trazidas fora de contexto, são trazidas dentro de um contexto para vilanizar.

BBC News Brasil – Nesse caso específico, a gente tem indícios de que de fato a conversa aconteceu pelo reconhecimento da procuradora Jerusa Viecili, que pediu desculpas publicamente ao ex-presidente. Ela está ali reconhecendo a parte dela nesse debate, o que nos leva a crer que eventualmente as frases dos outros também teriam acontecido. Se aconteceram, elas merecem esclarecimento. Elas hoje são públicas.

Dallagnol – Deixa eu discordar da tua premissa. A procuradora Jerusa veio e reconheceu que ela errou, que fez afirmações duras. Mas não reconheceu nem que foram aquelas afirmações. Ela falou: “fiz afirmações indelicadas, indevidas e peço desculpas”. Ela lembrou, ela reconheceu. Isso não significa que as outras pessoas vão lembrar de pequenas frases que falaram de dois, três, quatro anos, cinco anos intensos que, segundo uma revista colocou, foram 1 milhão de mensagens.

Isso não quer dizer que os outros vão lembrar, que os outros vão reconhecer, isso não autentica o conjunto das afirmações, que têm origem criminosa. Vamos supor, por amor ao argumento que aquilo ali tivesse eventualmente acontecido daquele modo, eu não ia falar pelos colegas. Eu poderia falar sobre o que está atribuído a mim ali que é primeira informação que eu teria trazido, dizendo que ela (Marisa Letícia) teria chegado ao hospital em “estado vegetal”.

O que eu teria feito ali seria reproduzir a informação de um médico que imagino que teria feito referência a um estado vegetativo. E eu não participei mais das conversas, segundo a linha que se coloca ali. De novo, partindo do pressuposto, para ficar bem claro, que isso teria acontecido. E ao final eu falaria de humanização. Mas ali seria uma referência, segundo as mensagens, ao ex-presidente Lula. Seria uma referência, sim, ao ministro do STF Gilmar Mendes. E não ao ex-presidente Lula.

Eu não estou nessas conversas, não me sinto confortável para avaliar a conduta dos colegas, agora o que eu quero dizer é que ainda que se tomasse isso como verdade, venha trazer a público, na minha visão, o jornalista tem a obrigação de trazer um quadro completo, e ele sabe da implicação daquilo que ele tá trazendo, ninguém é bobo, ninguém é ingênuo, que vai achar que vai a jogar aquilo e o interesse público tem que saber como as pessoas comunicaram aquilo. O efeito óbvio daquela matéria era vilanizar aquelas pessoas.

De novo, não estou reconhecendo o que essas pessoas falaram ou não falaram. Posso falar de mim, sobre o que eu lembro. E como a Jerusa falou sobre ela, sobre o que ela lembra. E a gente tem aí cinco anos de intensas mensagens, se você muda uma palavra, muda completamente o significado de um texto.

O meu ponto é: ainda que aquilo eventualmente tenha acontecido, isso são afirmações individuais, de pessoas determinadas, e quiseram colocar uma pecha dizendo assim “ah, a força-tarefa”. Havia frases ali de três, quatro pessoas, a força-tarefa são 15 procuradores, passaram por aqui 19, se não tem aí outras supostas mensagens, sequer de outras pessoas, isso retrataria eventualmente algumas percepções individuais de pessoas específicas que falaram, de novo, dentro de um ambiente familiar, em que as pessoas se sentem à vontade para falar bobagem, para ser de certo modo, um pouco irresponsáveis. Quantas vezes não estamos com a família e com as esposas e não falamos algo irresponsável? Uma bobagem?

É injusto você usar uma régua que você usa para declarações públicas e colocar essa régua para uma conversa que você tem com a sua esposa. É injusto, em segundo lugar, você levar isso a público sabendo que o efeito disso é a vilanização das pessoas e isso fica muito claro quando você pega o conjunto das reportagens que trazem essa conotação. Quando você não expõe quem são essas pessoas.

Vai ver lá quem é Januário Paludo. Que é uma pessoa sensível, que adotou três a quatro crianças, extremamente humana, porque se não, o que você está fazendo é manchar a reputação e a vida de um homem de modo extremamente injusto, criando uma deturpação de imagem. Você está criando não um retrato. Você não está perto de um retrato. Nem perto de uma caricatura.

Você está desfigurando a imagem dele. Você está colocando sobre ele uma pecha que talvez ele vá carregar para o resto da vida e que é extremamente injusta. Então, o jornalismo tem que ser responsável, tem que ser sensível na minha percepção, na minha visão e respeitando a liberdade de imprensa, dos jornalistas, na minha leitura faz parte da responsabilidade do jornalismo você trazer informação completa, você não manchar a reputação de uma pessoa sem tentar conhece um pouco melhor quem é essa pessoa, o contexto da vida dela.

Então, para nós, dói muito esse processo. Doem muito as deturpações, as descontextualizações, como nesse caso do vazamento, você trazer uma coisa e deturpar para dizer que houve um vazamento quando muitas pessoas só leem as manchetes e vão achar que gente vazou alguma coisa estava sob sigilo judicial, que cometemos uma ilegalidade quando isso nunca aconteceu, dizer que eu menti para você há dois, três anos, quando não há nenhuma evidência de que eu tenha mentido para você porque aquela frase que eu te falei é interpretada no contexto. Não tem outro sentido. Porque o outro sentido seria absurdo.

BBC News Brasil – Sobre esse processo administrativo que vai ser julgado no Conselho Nacional do MP. O Senhor recorreu, conseguiu que isso fosse postergado. Queria saber qual é a expectativa do Senhor?

Dallagnol – Olha, vou ser sincero. Se não fosse Deltan lá, eu apostaria fortemente que a pessoa não seria condenada. Mas acho que tem muita turbulência em cima de tudo o que nos envolve nesse momento atual. E vou fazer referência com base num caso que foi julgado nessa semana. Nessa semana, eles pegaram um caso meu em que eu fiz uma postagem de uma notícia do Estadão. Fiz uma postagem da notícia do Estadão e não coloquei nenhum juízo de valor.

Coloquei simplesmente uma transcrição de um parágrafo da matéria. Esse é um caso que foi levado pela pessoa que estava afetada nessa reportagem, era sobre a senadora Kátia Abreu. A senadora Kátia Abreu reclamou, o corregedor analisou e entendeu que não havia nada ilegal. Por quê? Porque ele não fez nenhum juízo de valor e aquela informação que foi divulgada pelo Estadão, ainda que estivesse acobertada por sigilo oficial, não era de um caso em que o procurador atua.

Ainda que tenha havido alguma revelação para o Estadão de alguma informação sigilosa, o procurador nunca teve acesso a essa informação sigilosa. Essa informação era de um caso que tramita no Supremo Tribunal Federal. Ou seja, não tem a menor chance de o procurador ter vazado essa informação para o Estadão, a informação já era pública quando o procurador divulgou porque já estava divulgada pelo Estadão. E, em terceiro lugar, não fez nenhum juízo de valor. É um caso claro, fácil, de arquivamento. Mas foi para o Conselho, e houve um debate árduo lá, um debate de horas.

E já tinha tido um caso semelhante que já tinha sido arquivado pelo plenário do Conselho neste ano por 13 a 1. Mas como era o meu caso, como existe um momento hoje, assim, difícil na Lava Jato, houve uma discussão que se estendeu por horas e já teve 3 votos em meu desfavor. Enquanto que um caso idêntico há poucos meses, foi só um voto em desfavor do procurador envolvido. Aliás, por coincidência, um procurador aqui da Lava Jato. O caso e era igualzinho ao meu.

Então, sobre esse caso que está indo a julgamento, não posso dizer que estou numa posição fácil diante desse contexto que está acontecendo. Agora, o que eu posso dizer é que acredito que o que eu falei não merece reprimenda pelo Conselho Federal do MP e eu acredito que muitas pessoas lá vão perceber isso de modo muito claro. Qual é esse caso que está indo a julgamento? Um caso em que eu formulei uma crítica pública numa rádio, na rádio CBN, em que eu afirmei que determinadas decisões do Supremo mandava uma mensagem de leniência forte em favor da corrupção. E por que eu fiz essa menção? Eu fiz uma crítica de autoridade pública contra decisões de autoridades públicas num assunto do interesse público. Essa é a franja interna mais básica do direito à liberdade de expressão.

Essa é a essência da liberdade de expressão que não existe para proteger elogio, existe justamente para proteger críticas. E esse ato foi questionado no Conselho Nacional do MP e vai ser julgado. E mais, uma coisa muito importante: essa própria afirmação da entrevista que eu fiz, eu complementei logo em seguida dizendo “olha não estou imputando má fé a ninguém, estou fazendo uma análise objetiva”.

Ou seja, disse expressamente na própria entrevista que não estava analisando a pessoa dos ministros (do STF), não estava criticando as pessoas dos ministros, não estava fazendo nenhuma avaliação sobre a conduta privada ou pública deles, mas estava sim avaliando as decisões, porque aquelas decisões contrariavam a visão do MP, a defesa poderia elogiar as decisões, ou em outros casos, a gente poderia elogiar e a defesa criticar, eu estava criticando as decisões com as quais a gente não concordava e estava falando que as decisões produzem um efeito social de uma percepção de impunidade. Essa foi a avaliação que eu fiz. Ela tem uma base teórica. Foi uma avaliação crítica, uma avaliação em que eu não xinguei ninguém, embora alguns ministros por vezes xinguem a gente.

A gente jamais xingou ninguém. Jamais fui indelicado. É a única representação que eu tenho sobre uma manifestação pública minha. Então, se você pega aquela frase e analisa dentro do contexto, quando você analisa, é claro que não foi uma manifestação de quebra de decoro. É claro que eu não fugi dos valores de civilidade, que isso está albergado pela liberdade de expressão.

É claro que a minha expectativa e torcida é de que existe uma decisão reconhecendo essa liberdade de expressão. Não porque é Deltan, mas porque na verdade o que está em julgamento neste caso, como neste último caso na última sessão, é um procurador que atuou de modo firme contra a corrupção, contra interesses poderosos, pessoas que se movimentam politicamente, em bastidores.

E a questão é: a gente quer um MP que mantenha essa independência, que futuros procuradores possam agir com liberdade e independência nestes casos, ou que os procuradores fiquem acovardados, medrosos, medindo palavras e não se sintam à vontade para fazer críticas públicas porque em razão dos interesses dos poderosos sendo criticados ele tem uma Espada de Dâmocles na cabeça dele e qualquer escorregão, qualquer dubiedade vai ser usada contra ele? Essa é a questão em jogo neste caso.

BBC News Brasil – Há dois outros casos na pauta do conselho, né? O senhor disse que o seu tratamento foi diferente de outro procurador. Sente algum tipo de perseguição dentro do conselho?

Dallagnol – Sinto que os meus casos estão tendo um tratamento talvez mais particular em razão desse momento que a gente está vivendo e das pressões todas que estão acontecendo.

BBC News Brasil – O senhor enxerga uma Lava Jato sem a presença do senhor? A operação continuaria na sua ausência?

Dallagnol – Você fala sobre um possível afastamento, é isso?

BBC News Brasil – Um possível afastamento a partir do que conversamos, de todo o escrutínio público e agora esses casos no conselho.

Dallagnol – Eu vejo especulação sobre isso, mas não vejo qualquer base para afastamento. Ainda que eu fosse condenado neste caso, a pena é censura, não é afastamento, não é demissão. Mesmo no outro caso para ir a julgamento, que é o caso envolvendo o (senador) Renan (Calheiros). Então é um caso envolvendo Toffoli, Gilmar e Lewandowski e outro envolvendo Renan Calheiros. Ainda que este outro caso vá a julgamento. São, de novo, pessoas poderosas e, ainda que eu venha a ser condenado, a punição é advertência ou censura, não suspensão. A questão é: existe sentido em uma suspensão para um procurador que não está sujeito à pena de suspensão?

E mais: a suspensão me afastaria de investigações e processos. Mas as condutas questionadas são uma declaração em entrevista e cerca 10 tuítes que fiz sobre Renan Calheiros e a campanha de voto aberto ao Senado. Então, não existe uma correlação lógica entre a medida de suspensão e as minhas condutas. Porque as minhas condutas são foram em investigação de processos, foram em entrevista e rede social. E o meu afastamento não seria de entrevista e rede social, seria de investigações e processos.

Então, um eventual afastamento não guardaria sequer correlação lógica com as supostas condutas pelas quais eu poderia ser punido. E ainda que guardasse, essas próprias condutas não estão sujeitas a suspensão. Você teria dois problemas no afastamento: proporcionalidade e coerência lógica. Eu não cogito que isso venha a acontecer, então não entraria nesta questão.

BBC News Brasil – Mantenho minha pergunta: em um caso de eventual afastamento, a operação sobrevive sem o senhor?

Dallagnol – Num caso de eventual afastamento, morte, qualquer coisa que me afastasse da operação, é claro que ninguém é insubstituível. Existe uma atuação de um grande número de agentes públicos de várias instituições nesse caso. O trabalho certamente seguiria firme, tenho a maior confiança nos colegas que estão aqui, são extremamente competentes, sérios, corretos. Então a operação seguiria, seguiria firme, sim, agora o problema é a mensagem que isso passaria.

A mensagem seria: promotores, vejam bem com quem vocês vão mexer. Vejam bem em que tipo de caso vocês vão entrar porque se vocês contrariarem interesses poderosos, vocês estarão sujeitos a riscos que os outros não estão. Se você olhar minha manifestação sobre Renan Calheiros, olhe na mesma época tuítes de outros procuradores. As coisas são muito semelhantes, agora, o caso deles não está no conselho, é o meu caso que está no conselho. Se você olhar o tuíte que eu fiz da matéria do Estadão, outros promotores retuitaram aquilo. Vários promotores e procuradores. Agora, não é o caso deles que está no Conselho, é o meu caso. Acho que a mensagem seria péssima, seria ruim para a história, para a força do MP, ruim para a instituição.

Acho que não é a mensagem que vai ser passada. Acho que os conselheiros, o CNMP, vão preservar a instituição, a proteção de pessoas que atuam em casos graves, sérios, grandes. É a visão que tenho, é nesse sentido que já me manifestei pelo CNMP, um órgão pelo qual tenho grande respeito.

Tenho respeito pela instituição STF, essencial para a democracia, eu critiquei já também o governo, Presidência, e eu tenho respeito pela função da Presidência, eu tenho respeito pelo Congresso Nacional, essencial à democracia, é o lugar de onde devem sair as melhores reformas que devem mudar o nosso país para melhor, seja tributária, Previdenciária, anticorrupção mesmo. São instituições essenciais, seus integrantes têm papel muito importante a desempenhar, tenho respeito à autoridade dessas pessoas. Jamais falei de descumprir qualquer decisão de qualquer autoridade. Mas eu tenho a liberdade de criticar atos, decisões, porque é disso que vive a democracia. É da circulação de ideias, é do livre-mercado de ideias.

O direito à liberdade de expressão é mais que um direito fundamental, é um pilar de sustentação da democracia. Se eu como procurador não posso criticar atos praticados, a gente vai estar privando do debate social, privando a sociedade de informações relevantíssimas que podem vir justamente dos atores que mais conhecem os casos que estão sendo levados a julgamento nas instâncias superiores, que são procuradores, promotores e juízes. E você vai privar da crítica social questões, como as decisões do Supremo, que só podem ser debatidas mediante crítica social porque não há recurso judicial contra aquelas decisões. O único recurso que a sociedade tem é o debate, a crítica social.

Assim como a gente defendeu a liberdade da imprensa e das pessoas de informar, acredito que é uma questão que não se trata de Deltan, mas da circulação de ideias de modo relevante ao debate público. É importante que seja debatida na nossa sociedade de modo abrangente e que parte, mas não se restringe a esse caso.

 

 

*Da BBC News