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Política e Poder

Dallagnol e o presente da Cia

“Quem veio de Portugal para o Brasil foram degredados, criminosos. Quem foi para os Estados Unidos foram pessoas religiosas, cristãs, que buscavam realizar seus sonhos. Era um outro perfil de colono.”

Essas palavras foram proferidas por Deltan Dallagnol, Procurador da República e coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, durante uma palestra realizada em uma Igreja Batista, em fevereiro de 2016.

A afirmação – esdrúxula, factualmente incorreta e preconceituosa – é um excelente exemplo da mentalidade colonizada que impera em amplos segmentos da sociedade brasileira, forjada a partir da mistura do complexo de vira-lata com a americanofilia inflamada e doses cavalares de puritanismo e crença no excepcionalismo americano.

No caso de Deltan, a frase talvez tenha uma alusão autobiográfica. Afinal, ele, um “cristão fervoroso”, também foi para os Estados Unidos em busca de um sonho – Deltan obteve seu mestrado na Universidade de Harvard em 2013. E a julgar por suas ações desde o ingresso no Ministério Público Federal (MPF), Deltan parece estar convencido de que a sua missão é servir a pátria dos “puritanos excepcionais”.

Deltan esteve à frente da força-tarefa da Lava Jato entre 2014 a 2021. A gigantesca operação, criada poucos meses depois do escândalo da espionagem praticada pelos serviços de segurança dos Estados Unidos contra empresas brasileiras, deixou um rastro de devastação nas contas públicas do Brasil.

Setores inteiros da economia nacional – sobretudo a construção civil e a indústria naval – foram completamente obliterados, deixando 4,4 milhões de pessoas desempregadas. Um estudo da PUC-SP estima que, em apenas um ano, a Lava Jato causou um prejuízo de mais de 142 bilhões de reais para o país – ao mesmo tempo em que ajudou as corporações estadunidenses a recuperarem mercados internacionais que as companhias brasileiras vinham conquistando.

A operação também teve consequências devastadoras na política nacional, ajudando a insuflar o golpe parlamentar que derrubou Dilma Rousseff em 2016, servindo de justificativa para a prisão política de Lula em 2018 e ensejando a adoção de uma nova política econômica de subordinação inconteste aos interesses do capital financeiro e de renúncia a quaisquer resquícios de soberania nacional.

Não causa espanto, portanto, que os Estados Unidos tenham buscado estabelecer o que o procurador estadunidense Kenneth Blanco definiu como “um relacionamento íntimo que desprezava procedimentos formais” com os membros da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. E Deltan, como bom admirador da “pureza cristã” dos estadunidenses, serviu de ponte a esse inusitado intercâmbio, contribuindo secretamente com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DOJ) e facilitando a investigação conduzida pelos estadunidenses contra as empresas brasileiras.

Em outubro de 2015, poucos meses após uma visita a Washington, Deltan recepcionou na sede do MPF uma delegação de 17 estadunidenses composta por procuradores do DOJ e agentes do FBI. As reuniões entre Deltan e os agentes internacionais duraram quatro dias e incluíram o repasse de informações sensíveis sobre as investigações envolvendo a Petrobras e outras empresas brasileiras. A colaboração jurídica é ilegal, uma vez que a troca de informações entre procuradores brasileiros e autoridades estrangeiras precisa ser autorizada pelo Ministério da Justiça – que, nesse caso, sequer foi informado sobre a visita.

Quando foi alertada sobre a possível colaboração irregular, a presidente Dilma Rousseff cobrou explicações do Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que por sua vez acionou o procurador Vladimir Aras, então diretor da Secretaria de Cooperação Internacional (SCI). Aras, entretanto, não impediu que Deltan desse seguimento à colaboração com os agentes estadunidenses.

Em uma conversa com Aras, registrada no vazamento de mensagens enviadas via Telegram, o coordenador da Lava Jato explicou seu interesse na colaboração. Deltan queria repassar informações úteis aos investigadores estadunidenses antes que firmassem acordos domésticos de delação, de modo a assegurar parte dos recursos da multa que seria paga pela Petrobras ao governo dos Estados Unidos: “Nós estamos com pressa, porque o DOJ já veio e teve encontro formal com os advogados dos colaboradores (…). Isso atende o que os americanos precisam e não dependerão mais de nós. A partir daí perderemos força para negociar divisão do dinheiro que recuperarem.”

Fiel à concepção weberiana da ética protestante, Deltan mostrou seu tirocínio para os negócios. Após fornecer ilegalmente subsídios para que a justiça estadunidense punisse a Petrobras com uma multa bilionária, o procurador ainda tratou de articular um esquema para obter o controle sobre parte desse valor.

Dos 3,5 bilhões de reais que a Petrobras pagou ao governo dos Estados Unidos, 2,5 bilhões deveriam ser repatriados para o Brasil. Deltan, entretanto, tentou retardar a devolução dos valores, pois tinha um plano mirabolante para o destino dessa verba: usá-la para financiar uma fundação voltada ao “combate à corrupção”. Tal fundação ficaria sob tutela da força-tarefa da Lava Jato, que utilizaria o dinheiro para, por exemplo, pagar por palestras e cursos proferidos por autoridades envolvidas no “combate à corrupção”, tais como… os procuradores da própria força-tarefa da Lava Jato! “Vamos organizar congressos e eventos e lucrar, ok? É um bom jeito de aproveitar nosso networking e visibilidade”, escreveu Deltan para sua esposa, apresentando em seguida a expectativa de lucro em 2018: “Total líquido das palestras e livros daria uns 400 mil”.

O plano de usar dinheiro público restituído da corrupção para financiar um esquema privado de enriquecimento por meio de palestras sobre combate à corrupção foi muito criticado pela Procuradoria Geral da República e pelo Supremo Tribunal Federal, razão pela qual foi abortado. Deltan, entretanto, seguiu colaborando de forma fiel com os agentes estadunidenses.

O procurador incentivou os agentes de Washington a conduzirem depoimentos com delatores diretamente nos Estados Unidos, de modo a contornar as salvaguardas oferecidas pela lei brasileira. Também se ofereceu a pressionar os delatores a viajarem para os Estados Unidos para prestarem esclarecimentos sem salvo-conduto. Mensagens da Lava Jato recentemente liberadas à defesa de Lula mostram que, além de Deltan, o ex-juiz Sergio Moro também recebia orientações e trocava informações com procuradores estadunidenses.

Arquivos de conversas de novembro de 2015 apreendidas na Operação Spoofing mostram, por exemplo, Moro instruindo Deltan a entrar em contato com procuradores dos Estados Unidos para obter instruções sobre uma quebra de sigilo de um executivo ligado a um estaleiro que tinha contratos com a Petrobras.

A colaboração ilegal com autoridades dos Estados Unidos também foi fundamental para a construção das acusações da Lava Jato de Curitiba contra o ex-presidente Lula. Conforme registrado nas mensagens vazadas, a Lava Jato recebeu ilegalmente dos agentes estadunidenses evidências do “caso Odebrecht” que pudessem ser utilizadas para sugerir suposta participação de Lula em esquemas de corrupção, visando justificar a quebra do sigilo fiscal dos familiares do ex-presidente sem a observância do devido processo legal.

Esses procedimentos não apenas foram ocultados da defesa de Lula, como também sonegados dos autos originais do processo. As mensagens sugerem que o nome do Lula não surgiu como evidência durante o curso das investigações. Ao contrário: o presidente, aparentemente, já era um alvo pré-definido e a força-tarefa passou a buscar provas que servissem à construção de um caso, promovendo operações com o objetivo de convencer pessoas a implicá-lo em atos de corrupção através de constrangimento, ameaça de punição legal e uma miríade de métodos pouco ortodoxos.

Não por acaso, os membros da força-tarefa comemoraram efusivamente a ordem de prisão expedida contra Lula em abril de 2018. Conforme registrado nas mensagens eletrônicas, Deltan era um dos mais animados do grupo dos procuradores no Telegram: “Meooo caneco. Não dá nem pra acreditar. Melhor esperar acontecer”, escreveu o coordenador da Lava Jato, em resposta a uma mensagem da procuradora Laura Tessler afirmando que já iria iniciar a comemoração pela prisão de Lula – então líder das pesquisas de intenção de voto para a eleição que transcorreria em alguns meses. Deltan afirma que não estaria no país para comemorar, já que tinha viagem agendada aos Estados Unidos. E finaliza a conversa pontuando que a prisão do líder petista era um “presente da CIA”.

Os diálogos estão transcritos abaixo na íntegra:
5 de abril de 2018
Isabel Grobba: Moro manda prender Lula.
Deltan: Antes que MA ferre tudo
Deltan: Creio que devemos ficar quietos neste momento.
Laura Tessler: sim
Laura Tessler: totalmente quietos
Laura Tessler: até porque o mandado já disse tudo, kkkk
Isabel Grobba: Está no uol que já foi expedido o mandado.
Isabel Grobba: Deve se apresentar até as 17 horas de amanhã.
Paulo: Ficará na PF… Novo local de peregrinação em.Curitiba!
Deltan: Meooo caneco
Deltan: Não da nem pra acreditar. Melhor esperar acontecer
Julio Noronha: Exatamente!
Deltan: Temos que pensar a segurança oras próximas semanas
Laura Tessler: eu já vou comemorar hoje
Deltan: Ou melhor, Vcs têm, pq estarei fora do país kkkk
Paulo: Aqui tá tudo em segurança comigo, não se preocupe
Deltan: Kkkk
Laura Tessler: o problema é vc e CF…o resto é desconhecido
Isabel Grobba: E eu sou a querida!
Paulo: Deltan na Disney enquanto Lula está preso, isso vai ser noticia!
Paulo: Mas… Problema
Laura Tessler: é mesmo….pode ir lá dar as boas vindas pra ele, Isabel
Isabel Grobba: hehehe
Paulo: Não dá p mudar a vida por causa disso
Julio Noronha: No Brasil, mesmo uma decisão judicial amparada no decidido pelo STF, pode não acontecer, mesmo q entre a decisão e o cumprimento sejam apenas horas
Laura Tessler: agora já era…deixa de pessimismo
Julio Noronha: Só o Lula vai mudar de vida!
Welter Prr: Ele tem ate amanha para se apresentar. Depois é foragido
Welter Prr: Mas acho que ele vem
Laura Tessler: eles vão armar um bom teatro até amanhã para ele chegar “nos braços do povo”
Paulo: Com certeza vai fazer um comício as 16h, antes de se apresentar
Deltan: Presente da CIA

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Política

Moro, de forma clandestina, acessou conversas de Gilmar Mendes e enviou material para procuradores

O ex-juiz Sergio Moro teve acesso a conversas de “GM”, provavelmente o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, e pediu para que os procuradores da autointitulada “força-tarefa” da “lava jato” analisassem o material. É o que dizem os novos diálogos enviados pela defesa do ex-presidente Lula ao STF.

Segundo os procuradores que integraram a “força-tarefa” da “lava jato” no Ministério Público Federal, a conversa não trata do ministro Gilmar Mendes, mas sim do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, que tem as mesmas iniciais.

Em outras conversas hackeadas, no entanto, os procuradores se referiam sem dúvidas a Gilmar ao usar a sigla GM.

O trecho não deixa claro se “GM” foi diretamente grampeado ou se foram escutadas conversas suas com algum investigado que teve o sigilo telefônico quebrado.

Em 31 de agosto de 2018, Deltan Dallagnol, ex-coordenador lavajatista, encaminhou a colegas uma mensagem de Moro. “Prezado, amanhã de manhã dê uma olhada por gentileza no 50279064720184047000. Há algo estranho nos diálogos.” O processo não está disponível.

Julio Noronha terceiriza o trabalho à Laura Tessler: “CF [possivelmente o ex-procurador Carlos Fernando dos Santos Lima] me mandou msg falando q a Rússia disse haver algo estranho nos diálogos do GM. CF disse ser urgente, para ver agora pela manhã. Será que você consegue ver?”

“Russo” e “Rússia” são como os procuradores se referem a Moro e à 13ª Vara Federal de Curitiba, que foi chefiada pelo ex-magistrado até o final de 2018, quando saiu para assumir o Ministério da Justiça de Jair Bolsonaro.

O ministro Dias Toffoli também é citado. Em uma passagem, quando comentam sobre conversas interceptadas envolvendo investigados da Odebrecht, Noronha diz que um advogado identificado como “M” seria próximo de “Peruca”. “Hummmm. Peruca pode ser o Toffoli. Foda heim”, responde Dallagnol.

Leia a íntegra da nota dos procuradores da República que integraram a “lava jato”:

1. Importante reafirmar que os procedimentos e atos da força-tarefa da Lava Jato sempre seguiram a lei e estiveram embasados em fatos e provas. As supostas mensagens são fruto de atividade criminosa e não tiveram sua autenticidade aferida, sendo passível de edições e adulterações. Os procuradores que não reconhecem as supostas mensagens, que foram editadas ou deturpadas para fazer falsas acusações que não têm base na realidade.
2. Exemplo da deturpação das supostas mensagens é a matéria publicada hoje pelo site CONJUR, afirmando que a força-tarefa teria tido acesso a diálogos interceptados do Ministro Gilmar Mendes, a partir da referência que existiria em investigações contemporâneas à de Guido Mantega (“GM”), este sim requerido em medidas propostas pela força-tarefa. Mesmo não se reconhecendo o teor das supostas mensagens, que têm sido apresentadas de modo editado ou deturpado, a ilação feita pelo site em nada se sustenta.
3. É complemente absurda, de má-fé e irresponsável a conclusão do jornalista de que os procuradores teriam “acessado conversas do ministro Gilmar Mendes” ou mesmo obtido tais diálogos a partir de algum investigado que conversou com o referido Ministro. Jamais, absolutamente, ocorreu qualquer interceptação em que qualquer Ministro do STF tenha, ainda que por conversas com terceiros, sido interceptado em primeiro grau.
4. Esse é mais um exemplo de como as mensagens de origem criminosa vêm sendo usadas fora de contexto ou falsificadas para criar factoides e narrativas disparatadas e incongruentes, com o fim de desacreditar o trabalho feito pela força tarefa, criar em relação à operação Lava Jato um clima de animosidade e descontentamento nos círculos dos três poderes e anular condenações.

Gilmar e Toffoli
Já é vasto o material apontando que os procuradores tinham uma obsessão pelo ministro Gilmar Mendes. Conforme mostrou a ConJur, os lavajatistas criaram um grupo no Telegram com o único objetivo de articular medidas contra o ministro; bolaram um manifesto contra ele; e disseram que era necessário “fazer algo com relação” ao magistrado do Supremo.

O complô, quase sempre liderado por Deltan, não incluía apenas a “força-tarefa” de Curitiba, mas também as franquias criadas em São Paulo e no Rio de Janeiro. Até membros da Procuradoria-Geral da República participavam das movimentações articuladas no Paraná.

Reportagem do El País, em parceria com o Intercept Brasil, revelou que os procuradores planejaram buscar na Suíça provas contra Gilmar. Segundo a notícia, os membros do MPF pretendiam usar o caso de Paulo Preto, operador do PSDB preso em um desdobramento da “lava jato”, para reunir munições contra o ministro.

A agitação não fica por menos quanto a Toffoli. Em entrevista concedida à CNN Brasil em dezembro do ano passado, o hacker Walter Delgatti Neto, responsável por invadir os celulares dos procuradores, disse que o plano do MPF em Curitiba era prender Gilmar e Toffoli.

“Eles queriam. Eu não acho, eles queriam. Inclusive Gilmar Mendes e Dias Toffoli. Eles tentaram de tudo para conseguir chegar ao Gilmar Mendes e ao Toffoli, eles tentaram falar que o Toffoli tentou reformar o apartamento e queriam que a OAS delatasse o Toffoli”, afirmou o hacker.

Uma conversa divulgada pela ConJur em fevereiro deste ano respalda a narrativa de Delgatti Neto. Em 13 de julho de 2016, Dallagnol disse que “Toffoli e Gilmar todo mundo quer pegar”.

*Com informações do Conjur

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Procuradora Laura Tessler sobre Lula: “Dá pra gritar gol quando ele se ferrar?”

Em nova petição apresentada nesta segunda-feira (1º/3) ao Supremo Tribunal Federal (STF), a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) apresentou novos diálogos nos quais os procuradores da extinta Lava Jato teriam, segundo os advogados, ocultado provas de inocência do ex-presidente, pressionado testemunhas e divulgado acusações falsas para abalar o réu.

De acordo com o documento, que faz parte de uma série de petições baseadas em mensagens interceptadas por hacker e analisadas na Operação Spoofing, os procuradores também teriam, de forma premeditada, aberto denúncias simultâneas, para ocupar a defesa e “bater em Lula”.

A procuradora Laura Tessler, em um dos diálogos transcritos, afirma: “Estava aqui pensando se era o caso de já ir preparando a terceira denúncia do Palocci. Talvez isso o anime um pouco mais…”.

Há outra conversa na qual os procuradores falam sobre o pedido de Lula para que seu depoimento ao ex-juiz Sergio Moro, em 2017, fosse transmitido ao vivo. Tessler indaga: “Dá pra gritar gol quando ele se ferrar? kkkkk”. O procurador Athayde Ribeiro Costa responde: “Kkkkk”.

Posteriormente, o ex-ministro da Fazenda acabou firmando delação com a Polícia Federal.

*Com informações do Metrópoles

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‘Ela é faca na caveira. Pedi uma decisão hoje e já saiu’: diálogos mostram proximidade entre Lava Jato e Juíza Gabriela Hardt

Diálogos apreendidos pela Operação Spoofing que aparecem em documento protocolado pela defesa do ex-presidente Lula no Supremo Tribunal Federal indicam, além da relação entre os procuradores da Lava Jato e o ex-juiz Sergio Moro, uma proximidade entre a força-tarefa de Curitiba e a juíza Gabriela Hardt, que sucedeu Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba.

No dia 1º de novembro de 2018, Moro aceitou o convite do então presidente eleito, Jair Bolsonaro, para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Um dos principais indícios é uma mensagem enviada pelo procurador Athayde Costa no grupo de Telegram da Lava Jato em 16 de novembro de 2018, às 23h57. “e Gabriela é faca na caveira demais Pedi uma decisao hj e ja saiu”, escreveu Costa.

Há, de fato, uma decisão assinada pela magistrada Gabriela Hardt em 16 de novembro daquele ano. No despacho, a juíza decretou o bloqueio de 20 milhões de reais de treze alvos da 56ª fase da Lava Jato, chamada de “Sem Fundos”. A determinação também sequestrou ativos de 38 empresas ligadas aos investigados pela operação.

“Não importa se tais valores, nas contas bancárias, foram misturados com valores de procedência lícita. O sequestro e confisco podem atingir tais ativos até o montante dos ganhos ilícitos”, afirmou Gabriela Hardt em seu despacho, assinado às 18h53. “Considerando os valores que transitaram subrepticiamente nas contas dos investigados, resolvo decretar o bloqueio das contas dos investigados até o montante de vinte milhões de reais.”

A decisão de Hardt foi tomada após uma investigação do Ministério Público Federal apontar que as empreiteiras OAS e Odebrecht supostamente repassaram 68 milhões de reais em propina ao PT e a ex-dirigentes da Petrobras e da Petros em um esquema de corrupção relacionado à construção da sede da estatal na Bahia, conhecida como Torre Pituba.

Segundo os investigadores, o superfaturamento da obra seria bilionário: o orçamento inicial, de 320 milhões de reais, chegou no total a 1,32 bilhão. Naquela fase da Lava Jato, o ex-presidente da Petros Wagner Pinheiro foi alvo de buscas, enquanto Marice Correa, cunhada do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, e o marqueteiro Valdemir Garcia foram alvos de mandados de prisão temporária.

Ao todo, naquela operação, a Polícia Federal cumpriu 22 mandados de prisão eapreensão em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia.

No dia 19 de dezembro, a Lava Jato denunciou 42 pessoas pelo suposto esquema criminoso. Na lista dos crimes cometidos segundo a peça estão corrupção, lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, desvios de recursos de instituição financeira (Petros) e organização criminosa.

Entre os denunciados estavam os três ex-presidentes da Petros: Wagner Pinheiro de Oliveira; Luís Carlos Fernandes Afonso e Carlos Fernando Costa; Armando Ramos Tripodi, ex-chefe de gabinete da presidência da Petrobras e ex-integrante suplente do Conselho Deliberativo da Petros; Renato de Souza Duque, ex-diretor de Serviços da Petrobras; e os funcionários da estatal Carlos Alberto Ribeiro de Figueiredo, Antônio Sérgio Oliveira Santana e Gilson Alves de Souza.

No chamado “núcleo de operadores” foram denunciados, entre outros, João Vaccari Neto e Marice Correa de Lima.

O caso envolvendo a 56ª fase da Lava Jato, porém, não é a única menção a Gabriela Hahrdt na nova leva de diálogos revelados. Em 2 de novembro de 2018, Dallagnol escreveu aos colegas procuradores no Telegram: “Precisamos marcar reunião com a Gabriela

sobre as fases pendentes de decisão. Temos só a do Athayde e Je?”. Horas depois, ele complementou: “Vou marcar com ela pro começo da semana”.

Veja outra citação à magistrada, desta vez em 7 de novembro de 2018:

*Com informações da Carta Capital

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Vaza Jato: A relação promíscua de Barroso e Dallagnol

Por Reinaldo Azevedo e Leandro Demori, do The Intercept Brasil, em parceria com Portal UOL – Ao contrariar parecer da Procuradoria Geral da República e determinar mandado de busca e apreensão no gabinete da liderança do governo no Senado — ocupado pelo senador Fernando Bezerra (MDB-PE) —, o ministro Roberto Barroso, do Supremo, pode ter surpreendido a alguns, mas não aos integrantes da força-tarefa de Curitiba — em especial Deltan Dallagnol, com quem mantém uma relação de proximidade que beira a cumplicidade.

Vem à luz, de novo, um dos aspectos mais deletérios da Lava Jato, que é a relação promíscua, dados os marcos do devido processo legal no Brasil, entre o órgão acusador e o juiz — nesse caso, fala-se, em muitos aspectos, daquele que integra o seleto grupo de juízes de juízes. Nas relações especiais que mantém com Dallagnol, nota-se que Barroso se comporta como um chefe, guia, tutor, um pai doce e dedicado, pronto a cuidar do jovem ousado.

A proximidade parece ter se estabelecido numa viagem que os dois fizeram a Oxford, com direito a passeio pelas ruas, como dois “flaneurs” a refletir em terras ignotas sobre o estado de direito em sua colônia de origem, mas com o distanciamento que lhes propiciava a ambiência estrangeira.

As conversas de Dallagnol com seus pares evidenciam que o acesso a Barroso é privilégio apenas seu. Foi ele que selou essa amizade inquebrantável, que galopa, como disse o poeta, por cima de qualquer fosso de funções. O procurador de primeira instância tem no ministro da corte constitucional brasileira o seu pai espiritual.

Abaixo, vocês lerão algumas das muitas situações — há ainda uma penca delas cujas circunstâncias têm de ser clarificadas e, por isso, não estão aqui — em que Dallagnol apela ao conselheiro sênior. Impetuoso, há diálogos em que o procurador de primeira instância também se atreve a aconselhar o tutor. Barroso parece admirar tal impetuosidade.

Em agosto de 2016, o ministro ofereceu em sua casa um coquetel de que Dallagnol era um dos convidados ilustres, como já noticiei aqui. O entendimento espiritual já havia se dado antes.

SUBSTITUTO DE TEORI ZAVASCKI, BARROSO E OS “MINISTROS VAGABUNDOS” DO STF
Teori Zavascki, relator do petrolão no Supremo, morreu num acidente aéreo no dia 19 de janeiro de 2017. Sem nem mesmo uma nota de pesar, os bravos integrantes da Lava Jato iniciam uma articulação para guindar Roberto Barroso ao posto de relator. E, por incrível que pareça, o doutor não era mero polo passivo nessa articulação. Os diálogos deixam claro que ele conversou a respeito, ora vejam, com representantes do órgão acusador — ou, para ser claro, com Dallagnol.

A estratégia, como revelam os diálogos, passa por mobilizar aliados na imprensa para plantar informações e, sobretudo, “queimar” nomes. O grupo queria evitar a todo custo que a relatoria caísse nas mãos de Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski ou Dias Toffoli.

Ainda no dia da morte, o procurador Diogo Castor de Mattos, que deixou a operação, informa aos colegas uma conjectura do ministro Marco Aurélio em entrevista. E, claro!, Castor deixa claro quem é o preferido da Lava Jato: Barroso. Mas também eram aceitáveis Edson Fachin e Luiz Fux. Ele só não queria os que considera “vagabundos”. A grafia dos diálogos segue conforme a grafia que aparece nos chats do Telegram.

21:54:41 – Diogo: Marco aurélio disse agora na rádio q pode cair em qualquer ministro, não sendo a redistribuicao restrita a segunda turma. Me parece bom, pois aumenta chances de cair com alguém bom como Barroso, fachin e fux.
No dia 31 de janeiro de 2017, não estava claro ainda qual seria o procedimento para definir o novo relator da Lava Jato. Os procuradores articulam freneticamente. Laura Tesseler enviar ao grupo um link de resportagem da Folha afirmando que Cármen Lúcia, então presidente do STF, pretendia promover um sorteio. Segue diálogo a partir de uma observação nada lisonjeira de Diogo Castor de Mattos:
09:24:39 – Diogo: 3 em 4 de cair com um vagabundo
09:37:37 – Laura Tessler: Vamos apostar na nossa sorte!
10:12:55 – Laura: 3 em 5
10:13:17 – Diogo: E se for o marco aurekio?

O grupo fica sabendo que será Edson Fachin a migrar da Primeira para a Segunda turma. Dallagnol desenha, então, a estratégia, depois de relatar uma opinião que lhe foi passada pelo jornalista Vladimir Neto, da TV Globo. Na mensagem, o coordenador da força-tarefa informa que vai mobilizar os tais “movimentos sociais” e propor um tuitasso para pressionar o Supremo:

12:03:42 – Deltan: Caros, falei ontem com Vladimir Neto. Ele acha que nenhum jornal está peitando dizer que sorteio na segunda turma seria loucura, ou falando contra Gilmar, Toffoli ou Lewa, pq se forem escolhidos o jornal estaria queimado com o relator… Concordo que não podemos ajudar, mas podemos queimar. Creio que devemos nos manifestar em off nesse sentido, falando que sorteio é roleta russa e que tememos que Toff, Gilm ou Lew assumam. Em minha leitura, isso não gerará efeito contrário. O que acham? Meu receio é não fazermos nada antes (embora o que possamos fazer é pouco) e depois ficar o caso com um desses. Reclamar depois será absolutamente inócuo. Os movimentos sociais têm falado sobre isso. Posso falar com eles e sugerir um tuitasso contra o sorteio, mas o problema é que sem sorteio a solução de consenso pode não ser boa também… enfim, sugestões? Cruzar os dedos rsrs? Vou sondar minha fonte enquanto isso
12:04:04 – Deltan: a sessão administrativa para discutir o critério ou a escolha seria amanhã
12:04:43 – Diogo: acho q devemos fazer tudo oq for possível
12:04:54 – Diogo: um dos tres na relatoria da lava jato seria o começo do fim
12:17:45 – Roberson: MPF [procurador Roberson Pozzobon]: Melhor caminho seria defender que deve ficar com um dos revisores (Barroso – o que seria ideal – ou Celso – que seria a opção menos pior na 2a). É fácil de defender racional e juridicamente para a população que esse é o melhor caminho, já que o caso iria para os ministros que naturalmente já estão mais familiarizados com a operação.
12:22:15: Creio que nossa manifestação não seria bem recebida pelo STF. Não vejo muito o que fazer. Eles estão se encaminhando para o sorteio simplesmente porque não houve possibilidade de fecharem um nome consensual.
12:24:51 – Paulo: minha opinião: partindo de nós qq manifestação, não teria nenhum efeito moral sobre o STF (v. resposta da Carmen Lúcia ao Moro) e, pelo contrário, poderia gerar uma mega-prevenção contra nós ou ainda vontade de revidar
12:25:13 – Paulo: agora, se houver um movimento social, sem vinculação conosco, contra o sorteio, aí pode ter algum resultado…12:25:35 – Paulo: a questão da roleta russa, que saiu no antagonista, é uma boa hashtag para insuflar as redes sociais

Conversa do dia 1º de fevereiro de 2017 dá conta de que o próprio Barroso tratava com Dallagnol sobre o substituto de Teori Zavascki. E, segundo testemunho de seu confidente, em conversa com a procuradora Anna Carolina Resende, o ministro sentia-se alijado do processo. Talvez considerasse uma grande injustiça. Afinal, isenção para tanto não lhe faltava, certo?
12:11:18 – CarolPGR: Deltan, fale com Barroso
12:11:37- CarolPGR: insista para ele ir pra 2 Turma
12:18:07- Deltan: Há infos novas? E Fachin?
12:18:11- Deltan: Ele seria ótimo
13:54:21- CarolPGR: Vai ser definido hj
13:54:33- CarolPGR: Fachin não eh ruim mas não eh bom como Barroso
13:54:44 – CarolPGR: Mas nunca se sabe quem será sorteado
13:56:40- CarolPGR: Barroso tinha q entrar nessa briga. Ele não tem rabo preso. Eh uma oportunidade dele mostrar o trabalho dele. Os outros ministros devem ter ciúmes dele, pq sabem que ele brilharia na LJ. Ele tem que ser forte e corajoso. Ele pode pedir p ir p 2 turma e ninguém pode impedi-lo. Vão achar ruim mas paciência, ele teria feito a parte dele
14:11:37 – Deltan: Ele ficou alijado de todo processo. Ninguém consultou ele em nenhum momento. Há poréns na visão dele em ir, mas insisti com um pedido final. É possível, mas improvável.
14:30:16 – Deltan: Mas sua mensagem foi ótima, Caroll
14:30:24 – Deltan: Por favor não comente isso com ninguém
14:30:25 – Deltan: Please
14:30:29 – Deltan: Ele pediu reserva
14:30:31 – Carol PGR: clarooo, nem se preocupe
14:30:45 – Carol PGR: só lhe pedi para falar novamente com ele porque isso está sendo decidido hoje
14:30:52 – Deltan: Foi o tom do meu último peido14:31:18 – Carol PGR: vamos rezar para Deus fazer o melhor
14:32:22 – Carol PGR: mas nosso mentalização aqui é toda em Barroso

Esse trecho acima já foi publicado por The Intercept Brasil. É evidente que Deltan sabe que a conversa que manteve com Roberto Barroso nada tinha de republicada. Daí o apelo para que fosse mantida em sigilo.

O INDULTO DE NATAL DE TEMER
Quando o então presidente Michel Temer tornou público seu indulto de Natal de 2017, a Lava Jato tonitruou aos quatro ventos que a medida teria sido feita com o intuito de beneficiar condenados da Lava Jato. Era cascata. Mas e daí? A operação ainda não havia desistido da ideia de derrubar mais um presidente.

Cármen Lúcia, então na presidência do STF, suspendeu parcialmente parte do decreto, numa afronta explícita ao Artigo 84 da Constituição, que trata das prerrogativas do presidente. Diogo Castor havia escrito um violento artigo contra o ato presidencial. Dallagnol revelou a colegas parte das conversas confidenciais que mantinha com Barroso.

28 de dezembro de 2017
13:46:56 – Laura Tessler: Diogo, parabéns pelo artigo. Ficou muito bom.
13:50:32 – Diogo: Obrigado Laura!
17:03:20 – Deltan: Saiu a liminar. Carmem Lúcia suspendeu parcialmente o decreto.
17:05:30 – Deltan: Caso distribuído para Barroso
17:05:52 – Deltan: Que cá entre nós me escreveu elogiando o artigo sobre o indulto
17:06:13 – Deltan: A distribuicao pro Barroso foi o que pedi a Deus!!

Como se vê, a relação entre Dallagnol e Barroso já tem apelos de outro mundo. O jovem procurador ora, e Deus joga Barroso em seu colo. Ora vejam… O ministro trocava confidências sobre um caso de que virou relator com um membro do mesmo MPF que havia recorrido contra o decreto. É do balacobaco!

Dá para imaginar a sua isenção depois de ter elogiado o artigo de Castor.

FORÇA-TAREFA COMO TROPA AUXILIAR DE BARROSO
Barroso determinou, no dia 29 de março de 2018, a prisão de José Yunes, ex-assessor do então presidente Michel Temer. Tratou-se de uma exorbitância, mas não cabe tratar do assunto neste texto. O relevante é outra coisa. Mais uma vez, lá estava Deltan no Telegram. Depois de repassar a notícia do G1 com a informação, emendou: “Barroso foi para guerra aberta. E conta conosco como tropa auxiliar”.

70 MEDIDAS CONTRA A CORRUPÇÃO
Lembram-se das tais “70 Medidas Contra a corrupção”, encampadas por Dallagnol e pela Transparência Internacional? Sim, também elas passaram pelo escrutínio do onipresente Barroso. Deltan escreve num chat privado no dia 28 de maio de 2018:
22:54:18 – Deltan: Caros, comentei com Bruno, mas isso tem que ficar entre nós três, please. Hoje falei com Barroso, que gostou muito da ideia das medidas e da campanha da TI e vai divulgar. Passei pra ele os arquivos e materiais.

“Bruno” é Bruno Brandão, da Transparência Internacional, que evidencia, com a divulgação dos diálogos revelados por The Intercept Brasil, uma proximidade com a força-tarefa e com Dallagnol que deveria ser considerada incômoda para um ente que se quer independente da política — o que a Lava Jato não é, tampouco Dallagnol, que já revelou em outras circunstâncias pretensões político-eleitorais. Moro, como se sabe, já é ministro de Bolsonaro.

MAIS UMA VEZ, O CONSELHEIRO
No dia 21 de maio, Dallagnol informa que vai a uma de suas famosas palestras, desta vez acompanhado de ninguém menos do que seu tutor. Não consegue esconder o entusiasmo. Escreve aos colegas:
09:03:11 – Deltan: Yep. Pela manhã, palestra na FIEP. Tentarei falar com Barroso, nem que seja no almoço, mas não sei se haverá momento propício. Questoes a abordar?
09:10:20 – O principal é saber qual é o clima do STF em relação a nós.

Como se nota, Dallagnol também usava Barroso como uma espécie de Candinha do Supremo.

BARROSO, O QUE VALE POR DEZ
Em abril de 2019, Barroso concedeu uma palestra na Universidade de Columbia, em Nova York, e atacou o Supremo de modo espantoso. Sugeriu que o achincalhe de que era alvo o tribunal era bastante compreensível, quem sabe justo. Disse: “A pergunta que me faço frequentemente é por que o STF está sob ataque, por que está sofrendo esse momento de descrédito. Bem, o que acho que está acontecendo é que há uma percepção em grande parte da sociedade e da imprensa brasileira de que o STF é um obstáculo na luta contra a corrupção no Brasil”.

O procurador Júlio Noronha posta no Telegram, no dia 25 de abril, link com reportagem da Folha. Deltan expressa, mais uma vez, seu apreço pelo pai intelectual:
20:49:58 – Julio Noronha: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/04/stf-esta-sob-ataque-e-sofre-momento-de-descredito-afirma-barroso.shtml
22:10:11 – Deltan: Engracado o momento em que quem nos desagrava é outro ministro e não a PGR
22:10:24 – Deltan: Um Barroso vale 10 PGRs

AS DEZ MEDIDAS
Vocês se lembram das tais “Dez Medidas Contra a Corrupção” inventadas por Dallagnol, não? Vieram a público na forma de um projeto de lei de origem popular — uma mentira muito bem urdida com apoio de setores da imprensa. Quatro delas tinham características obviamente fascistoides — virtual extinção do habeas corpus, licença irrestrita para prisões preventivas, aceitação de provas colhidas ilegalmente e teste de honestidade —, mas o garotão não hesitou: passou para papai Barroso a sua mais deletéria criação. No dia 26 de julho de 2016, informa em conversa com a procuradora Luciana Asper — todas as transcrições serão feitas sempre conforme o original:
21:59:17- Deltan: Luciana, passei as 10 medias pro Min. Barroso, que tende a ser simpático a elas, pelo menos em sua maior parte. Ele se intererssou e disse que lerá no recesso…. é um apoio em potencial

DELTAN: 89% BARROSO
O apreço de Dallagnol por Barroso tem até um número percentual. A Veja publicou um teste para saber com qual ministro do Supremo, dadas as suas opiniões, os leitores mais se identificavam. Num chat privado, no dia 20 de abril de 2018, o professor de direito da FGV Michael Mohallem afirma ter respondido as questões e ter recebido como resposta que sua maior identidade era com Luiz Fux: 75%. Deltan, conforme o esperado, informa que ele e Barroso coincidiam em 89%. Não se deve perguntar a Wesley Safadão o que são os outros 11%.

18:07:33 – Michael Mohallem: https://complemento.veja.abril.com.br/brasil/teste-quem-e-voce-no-stf/
18:07:50 – Michael Mohallem: 75% fux😞
18:42:21 – Deltan: Ha!
18:42:23 – Deltan: Eu sabia
18:42:29 – Deltan: 89% Barroso

Convenham: Mohallem poderia ter dito: “Eu também sabia”

ESTREITANDO LAÇOS
No dia 13 de maio de 2017, a procuradora Anna Carolina Resende pergunta se Dallagnol está em Oxford nestes termos: “Deltan, vc tá em Oxford? Vi que Barroso foi e me lembrei q foi aí q vcs estreitaram laços.”

A amiga de Deltan já havia percebido o tal estreitamento. Com efeito, ele havia se dado no ano anterior, quando ambos estiveram em Oxford. No dia 19 de junho de 2016, Deltan informa à sua mulher: “Estamos passeando aqui com o ministro barroso”. Como diria o policial Louis a Rick, no filme Casablanca, “era o início de uma bela amizade”.

É crime um procurador passear com um ministro do Supremo em Oxford, informando, inclusive, à sua mulher que ambos estão “chiques”? A resposta é “não”.

Nestes poucos exemplos, de um elenco enorme de conversas em que o procurador trata o ministro como orientador, parceiro e interlocutor — e em que ousa mesmo patrocinar a sua candidatura a relator do petrolão —, o que se tem é um exemplo flagrante da promiscuidade entre órgão acusador e órgão julgador.

Chega-se a tratar a Lava Jato como tropa auxiliar de um general — Barroso! — que decidiu, então, ir à guerra — no caso, entende-se, contra o governo Michel Temer.

Pergunta-se: papel de ministro é ir à guerra? Papel de procuradores é se comportar como tropa auxiliar?

Dallagnol pode ser, se quiser, 99% Barroso, a exemplo daquela música, como condição, vamos dizer, afetivo-existencial. Inaceitável é que procurador e ministro deixem que essa amizade contamine assuntos que interessam ao estado democrático e de direito.

Já sabemos que Barroso considera isso tudo, como é mesmo?, “fofoca” e que Deltan Dallagnol e os demais procuradores não reconhecem a autenticidade das conversas, embora não as neguem. E poderiam negá-las? Pois é… A resposta é “não”!

Nestes poucos exemplos, de um elenco enorme de conversas em que o procurador trata o ministro como orientador, parceiro e interlocutor — e em que ousa mesmo patrocinar a sua candidatura a relator do petrolão —, o que se tem é um exemplo flagrante da promiscuidade entre órgão acusador e órgão julgador.

Chega-se a tratar a Lava Jato como tropa auxiliar de um general — Barroso! — que decidiu, então, ir à guerra — no caso, entende-se, contra o governo Michel Temer.

Pergunta-se: papel de ministro é ir à guerra? Papel de procuradores é se comportar como tropa auxiliar?

Dallagnol pode ser, se quiser, 99% Barroso, a exemplo daquela música, como condição, vamos dizer, afetivo-existencial. Inaceitável é que procurador e ministro deixem que essa amizade contamine assuntos que interessam ao estado democrático e de direito.

Já sabemos que Barroso considera isso tudo, como é mesmo?, “fofoca” e que Deltan Dallagnol e os demais procuradores não reconhecem a autenticidade das conversas, embora não as neguem. E poderiam negá-las? Pois é… A resposta é “não”!

 

 

*Do 247

*Foto: Et Urbis Magna

 

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Vaza Jato – Vazamento seletivo de grampo: Ódio e perseguição de Moro e procuradores a Lula comprovam sua inocência

PF gravou 22 telefonemas do ex-presidente após ordem para interromper escuta que revelou diálogo com Dilma em 2016.

Conversas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) gravadas pela Polícia Federal em 2016 e mantidas em sigilo desde então enfraquecem a tese usada pelo hoje ministro Sergio Moro para justificar a decisão mais controversa que ele tomou como juiz à frente da Lava Jato.

Em 16 de março de 2016, cinco horas depois de mandar interromper a escuta telefônica que autorizara no início do cerco da operação ao líder petista, Moro tornou público um diálogo em que a então presidente Dilma Rousseff tratou com Lula de sua posse como ministro da Casa Civil.

A divulgação do áudio de 1min35s incendiou o país e levou o Supremo Tribunal Federal a anular a posse de Lula, às vésperas da abertura do processo de impeachment e da deposição de Dilma. Para a Lava Jato, o telefonema mostrava que a nomeação de Lula como ministro tinha como objetivo travar as investigações sobre ele, transferindo seu caso de Curitiba para o STF.

Mas registros inéditos obtidos pela Folha e analisados em conjunto com o site The Intercept Brasil indicam que outras ligações interceptadas pela polícia naquele dia, mantidas em sigilo pelos investigadores, punham em xeque a hipótese adotada na época por Moro, que deixou a magistratura para assumir o Ministério da Justiça no governo Jair Bolsonaro (PSL).

A reportagem teve acesso a anotações dos agentes que monitoraram Lula, com resumos de 22 conversas grampeadas após a interrupção da escuta em março de 2016. Elas foram gravadas porque as operadoras de telefonia demoraram a cumprir a ordem de Moro e o sistema usado pela PF continuou captando as ligações.

Os diálogos, que incluem conversas de Lula com políticos, sindicalistas e o então vice-presidente Michel Temer (MDB), revelam que o petista disse a diferentes interlocutores naquele dia que relutou em aceitar o convite de Dilma para ser ministro e só o aceitou após sofrer pressões de aliados.

O ex-presidente só mencionou as investigações em curso uma vez, para orientar um dos seus advogados a dizer aos jornalistas que o procurassem que o único efeito da nomeação seria mudar seu caso de jurisdição, graças à garantia de foro especial para ministros no Supremo.

As anotações mostram que Lula estava empenhado em buscar uma reaproximação com Temer e o MDB e indicam que seus acenos eram bem recebidos pelo vice-presidente, na época visto como fiador da transição para o novo governo que seria formado se Dilma fosse afastada do cargo.

A PF escutou duas conversas de Lula e Temer. Na primeira, eles marcaram uma reunião para o dia seguinte, e Lula disse a Temer que a rejeição enfrentada pelos políticos numa recente manifestação pró-impeachment mostrava que o avanço da Lava Jato criara riscos para todos os partidos, não só o PT.

Na segunda ligação, após discutir a situação de um aliado do vice-presidente no governo, o petista prometeu ser um parceiro e disse que eles deveriam atuar como “irmãos de fé”. Segundo as anotações dos agentes da PF, Temer respondeu a Lula dizendo que “sempre teve bom relacionamento” com ele.

Embora os registros mostrem que os policiais prestaram atenção a todas as conversas do ex-presidente, o telefonema de Dilma foi o único que a PF anexou aos autos da investigação sobre Lula nesse dia antes que Moro determinasse o levantamento do sigilo do processo.

Mensagens que integrantes da Lava Jato trocaram no aplicativo Telegram, obtidas pelo Intercept e analisadas em conjunto com a Folha, mostram que um dos policiais na escuta alertou os investigadores para o telefonema de Dilma assim que ouviu a ligação e foi instruído a produzir um relatório.

Não foi o que ocorreu com as outras conversas. O mesmo agente usou o Telegram para avisar que Lula também falara com Temer e fez um resumo do primeiro diálogo entre eles, com duas horas de atraso. Nenhum dos investigadores que participava do grupo reagiu à informação no Telegram.

O material examinado pela Folha e pelo Intercept mostra que o grampo permitiu que a Lava Jato soubesse do convite de Dilma a Lula com uma semana de antecedência e usasse o tempo para preparar junto com Moro o levantamento do sigilo da investigação e das escutas telefônicas.

No dia 9 de março, quando havia apenas especulações sobre o assunto na imprensa, o agente Rodrigo Prado ouviu Lula confirmar que recebera o convite, numa conversa com o ex-ministro Gilberto Carvalho. O policial alertou os outros investigadores no Telegram dez minutos depois.

9.mar.2016

Rodrigo Prado16:02:49 Ela ofereceu mesmo pra ele

16:03:07 E ele esta pensando

16:03:07 Talvez aceite

16:04:01 Nao só por causa da LJ mas para salvar o Governo dela

16:04:33 Cai isso numa conversa dele com Gilberto Carvalho

O áudio anexado aos autos pela PF mais tarde sugere que Lula ainda tinha dúvidas sobre a ideia e temia que sua ida para o governo fosse associada a uma tentativa de escapar da Lava Jato. Para os investigadores, porém, não havia dúvida de que o objetivo dos petistas era exatamente esse.

Desde o início da escuta telefônica, em 19 de fevereiro, várias conversas interceptadas haviam mostrado que Lula e seus aliados estavam preocupados com o avanço das investigações, temiam que ele fosse preso e buscavam apoio de autoridades do governo e ministros de tribunais superiores.

A força-tarefa à frente do caso em Curitiba acompanhou de perto a interceptação. No dia em que soube do convite de Dilma, o procurador Deltan Dallagnol, coordenador do grupo, pediu um CD com todos os áudios. “Estou sem nada pra ouvir no carro”, disse no Telegram, em tom de brincadeira.

9.mar.2016

Deltan Dallagnol 19:25:19 Igor consegue pra mim CD ou DVD com todos os áudios do 9 e a análise dos que tiver? Estou sem nada pra ouvir no carro rsrsrs

Igor Romário de Paula 19:45:20 Sim… amanhã, ok!?

Deltan 19:59:45 emoji sinal positivo

9 Referência pejorativa a Lula, que perdeu um dedo da mão esquerda quando operário

10.mar.2016

Deltan 00:20:56 Igor falei com o pessoal e parece que recebemos só os de destaque e não temos os daqueles em volta que podem ser importante para indicar riscos à segurança e a condução… Consegue os áudios completos e relatórios por favor?

[…]

Igor 21:19:23 O cara vai ser mesmo ministro

Deltan 21:21:06 Januário vem pra cá pra discutirmos o que fazer com o procedimento em sigilo

21:21:14 ele ia te ligar creio agora

Igor 21:26:42 Chego aí em 15 minutos…

Para os investigadores, havia uma oportunidade para levantar o sigilo da investigação, revelando o conteúdo das conversas de Lula, antes que sua nomeação como ministro obrigasse Moro a encaminhar o caso a Brasília e a força-tarefa de Curitiba perdesse o controle sobre a investigação.

As mensagens obtidas pelo Intercept mostram que o assunto foi discutido com o juiz, que pediu relatórios com transcrições dos diálogos considerados mais relevantes. Em 15 de março, na véspera da nomeação de Lula, a polícia anexou aos autos da investigação três relatórios e 44 arquivos de áudio.

19:49:46 Prado e demais colegas da análise: Teríamos condições de apresentar os três relatórios de interceptação amanhã de manhã, com tudo o que tem de relevante nos dois períodos até o momento? (pergunto porque sei que vcs estavam com eles praticamente prontos)

14.mar.2016

Prado 20:24:45 Luciano: amanha de manha nao seria possivel. Sao 41 ligacoes no relatorio. Ainda faltam algumas mesmo fazendo mutirao de transcricao. Acho que conseguimos ate o final do dia de amanha.

20:25:15 Voces pensam em eprocar isso quando?

20:26:44 Se for uma emergencia, fechamos o relatorio do jeito que esta, mas muitas ligacoes so estao com resumo. E o Russo pediu expressamente que todas fossem transcritas.

20:27:16 Estamos tentando fazer o melhor possivel, porque esse relatorio vai fazer um strike em BSB

Flores 20:28:57 Estamos vendo essa questão da oportunidade… parece que já está confirmada a aceitação dele para Casa Civil

Lula aceitou o convite de Dilma na manhã do dia 16. Enquanto os dois conversavam no Palácio da Alvorada, procuradores se reuniram com Moro em Curitiba para discutir o levantamento do sigilo, e Deltan, que estava em Brasília, foi à Procuradoria-Geral da República obter aval para a iniciativa.

Moro mandou interromper a escuta telefônica às 11h12, depois que a imprensa confirmou a nomeação de Lula. Num despacho sucinto, o juiz disse que o grampo se tornara desnecessário após as buscas realizadas duas semanas antes, quando Lula fora levado à força pela PF para depor em São Paulo.

A demora das operadoras de telefonia para executar a ordem de Moro em 16 de março permitiu que os investigadores continuassem escutando as conversas de Lula por cinco horas. Com o sistema usado pela PF, as ligações são desviadas automaticamente para os computadores da polícia pelas operadoras.

A primeira pessoa com quem o ex-presidente falou após o encontro com Dilma foi sua assessora Clara Ant, segundo as anotações feitas pelos agentes na escuta. Lula confirmou sua nomeação como ministro, mas indicou que estava desconfortável com a situação.

“Diz que acabou de se foder. LILS diz que ficaram discutindo até meia-noite. LILS tem mais incerteza do que certeza. LILS diz que não tem como escapar ‘dela’”, resumiu o agente que estava na escuta, identificando Lula sempre pelas iniciais de seu nome completo.

Os registros obtidos pela Folha mostram que o ex-presidente manifestou o mesmo incômodo ao falar com seu advogado Cristiano Zanin Martins, o ex-ministro Franklin Martins, o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, e dois jornalistas de sua confiança.

O tom foi outro nas conversas com políticos. As anotações da PF indicam que Lula expressou a todos entusiasmo com sua ida para o governo, apostando em sua capacidade de recompor a base de apoio a Dilma no Congresso e promover mudanças na política econômica.

Ao deputado José Guimarães (PT-CE), então líder do governo na Câmara, avisou que estava disposto a conversar até com Eduardo Cunha (MDB-RJ), que rompera com Dilma após assumir a presidência da Casa e liderava as articulações para acelerar o processo de impeachment.

Lula iniciou a conversa com Temer dizendo que queria mudar sua relação com o Palácio do Planalto, do qual o vice se afastara após desentendimentos com Dilma. O tom foi amistoso. “[Lula] Pede para preparar o uísque e o gelo”, anotou o agente da PF, depois que eles combinaram o encontro no dia seguinte.

O líder petista compartilhou com Temer sua preocupação com as manifestações pró-impeachment que tinham ocorrido pouco antes, no domingo, 13 de março. Uma multidão fora às ruas em São Paulo para demonstrar sua insatisfação com os políticos e seu apoio a Moro e à Lava Jato.

“Ninguém ganhou com a manifestação de domingo”, disse Lula a Temer, segundo os registros da PF. “Quem ganhou foi o combate à corrupção expressado na figura do MORO. Diz que esse combate à corrupção foi sempre um alimento para golpistas no mundo inteiro.”

“Quem ganhou foi a negação da política”, acrescentou o ex-presidente. “A classe política tem que se unir para recuperar o seu espaço.”

Minutos depois, Temer telefonou a Lula para falar do deputado Mauro Lopes (MDB-MG), que Dilma nomeara ministro da Aviação Civil. O vice temia que a indicação fosse vista como afronta pelo partido, que ainda não desembarcara do governo, mas vetara a ocupação de novos cargos no primeiro escalão por seus filiados.

Lula prometeu tratar do assunto com Dilma. “LILS quer ser o parceiro de TEMER para reconstruir a relação com PMDB. LILS quer ser irmãos de fé”, anotou o agente na escuta, de acordo com os registros obtidos pela Folha. “TEMER diz que sempre teve bom relacionamento com LILS.”

12h47

Michel Temer (MDB), então vice-presidente: “Diz que vão conversar amanhã. TEMER está em SÃO PAULO. LILS quer saber se o uísque está lá ainda. Diz que TEMER tomou um pouco. LILS quer conversar com TEMER porque aceitou a CASA CIVIL. TEMER diz que precisam conversar. LILS diz que quer mudar a relação de TEMER com o PALÁCIO. Marcam às 19 horas em SÃO PAULO. Pede para preparar o uísque e o gelo. LILS diz que aceitou porque há uma possibilidade de animar o país. LILS diz que ficou preocupado com a manifestação de domingo. Diz que ninguém ganhou com a manifestação de domingo. Diz que quem ganhou foi o combate à corrupção expressado na figura do MORO. Diz que esse combate à corrupção foi sempre um alimento para golpistas no mundo inteiro. E quem ganhou foi a negação da política. O que fizeram com a MARTA, com o AÉCIO, com o ALCKMIN. Diz que a classe política tem que se unir para recuperar o seu espaço. LILS diz que vai restabelecer a relação carinhosa entre seres humanos nesse país.”

12h58

Michel Temer: “[Temer] Diz que está muito preocupado com MAURO LOPES assumir antes de resolver essas questões. Fala da história da afronta. Tem que esperar mais uns dias. LILS diz que tentou falar com ela. Ela está em reunião. LILS quer ser o parceiro de TEMER para reconstruir a relação com PMDB. LILS quer ser irmãos de fé. Se coloca à disposição. Quer harmonizar isso. TEMER quer trazer algumas pessoas para a relação deles. TEMER vai chamar PADILHA. LILS diz para chamar. TEMER diz que sempre teve bom relacionamento com LILS.”

Dilma telefonou às 13h32. Avisou Lula que mandara um assessor lhe entregar o termo de posse para que tivesse o documento em mãos “em caso de necessidade”. O ex-presidente assentiu e os dois desligaram. Lula acertara com Dilma que só tomaria posse na semana seguinte, no dia 22.

As mensagens obtidas pelo Intercept mostram que o impacto dessa conversa foi imediato entre os investigadores, ao contrário dos outros telefonemas. “Estao preocupados se vamos tentar prende-lo antes de publicarem no DOU a nomeacao do Lils”, escreveu Prado no Telegram.

O procurador Athayde Ribeiro da Costa concordou com a interpretação: “já é calro. mais isso demonstra ainda mais o desvio de finalidade da nomeação”. As mensagens foram reproduzidas com a grafia encontrada nos arquivos recebidos pelo Intercept, incluindo erros de português e abreviaturas.

A PF anexou aos autos o áudio com a conversa de Dilma e Lula e o relatório com sua transcrição às 15h37. O Ministério Público já se manifestara a favor da retirada do sigilo da investigação, antes mesmo de tomar conhecimento do diálogo. Moro ainda não tinha tomado uma decisão.

16.mar.2016

Prado 13:44:48 Senhores: Dilma ligou para LILS avisando que enviou uma pessoa para entregar em maos o termo de posse de LILS. Ela diz para ele ficar com esse termo de posse e só usar em “caso de necessidade”…

13:45:26 Estao preocupados se vamos tentar prende-lo antes de publicarem no DOU a nomeacao do Lils

Flores 14:26:31 Prado, transcreve literalmente tudo sem comentários. Faz uma informação em complemento ao relatório de pessoas com foro. Estou voltando pra SR pra carregar no eproc com áudio

[…]

Athayde Ribeiro da Costa 14:27:39 já é calro. mais isso demonstra ainda mais o desvio de finalidade da nomeação

Flores 14:29:50 Isso

[…]

Prado 14:53:26 To zerando

14:53:30 Tem muita ligacao

14:54:46 Falou com Temer… Lils Disse que ficou muito preocupado com as manifestacoes nas ruas domingo… Porque sao anti-politicas… E que ele precisa unir todos os politicos novamente para recuperarem o lugar deles…

Registros no sistema eletrônico de acompanhamento dos processos da Justiça Federal mostram que o juiz examinou com atenção os áudios anexados pela PF. Ele determinou a exclusão dos arquivos de duas conversas com advogados de Lula, argumentando que envolviam sigilo profissional.

Moro decidiu levantar o sigilo dos autos às 16h19. A GloboNews noticiou a decisão às 18h32 e revelou que Dilma fora grampeada. Uma cópia da transcrição do diálogo que a presidente tivera com Lula naquela tarde foi lida ao vivo.

Depois que a notícia entrou no ar, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima foi o primeiro a avisar os colegas, num grupo que reunia vários procuradores de Curitiba no Telegram. “Ótimo dia rs”, escreveu Deltan. “[M]Eu Deus!!!”, disse Orlando Martello. “O mundo caiu”, afirmou Athayde.

Em Brasília, manifestantes se aglomeraram na frente do Palácio do Planalto para protestar contra o governo. No plenário da Câmara, deputados da oposição pediram a renúncia de Dilma e chamaram Lula de ladrão, aos gritos, antes que a sessão fosse encerrada em meio a tumulto.

O procurador Eduardo Pelella, chefe de gabinete do então procurador-geral Rodrigo Janot, chamou Deltan para entender o que acontecera. Ele dera seu aval ao levantamento do sigilo da investigação pela manhã, mas não fora avisado de que a Lava Jato tinha grampeado a presidente da República.

“Parece que foi hoje cedo”, disse Deltan, que passara o dia em reuniões em Brasília, mas em contato com os colegas de Curitiba pelo Telegram. “Tudo que sabemos é o que está nos relatórios que te entreguei”, acrescentou, referindo-se as transcrições feitas pela PF antes da conversa de Dilma.

16.mar.2016

Carlos Fernando 18:40:09 Tá na globo news

Deltan 18:52:42 Ótimo dia rs

Orlando Martello 18:53:19 O q está na globo news? Os áudios?

Athayde 18:53:37 Tudo

Jerusa Viecili 18:53:40 Isso

Orlando 18:53:59 Eu deus!!! Rs

Athayde 18:54:11 O mundo caiu

Deltan 18:59:54 Caros vamos descer a lenha até terça

19:00:02 por cautela falei com Pelella e deu ok

16.mar.2016

Eduardo Pelella 19:17:38 Vcs sabiam do áudio da Dilma?

19:17:59 Moro não menciona na decisão. E a gente não falou sobre isso

Deltan 19:22:57 Não

19:23:04 Parece que foi hoje cedo

Pelella 19:23:12 hoje cedo?

Deltan 19:23:13 Os relatórios foram fechados ontem

Pelella 19:23:17 Putz!

Deltan 19:23:22 Ouvi alguém falar que foi hoje cedo

Pelella 19:23:27 Não estão nos relatórios?

19:23:35 Caralhooo!!!

19:23:38 Vou ler aqui

Deltan 19:23:38 Relatórios são de ontem

19:23:54 Foram revisados hoje antes de juntar

19:23:59 Para não ter nada pessoal

19:24:12 Tudo que sabemos é o que está nos relatórios que te entreguei

As mensagens obtidas pelo Intercept indicam que no fim da noite os procuradores se deram conta de que havia dúvidas sobre a legalidade das decisões de Moro naquele dia. Eles começaram a debatê-las no Telegram enquanto acompanhavam o desenrolar de manifestações contra o PT em São Paulo e outras cidades.

Dilma e os advogados de Lula questionaram as decisões do juiz, argumentando que sua conversa não poderia ter sido grampeada se Moro já tinha determinado o fim da escuta, nem os autos poderiam ter sido divulgados sem que o STF tivesse sido alertado para as citações a ela e a outras autoridades com foro especial.

“Estou preocupado com moro! Com a fundamentação da decisão”, disse o procurador Orlando Martello no Telegram. “Vai sobrar representação para ele.”

“Vai sim”, respondeu Carlos Fernando. “E contra nós. Sabíamos disso.” Para Laura Tessler, o apoio da opinião pública garantiria proteção à Lava Jato: “a população está do nosso lado…qualquer tentativa de intimidação irá se voltar contra eles”. Carlos Fernando recomendou: “Coragem… Rsrsrs”.

Após compartilhar com o grupo vídeos de uma manifestação que estava ocorrendo na Avenida Paulista, em São Paulo, Martello sugeriu que todos os integrantes da operação renunciassem aos cargos se algo acontecesse com Moro. Laura sugeriu que a melhor resposta seria mover uma ação contra Lula e pedir sua prisão.

Para Andrey Borges de Mendonça, seria difícil defender a divulgação da conversa de Dilma por causa do horário em que ocorrera, mas a maioria discordou. “O moro recebeu relatório complementar e o incorporou”, disse Carlos Fernando. “Nesta altura, filigranas não vão convencer ninguém.”

Deltan entrou tarde na discussão e se alinhou com Carlos Fernando. “Andrey No mundo jurídico concordo com Vc, é relevante”, disse. “Mas a questão jurídica é filigrana dentro do contexto maior que é político.”

Mendonça disse concordar com o chefe da força-tarefa, mas insistiu. “Isso tera q ser enfrentado muito em breve no mundo juridico”, escreveu. “O estrago porem esta feito. E mto bem feito”. Era tarde, e os outros integrantes do grupo não se manifestaram mais sobre o assunto.

16.mar.2016

Orlando 21:05:53 Estou preocupado com moro! Com a fundamentação da decisão. Vai sobrar representação para ele.

Carlos Fernando 21:06:48 Vai sim. E contra nós. Sabíamos disso.

Orlando 21:09:14 Ele justificou em precedentes stf a abertura dos áudios?

Laura Tessler 21:09:25 Acho que não…já chagaram ao limite da bizarrice…a população está do nosso lado…qualquer tentativa de intimidação irá se voltar contra eles

Carlos Fernando 21:18:01 Coragem… Rsrsrs

[…]

Orlando 21:19:20 Se acontecer algo com moro renúncia coletiva de MPF, pf e RF

[…]

Carlos Fernando 21:19:48 Por mim, ok

21:20:07 Adoro renunciar… Rsrsrs

Laura 21:20:28 Renúncia coletiva nada….denúncia é pedido de prisão!!!!

21:21:20 Hahahhahahaha

Carlos Fernando 21:21:21 Laura é xiita.. Rsrsrs

A transcrição das mensagens manteve a grafia original dos arquivos obtidos pelo The Intercept Brasil

Moro não fez nenhuma menção à conversa de Dilma e Lula na decisão que levantou o sigilo dos autos. No dia seguinte, em novo despacho, afirmou que não tinha prestado atenção no diálogo anexado aos autos. “Não havia reparado antes no ponto, mas não vejo maior relevância”, escreveu.

A resposta chegou cinco dias depois, em despacho do ministro Teori Zavascki, relator dos casos da Lava Jato no STF. Ele suspendeu as decisões de Moro e mandou que enviasse os autos da investigação sobre Lula a Brasília, observando que o sigilo fora levantado “sem nenhuma das cautelas exigidas em lei”.

Ao explicar sua conduta uma semana mais tarde, Moro disse a Teori que não tivera intenção de provocar “polêmicas e constrangimentos desnecessários” e pediu “respeitosas escusas”, mas não reconheceu nenhum erro na condução do processo.

Junto com os autos, Moro enviou a Teori um CD com todos os diálogos interceptados pela polícia, afirmando que mantivera em sigilo apenas conversas pessoais, com advogados ou que “simplesmente não têm conteúdo jurídico-criminal relevante”.

Finalmente, em junho, Teori anulou as decisões de Moro e o repreendeu, afirmando que ele usurpara as atribuições do Supremo ao tratar a conversa de Dilma e Lula como válida, divulgar diálogos dela e de outras autoridades com foro na corte e fazer juízo de valor sobre sua conduta sem ter competência legal para tanto.

Mas os efeitos das decisões de Moro eram irreversíveis. Com base nas conversas divulgadas pelo juiz, o ministro Gilmar Mendes, do STF, anulou a posse de Lula dois dias depois, em 18 de março. Com o aprofundamento da crise política, a Câmara aprovou a abertura do processo de impeachment em abril e afastou Dilma do cargo.
Lula conversa ao telefone no dia em que foi gravado pela PF, em cena registrada no documentário ‘Democracia em Vertigem’
Lula conversa ao telefone no dia em que foi gravado pela PF, em 2016, em cena registrada no documentário ‘Democracia em Vertigem’ – Reprodução

OUTRO LADO

O ministro da Justiça, Sergio Moro, disse que não soube dos telefonemas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que a Polícia Federal grampeou e manteve sob sigilo em 2016, quando era o juiz à frente das ações da Lava Jato em Curitiba.

“O atual ministro teve conhecimento, à época, apenas dos diálogos selecionados pela autoridade policial e enviados à Justiça”, afirmou o Ministério da Justiça, por meio de nota.

“Cabe à autoridade policial fazer a seleção dos diálogos relevantes do ponto de vista criminal e probatório”, afirmou. “Diálogos que não envolvam ilícitos não são usualmente selecionados.”

Embora as mensagens obtidas pelo Intercept indiquem sua presença em reuniões com integrantes da Lava Jato para tratar das escutas, Moro disse não saber se os procuradores também participaram da seleção dos áudios divulgados.

“Se o Ministério Público Federal também participou da seleção, o ministro da Justiça desconhece, mas, se ocorreu, isso seria igualmente lícito”, afirmou.

Moro disse que suas razões para tornar públicos os telefonemas de Lula estão expostas em suas decisões como juiz, e acrescentou que todo o material foi enviado depois ao Supremo Tribunal Federal.

O ministro reafirmou que não reconhece a autenticidade das mensagens recebidas pelo Intercept, cujo vazamento é objeto de uma investigação conduzida pela Polícia Federal.

Em nota, a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba disse que cabe à polícia selecionar as interceptações relevantes para as investigações e que “não houve seleção de áudios pelas autoridades quando do levantamento do sigilo” do caso de Lula.

“Havendo áudio ou qualquer outra prova de conduta ilícita por parte de pessoas com prerrogativa de foro, a Procuradoria-Geral da República ou outra autoridade competente é comunicada, sem exceção”, afirmou.

“Não havendo indícios de crimes, os áudios são posteriormente descartados, conforme previsto na legislação, com a participação da defesa dos investigados”, acrescentou. “Neste contexto pode ter havido a captação fortuita de diálogos de eventuais outras pessoas não investigadas.”

“As conversas que não revelaram, na análise da polícia, interesse para a investigação, permaneceram disponíveis para a defesa, que tem o direito de informá-las nos autos e utilizá-las”, observou.

A força-tarefa acrescentou que seu coordenador, o procurador Deltan Dallagnol, “não conseguiu acompanhar diretamente os acontecimentos daquela tarde” porque passou o dia em Brasília, com muitos compromissos.

A Polícia Federal não quis fazer comentários sobre a seleção dos áudios que anexou aos autos da investigação em 2016.

Em nota na época, a PF observou apenas que a interrupção de interceptações telefônicas depende do cumprimento da ordem judicial pelas operadoras de telefonia, e que todas as ligações gravadas foram encaminhadas à Justiça para que definisse seu destino, não só as que foram anexadas aos autos.

A polícia afirmou que as investigações sobre o vazamento das mensagens da Lava Jato ainda não foram concluídas. “A Polícia Federal analisa as circunstâncias da obtenção de dados, referentes a trocas de mensagens privadas, por terceiros”, disse. “O teor de tais mensagens não é objeto da investigação.”

O procurador Eduardo Pelella, que era chefe de gabinete do procurador-geral Rodrigo Janot, disse que “tomou conhecimento dos fatos a partir do que foi informado pelos colegas de primeiro grau”, e que Janot “aconselhou que fosse seguido o padrão de atuação da força-tarefa em casos semelhantes”.

Informado das anotações da PF sobre suas conversas com Lula em 16 de março de 2016, o ex-presidente Michel Temer disse que reconhece os diálogos, e que nunca soube que tinha sido grampeado naquele dia.

 

 

*Do ET Urbis Magna

 

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Vaza Jato – Dallagnol: “E sabe se a opinião de Moro ainda tá valendo algo no governo?”

“Falei c Moro que confirmou que Aras é o candidato dele…. calma! O outro Aras rs”, brinca Deltan Dallagnol. “E sabe se a opinião do Moro ainda tá valendo algo no governo? Tô achando ele bem enfraquecido ultimamente…isso me assusta bastante”, responde a procuradora Laura Tessler.

Os procuradores da Lava Jato criticaram abertamente o procurador Augusto Aras, indicado por Jair Bolsonaro para ser o novo procurador-geral da República, e também explicitaram a visão de que o ministro Sergio Moro apita pouco ou quase nada no governo de Jair Bolsonaro. É o que aponta o novo capítulo da Vaza Jato, revelado pela jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, em parceria com site The Intercept.

“Nas mensagens, obtidas pelo site The Intercept Brasil e analisadas pela Folha, eles se mostram perplexos com entrevista de Aras, em abril. Nela, o subprocurador acena a Jair Bolsonaro e ataca o processo de escolha para procurador-geral da República, até então feito por meio de uma lista tríplice. Um dos procuradores ironiza: ‘Tem de acabar com essa história de eleição. Pra quê eleição?’. E completa: ‘A democracia é incapaz de reconhecer os valores ocultos das grandes personalidades latentes'”, diz a coluna.

“O procurador Vladimir Aras, que concorria à lista tríplice com o apoio de Sergio Moro e é primo de Augusto Aras, comenta: ‘A entrevista entrou para a história institucional como uma das mais deploráveis já dadas por um membro do MPF [Ministério Público Federal]’. ‘Falei c Moro que confirmou que Aras é o candidato dele…. calma! O outro Aras rs’, brinca Deltan Dallagnol. ‘E sabe se a opinião do Moro ainda tá valendo algo no governo? Tô achando ele bem enfraquecido ultimamente…isso me assusta bastante’, responde a procuradora Laura Tessler”, prossegue Mônica Bergamo.

Moro acabou não sendo nem sequer consultado por Bolsonaro, que na quinta (5) indicou Aras para a PGR.

 

 

*Com informações do 247

 

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Se depois da entrevista de Dallagnol para o El País assumindo a veracidade das mensagens contra a família de Lula, o STF se acovardar, é a falência da justiça brasileira

Em uma das entrevistas mais detalhadas que concedeu desde o início da série de reportagens que expõe supostos diálogos entre membros da Lava Jato – incluindo o atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro – em mensagens de celular, o procurador-chefe da operação, Deltan Dallagnol, se diz vítima de “maldade” e “veneno”.

Mas, frente às acusações de insensibilidade e frieza de procuradores da força-tarefa – como Januário Paludo, que teria dito que “o safado só queria passear” quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu para ir ao enterro do irmão morto por um câncer, e Laura Tessler, que pediu “dose extra de paciência para a sessão de vitimização” quando a ex-primeira-dama Marisa Letícia sofreu um AVC -, Dallagnol relativiza.

Lava Jato ‘tem coisas que foram verdade’ e não deve ser totalmente anulada, diz Lula

“As pessoas têm que entender que essas conversas são conversas que você teria na mesa de casa com a família, são pessoas que estão trabalhando há cinco anos juntas, são amigas. São conversas que você tem com o círculo de intimidade, conversas que você fica à vontade para falar até alguma besteira, uma bobagem, para ser até certo modo irresponsável”, disse o procurador-chefe da Lava Jato em entrevista exclusiva à BBC News Brasil.

Em mais de uma hora de entrevista, ao mesmo tempo em que reconhece a veracidade de alguns vazamentos publicados pelo site The Intercept Brasil (“A gente foi hackeado, eles têm mensagens verdadeiras. Eu não posso atestar que tudo lá seja verdade, mas existem coisas lá que a gente lembra”), Deltan critica a falta de contexto que enxerga nas mensagens. (“Existe aí um foco em tentar sempre mostrar aquilo que pode gerar uma polêmica”).

Na quinta-feira, uma entrevista dada pelo procurador à BBC News Brasil em abril de 2017 (Lava Jato: ‘Não temos instrumento eficiente para identificar vazamentos’, diz Dallagnol) foi citada pelo Intercept em reportagem sobre mensagens que mostrariam que procuradores “vazaram” informações à imprensa com o intuito de estimular delações premiadas. No texto do site, o procurador Carlos Fernando Santos Lima diria: “Meus vazamentos objetivam sempre fazer com que pensem que as investigações são inevitáveis e incentivar a colaboração”.

Em 2017, Deltan disse que “agentes públicos não vazam informações”, o que é apontado pelo site como uma suposta mentira do procurador-chefe. Ele nega: “Eles mudam o significado de vazamento. Usam vazamento no significado de “furo”, de informação inédita”, diz. “Outra coisa é revelar informação que está sob sigilo judicial. Isso é crime, isso é errado, isso a gente nunca fez.”

Alvo de denúncias no Conselho Nacional do Ministério Público e escrutínio pelas divulgações de mensagens com colegas, Deltan afirma que a Lava Jato está sangrando. “Isso faz a operação sangrar. E quando a operação sangra, vêm os tubarões”.

Confira a entrevista completa:

BBC News Brasil – Há dois anos, o senhor me disse: “Nos casos em que apenas agentes públicos tinham acesso a dados, as informações da Lava Jato não vazavam”. Queria saber se o senhor mantém essa informação.

Deltan Dallagnol – Mantenho integralmente. Hoje (quinta-feira, 29), saiu uma reportagem nos acusando de vazamentos, mas tem um jogo semântico aí, de significado de palavras. A gente estava conversando em um contexto em que muita coisa sigilosa estava vindo a público porque delatores faziam colaborações com o Ministério Público, e depoimentos deles vinham a público ilegalmente.

Eu falei: “Olha, a gente não tem interesse em vazar”. Porque se eu quero que algo vá a público, basta eu pedir o levantamento do sigilo dos autos. O sigilo existe em favor das investigações. É o MP que traça a estratégia da investigação.

Hoje, em um jogo semântico, uma reportagem com base em supostas mensagens que a gente teria trocado quis dizer que a gente vaza informação e que eu teria mentido naquele momento. Mas aí eles mudam o significado de vazamento. Usam vazamento no significado de “furo”, de informação inédita, o que é ridículo porque quando você está conversando em uma entrevista como agora você pode fazer uma pergunta sobre algo que eu nunca falei para ninguém.

Se aquela informação não é sigilosa, eu posso falar para você. Isso é um furo, não é um vazamento. Aquelas supostas mensagens em que eles se basearam para dizer que havia vazamento não têm nada de vazamento, ainda que a gente considere que elas sejam verdadeiras. A gente não consegue recordar o que aconteceu há cinco anos e eu não consigo atestar que aquilo seja fato. Mas, ainda que seja fato, o que tem lá não é nada de informação que estava sob sigilo, eram informações que estavam em autos públicos combinadas com nossa estratégia de informação.

Eu falei “olha”… segundo a mensagem, eu teria falado, “olha, a gente cogita ou vai fazer um pedido de cooperação internacional para os EUA em relação a Bernardo Freiburghaus”. Essa é uma informação de estratégia sobre o futuro. Estava em sigilo? Não estava. Essa acusação de vazamento é muito grave, equivocada, absurda e maldosa, porque vazamento tem o sentido jurídico muito claro: colocar a público informação sigilosa. E, quando eu falo sobre uma estratégia futura nossa, essa informação nem tem como estar em sigilo judicial porque nem existem autos.

E é uma informação que a gente pode revelar de acordo com a estratégia de investigação. Naquele momento, estávamos investigando Odebrecht, pessoas que tiveram relacionamento com Bernardo Freiburghaus, e nos interessava que ele viesse colaborar com as investigações. Então interessava colocar publicamente a nossa estratégia para ele ver que ela era séria, consistente, que ia envolver outros países, e para avaliar dentro do cenário completo quais eram as melhores alternativas de defesa dele, inclusive a possibilidade de vir a colaborar.

Outra coisa é revelar informação que está sob sigilo judicial. Isso é crime, isso é errado, isso a gente nunca fez. E se você voltar à nossa entrevista, o contexto era esse. As informações levianas que diziam que a Lava Jato trabalha com vazamento de informações: isso é balela, mentira, falso. A gente nunca vazou.

BBC News Brasil – Uma das críticas que se fazia à Lava Jato naquela época é que a operação usaria a imprensa como forma de pressão para se conseguir delações ou avançar em investigações. Nos diálogos divulgados pelo Intercept Brasil, o procurador Santos Lima assumiria que vazava informações para a imprensa com o intuito de interferir em colaborações. A aspa que aparece ali seria a seguinte: “meus vazamentos objetivam sempre fazer com que pensem que as investigações são inevitáveis e incentivar a colaboração”. No grupo, não houve reação dos membros. Como vê a fala neste contexto?

Dallagnol – Vamos supor que essa fala aconteceu, tá? Eu não posso afirmar, mas vamos supor. Volta no contexto. Qual é a pergunta a que ele responde? O Orlando perguntou quem foi que adiantou a estratégia do caso Petrobras para a imprensa. E aí, o Carlos Fernando fala e ele usa esse termo equivocado “os meus vazamentos”.

“As minhas falas são feitas com o propósito de incentivar a colaboração.” Não era algo sigiloso, era uma estratégia de investigação. E aí está o giro semântico que os caras fazem para nos atribuir vazamentos. O que existiu ali, se existiu, foi um adiantamento de estratégia de investigação, que é o que o Orlando fala. De novo, posso adiantar estratégia de investigação? Posso. Não tem nada de ilegal, ilegítimo e ilícito nisso.

BBC News Brasil – Pode fazer isso para incentivar colaboração?

Deltan – Isso, não tem nada de errado nisso. Pelo contrário, é uma estratégia “fora da caixa”. Usada, correta e legítima. Digamos que eu esteja investigando um setor em que várias empresas corromperam o poder público e uma dessas empresas me procura para fazer uma delação premiada.

Só que eu não sei se essa empresa é a que mais tem a colaborar. Eu quero fazer esse acordo em benefício da sociedade, do interesse público, com aquela que tem mais informações relevantes a oferecer: provas sobre os crimes praticados, vídeos daquilo. Então, quero estabelecer uma concorrência. O que chamamos de Dilema do Prisioneiro. Quero que várias pessoas compitam pela colaboração para que a gente consiga fazer para a sociedade o melhor.

Então, não tem nada de errado eu buscar a imprensa e falar: olha, existe já a empresa buscando a colaboração. Eu não vou falar qual empresa. Vou falar: existe, sim, empresa buscando colaboração.

A imprensa divulga isso e isso gera uma corrida pela colaboração. O que acontece? Outras empresas vêm buscar essa colaboração e a gente vai escolher qual é a melhor para o interesse público. Veja que estou usando métodos legais e legítimos para atingir um fim de interesse público, sem nada de errado, sem vazamento. Estou adiantando uma estratégia e não tem nada de ilegal nisso.

BBC News Brasil – O jogo semântico a que o senhor se refere é usado pelo próprio procurador nessa conversa.

Deltan – É, eu acho que tem aí uma dubiedade de termos. Se você interpretar vazamento no sentido que eu usei na nossa conversa é no sentido de nunca passar informação sigilosa. O contexto em que estávamos conversando era que muitas colaborações premiadas negociadas sob sigilo estavam vindo a público. Qual era o contexto? A gente conversou e eu expliquei que a Lava Jato nunca vazou.

Se você interpretasse que a Lava Jato jamais deu furo, você poderia me falar naquela época: “Não, espera aí, você está me dando um furo agora. Algo que nunca falou a ninguém. Respondendo a uma questão que nenhum jornalista nunca fez”. Então, eu jamais falaria que a gente nunca deu um furo porque isso acontece toda semana. Furos acontecem e são normais, regulares e legítimos.

Depende do interesse do jornal. Vem um jornal e me pergunta sobre informações públicas, só que nenhum órgão de imprensa se interessou. Aí eu falo, explico aquilo. O jornal vai ter um furo. Nada de errado.

É evidente que eu estava falando que a gente não passou informação sob sigilo. E é isso que eles (Intercept Brasil) admitem na matéria. Eles colocam na matéria que não estão dizendo que o procurador passou informações que estavam sob sigilo. E aí ao mesmo tempo eles falam que eu menti? Isso é ridículo, é absurdo, é uma campanha difamatória, é maldade. Isso é veneno, tem veneno escorrendo no texto.

BBC News Brasil – De novo, quando o procurador Santos Lima diz que “os vazamentos objetivam sempre fazer com que as pessoas pensem que as investigações são inevitáveis e incentivar a colaboração”. Incentivar a colaboração. Mas, a colaboração, segundo determina a lei, é algo que deve ser espontâneo e partir do colaborador. Quando o procurador vaza, como disse Santos Lima…

Deltan – Calma, calma, vamos colocar no contexto. Vamos interpretar de acordo com o contexto. O Orlando tinha perguntado “quem passou a estratégia de investigação”. Ou seja, o futuro, o que a gente vai fazer, nada que esteja sob sigilo judicial. De novo, vamos contextualizar: o que se estava falando ali, assumindo a veracidade das mensagens, que é algo que eu não posso atestar, mas assumindo que aconteceu como está ali: se aconteceu, aconteceu no contexto de um furo.

BBC News Brasil – O ponto é: incentivar a colaboração. Quando se dá um furo para incentivar uma colaboração…

Deltan – Nada de errado.

BBC News Brasil – Não se está interferindo numa decisão espontânea?

Deltan – Não. Nada, nada de errado. É uma estratégia de atuação lícita e legítima. A colaboração deve ser voluntária, o que é diferente de espontânea. Espontânea é quando parte da própria pessoa, voluntária é quando a pessoa decide fazer por vontade própria. (O errado é) quando não existe voluntariedade. Quando existe coação.

Há dois tipos de coação: uma é a coação física – eu te agarro e te levo para algum lugar, você foi coagido. Outra é a coação moral – eu boto uma arma na sua cabeça e digo: “se você não fizer, eu vou te matar”. Não é uma coação física, é moral, eu estou ameaçando você de um mal grave.

A questão é: eu adotar estratégias legítimas e de divulgação de informações é uma forma de coação? Evidente que não. Se eu adoto um bloqueio de bens previsto em lei e que se enquadra naquela situação concreta, faço esse bloqueio e faço acusações pertinentes com base em fatos e provas e se isso gera um ambiente mais propício para a colaboração, isso é mérito da estratégia de investigação. A grande questão é: os atos eram legais, eu fiz o que está na lei? Se fiz, se não violei a lei, tudo é questão de estratégia de investigação.

A gente trabalhou com estratégia, a gente nunca escondeu isso, a gente trabalhou com estratégia de comunicação, sempre buscou ser transparente, prestar informações à sociedade, buscar o apoio da sociedade. Eu fazer isso é um exercício regular de direito da acusação, está dentro do nosso direito, do nosso dever, inclusive, de buscar trabalhar do melhor modo para produzir interesse público e alcançar resultados.

BBC News Brasil – Procurador, por que pedido de off nesse caso, uma vez que a informação era pública, dentro dessa estratégia que o senhor está descrevendo?

Deltan – Existem conversas com jornalistas feitas em on e em off, ambas são legítimas. Pessoas marcam aqui diariamente encontros com a nossa assessoria de comunicação para falar: “quero em on”, “quero em off”. Vem aqui alguém e quer fazer uma entrevista, como a que a gente está fazendo. Você vai veicular e vai dizer: Deltan disse isso, disse aquilo.

Agora, existem informações que a gente opta, por estratégia de comunicação, em não aparecer que foi Deltan que disse isso ou falou aquilo. A gente conversa com o jornalista em off, ou por estratégia dele ou nossa. Isso é comum, aceito, todo jornalista sabe que conversas em off são legítimas. O que não pode acontecer em on ou off é passar informação em sigilo, e é isso que eu te disse que nunca aconteceu e reafirmo. Mas eles têm lá anos… A gente foi hackeado, eles têm mensagens verdadeiras.

Eu não posso atestar que tudo lá seja verdade, mas existem coisas lá que a gente lembra que aconteceram, temas que a gente lembra que conversou. Se de tudo que a gente conversou, um milhão de mensagens segundo a Veja, e eles tiram dois trechinhos que não falam nada de sigiloso para querer distorcer e dizer que a gente vazou, ah, dá licença, né? Vamos falar de algo mais útil.

BBC News Brasil – Sobre o que o senhor falou como coação moral. Quando um procurador diz que as suas contribuições para a imprensa, ou os seus vazamentos, como ele disse, acontecem para incentivar colaborações, para que as pessoas pensem que as investigações são inevitáveis, isso de alguma maneira não está coagindo essas pessoas a colaborarem? Não é uma interferência no processo natural? O senhor se refere a isso como uma ‘estratégia fora da caixa’. Qual é a linha tênue entre estratégia fora da caixa e coação?

Deltan – Ricardo, você está me fazendo perguntas, certo? Você está me coagindo a responder?

BBC News Brasil – Não, estou deixando o senhor à vontade para respondê-las.

Deltan – Isso, você está me incentivando, a pergunta é um incentivo, é uma oportunidade. Mas qual é a linha tênue entre uma pergunta e você estar me coagindo? Você incentivar a pessoa, criar incentivos para a pessoa perceber o cenário é totalmente diferente de coagir. Em Direito a gente estuda coação física e coação moral. Física: você pegar a pessoa, obrigar a pessoa, pegar o braço da pessoa e obriga-la a atirar em outro dobrando o dedo dela. Coação moral: colocar uma arma na cabeça da pessoa e falar “faça isso ou eu te mato”. Você coloca uma ameaça, uma ameaça injusta.

Se você disser para a pessoa: “Se você praticar um crime, praticar corrupção, você vai ser preso”. Isso é uma coação. É uma ameaça que se está fazendo: “Você vai ser preso se praticar o crime”. Uma coação legal, legítima, devida, correta, que a lei estabelece. E é uma coação moral, porque isso influencia a vontade da pessoa que vai praticar o crime. A punição efetiva, adequada, dentro da lei é uma coação moral legítima.

Agora, a distinção não é existir coação moral ou não. A questão é: existem ações que podem ser coação legal ou ilegal. Se eu pegar alguém e fizer um questionamento, um interrogatório, e a pessoa responder, eu estou perguntando, não a estou coagindo a responder. Você pode dizer: “não, mas a pessoa está se sentindo desconfortável”. Não é, isso é legal. Agora, se a pessoa vai e tortura alguém, claro, isso é uma coação ilegal, ilegítima.

BBC News Brasil – Os exemplos que o senhor usa são bastante extremos, né? Botar uma arma na cabeça, torturar. A gente está falando de coisas mais sutis.

Deltan – Como perguntas. Isso. Eu não considero que você esteja me coagindo.

BBC News Brasil – Mas vejo uma diferença clara entre o que está acontecendo aqui, uma entrevista gravada, a gente conversando claramente, e uma informação passada em off para a imprensa sobre um terceiro. É diferente do que está acontecendo aqui, né?

Deltan – Isso. É uma informação legítima, legal, dentro da lei. Quando uma pessoa decide colaborar com a Justiça? Quando ela vê que a colaboração é melhor que a alternativa dela, que é responder ao processo judicial. A gente lida muito na negociação com o conceito de Batna (best alternative to the negociated agreement – melhor alternativa à solução negociada, em tradução livre). Um conceito muito conhecido no mundo dos negócios.

Quando um colaborador, um investigado, uma pessoa potencialmente criminosa decide colaborar? Quando ele fala: “Hm, a água está subindo. Existem investigações contra mim, processos suficientes e eu vou responder por isso, vou ser preso, existe uma atuação de órgãos internacionais para mim. Melhor eu colaborar”. Há dois jeitos de fazer a pessoa colaborar: ou você diminui a pena dele, aumenta benefícios. Ou você piora a alternativa dele.

A grande questão é: você jamais pode piorar a alternativa dele de modo ilegal. Não pode fazer uma prisão indevida, um bloqueio de bens indevido, uma acusação indevida, nada indevido, esse é o limite ético e legal. Agora, tudo o que você tem como instrumento legal para combater o crime organizado e a grande corrupção, você pode e deve usar contra aquela pessoa, estando presentes os requisitos legais.

É isso que a gente sempre fez como Lava Jato e força-tarefa. A gente sempre adotou a força da lei em relação a pessoas que praticaram crimes graves. Isso gera um ambiente em que a pessoa pode dizer: “Hm, melhor eu colaborar”. Isso foi feito em relação a todo mundo na operação Lava Jato.

Se a gente não atuasse de modo legal e íntegro, não só as nossas decisões seriam revisadas a cada instante, como as pessoas jamais iriam decidir colaborar. E mais, se a gente ultrapassasse a barreira legal, a pessoa não ia ver a colaboração como melhor saída, ela iria ver o recurso, o habeas corpus como melhor saída, porque a nossa atuação seria ilegítima. O que a gente fez foi atuar de forma legitima, correta, mas firme, que é o que todo brasileiro espera. Respeitando os direitos humanos de modo adequado, mas de modo firme, usando a força da lei para casos com a gravidade daqueles que a gente descobriu na Lava Jato.

BBC News Brasil – Qual impacto essa série de reportagens (do Intercept) e tudo que vem a reboque teve ou tem sobre a operação?

Deltan – Essas reportagens vêm e mordem a operação. Mordem e fazem a operação sangrar. Não têm alcance grande, vários veículos filtram, vários falam “olha, isso não é certo, não é devido, não vou divulgar”. Várias pessoas percebem que o que está ali é construído em cima de juízo de valor, tem uma pauta por trás, são editoriais, é ativismo e não reportagens, mas isso faz a operação sangrar. E quando a operação sangra, vêm os tubarões.

Que são pessoas que têm grande poder político, possibilidade de tomar ações contra a Lava Jato e a Lava Jato fica exposta a toda uma sorte de revezes como a recente lei de abuso de autoridade. Uma lei que precisava vir, mas não com o conteúdo que ela veio. É como vir uma lei ameaçando o direito ao sigilo de fonte. Essa lei de abuso de autoridade ameaça a independência de promotores e juízes em casos envolvendo poderosos.

BBC News Brasil – O presidente Bolsonaro inclusive já avisou que não deve vetar totalmente o projeto de lei de abuso de autoridade. Ele também anunciou que o orçamento da polícia federal deve vir mais diminuto no próximo ano. O presidente Bolsonaro também faria parte deste grupo de tubarões?

Deltan – Em relação à atuação do presidente em relação aos vetos, vamos esperar o que vai acontecer para a gente se manifestar. Existem dispositivos lá sobre os quais eu não vejo problema nenhum. Acho até positivos.

Agora, existem regras lá que impedem investigações legítimas contra pessoas poderosas e no meu entendimento devem ser vetadas.

BBC News Brasil – O corte no orçamento da Polícia Federal e o aceno do presidente em escolher alguém para a PGR que pense parecido com ele, e, portanto, eventualmente não respeitar a consulta aos procuradores, algo que sempre aconteceu, vai nesse sentido que o senhor descreve como tentativa de prejudicar o combate à corrupção no Brasil?

Deltan – Em relação à escolha do PGR, ela ainda não aconteceu. Minha sugestão é esperar ver o que vai acontecer. Já me manifestei em relação à importância de que seja escolhido alguém capaz, preparado com histórico de atuação testado e aprovado, o que é justamente o objetivo da lista tríplice. Em relação ao Ministério da Justiça, eu não tenho conhecimento suficiente e precisaria pesquisar para responder isso.

A questão é: quantos ministérios sofreram cortes? Qual foi o corte médio dos diferentes ministérios? Qual o corte no Ministério da Justiça e Segurança Pública? Esse corte, dentro das políticas essenciais à sociedade, saúde, educação, segurança etc., está sendo bem distribuído? O que é em grande medida uma avaliação política. Se tiver uma discrepância muito grande, eu poderia até eventualmente, tendo dados, me manifestar. Mas sem os dados seria irresponsável.

BBC News Brasil – Então sobre um eventual corte no orçamento da Polícia Federal, se vier de forma coerente com outros cortes em outras partes do governo, o senhor não vê como problema.

Deltan – Depende de quais cortes em quais áreas. Cortar verbas para financiamentos de grandes empresas no BNDES tem um peso. Cortar verba para uma atuação essencial de polícia e segurança pública tem outro peso. Cortar verbas para saúde, como atendimento essencial da população em hospitais tem um peso ainda muito maior. É muito mais sensível. Agora, se você insistir nessa questão eu poderia até dizer que você está me coagindo, viu? (risos) Dentro desse contexto que a gente vem conversando.

BBC News Brasil – O senhor fique à vontade para responder ou não.

Deltan – Assim como os réus ficam à vontade para responder ou não. Assim como o caso do Bernardo Freiburghaus, ele não colaborou com a Justiça. Essa é a maior prova de que essa questão de coação não faz qualquer sentido.

BBC News Brasil – A gente falou sobre PGR – o senhor não faz então questão que a lista tríplice seja respeitada, é isso?

Dallagnol – Acho muito importante que a lista tríplice seja respeitada. Ela é uma segurança que a gente tem de que a pessoa que está lá é isenta, independente, com um histórico de atuação provado e aprovado. Acho muito importante que seja respeitada, sim.

BBC News Brasil – Sinto o senhor bastante cuidadoso em fazer qualquer comentário em relação ao presidente.

Dallagnol – A minha atuação é técnica, nos processos. Se você me perguntar sobre Lava Jato, corrupção etc., eu falo com muita propriedade.

BBC News Brasil – Mas a gente está falando sobre corrupção e investigações…

Dallagnol – É, mas essa matéria, ela diz respeito à corrupção, mas diz respeito também a questões políticas. Eu não vou entrar no debate político, essa não é minha seara. A nossa atuação é técnica, é apartidária. Na última vez em que eu entrei nesse ponto, antes falavam que eu era de direita, agora falam que eu era de esquerda. A ideia de politização não favorece a Lava Jato, embora eu não tenha falado nada de errado e tenha feito uma avaliação sobre corrupção, como você mesmo mencionou, as pessoas começam a desenvolver teorias que é bom que se evite.

Inserir a Lava Jato nesse quadro de guerra política porque o nosso trabalho interessa a quem é de direita, de esquerda, de lado, de cima de baixo. Não importa a visão da pessoa, todo mundo tem o que fazer com os bilhões desviados pela corrupção no Brasil. Esse é o nosso foco. A gente tenta agregar e chamar todas as pessoas para essa causa, seja ela de direita, esquerda, cima, lado, conservador, liberal, progressista…

BBC News Brasil – O senhor está citando esse hexágono e me lembra que o filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, foi um dos que chamaram o senhor de esquerdista recentemente. Sobre o comentário específico do filho do presidente, o senhor tem alguma resposta?

Dallagnol – Eu prefiro não comentar.

BBC News Brasil – O senhor prefere deixar então Eduardo Bolsonaro semear essa ideia de que o senhor é financiado por ONGs de esquerda?

Dallagnol – Eu não vou comentar isso. Vou deixar para cada um olhar o passado, a história da nossa atuação e tirar suas próprias conclusões.

BBC News Brasil – O senhor e o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, foram muito expostos na chamada “Vaza Jato”, apareceram muito nesta série de reportagens. Vocês têm se conversado a respeito? Isso afetou a relação de vocês de alguma maneira?

Dallagnol – A gente conversou com o ministro Sergio Moro algumas vezes antes de ele sair da Lava Jato e depois, sobre temáticas de interesse da luta contra a corrupção. Não vejo como essas coisas que estão saindo possam afetar uma relação profissional, pública, e de contribuição para essa causa pública tão relevante.

BBC News Brasil – Essas conversas não devem mais estar acontecendo por aplicativos de mensagem, eu imagino.

Dallagnol – Olha, como acontecem as conversas não é o que importa. O que importa é o que acontece nas conversas e o grande ponto é esse: nossas conversas são profissionais e são com o objetivo de contribuir para a temática anticorrupção, com a avaliação de propostas feitas por ele, eventuais sugestões, eventuais preocupações com essa lei de abuso de autoridade que está passando e assim por diante.

BBC News Brasil – Essa série mostra o impacto pessoal da operação Lava Jato nos procuradores da força-tarefa. Segundo as reportagens, se as gravações ou vazamentos se confirmam, o senhor, por exemplo, teria ganhado muito dinheiro com palestras, fazendo palestras privadas sobre luta contra a corrupção. Deveria haver algum tipo regulação sobre o que pode ou não pode, e, se houvesse, o senhor deveria ter feito tantas palestras como fez, e para as empresas que fez?

Dallagnol – Essa regra existe, na verdade. Não é que não existe. Ela está na Constituição e fala que a única atividade que promotores e juízes podem desempenhar além da atividade do cargo público é a docência. E tanto o Conselho Nacional de Justiça quanto o Conselho Nacional do Ministério Público concordam que a docência engloba atividade de palestras e uma atividade de cidadania, de ensino, de construção de mensagens, passar informações de modo construtivo, construindo e edificando valores de visão de mundo das pessoas. Existe uma concordância em relação a isso. Essa atividade é constitucionalmente admitida, é admitida nos órgãos que regem a nossa profissão, é legítima. Já foi reconhecida no meu caso em 2017, o Conselho Nacional do MP examinou esta questão e disse que não tinha absolutamente nada de errado nesta atividade.

Eu presto essa atividade de modo remunerado e especialmente de modo gratuito. Na última matéria que saiu sobre isso, a Folha me perguntou quantas gratuitas eu fiz. Eu achei muito justa a pergunta por que ela dava o contexto. Eu falei que no último ano eu dei 34 palestras gratuitas, sendo que sete a cada 10 delas foram nas noites, fins de semana, feriados, férias. Ou seja, tempo em que eu poderia estar com a minha família, descansando, em lazer. Fiz isso porque eu acredito nessa atividade. Mas aí isso não saiu na matéria. Uma informação relevantíssima, a meu ver essencial, não foi incluída.

Outro aspecto – a matéria saiu com o enfoque de que Deltan abandona a filantropia. Nesse ano, já foram mais de 70 mil reais doados em filantropia. E todos os casos de doação desse ano aconteceram antes de começar essa Vaza Jato. Não foi algo que fiz porque isso veio a público. Aí falam assim: Deltan abandonou a filantropia. Na minha perspectiva, com todo o respeito ao trabalho dos jornalistas, a meu ver não está sendo retratado de modo mais completo, mais equilibrado. De novo, com todo o respeito à liberdade de imprensa, a escolherem e pautarem o que vão noticiar.

A Folha sempre tem esse perfil, e é um perfil legítimo de apontar o ponto preto no lençol branco, mas quando você foca naquilo que ela entende como ponto preto no lençol branco, isso passa para as pessoas uma mensagem distorcida. Se esquece do lençol. Então, de novo, a minha atividade de palestras, além de ser legal e legítima, em relação às remuneradas, se considerar tudo o que aconteceu desde 2016, mais de 50% do que recebi foi doado ou destinado a interesse público, teve uma destinação pública. Uma parte desse valor, 180 mil, estão reservados para investir especificamente na causa de corrupção. Isso está declarado no meu imposto de renda, tudo o que recebi está declarado. Eu poderia ficar com os recursos, não tem nada de errado, e ainda assim eu doo grande medida.

Aí você poderia me perguntar: isso deveria ser regulado mais a fundo, a questão da publicidade? Existem duas formas de controle em relação a isso. A primeira é a publicidade completa dessa informação. A segunda é prestar informação para a corregedoria. O nosso sistema é prestar à corregedoria, eu presto, informava periodicamente que realizava uma série de palestras, e me colocava à disposição para fornecer informações complementares. Esse é o modo de controle que a gente tem.

É legal? Sim. É legítimo? Sim. É moral? Sim, isso contribui para o debate público de ideias, para alcançar pessoas para uma causa de cidadania, de integridade, o que é positivo. E além de tudo isso, há destinação de grande parte dos valores para crianças que não têm lares, que foram retiradas das casas, pessoas com fome no nordeste, atividades de uma fundação como a Lia Maria Aguiar, crianças com câncer. Eu destinei em valores atualizados coisa de R$ 270 mil reais para crianças com câncer. Pergunta a essas crianças se essa atividade é boa e benéfica? É uma atividade econômica como qualquer outra, autorizada pela Constituição e que beneficia a sociedade em diferentes modos.

BBC News Brasil – O senhor disse que foram 34 palestras gratuitas de um ano para cá. Essa informação vai estar na nossa reportagem. E eu também queria saber quanto dinheiro o senhor ganhou em palestras pagas neste mesmo período.

Dallagnol – Essa é uma informação privada, de novo. Essa atividade é legal, legítima e privada. É a mesma coisa que eu perguntar qual é o seu salário.

BBC News Brasil – É que é conveniente divulgar o número de palestras gratuitas para defender o seu ponto ao mesmo tempo em que guarda esta outra informação. Parece contraditório.

Dallagnol – Não, não é contraditório. Essa é uma atividade privada, legítima, e eu não tenho nenhuma obrigação de oferecer essa informação, assim como você não é obrigado a fornecer o seu salário. O que eu posso dizer, em geral, só por uma questão de balanço geral, é que foram bem mais palestras gratuitas do que palestras remuneradas. Não só nesse período, mas se a gente somar todo o período desde 2015, 2016, o número de palestras gratuitas é bem maior que o de palestras remuneradas.

É bem maior mesmo, bem mais significativo. Isso mostra, de novo, o nosso compromisso com esse debate público, com essa discussão de ideias, com a construção da cidadania. Existem palestras remuneradas? Existem, sim. Em relação às remuneradas e aos favores, o que posso dizer de modo geral é que, se você pegar todos os valores que vieram, contando doações e tributos, eu fico com menos de 40% do valor desde 2016 até 2018, que é o período que eu já fechei com base nas declarações de IR.

BBC News Brasil – De fato, essa é uma informação privada. Mas como o senhor divulgou uma informação privada de número de palestras gratuitas, porque isso é positivo para a imagem do senhor, eu achei que faria sentido divulgar as demais. O senhor discorda?

Dallagnol – Eu acho que essa informação de que eu fiz bem menos remuneradas do que gratuitas é mais do que suficiente para que as pessoas tenham uma dimensão. É uma informação privada. É o mesmo que eu perguntar quanto você e seus colegas ganham. Ninguém sai perguntando para as pessoas quanto que o médico ganha, ou o profissional de saúde ganha.

BBC News Brasil – Eu não perguntei quantas palestras gratuitas o senhor fez, e o senhor me disse. Então…

Dallagnol – Eu disse por quê? Porque existe aí um foco em tentar sempre mostrar aquilo que pode gerar uma polêmica e não mostrar o que traz equilíbrio. E mais: o contexto não traz só equilíbrio, traz significado. Quando a pessoa sabe que o número de palestras gratuitas é muito maior que remuneradas, sabe que a maior parte das gratuitas eu faço com sacrifício do meu tempo pessoal, a pessoa passa a perceber: “Não, essa pessoa está engajada numa causa. Ela tem um propósito maior para estar fazendo isso”.

BBC News Brasil – Mas ao mesmo tempo, se o senhor me diz que ganhou 500 mil reais, ou 1 milhão de reais, ou 5 milhões de reais com palestras privadas, isso também poderia levar algumas pessoas a refletirem: “Nossa, a atividade da Lava Jato é muito rentável para os seus membros”.

Dallagnol – A atividade da Lava Jato não é rentável para os seus membros. Tenho processos contra mim pedindo mais de um milhão de reais, tem ação popular movida contra a gente aqui, uma série de representações contra nós no Conselho Nacional do MP, a gente ganha menos que os procuradores do outro lado da rua porque a gente não tem direito a verbas que outras pessoas que estão fora de outras forças-tarefas têm. Essa é a verdade, a gente tem uma remuneração menor.

BBC News Brasil – De que remuneração o senhor sente falta?

Dallagnol – Não é que sinta falta. Outros procuradores recebem verbas que a gente não recebe. Existem verbas por exemplo: quando alguém sai em férias e você se dispõe a cobrir o trabalho daquela pessoa você tem um acréscimo previsto em lei sobre o seu salário e a gente não recebe isso, porque a gente já é sobrecarregado com o nosso trabalho. A gente não tem como assumir o trabalho de nenhuma outra pessoa em férias. Então, comparativamente, você trabalhar numa força-tarefa é um decréscimo salarial. Mas ninguém fala desse outro lado, que eu tenho um processo contra mim pedindo mais de 1,2 milhão de reais nas costas e que eu posso vir a ser condenado. Eu não acredito que isso vá acontecer porque a gente não fez nada de ilegal, mas isso são compromissos que a gente vai assumindo. E ninguém fala disso.

Qual é o argumento que alguém poderia usar sob o aspecto de questionamento moral? “Você está recebendo isso em razão da sua visibilidade na Lava Jato”. Qual é a minha resposta: ainda que se retirem todos os meus méritos pessoais da minha competência profissional, ainda que você abstraia todos os meus méritos pessoais de estudos de assuntos, disposição, ainda que se tirem todos os méritos e você diga que esse é um fator aleatório, o que John Rawls coloca é que nenhuma atividade econômica deve ser impedida por causa disso. Pelo contrário, devem ser estimuladas e você resolve isso por tributação e por política pública. Você deve distribuir parte desses valores para outras pessoas. Então, mais de 30% via tributação foram para outras pessoas, para pessoas necessitadas, atendimentos em hospitais, para o que for que os tributos forem usados.

E grande parte dos valores ainda assim eu redistribuo para outras pessoas e trago outro benefício social por meio da filantropia, por meio de uma atividade beneficente. Esse é o quadro completo. Com toda a sinceridade, eu não consigo entender como procedentes os questionamentos que são feitos. Acho que existe no imaginário social um preconceito a ganhos econômicos lícitos, talvez um preconceito cultural, alguns sociólogos falam disso. Mas é uma atividade econômica lícita, legítima, não tem nada de errado e ela traz uma série de benefícios sociais.

BBC News Brasil – Os pontos que o senhor diz que não costumam aparecer estarão na nossa reportagem. O nosso objetivo é mostrar os dois lados. O senhor está reforçando muito um: o da filantropia, o do trabalho social, e não dá nenhuma informação sobre o outro, que é justamente…

Dallagnol – Mas o outro já saiu, está na Folha. Tem os valores, tudo. Minha atividade dos últimos anos está toda publicizada. Eu fui vítima de um crime, eu não preciso ficar me expondo mais ainda do que estou sendo exposto. Essa exposição já é injusta, é como se eu entrasse na sua vida, roubasse seu celular e seu computador e passasse a revelar coisas da sua vida. Veja que várias coisas que estão vindo a público, na minha perspectiva humilde, modesta e reconhecendo outras visões, não têm nem interesse público.

Qual é o interesse público sobre a possibilidade da construção ou não de um monumento para lembrar as pessoas que existem reformas? Essas são supostas conversas que vieram e foram publicadas e que, na minha opinião, não têm nenhum interesse público. Por que, se existiram essas conversas, não foi efetivada (a construção), e segundo porque não tem sombra de ilicitude nisso.

BBC News Brasil – O senhor acha que há interesse público nas conversas sobre a ideia de se abrir uma fundação ou instituto para palestras, algo que teria sido debatido entre o senhor e colegas, e a ideia eventual de usar esposas como capital social ou o nome dessas empresas para que os senhores pudessem trabalhar?

Dallagnol – Você está querendo dizer que seria ilegal abrir uma empresa?

BBC News Brasil – Não, estou fazendo uma pergunta mesmo. O senhor fala em exposição e a ideia não é expô-lo, é esclarecer.

Dallagnol – Não teve conversa de fundação, isso não teve. O que teve conversa, que foi divulgada, vamos colocar assim, essas supostas conversas, ainda que a gente dê crédito, conversa sobre criar uma empresa para gerenciar palestras ou cursos jurídicos, eventos, congressos. Se existiu isso, tem alguma sombra de ilicitude, ainda que as esposas figurem no contrato social e sejam administradoras? Não tem nada de errado.

BBC News Brasil – Não poderia estar no nome dos promotores, poderia?

Dallagnol – Pode! Aí que está. É uma informação incorreta que é difundida incorretamente e essa questão mostra ainda mais que as coisas estão sendo difundidas de modo errado. Promotores e juízes podem, sim, ser sócios, podem ser sócios de empresas. O que eles não podem ser é administradores. Eles podem ser sócios da esposa ou quem for.

BBC News Brasil – Desculpe, me refiro então à administração.

Dallagnol – Isso. Eles podem ser sócios, vários são, vários promotores são sócios de cursos jurídicos, têm a propriedade, podem inclusive ser sócios majoritários. O que não pode é ser sócio administrador, você não pode ficar assinando cheque, fazendo contabilidade, porque afinal de você tem outra atividade a desempenhar, a de procurador ou juiz. Não tem nada de errado você abrir e estar na empresa, ter a esposa na empresa ou qualquer outra pessoa que exerça essa função de administração. Quando saiu essa matéria, eu vi gente escrevendo que seriam laranjas. Releia as supostas mensagens, ainda que você admita que elas sejam verdadeiras, não tem nada de laranja.

BBC News Brasil – Eu estou sempre usando o futuro do pretérito, né, não estou admitindo.

Dallagnol – Mas ainda que a gente parta delas como pressuposto, eu não tenho como lembrar do que eu conversei há cinco anos em exatos termos. Eu não tenho padrão de comparação. Agora, se você me perguntar: existiu uma cogitação de abrir uma empresa? Existiu uma cogitação de abrir empresa. Cogitei inclusive abrir empresa antes, em razão das palestras que eu faço. Por que eu decidi não fazer em relação às palestras que eu faço ainda que você mudasse completamente a tributação para menor? Eu não fiz porque achei que fazendo como pessoa física seria muito mais transparente. E eu decidi não fazer.

Em outro momento, existiu uma conversa, que eu não sei se está retratada ou não, de abrir uma empresa para fazer alguns cursos jurídicos, como promotores e juízes têm empresas para isso. Se existisse essa empresa, seria totalmente dentro da lei. É infantil pensar que promotores, procuradores, ainda mais com o grau de exposição que temos, cogitar fazer uma coisa ilegal. Seria aberrante. Veja que se fosse feito uma empresa dessas, a gente exerceria uma função pedagógica. A gente eventualmente convidaria outros professores para dar aulas, o que é completamente legal, legítimo. Mas de novo nunca aconteceu. Não aconteceu porque a gente não tem tempo na Lava Jato para fazer isso. Se acontecesse, seria legal, legítimo, correto.

Olha que interessante… Quando saíram essas mensagens, saiu a publicação, falou-se que o objetivo nosso seria lucrar. Poucos dias depois saiu outro suposto diálogo com a minha esposa em que eu digo: “olha vou aceitar as condições para essa palestra porque justamente nosso objetivo com isso não é lucrar”. Nosso objetivo com isso não é lucrar. Então veja que quando eles colocam uma coisa, eles não colocam a outra coisa. Eles não dão a informação completa. E existiram várias outras contradições que vão surgindo.

Num determinado momento, eles falam que o intuito era perseguir o Lula. Com base nessas supostas mensagens. Em outro momento, eles vêm e falam que a gente decidiu não fechar o acordo de colaboração com o Antonio Palocci existindo quase 200 menções a Lula. Veja que contraditório. Se a gente tivesse algum intuito de perseguição, essa colaboração teria sido feita. Mas não fez porque a gente achou que não era adequado fazer por uma série de razões. Acho que não era suficiente a informação, que não estava suficientemente comprovada. Agora, se o nosso objetivo fosse criar vento, criar acusações políticas, gerar fatos, gerar alegações contra um determinado personagem, não faz sentido a gente não ter feito esse acordo. As informações são trazidas em matérias diferentes e não são contextualizadas. A questão é se eles têm essas supostas mensagens, por que não trazem tudo a público em conjunto? Para que as pessoas possam ter uma análise com contexto? O que eu falava é que a verdade é o todo. A parte você só compreende dentro de um todo maior.

Essa semana surgiram supostas mensagens com críticas que desumanizariam alguns dos procuradores. Espera aí, e todo o resto? E eu lembro que a gente conversou sobre isso em mensagens. A gente estava com medo de fazer busca e apreensão contra um determinado réu porque o filho tinha depressão. O filho tinha uma depressão profunda. A gente seguiu as redes sociais do filho, legitimamente, era aberta. A gente acompanhou a vida do filho, a gente fez uma série de análises para a gente ver se o filho não correria um risco de vida. Não poderia se suicidar, poderia fazer alguma besteira se a gente fizesse alguma ação contra o pai. Ou seja, tem um elemento humano forte; todo mundo tem uma atividade humana forte. Mas aí trazem um recorte para desumanizar, vilanizar.

BBC News Brasil – Você está se referindo às conversas sobre a família do ex-presidente Lula, imagino.

Dallagnol – Isso. Exatamente. Não consigo lembrar do que aconteceu. Aliás, essas supostas conversas, ainda que você tome como legítimas, não dizem respeito a mim especificamente, eu trouxe uma informação inicial referente a ela (Marisa Letícia) ter chegado em estado vegetal ao hospital, eu usei a expressão que o médico tinha me trazido. O que o amigo do amigo do médico tinha me trazido, “chegou com um estado vegetal”. Imagino que seja uma referência ao estado vegetativo. Essa expressão clínica, mas repassei a informação como recebi. Não estava nas conversas seguintes.

Agora, ainda que você suponha que aquilo que se seguiu seja verdadeiro, de novo, não posso afirmar, ainda que você suponha isso, é um recorte da realidade e não é trazido em conjunto com o resto. Se as pessoas querem retratar a verdade, elas tinham que trazer tudo isso à tona. Posso pegar uma frase tua da nossa entrevista, tirar de contexto para dizer que você tem uma visão ou outra para te sacanear. E as pessoas têm que entender que essas conversas são conversas que você teria na mesa de casa com a família, são pessoas que estão trabalhando há cinco anos juntas, são amigas.

São conversas que você tem com o círculo de intimidade, conversas que você fica à vontade para falar até alguma besteira, uma bobagem, para ser até certo modo irresponsável, para fazer brainstorming, para você lançar uma ideia sobre a qual você tem dúvida e para você construir a ideia ao longo do tempo.

BBC News Brasil – Sobre o caso que saiu, houve uma falta de cuidado, uma falta de humanidade na opinião do senhor?

Dallagnol – Não posso falar especificamente com conversas específicas que nem sei se aconteceram. Se ficar tratando disso, vai reforçar uma mensagem que considero injusta que foi trazida sobre essas pessoas. O que eu posso falar com a maior tranquilidade é sobre as pessoas que estavam ali. Posso falar que Januário é uma pessoa super humana. Que adotou já umas três, quatro crianças que não tinham um futuro e acolher na família dele. E aí essa pessoa está sendo vilanizada. Você acha isso justo? Você tomar uma pessoa que já adotou três a quatro crianças que estavam em situação de abandono, que não tinham família, que acolheu no lar dele, uma pessoa extremamente sensível, uma pessoa humana e você retira uma frase em contexto familiar, em contexto de família, que você sente até irresponsável para vilanizar essa pessoa, dizer que essa pessoa não tem coração, que essa pessoa é desumana?

Olha, isso é de uma superficialidade, sabe? De uma maldade? Quando você recebe um pedaço de informação, você olha só aquilo e às vezes você tem que avaliar o mundo pelo que você que recebeu. Mas de novo, vamos ao Januário Paludo. Digamos que ele tenha feito aquelas afirmações, aquilo lá, várias pessoas dizem “que cara frio”, “sem coração” etc. Aí você olha o resto da vida dele e vê que ele adotou três, quatro crianças, sem que ele precisasse fazer isso, nas quais ele está investindo não só a vida, mas recursos. Acolheu em uma família e está investindo a vida, o tempo dele nisso. Uma pessoa que investiu anos aqui na Lava Jato. Veja como as informações são trazidas fora de contexto, são trazidas dentro de um contexto para vilanizar.

BBC News Brasil – Nesse caso específico, a gente tem indícios de que de fato a conversa aconteceu pelo reconhecimento da procuradora Jerusa Viecili, que pediu desculpas publicamente ao ex-presidente. Ela está ali reconhecendo a parte dela nesse debate, o que nos leva a crer que eventualmente as frases dos outros também teriam acontecido. Se aconteceram, elas merecem esclarecimento. Elas hoje são públicas.

Dallagnol – Deixa eu discordar da tua premissa. A procuradora Jerusa veio e reconheceu que ela errou, que fez afirmações duras. Mas não reconheceu nem que foram aquelas afirmações. Ela falou: “fiz afirmações indelicadas, indevidas e peço desculpas”. Ela lembrou, ela reconheceu. Isso não significa que as outras pessoas vão lembrar de pequenas frases que falaram de dois, três, quatro anos, cinco anos intensos que, segundo uma revista colocou, foram 1 milhão de mensagens.

Isso não quer dizer que os outros vão lembrar, que os outros vão reconhecer, isso não autentica o conjunto das afirmações, que têm origem criminosa. Vamos supor, por amor ao argumento que aquilo ali tivesse eventualmente acontecido daquele modo, eu não ia falar pelos colegas. Eu poderia falar sobre o que está atribuído a mim ali que é primeira informação que eu teria trazido, dizendo que ela (Marisa Letícia) teria chegado ao hospital em “estado vegetal”.

O que eu teria feito ali seria reproduzir a informação de um médico que imagino que teria feito referência a um estado vegetativo. E eu não participei mais das conversas, segundo a linha que se coloca ali. De novo, partindo do pressuposto, para ficar bem claro, que isso teria acontecido. E ao final eu falaria de humanização. Mas ali seria uma referência, segundo as mensagens, ao ex-presidente Lula. Seria uma referência, sim, ao ministro do STF Gilmar Mendes. E não ao ex-presidente Lula.

Eu não estou nessas conversas, não me sinto confortável para avaliar a conduta dos colegas, agora o que eu quero dizer é que ainda que se tomasse isso como verdade, venha trazer a público, na minha visão, o jornalista tem a obrigação de trazer um quadro completo, e ele sabe da implicação daquilo que ele tá trazendo, ninguém é bobo, ninguém é ingênuo, que vai achar que vai a jogar aquilo e o interesse público tem que saber como as pessoas comunicaram aquilo. O efeito óbvio daquela matéria era vilanizar aquelas pessoas.

De novo, não estou reconhecendo o que essas pessoas falaram ou não falaram. Posso falar de mim, sobre o que eu lembro. E como a Jerusa falou sobre ela, sobre o que ela lembra. E a gente tem aí cinco anos de intensas mensagens, se você muda uma palavra, muda completamente o significado de um texto.

O meu ponto é: ainda que aquilo eventualmente tenha acontecido, isso são afirmações individuais, de pessoas determinadas, e quiseram colocar uma pecha dizendo assim “ah, a força-tarefa”. Havia frases ali de três, quatro pessoas, a força-tarefa são 15 procuradores, passaram por aqui 19, se não tem aí outras supostas mensagens, sequer de outras pessoas, isso retrataria eventualmente algumas percepções individuais de pessoas específicas que falaram, de novo, dentro de um ambiente familiar, em que as pessoas se sentem à vontade para falar bobagem, para ser de certo modo, um pouco irresponsáveis. Quantas vezes não estamos com a família e com as esposas e não falamos algo irresponsável? Uma bobagem?

É injusto você usar uma régua que você usa para declarações públicas e colocar essa régua para uma conversa que você tem com a sua esposa. É injusto, em segundo lugar, você levar isso a público sabendo que o efeito disso é a vilanização das pessoas e isso fica muito claro quando você pega o conjunto das reportagens que trazem essa conotação. Quando você não expõe quem são essas pessoas.

Vai ver lá quem é Januário Paludo. Que é uma pessoa sensível, que adotou três a quatro crianças, extremamente humana, porque se não, o que você está fazendo é manchar a reputação e a vida de um homem de modo extremamente injusto, criando uma deturpação de imagem. Você está criando não um retrato. Você não está perto de um retrato. Nem perto de uma caricatura.

Você está desfigurando a imagem dele. Você está colocando sobre ele uma pecha que talvez ele vá carregar para o resto da vida e que é extremamente injusta. Então, o jornalismo tem que ser responsável, tem que ser sensível na minha percepção, na minha visão e respeitando a liberdade de imprensa, dos jornalistas, na minha leitura faz parte da responsabilidade do jornalismo você trazer informação completa, você não manchar a reputação de uma pessoa sem tentar conhece um pouco melhor quem é essa pessoa, o contexto da vida dela.

Então, para nós, dói muito esse processo. Doem muito as deturpações, as descontextualizações, como nesse caso do vazamento, você trazer uma coisa e deturpar para dizer que houve um vazamento quando muitas pessoas só leem as manchetes e vão achar que gente vazou alguma coisa estava sob sigilo judicial, que cometemos uma ilegalidade quando isso nunca aconteceu, dizer que eu menti para você há dois, três anos, quando não há nenhuma evidência de que eu tenha mentido para você porque aquela frase que eu te falei é interpretada no contexto. Não tem outro sentido. Porque o outro sentido seria absurdo.

BBC News Brasil – Sobre esse processo administrativo que vai ser julgado no Conselho Nacional do MP. O Senhor recorreu, conseguiu que isso fosse postergado. Queria saber qual é a expectativa do Senhor?

Dallagnol – Olha, vou ser sincero. Se não fosse Deltan lá, eu apostaria fortemente que a pessoa não seria condenada. Mas acho que tem muita turbulência em cima de tudo o que nos envolve nesse momento atual. E vou fazer referência com base num caso que foi julgado nessa semana. Nessa semana, eles pegaram um caso meu em que eu fiz uma postagem de uma notícia do Estadão. Fiz uma postagem da notícia do Estadão e não coloquei nenhum juízo de valor.

Coloquei simplesmente uma transcrição de um parágrafo da matéria. Esse é um caso que foi levado pela pessoa que estava afetada nessa reportagem, era sobre a senadora Kátia Abreu. A senadora Kátia Abreu reclamou, o corregedor analisou e entendeu que não havia nada ilegal. Por quê? Porque ele não fez nenhum juízo de valor e aquela informação que foi divulgada pelo Estadão, ainda que estivesse acobertada por sigilo oficial, não era de um caso em que o procurador atua.

Ainda que tenha havido alguma revelação para o Estadão de alguma informação sigilosa, o procurador nunca teve acesso a essa informação sigilosa. Essa informação era de um caso que tramita no Supremo Tribunal Federal. Ou seja, não tem a menor chance de o procurador ter vazado essa informação para o Estadão, a informação já era pública quando o procurador divulgou porque já estava divulgada pelo Estadão. E, em terceiro lugar, não fez nenhum juízo de valor. É um caso claro, fácil, de arquivamento. Mas foi para o Conselho, e houve um debate árduo lá, um debate de horas.

E já tinha tido um caso semelhante que já tinha sido arquivado pelo plenário do Conselho neste ano por 13 a 1. Mas como era o meu caso, como existe um momento hoje, assim, difícil na Lava Jato, houve uma discussão que se estendeu por horas e já teve 3 votos em meu desfavor. Enquanto que um caso idêntico há poucos meses, foi só um voto em desfavor do procurador envolvido. Aliás, por coincidência, um procurador aqui da Lava Jato. O caso e era igualzinho ao meu.

Então, sobre esse caso que está indo a julgamento, não posso dizer que estou numa posição fácil diante desse contexto que está acontecendo. Agora, o que eu posso dizer é que acredito que o que eu falei não merece reprimenda pelo Conselho Federal do MP e eu acredito que muitas pessoas lá vão perceber isso de modo muito claro. Qual é esse caso que está indo a julgamento? Um caso em que eu formulei uma crítica pública numa rádio, na rádio CBN, em que eu afirmei que determinadas decisões do Supremo mandava uma mensagem de leniência forte em favor da corrupção. E por que eu fiz essa menção? Eu fiz uma crítica de autoridade pública contra decisões de autoridades públicas num assunto do interesse público. Essa é a franja interna mais básica do direito à liberdade de expressão.

Essa é a essência da liberdade de expressão que não existe para proteger elogio, existe justamente para proteger críticas. E esse ato foi questionado no Conselho Nacional do MP e vai ser julgado. E mais, uma coisa muito importante: essa própria afirmação da entrevista que eu fiz, eu complementei logo em seguida dizendo “olha não estou imputando má fé a ninguém, estou fazendo uma análise objetiva”.

Ou seja, disse expressamente na própria entrevista que não estava analisando a pessoa dos ministros (do STF), não estava criticando as pessoas dos ministros, não estava fazendo nenhuma avaliação sobre a conduta privada ou pública deles, mas estava sim avaliando as decisões, porque aquelas decisões contrariavam a visão do MP, a defesa poderia elogiar as decisões, ou em outros casos, a gente poderia elogiar e a defesa criticar, eu estava criticando as decisões com as quais a gente não concordava e estava falando que as decisões produzem um efeito social de uma percepção de impunidade. Essa foi a avaliação que eu fiz. Ela tem uma base teórica. Foi uma avaliação crítica, uma avaliação em que eu não xinguei ninguém, embora alguns ministros por vezes xinguem a gente.

A gente jamais xingou ninguém. Jamais fui indelicado. É a única representação que eu tenho sobre uma manifestação pública minha. Então, se você pega aquela frase e analisa dentro do contexto, quando você analisa, é claro que não foi uma manifestação de quebra de decoro. É claro que eu não fugi dos valores de civilidade, que isso está albergado pela liberdade de expressão.

É claro que a minha expectativa e torcida é de que existe uma decisão reconhecendo essa liberdade de expressão. Não porque é Deltan, mas porque na verdade o que está em julgamento neste caso, como neste último caso na última sessão, é um procurador que atuou de modo firme contra a corrupção, contra interesses poderosos, pessoas que se movimentam politicamente, em bastidores.

E a questão é: a gente quer um MP que mantenha essa independência, que futuros procuradores possam agir com liberdade e independência nestes casos, ou que os procuradores fiquem acovardados, medrosos, medindo palavras e não se sintam à vontade para fazer críticas públicas porque em razão dos interesses dos poderosos sendo criticados ele tem uma Espada de Dâmocles na cabeça dele e qualquer escorregão, qualquer dubiedade vai ser usada contra ele? Essa é a questão em jogo neste caso.

BBC News Brasil – Há dois outros casos na pauta do conselho, né? O senhor disse que o seu tratamento foi diferente de outro procurador. Sente algum tipo de perseguição dentro do conselho?

Dallagnol – Sinto que os meus casos estão tendo um tratamento talvez mais particular em razão desse momento que a gente está vivendo e das pressões todas que estão acontecendo.

BBC News Brasil – O senhor enxerga uma Lava Jato sem a presença do senhor? A operação continuaria na sua ausência?

Dallagnol – Você fala sobre um possível afastamento, é isso?

BBC News Brasil – Um possível afastamento a partir do que conversamos, de todo o escrutínio público e agora esses casos no conselho.

Dallagnol – Eu vejo especulação sobre isso, mas não vejo qualquer base para afastamento. Ainda que eu fosse condenado neste caso, a pena é censura, não é afastamento, não é demissão. Mesmo no outro caso para ir a julgamento, que é o caso envolvendo o (senador) Renan (Calheiros). Então é um caso envolvendo Toffoli, Gilmar e Lewandowski e outro envolvendo Renan Calheiros. Ainda que este outro caso vá a julgamento. São, de novo, pessoas poderosas e, ainda que eu venha a ser condenado, a punição é advertência ou censura, não suspensão. A questão é: existe sentido em uma suspensão para um procurador que não está sujeito à pena de suspensão?

E mais: a suspensão me afastaria de investigações e processos. Mas as condutas questionadas são uma declaração em entrevista e cerca 10 tuítes que fiz sobre Renan Calheiros e a campanha de voto aberto ao Senado. Então, não existe uma correlação lógica entre a medida de suspensão e as minhas condutas. Porque as minhas condutas são foram em investigação de processos, foram em entrevista e rede social. E o meu afastamento não seria de entrevista e rede social, seria de investigações e processos.

Então, um eventual afastamento não guardaria sequer correlação lógica com as supostas condutas pelas quais eu poderia ser punido. E ainda que guardasse, essas próprias condutas não estão sujeitas a suspensão. Você teria dois problemas no afastamento: proporcionalidade e coerência lógica. Eu não cogito que isso venha a acontecer, então não entraria nesta questão.

BBC News Brasil – Mantenho minha pergunta: em um caso de eventual afastamento, a operação sobrevive sem o senhor?

Dallagnol – Num caso de eventual afastamento, morte, qualquer coisa que me afastasse da operação, é claro que ninguém é insubstituível. Existe uma atuação de um grande número de agentes públicos de várias instituições nesse caso. O trabalho certamente seguiria firme, tenho a maior confiança nos colegas que estão aqui, são extremamente competentes, sérios, corretos. Então a operação seguiria, seguiria firme, sim, agora o problema é a mensagem que isso passaria.

A mensagem seria: promotores, vejam bem com quem vocês vão mexer. Vejam bem em que tipo de caso vocês vão entrar porque se vocês contrariarem interesses poderosos, vocês estarão sujeitos a riscos que os outros não estão. Se você olhar minha manifestação sobre Renan Calheiros, olhe na mesma época tuítes de outros procuradores. As coisas são muito semelhantes, agora, o caso deles não está no conselho, é o meu caso que está no conselho. Se você olhar o tuíte que eu fiz da matéria do Estadão, outros promotores retuitaram aquilo. Vários promotores e procuradores. Agora, não é o caso deles que está no Conselho, é o meu caso. Acho que a mensagem seria péssima, seria ruim para a história, para a força do MP, ruim para a instituição.

Acho que não é a mensagem que vai ser passada. Acho que os conselheiros, o CNMP, vão preservar a instituição, a proteção de pessoas que atuam em casos graves, sérios, grandes. É a visão que tenho, é nesse sentido que já me manifestei pelo CNMP, um órgão pelo qual tenho grande respeito.

Tenho respeito pela instituição STF, essencial para a democracia, eu critiquei já também o governo, Presidência, e eu tenho respeito pela função da Presidência, eu tenho respeito pelo Congresso Nacional, essencial à democracia, é o lugar de onde devem sair as melhores reformas que devem mudar o nosso país para melhor, seja tributária, Previdenciária, anticorrupção mesmo. São instituições essenciais, seus integrantes têm papel muito importante a desempenhar, tenho respeito à autoridade dessas pessoas. Jamais falei de descumprir qualquer decisão de qualquer autoridade. Mas eu tenho a liberdade de criticar atos, decisões, porque é disso que vive a democracia. É da circulação de ideias, é do livre-mercado de ideias.

O direito à liberdade de expressão é mais que um direito fundamental, é um pilar de sustentação da democracia. Se eu como procurador não posso criticar atos praticados, a gente vai estar privando do debate social, privando a sociedade de informações relevantíssimas que podem vir justamente dos atores que mais conhecem os casos que estão sendo levados a julgamento nas instâncias superiores, que são procuradores, promotores e juízes. E você vai privar da crítica social questões, como as decisões do Supremo, que só podem ser debatidas mediante crítica social porque não há recurso judicial contra aquelas decisões. O único recurso que a sociedade tem é o debate, a crítica social.

Assim como a gente defendeu a liberdade da imprensa e das pessoas de informar, acredito que é uma questão que não se trata de Deltan, mas da circulação de ideias de modo relevante ao debate público. É importante que seja debatida na nossa sociedade de modo abrangente e que parte, mas não se restringe a esse caso.

 

 

*Da BBC News

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Fascismo macabro da Lava Jato: Procuradores fazem piada de Lula nas mortes de Marisa, de Vavá e de seu neto Arthur

Quando o Brasil assiste a esse festival de estupidez e violência fascistas de Bolsonaro e Witzel, que pegaram carona na Lava Jato, vê a dimensão e espessura assustadoras do mal que os procuradores da Força-tarefa carregam e, de imediato, entende porque apoiaram e ajudaram a eleger Bolsonaro na trama macabra que tirou Lula da disputa política. Essa gente da república de Curitiba é muito pior do que se imagina. É gente ruim, do mal mesmo, como mostra a matéria publicada pelo Uol.

Integrantes da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba ironizaram a morte da ex-primeira-dama Marisa Letícia e o luto do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT), conforme revelam mensagens de chats privados no aplicativo Telegram enviados por fonte anônima ao site The Intercept Brasil analisadas em parceria com o UOL.

Os diálogos também mostram que procuradores divergiram sobre o pedido de Lula para ir ao enterro do irmão Genival Inácio da Silva, o Vavá, em janeiro passado –quando o ex-presidente já se encontrava preso– e que temiam manifestações políticas em favor de Lula. Na ocasião, alguns membros da Lava Jato disseram acreditar que a militância simpatizante de Lula pudesse impedir a volta dele à superintendência da PF (Polícia Federal), em Curitiba.

Deltan fez lobby com STF e governo Bolsonaro para tentar emplacar novo PGR Senador confirma encontro com Deltan, mas nega articulação para PGR Lava Jato viu em resultado das eleições no Senado chance de tirar Gilmar Deltan usou partido político para mover ação contra Gilmar Mendes no STF A despedida de Lula do neto Arthur Araújo Lula da Silva, que morreu aos 7 anos em março, também foi assunto entre procuradores da Lava Jato e alvo de crítica em chat composto por integrantes do MPF.

Em 24 de janeiro de 2017, Marisa Letícia sofreu um AVC hemorrágico. A internação no hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, é comentada em chat no aplicativo Telegram.

A reportagem manteve as grafias das mensagens tal qual constam nos arquivos enviados ao Intercept, mesmo que contenham erros ortográficos ou de informação. Não há indícios de que as mensagens tenham sido adulteradas.

A morte encefálica da ex-primeira-dama foi confirmada em 3 de fevereiro de 2017. Na véspera, a procuradora da República Laura Tessler, do MPF (Ministério Público Federal) em Curitiba, sugere que Lula faria uso político da perda da mulher.

Minutos após a confirmação da morte de Marisa Letícia ser noticiada, o tema volta ao chat Filhos do Januário 1.

Em 4 de fevereiro de 2017, após nota da colunista do jornal Folha de S.Paulo Mônica Bergamo sobre a agonia vivida por Marisa em seus últimos dias de vida ter sido compartilhada no grupo, a procuradora Laura Tessler refuta a possibilidade de o agravamento do quadro da ex-primeira-dama ter acontecido após busca e apreensão na casa dela e dos filhos e condução coercitiva de Lula, determinada pelo então juiz Sergio Moro no ano anterior.

“Ridículo… Uma carne mais salgada já seria suficiente para subir a pressão… ou a descoberta de um dos milhares de humilhantes pulos de cerca do Lula”, afirma Laura.

Em abril passado, em entrevista ao jornal El País e à Folha de S.Paulo, Lula disse que “Marisa morreu por conta do que fizeram com ela e com os filhos dela. Dona Marisa perdeu motivação de vida, não saía mais de casa, não queria mais conversar nada”. O ex-presidente respondia à pergunta sobre a possibilidade de a saúde da mulher ter sido afetada pelas investigações.

Na mesma conversa, o procurador Januário Paludo, que também integra a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, coloca sob suspeita as circunstâncias da morte de Marisa Letícia. “A propósito, sempre tive uma pulga atrás da orelha com esse aneurisma. Não me cheirou bem. E a segunda morte em sequência”, diz ele, sem especificar à qual outra morte se referia.

A suspeição em relação às circunstâncias da morte da ex-primeira-dama já havia sido exposta por Paludo em 24 de janeiro, quando Marisa Letícia fora internada. Na ocasião, o chefe da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, afirma que Marisa havia chegado debilitada ao hospital.

“Um amigo de um amigo de uma prima disse que Marisa chegou ao atendimento sem resposta, como vegetal”, afirma Deltan. Paludo reage à frase dizendo: “Estão eliminando as testemunhas”.

Em 4 de fevereiro, o corpo de Marisa Letícia foi velado em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista. A fala de Lula na despedida da mulher é compartilhada pela procuradora Laura Tessler no chat. Na ocasião, Lula afirmou: “Eles que têm que provar que as mentiras que estão contando são verdade. Então, Marisa, descanse em paz porque esse Lulinha paz e amor vai continuar brigando muito”.

Deltan define a manifestação de Lula como “uma bobagem”. “Bobagem total… nguém mais dá ouvidos a esse cara”, diz.

O tema volta ao grupo no dia seguinte, quando o procurador Antônio Carlos Welter diz que “a morte da Marisa fez uma martir [sic] petista e ainda liberou ele pra gandaia sem culpa ou consequência politica”.

A morte de Marisa também foi comentada por outros integrantes do MPF em chats no Telegram. Ainda em 4 de fevereiro, a procuradora da República Thaméa Danelon, da força-tarefa da Lava Jato em São Paulo, critica a participação da procuradora Eugênia Augusta Gonzaga no velório da ex-primeira-dama, o que, para ela, equivaleria a ir ao enterro da “esposa do líder de uma facção do PCC”.

“Olhem quem estava no velório da Ré Marisa Leticia”, escreve às 14h07 no grupo Parceiros/MPF – 10 Medidas, ao citar fotografia de Eugênia na cerimônia. Outros procuradores questionam qual seria o problema da presença no velório de Eugênia Gonzaga, que chefiou a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos de 2014 até o começo de agosto.

“Acho um desrespeito ao Janot e a todos os colegas envolvidos na LJ. Além disso, demonstra partidarismo. Algo q temos q evitar Apenas isso. Abraços”, responde Thaméa às 15h16. Ela se referia a Rodrigo Janot, então procurador-geral da República. “É como um colega ir ai enterro da esposa do líder de uma facção do PCC. No mínimo inapropriado”, compara.

“O safado só queria passear”, diz procurador sobre pedido de Lula para ir a enterro de irmão.

A maneira com que Lula externou a perda de parentes e eventuais manifestações públicas de apoio ao ex-presidente nesses momentos foram debatidas por procuradores em ao menos outros dois episódios em 2019: em 29 de janeiro, ocasião em que o irmão Vavá morreu em decorrência de um câncer, e, a partir de 1º março, quando foi confirmada a morte do neto Arthur.

Em 29 de janeiro, o procurador Athayde Ribeiro Costa compartilha no grupo Filhos do Januário 3 a notícia de que Vavá havia morrido. A resposta de Deltan à informação já indicava o debate que se iniciaria no chat. “Ele vai pedir para ir ao enterro. Se for, será um tumulto imenso”, diz.

As consequências de uma eventual saída de Lula da superintendência da PF em Curitiba e a legalidade da liberação provisória dividem opiniões no chat. Parte dos procuradores defende o direito de Lula ir ao enterro de Vavá, enquanto outros sustentam que o ex-presidente não é um “preso comum” e se posicionam contra a ida de Lula ao sepultamento do irmão.

Athayde Ribeiro Costa faz uma ressalva em relação à possível repercussão internacional negativa que a proibição traria. “Mas se nao for, vai ser uma gritaria. e um prato cheio para o caso da ONU [Organização das Nações Unidas]”, diz em referência à manifestação que a defesa de Lula apresentaria dias depois ao Comitê de Direitos Humanos do órgão.

No texto, os advogados de Lula diziam que a prisão se devia a uma “perseguição política” e citavam que o tratamento dado a ele era “carregado de cruel mesquinhez”. Meses antes, durante a corrida eleitoral, a ONU já havia recomendado ao Estado brasileiro “garantir ao ex-presidente o exercício de todos os direitos políticos mesmo que na prisão”.

O procurador Orlando Martello diz achar “uma temeridade ele sair. Não é um preso comum. Vai acontecer o q aconteceu na prisão” e conclui: “A militância vai abraçá-lo e não o deixaram voltar. Se houver insistência em trazê-lo de volta , vai dar ruim!!”.

O procurador Diogo Castor pondera que “todos presos em regime fechado tem este direito”, e Orlando Martello retoma o argumento do risco à segurança: “3, 4, 10 agentes não o trarão de volta. Aí q mora o perigo caso insistam em fazer cumprir a lei”.

Em abril de 2018, Lula se entregou à PF após ficar dois dias na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo. Manifestantes tentaram impedir que o ex-presidente fosse levado à prisão e dificultaram o trabalho dos policiais federais.

Depois desta troca de mensagens, Januário Paludo encaminha aos colegas uma manifestação que seria entregue à juíza responsável por avaliar o pedido de liberação. Trata-se de um parecer da força-tarefa da Lava Jato pelo indeferimento da saída solicitada pela defesa de Lula. Ao ler o texto, Athayde Ribeiro Costa pondera: “Simplesmente indefirir estamos agindo como pilatos e deixando a juiza em situaca difícil”.

Minutos depois, os procuradores têm acesso a parecer da Polícia Federal que disse não ter condições de atender ao pedido de Lula. O relatório levou em consideração três situações de risco: “Fuga ou resgate do ex-presidente Lula, atentado contra a vida do ex-presidente e comprometimento da ordem pública”. A PF também considerou que as aeronaves que poderiam estar disponíveis para levar o petista ao enterro, naquele momento, estavam realocadas para dar apoio às autoridades em Brumadinho (MG), onde o rompimento de uma barragem, dias antes, deixou aos menos 248 mortos.

Anteriormente, a Justiça Federal, na primeira e na segunda instâncias, já havia se posicionado contra a solicitação dos advogados do ex-presidente. Minutos depois da manifestação da PF, a Procuradoria da República do Paraná também se posicionou contra o pedido de Lula.

No chat, Antônio Carlos Welter concorda com a PF, mas diz acreditar que Lula tinha o direito de ir ao enterro do irmão. “Eu acho que ele tem direito a ir. Mas não tem como”. Januário Paludo responde: “O safado só queria passear e o Welter com pena”.

Laura Tessler comenta: “O foco tá em Brumadinho…logo passa…muito mimimi”.

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Dias Toffoli, permitiu contudo que Lula fosse levado a São Paulo e se encontrasse com familiares em unidade militar da região. A decisão foi publicada no momento em que Vavá estava sendo sepultado em São Bernardo do Campo, e Lula acabou não deixando a carceragem da PF.

“Fez discurso político em pleno enterro do neto”, diz procuradora.

Em 1º de março, o grupo Filhos de Januário 4 foi surpreendido com o compartilhamento de notícia sobre a morte de Arthur. Dias depois, o laudo da necropsia confirmaria a morte do neto de Lula por infecção generalizada provocada por uma bactéria.

A procuradora Jerusa Viecili diz: “Preparem para nova novela ida ao velório”.

Deltan opina com base na decisão de Dias Toffoli no dia do enterro do irmão de Lula. “Tem q fazer igual o Toffoli deu”, diz.

Após autorização judicial, Lula foi ao enterro do neto em uma aeronave cedida pelo governo do Paraná. Deltan encaminha aos colegas notícia sobre um contato telefônico feito entre Lula e o ministro do STF Gilmar Mendes em que o ex-presidente teria se emocionado.

O procurador Roberson Pozzobon comenta: “Estratégia para se ‘humanizar’, como se isso fosse possível no caso dele rsrs”.

No chat Winter is Coming, na mesma data, a procuradora Monique Cheker, que atua em Petrópolis (RJ), comenta a fala de Lula durante a despedida do neto. O grupo é composto por integrantes do MPF de diferentes estados.

No enterro, Lula afirmou que Arthur havia sofrido bullying na escola por ser seu neto e prometeu provar que não havia cometido irregularidades.

“Fez discurso político (travestido de despedida) em pleno enterro do neto, gastos públicos altíssimos para o translado, reclamação do policial que fez a escolta… vão vendo”, diz Monique Cheker.

Outro lado Procurada, a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba disse que não poderia se manifestar sem ter acesso integral às conversas. O espaço continua aberto a manifestações de seus procuradores.

As procuradoras da República Thaméa Danelon e Monique Cheker responderam, por meio das assessorias de imprensa do MPF em São Paulo e,no Rio de Janeiro, respectivamente, que não iriam se manifestar sobre as mensagens citadas na reportagem.

 

*Do Uol

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Novos vazamentos: Áudios: Corregedor-geral do MPF acobertou confissão de procurador da Lava Jato que pagou por outdoor ilegal

Leia abaixo a matéria completa do Intercept Brasil

Procurador Diogo Castor de Mattos confessou ao corregedor-geral do Ministério Público Federal que pagou por um outdoor para promover a Lava Jato. A peça, instalada em março ao lado do aeroporto de Curitiba, era ilegal. É papel do corregedor abrir inquérito sobre desvios de conduta de membros do MPF, mas Oswaldo Barbosa deu o caso por encerrado sem investigação formal – e omitiu a confissão do Conselho Nacional do Ministério Público, o CNMP, que também poderia punir o procurador.

Áudios do arquivo da Vaza Jato mostram que membros da força-tarefa sabiam da confissão, e o episódio causou preocupação: nos bastidores, o grupo atuou para esvaziar a apuração e a publicidade do caso. O coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol, intermediou conversas com Barbosa para proteger Castor de Mattos, mesmo sabendo da confissão de culpa. As mensagens indicam que o corregedor disse a Dallagnol que iria suspender apurações e manter o caso em segredo. O lobby foi bem-sucedido. Nenhum procedimento foi instaurado para apurar a conduta do procurador, que se afastou da operação logo depois da confissão apresentando um atestado médico.

Este é o segundo episódio revelado pelos arquivos da Vaza Jato que mostra a corregedoria do MPF deixando de investigar desvios de procuradores da operação. Em 8 de agosto, o Intercept e a Folha de S.Paulo já haviam mostrado que o antecessor de Barbosa no cargo, Hindemburgo Chateaubriand Filho, criticou a divulgação de uma palestra de Dallagnol em conversas informais, mas não abriu apuração oficial sobre o caso.

Como a confissão de Castor de Mattos foi abafada, o CNMP arquivou um pedido de investigação alegando que não havia indícios da participação de membros do MPF no aluguel do outdoor. Também é papel do corregedor compartilhar informações com conselhos superiores, como é o caso do CNMP, que engloba também as procuradorias estaduais, militares e do trabalho do país.

Em conversas reservadas no Telegram obtidas pelo Intercept, Dallagnol e outros procuradores da força-tarefa também recomendaram “sigilo total” aos colegas, para o caso não ganhar repercussão na imprensa. Pelo menos três procuradores mencionaram a confissão de Castor de Mattos em áudios anexados às conversas.

A mensagem de apoio à Lava Jato surgiu em março deste ano, em um outdoor instalado na avenida que é a principal porta de saída do Aeroporto Afonso Pena, em São José dos Pinhais, rumo a Curitiba. Ao fundo, nove procuradores estampavam a imagem. À frente, lia-se: “Bem-vindo à República de Curitiba. Terra da Operação Lava Jato, a investigação que mudou o país. Aqui a lei se cumpre. 17 de março – 5 anos de Operação Lava Jato — O Brasil Agradece”. A propaganda não estava assinada.

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Na época, a Lava Jato se apressou a negar publicamente que a confecção da peça tivesse sido encomendada por membros da força-tarefa. Mas um coletivo de advogados entrou com uma representação no CNMP alegando que a propaganda feria o princípio da impessoalidade e exigiu investigação sobre sua autoria e financiamento.

Castor de Mattos pediu afastamento da força-tarefa em 5 de abril. Ele apresentou um atestado médico para justificar a decisão. Oficialmente, o grupo de procuradores se limitou a agradecer ao colega pelos serviços prestados nos cinco anos da operação, sem expor seus motivos. A imprensa noticiou, à época, que ele sofria de cansaço físico e mental. Além de sair da Lava Jato, Castor de Mattos também deixou a operação Integração, um desdobramento da operação que mira contratos de pedágio em rodovias do Paraná.

Cerca de 20 dias depois da confissão de Castor de Mattos chegar à corregedoria do MPF, e ter sido mantida sob sigilo, a representação no CNMP foi arquivada. “A publicidade não foi contratada por nenhum membro do Ministério Público”, escreveu o relator do caso no conselho, Luiz Fernando Bandeira de Mello.

“Não há nos autos qualquer indício de participação dos membros ora requeridos na exposição do outdoor, não havendo, portanto, nenhuma conduta a se investigar em âmbito disciplinar pela Corregedoria Nacional”, diz a decisão de Bandeira de Mello. Procurado pelo Intercept, Mello preferiu não se pronunciar.

Mas o coletivo de advogados que entrou com a reclamação, o Centro de Direitos Humanos e Memória Popular de Foz do Iguaçu, recorreu contra o arquivamento, alegando que encontrou a pessoa cujo nome constava na encomenda do outdoor. Tratava-se do músico João Carlos Queiroz Barbosa, que registrou um boletim de ocorrência negando participação no caso. Ele disse que sequer teria renda suficiente para arcar com os custos da propaganda.

Conversamos com Barbosa, o músico, que informou que não conhece ninguém da Lava Jato e nem da empresa responsável pelo outdoor. Ele disse que foi ouvido sobre o caso pela Polícia Federal e está conversando com advogados para avaliar o que fazer. “Com certeza fui vítima de alguma fraude”, afirmou. “Sou pai de família, músico, professor, cristão e a última coisa em que me envolveria na vida seria isso!”

No último dia 5 de agosto, o relator manteve o arquivamento no CNMP, mas enviou uma cópia do caso para a corregedoria nacional do MPF, que decidiu pedir explicações para o coordenador da Lava Jato. Dallagnol foi comunicado no dia 15, mas ainda não respondeu

O outdoor ficaria em exposição entre 13 de março e 14 de abril, segundo o recibo emitido pela Outdoormídia. Mas ele foi retirado antecipadamente. De acordo com Tânia Mandarino, do coletivo de advogados que acionou o CNMP sobre o caso, no dia 30 de março a peça já havia sido removida.

A Outdoormídia não respondeu às perguntas enviadas pelo Intercept. A empresa se limitou a dizer que “veiculou o pedido do cliente” e que só responde a perguntas sobre essa questão “através de pedido judicial”.

‘. . .seria caso de internação, não de corregedoria rs’

BRAZIL-CRISIS-JUSTICE-CORRUPTION-DELTAN DALLAGNOL

Quando o outdoor começou a chamar a atenção em Curitiba, assessores de imprensa do MPF levaram o questionamento de jornalistas a Dallagnol. Ele negou envolvimento no dia 25 de março e completou que não era o caso de ir atrás de quem fez a propaganda. “Temos só que dizer que não é nosso e não sabemos de quem é, mas recebemos esse tipo de manifestação como sinal de carinho da sociedade ou algo assim”.

Dois dias depois, Oswaldo Barbosa entrou em contato com Dallagnol pelo Telegram para perguntar sobre o outdoor. “O outdoor existe, mas não sabemos quem o colocou ou pagou. Como imaginou corretamente, jamais faríamos isso… seria caso de internação, não de corregedoria rs”, respondeu o chefe da força-tarefa.

Barbosa não ficou satisfeito. No dia seguinte, o corregedor voltou a questionar Dallagnol. Desta vez, sugeriu que os procuradores tentassem remover a peça da rua – embora já se mostrasse convicto de que não haveria envolvimento de membros da força-tarefa no episódio.

28 de março de 2019 – Chat privado

Oswaldo Barbosa – 11:44:56 – Deltan, verifique quem colocou este outdoor sem autorização no órgão de fiscalização, pois está repercutindo muito, inclusive no CNMP…
Deltan Dallagnol – 12:26:29 – Oi Oswaldo, agradeço a preocupação, mas tenho dúvidas sobre nossa atribuição para apurar isso porque não é ato ilícito sob prisma civil ou criminal. Se fizermos algo, seria questionável. Mesmo se descobríssemos quem fez, não sei o que poderíamos fazer com a informação, por não ser nada ilegal em princípio. Parece-me que o adequado a nós é simplesmente esclarecer que não é nosso ou do nosso conhecimento a quem questionar. Creio que o Estadão já perguntou até. Fique à vontade aí para buscar a informação. Acredito que há atribuição correcional se houver notícia pública de que fomos nós, e parece que há. Se houver a apuração, seria importante tornar público o resultado, porque desmentiria a falsa acusação lançada por blogs. Abraços
Barbosa – 12:58:47 – Tenho certeza que não foram vocês! O sentido da minha intervenção foi no sentido de eventualmente vocês conseguirem retirar o outdoor da rua…
Barbosa – 13:06:47 – Mas se não conseguirem…tudo bem!

Dallagnol e o corregedor voltaram a se falar pelo Telegram na semana seguinte. Mas aí o tom da conversa foi outro. Segundo as mensagens analisadas pelo Intercept, naquele momento Barbosa foi informado de que Castor de Mattos confessara ser responsável pelo outdoor.

No início da noite de 5 de abril, o coordenador da força-tarefa comunicou aos colegas, no grupo Filhos do Januário 4, o conteúdo de um ofício que havia enviado a Barbosa relatando a confissão de Castor de Mattos e o seu tratamento de saúde.

“Senhor Corregedor, Cumprimentando-o, dirijo-me a V. Exa. para informar, em nome dos colegas que integram a força-tarefa da operação Lava Jato, que o procurador Diogo Castor de Mattos, afastado nesta data por razão psiquiátrica, comunicou aos procuradores que custeou com recursos próprios, por iniciativa de um amigo do seu relacionamento particular, a publicação de outdoor com imagem e mensagem de reconhecimento dos trabalhos da Lava Jato, nesta cidade, em março deste ano. O referido procurador informou ainda que encaminhou ofício a V. Exa., nesta data, solicitando audiência para reportar voluntariamente o fato a essa Corregedoria. Temos conhecimento ainda de que o referido procurador vem se submetendo a tratamento psiquiátrico desde dezembro de 2018 e, nesta data, afastou-se dos trabalhos por determinação médica. O procurador Diogo Castor de Mattos, também, pediu formalmente o afastamento definitivo dos trabalhos da Lava Jato, fundamentando seu afastamento em quadro de estafa de caráter físico, emocional e intelectual (ofício 2706/2019-PRPR/FT – PRPR00023953/2019). Nesta mesma data, foi solicitado seu afastamento à Exma. Procuradora-Geral da República. Estamos reportando essa situação a V. Exa. assim que tomado conhecimento do fato, colocando-nos à disposição para qualquer esclarecimento complementar. Certos de sua atenção, renovamos protestos de elevada estima e distinta consideração.”

Minutos depois, Dallagnol avisou o próprio corregedor, em chat privado, que encaminhara o ofício. “Caro Oswaldo, obrigado por sua atenção, mais uma vez. Fiz o ofício, confidencial, cadastrando apenas nós dois”. Barbosa respondeu em seguida: “Grato. Despacharei na segunda, abraços”.

Ou seja: na iminência de ser investigado e afastado, Castor de Mattos apresentou um atestado médico, datado do dia anterior, para formalizar sua saída da Lava Jato. O documento, assinado por um médico de Curitiba, recomendava o afastamento do procurador por 30 dias. Os demais integrantes da operação decidiram não divulgar oficialmente as razões do colega para se afastar. “O objetivo disso não é nos preservar, mas preservar ele na verdade”, disse Dallagnol no grupo Filhos de Januário 4, respondendo a colegas que questionavam se deveriam publicizar o caso.

O teor do ofício foi explicado por Dallagnol minutos depois no mesmo grupo, em que estavam procuradores da Lava Jato. Dallagnol disse aos colegas que a corregedoria estaria disposta a suspender duas investigações que envolviam Castor de Mattos no CNMP. O atestado médico abafaria os casos.

5 de abril de 2019 – Filhos do Januário 4

Deltan Dallagnol – 19:55:41 – Resumo da conversa com corregedor: 1. Foi bem sensível à questão de o colega estar sob tratamento 2. Disse que nesse tipo de situação ele instaura uma sindicância não disciplinar, submete a pessoa a junta médica, e a depender do resultado pode entender pela inimputabilidade para o fato (e inclusive para o outro fato em que ele falou “turma do abafa”) 3. Pediu pra eu fazer ofício (o feito acima) e ele suspenderia apuração e mandaria ofício pro CNMP pra suspender tb a apuração da turma do abafa, tudo com sigilo 4. Disse que pessoas que estão com dificuldades de saúde devem compreender e perceber que a Instituição não é algoz, mas se sentir acolhidas em momento difícil. Em outros casos isso aconteceu e a pessoa voltou a prestar bom serviço público. 5. Disse que topa receber ele em floripa.

O Intercept perguntou para o MPF por que o corregedor não abriu um procedimento para investigar a conduta de Castor de Mattos; se alguma providência foi ou será tomada sobre o assunto; e se houve compartilhamento de informações com o CNMP. A resposta, enviada por e-mail, se limitou a informar que a corregedoria não comenta informações obtidas “mediante violação da garantia constitucional do sigilo das comunicações telemáticas”, e que o caso é protegido por sigilo.

Também questionamos o MPF em Curitiba sobre o episódio, mas os procuradores se recusaram a responder alegando que não enviamos a íntegra das mensagens antecipadamente. O Intercept esclarece que jamais envia o conteúdo completo de suas reportagens previamente a quaisquer fontes ou pessoas citadas, mas que oferece, inclusive na série Vaza Jato, a caracterização dos trechos nos quais são mencionadas, e que concede ao menos 24 horas para que elas enviem suas considerações.

No dia em que o corregedor avisou a Dallagnol que poderia suspender a investigação sobre o outdoor, Castor de Mattos se despediu dos colegas. “Nesses cinco anos, formamos a mais bela família que eu já conheci. Quem sabe um dia voltaremos a se encontrar… amo todos vocês, do fundo do meu coração. Obrigado pelo apoio neste momento difícil, jamais esquecerei. Desculpe eventuais problemas que causei. Contem comigo sempre! Abraço!! Diogo Castor.”

Com Castor de Mattos já fora do grupo, os procuradores debateram os problemas que o vazamento do caso poderia causar.

5 de abril de 2019 – Filhos do Januário 4

Paulo Galvão – 18:38:20 – Pessoal, só lembrando a todos: em respeito ao Diogo, o ideal é que o assunto seja tratado com sigilo total. Ele já fez a comunicação à Corregedoria, então agora é com as instâncias competentes. Digo isso para evitarem qualquer comentário em grupos de colegas ou rodas de amigos.
Laura Tessler – 18:39:24 – e evitar comentar com os servidores…o pessoal tá curioso e querendo pescar mais detalhes sobre as razões do afastamento.
Deltan Dallagnol – 18:45:11 – Isso, por favor. Esse assunto tem que ficar aqui. Não podemos falar com colegas, porque falarão com outros, que falarão com outros, e estaremos expondo o colega e a própria operação.

A principal preocupação dos procuradores era com a imagem da força-tarefa. “Se fosse só tratamento de saúde ele continuaria na FT. Temos que proteger a operação tb, não apenas ele. Sei que a situação é delicada, mas quando o fato se tornar público, estaremos no sal”, comentou a procuradora Jerusa Viecili no mesmo grupo.

Em seguida, os membros da força-tarefa começaram a discutir uma nota que seria enviada para a imprensa se o caso se tornasse público. Nela, a Lava Jato afirma que o corregedor tomaria as providências cabíveis – apesar de já ter sido acordado que nada aconteceria. O texto não foi divulgado nem mesmo após o papel de Castor de Mattos no caso ter sido revelado.

‘SE NÃO TIVER REPERCUSSÃO, NO FUTURO NADA OBSTA QUE ELE RETORNE’

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Num ambiente mais privado, um grupo de Telegram com quatro dos principais procuradores da Lava Jato, Castor de Mattos foi criticado após o afastamento. Em áudios enviados no grupo DD-OM-PG-JN (referência aos nomes dos participantes, Dallagnol, Orlando Martello, Paulo Galvão e Julio Noronha) em 7 de abril, Martello classificou o ato de Castor de Mattos como uma “traição”. O procurador, no entanto, ressaltou que o colega poderia voltar para a Lava Jato, no futuro, se o caso não se tornasse um escândalo público.

O procurador continuou o raciocínio em outro áudio enviado em seguida. Ele disse acreditar que a investigação do CNMP seria “esvaziada”.

O Intercept já mostrou que o CNMP, órgão que deveria punir os maus profissionais, antecipou uma decisão que acabaria protegendo a Lava Jato.

Em outra gravação, o procurador Paulo Galvão diz que Castor de Mattos prestou as informações “espontaneamente” à corregedoria. Também enfatizava aos colegas que o motivo oficial do pedido de afastamento era o tratamento de saúde.

O procurador Julio Noronha, também em uma fala enviada no grupo, pondera que, se a força-tarefa justificasse a saída de Castor de Mattos apenas pela questão de saúde, estaria sendo “conivente além do necessário com a situação”.

‘Mande todos para o PQP. É preciso estancar a questão.’

Integrante da força-tarefa desde o início, em 2014, o procurador de 33 anos (o mais jovem a passar pela Lava Jato) se envolveu numa série de controvérsias ao longo dos anos. Ele é parente de um advogado que atuou na defesa de réus da operação e de um procurador do TRF-4. Ele também escreveu artigos desafiando ministros de cortes superiores. Castor de Mattos, porém, sempre foi protegido pelos colegas — principalmente por Dallagnol, de quem foi estagiário e a quem se referia no chats como “professor”.

O CNMP apura duas denúncias contra Castor de Mattos, ambas em sigilo. Em uma, ele responde junto a 12 colegas — incluindo Dallagnol — ligados à criação de uma “fundação da Lava Jato”, que iria gerir recursos de um fundo de R$ 2,5 bilhões oriundos de um acordo entre a Petrobras e autoridades dos Estados Unidos para “financiar atividades anticorrupção”.

A outra surgiu em abril, depois de o procurador assinar um artigo no site O Antagonista, no qual ele chama a Segunda Turma do STF de “turma do abafa”. Entre os ministros do grupo, prevaleceu o entendimento de que casos de caixa 2 deveriam ser encaminhados para a Justiça Eleitoral, o que vai contra a opinião da Lava Jato. O presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, não gostou e pediu que se investigasse Castor de Mattos. O plenário do CNMP aceitou a abertura do procedimento administrativo disciplinar no último dia 13, o que pode resultar em sanções que vão de advertências até a demissão do procurador — caso seja condenado.

O artigo assinado por Castor de Mattos recebeu um contra-ataque feroz do ministro Gilmar Mendes, que chamou os procuradores da Lava Jato de “gentalha” e “cretinos”. No mesmo mês, março, o procurador havia publicado outro artigo criticando o presidente do Superior Tribunal de Justiça, João Otávio de Noronha, após o ministro conceder um habeas corpus ao ex-governador do Paraná, Beto Richa, do PSDB. Castor de Mattos disse que Noronha não tinha “credenciais acadêmicas”. A filha de Noronha respondeu o artigo chamando Castor de Mattos de “moleque inconsequente”, que tinha que “deixar as fraldas” e “aprender a ler”.

No ano passado, Mendes, um costumeiro crítico da operação, já havia desfiado insinuações contra Castor de Mattos e perguntado, durante sessão em 11 de abril de 2018, “se alguém tinha dúvida de que a corrupção já entrou na Lava Jato e na procuradoria”. As acusações do ministro se referem a um conflito de interesses do procurador: Diogo é irmão de Rodrigo Castor de Mattos, advogado que atua defendendo acusados pela Lava Jato.

Um dos réus mais célebres defendidos por Rodrigo é João Santana, marqueteiro de campanhas eleitorais vitoriosas de Luís Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, do PT. O advogado assumiu a defesa de Santana em abril de 2017, poucas semanas depois de a delação do publicitário ser assinada. Nos depoimentos, publicados de modo estrondoso pela imprensa, ele e a esposa, Monica Moura, disseram que os ex-presidentes sabiam que havia caixa 2 nas campanhas de 2006 e 2014.

Castor de Mattos também é parente de outro ator da Lava Jato: Maurício Gotardo Gerum, procurador do Ministério Público Federal que atua no TRF-4. Maurício e Diogo são primos. Foi Gerum quem apresentou o parecer da procuradoria no caso do sítio de Atibaia pedindo o aumento da pena a ser cumprida por Lula, caso a condenação seja confirmada em segunda instância.

A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu a suspeição de Gerum em julho deste ano, já que Castor de Mattos atuou como promotor na acusação e, seu irmão Rodrigo, como advogado de João Santana e Mônica Moura, que são testemunhas no processo. Gerum respondeu que não é suspeito de atuar no caso porque, apesar de gostar muito dos irmãos Castor de Mattos, não mantém muito contato com eles.

O parentesco entre o procurador e o advogado de defesa era um tema espinhoso na força-tarefa havia anos. Em conversa reservada no Telegram, Castor de Mattos pedia conselhos a Dallagnol sobre o assunto e recebia mensagens tranquilizadoras.

1º de março de 2015 – Chat privado

Diogo Castor de Mattos – 14:34:33 – Opa blza? Meu irmão falou aqui q vai fazer representação de ctbapra um escritório de sp que faz a defesa da toshiba.
Deltan Dallagnol – 15:22:35 – Então, em pp, é só Vc não atuar em casos da Toshiba. E nunca, nunca, em razão do passado, assine peças só Vc. Pega sempre a assinatura de outro(s). Susse.
Castor de Mattos – 20:25:33 – Blza.

Não era apenas Dallagnol que defendia o colega. Em 16 de maio de 2017, o então integrante da força-tarefa de Curitiba Carlos Fernando Santos Lima alertou Dallagnol, em uma conversa particular entre os dois no Telegram, que outros procuradores estavam criticando a proximidade de Diogo com o irmão advogado em um grupo.

“Deltan. Você deve intervir no grupo que estão crucificando o Diogo para alertar que o impedimento é superveniente e quem deve se afastar é o irmão dele”, escreveu Lima. Minutos depois, Dallagnol respondeu: “Veja as conversas. Meu receio é dar mais pano pra manga. Vão na linha do mulher de Cesar. Estou entre a reunião da TI e a palestra. Posso escrever amanhã com calma, ou se escreverem posto”.

As conversas a que eles se referem ocorreram em 13 e 14 de maio de 2017 no grupo chamado 2017 – Parceiros/MPF – 10 Medidas., formado por procuradores engajados no projeto das 10 Medidas contra a Corrupção, encabeçado por Dallagnol. O assunto começou quando a procuradora Raquel Branquinho enviou o link de uma matéria que tratava do parentesco entre Diogo e Rodrigo. “Não há conflito de interesses nessas situações?”, disse em seguida.

‘não vamos dar o braço a torcer pedindo para o Diogo sair.’

Um assessor de imprensa do MPF, que estava no grupo, respondeu com uma nota enviada a jornalistas que questionaram o assunto. “Obrigada SUPRIMIDO. Li a resposta. Muito bem elaborada. Como aqui é um fórum livre de debates, acho que a partir do momento que há coincidência de atuação, segundo o esclarecimento de vcs a partir de abril de 2017, passou a existir conflito. Ou o procurador ou o irmão advogado poderiam permanecer no caso. Obrigada”, respondeu Branquinho.

Dallagnol respondeu: “Concordo, Raquel. Diogo nunca atuou no caso, por divisão de tarefas, e agora há razões adicionais para não atuar. Nessas situações, temos o cuidado de isolar o colega inclusive de informações, apesar da plena confiança, para protegê-lo. É totalmente diferente da situação, p ex, de Gilmar”.

“Eu sempre estou à vontade para externar minha opinião sobre assuntos da nossa Instituição”, escreveu Branquinho. “Acho que vcs são bastante maduros e experientes para conviver com a divergência de opinião, Ainda mais quando é construtiva. Não vejo a situação, para o público externo, muito diferente de Gilmar ou do próprio PGR. Nesses casos, acho que as aparências importam. Mas este debate, da minha parte, encerra se por aqui. Grande abraço”, completou a procuradora.

 

*The Intercept Brasil