O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu um prazo de 15 dias para que a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifeste em dois pedidos para que o presidente Jair Bolsonaro e o filho dele, o vereador no Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro (PSC), sejam investigados por suposta obstrução de Justiça nas investigações a respeito do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) no ano passado.
“Abra-se vista à Procuradoria-Geral da República para que se manifeste no prazo de 15 dias”, disse Moraes em despacho publicado nesta terça.
Os pedidos apresentados pela Associação Brasileira de Imprensa e pelo PT têm como base o fato de Carlos Bolsonaro ter dito que acessou as gravações da portaria no condomínio Vivendas da Barra, no Rio de Janeiro, onde mora um dos acusados do assassinato da vereadora.
Um porteiro do condomínio — onde Bolsonaro e seu filho também têm casa — disse inicialmente à Polícia Civil que “seu Jair” autorizou, no dia 14 de março de 2018, a entrada do ex-policial militar Élcio de Queiroz no local.
Élcio e o policial reformado Ronnie Lessa, também morador do condomínio, respondem pelo assassinato da vereadora.
Na mais recente reviravolta em torno das investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, um porteiro do condomínio Vivendas da Barra mudou seu depoimento sobre um dos acusados de envolvimento direto nos homicídios.
Marielle e Anderson foram mortos no dia 14 de março de 2018.
Na quarta-feira (20), o funcionário — de nome não divulgado oficialmente — afirmou à Polícia Federal que errou ao ter dito em dois depoimentos à Polícia Civil do Rio de Janeiro, em outubro, que o ex-policial militar Élcio Queiroz foi autorizado a entrar no condomínio, horas antes dos assassinatos, por alguém na casa do então deputado federal Jair Bolsonaro. Mais especificamente, alguém que ele identificou com a voz do “Seu Jair”.
Mas por que o porteiro mudou sua versão, se o próprio anotou na planilha de acessos ao condomínio em 14 de março de 2018 que Queiroz iria à casa 58, onde Bolsonaro morava, em vez da casa 66, onde morava o policial militar reformado Ronnie Lessa, acusado de efetuar os disparos contra Marielle e Anderson?
E por que nenhuma das linhas de investigação chegou a um possível motivo para os crimes?
Veja abaixo lacunas e perguntas sem respostas que surgiram em torno da investigação. Por que os motivos do crime ainda não foram identificados?
Depois de um ano e seis meses de investigação, a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal chegaram em setembro formalmente a um suspeito de ser o mentor dos assassinatos: Domingos Brazão, conselheiro afastado do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE/RJ).
A partir de interceptações telefônicas feitas numa investigação paralela à da Polícia Civil do Rio, a Polícia Federal apontou que Brazão era ligado ao chamado Escritório do Crime, grupo de milicianos e matadores de aluguel que tem sua base em Rio das Pedras, favela na zona oeste da cidade. E os assassinatos podem ter sido, segundo essa linha de investigação, executados por integrantes dessa milícia.
Mas ainda não está claro qual seria a relação entre Brazão e os acusados de executar o crime. E tampouco se sabe qual seria a motivação dele para desejar a morte da vereadora.
Segundo a denúncia da PGR, que havia solicitado à Polícia Federal que investigasse possível interferência na apuração estadual dos assassinatos, a investigação do vínculo entre Brazão e o Escritório do Crime vem sendo dificultada pelo fato de o grupo criminoso ter ligações com membros da Polícia Civil.
Denúncia assinada pela então PGR Raquel Dodge apontou um possível mandante do crime.
Cinco pessoas foram acusadas de atrapalhar a investigação, entre elas um policial militar e um delegado federal.
Investigadores afirmam que Brazão buscava desviar o curso da apuração para longe de si e em direção ao miliciano Orlando Oliveira Araújo, conhecido como Orlando Curicica, e o vereador Marcelo Moraes Siciliano, e chegou a ser bem-sucedido nessa estratégia por cerca de um ano. Siciliano e Brazão disputam controle político na zona oeste do Rio.
A então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, argumentava que as lacunas sobre motivos do crime e os possíveis mandantes justificavam a federalização do caso, ou seja, que a investigação saísse do âmbito estadual do Rio de Janeiro e passasse à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal.
“O eventual fracasso da persecução criminal do mandante imporia a responsabilização internacional do Estado brasileiro”, afirmou Dodge à época.
O advogado de Brazão, Ubiratan Guedes, negou qualquer envolvimento do cliente nas mortes de Marielle e Anderson e classificou a denúncia da PGR de sensacionalista.
Por que Marielle entrou na mira dos criminosos?
O crime teria sido “meticulosamente planejado” nos três meses anteriores, segundo o Ministério Público fluminense. Isso significa que Marielle passou a ser um alvo antes mesmo de completar um ano como vereadora.
Segundo a denúncia, “é inconteste que Marielle Francisco da Silva foi sumariamente executada em razão da atuação política na defesa das causas que defendia”.
Ela havia sido a quinta candidata a vereadora mais votada nas eleições municipais de 2016 do Rio, com 46.502 votos, em sua primeira disputa eleitoral.
Na Câmara, era uma das relatoras de uma comissão criada em fevereiro para monitorar a intervenção federal de segurança pública no Estado do Rio. Também presidia a Comissão de Defesa da Mulher e havia proposto projetos de lei voltados à defesa de direitos de minorias e a assistência social.
Entre eles estavam a criação de espaço de acolhida de crianças durante a noite, enquanto seus pais estudam ou trabalham, uma campanha permanente de conscientização sobre assédio e violência sexual, um estudo periódico de estatísticas sobre mulher atendidas por serviços públicos da cidade, a oferta de assistência técnica gratuita em habitação para famílias de baixa renda e um dia de combate à LGBTfobia.
Giniton Lages, chefe da Delegacia de Homicídios da Capital, responsável pela investigação, afirmou que um dos acusados de participação direta no crime, Ronnie Lessa, tem “obsessão por personalidades que militam à esquerda”.
Segundo o delegado Giniton Lages (foto), um dos acusados, Lessa, tem ‘obsessão por personalidades que militam à esquerda’.
Essa interpretação foi corroborada pela promotora Simone Sibilio. Para ela, os acusados agiram por “motivo torpe” e Lessa teria matado a vereadora por “repulsa” a sua atuação política. Anderson teria sido incluído como alvo para dificultar a solução do crime.
O MP-RJ não excluiu, no entanto, que tenha havido outras motivações, nem que o crime tenha sido encomendado por outras razões.
O general Richard Nunes, secretário de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, disse ao jornal O Estado de S. Paulo, que Marielle teria sido morta a mando de milicianos. O motivo seria a crença de que a vereadora poderia interferir em interesses relacionados à grilagem de terras e construções irregulares de edifícios na zona oeste do Rio, principal área de atuação destes grupos paramilitares na cidade.
Milícias são grupos armados irregulares formados muitas vezes por integrantes e ex-integrantes de forças de segurança do Estado, como policiais, bombeiros e agentes penitenciários. E assumem por meio da força o controle territorial de áreas ou mesmo bairros inteiros e coagem moradores e comerciantes a pagarem por proteção.
Em que pé está a investigação agora?
A investigação conduzida pela Polícia Civil e pelo Ministério Público do Rio apontou dois acusados de terem participado diretamente dos assassinatos. Élcio Queiroz, que teria dirigido o carro usado no crime, e Ronnie Lessa, que teria feito os disparos.
O processo está próximo do desfecho na primeira instância da Justiça.
A fase seguinte seria voltada à busca pelos mandantes e pelos motivos do crime.
Mas menções pontuais recentes à família Bolsonaro ao longo da investigação sobre os assassinatos realimentaram os debates em torno da federalização dessas duas fases da investigação — a ideia é defendida, entre outros, pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro.
“Vendo esse novo episódio, em que se busca politizar indevidamente, na minha avaliação, claro que será decidido pela Justiça, mas o melhor caminho para uma investigação exitosa é a federalização”, disse o ministro em entrevista à rádio CBN.
Ele se referia à informação de que um porteiro afirmou à Polícia Civil que Queiroz, um dos acusados de participação direta no crime, se dirigiu à casa do então deputado federal Bolsonaro horas antes dos assassinatos — o porteiro mudou sua versão nesta semana e negou seu próprio relato.
Moro defende que investigação dos assassinatos seja federalizada
Formalmente, o pedido de federalização cabe à Procuradoria-Geral da República pedir e a decisão fica a cargo do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Há ainda outros dois aspectos que fortalecem a hipótese de federalização, que poderia envolver tanto a fase atual da investigação (sobre quem executou o crime) quando a próxima (sobre os mandantes).
O primeiro é a tentativa de interferência nas investigações apontada pela PGR. A outra é a série de divergências e conflitos entre as investigações conduzidas pela Polícia Civil e pelo Ministério Público em âmbito estadual.
Familiares de Marielle são contrários à federalização. “Nós da família estamos acompanhando o desempenho dos policiais e promotores de perto e sabemos que o trabalho realizado por eles é positivo”, afirmaram em nota.
O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, também discorda da proposta. “A Polícia Federal não tem expertise nenhuma de crime de homicídio, não tem departamento de homicídios”, disse. Para ele, a mudança traria atrasos a essa fase da investigação sobre os acusados de participação direta do crime.
Por que o porteiro mudou seu depoimento?
O caso da testemunha que citou o nome do presidente durante as investigações veio à tona em uma reportagem do Jornal Nacional veiculada no dia 29 de outubro. Segundo ela, um porteiro do condomínio Vivendas da Barra disse em depoimento à Polícia Civil fluminense que Élcio Queiroz afirmou que iria à casa que pertence ao presidente.
Ao recebê-lo na guarita, o porteiro afirmou ter ligado para casa 58 para confirmar se o visitante poderia entrar, e alguém na residência autorizou a entrada do veículo, um Renault Logan. Em dois depoimentos à Polícia Civil do RJ, o porteiro disse ter reconhecido a voz de quem atendeu como sendo a do “Seu Jair”, segundo o Jornal Nacional.
Ele explicou que acompanhou a movimentação do carro de Queiroz pelas câmeras de segurança e viu que o carro tinha ido para a casa 66, onde morava Lessa.
O porteiro disse, então, ter ligado de novo para a casa 58, e que o homem identificado por ele como sendo “Seu Jair” teria dito que sabia para onde Élcio estava indo. Além desse depoimento, o registro manuscrito de entrada trazia o número da casa de Jair Bolsonaro ao lado da placa do carro do visitante.
Polícia Federal ouviu porteiro depois que depoimento com menção ao presidente veio à tona.
Depois da veiculação da reportagem, o governo Bolsonaro pediu à Polícia Federal que ouvisse o porteiro.
Nesta quarta-feira (20), o porteiro recuou do depoimento que deu no mês anterior. Segundo o jornal O Globo, ele disse à Polícia Federal ter anotado errado o número da casa na planilha e que inventou o relato sobre “Seu Jair” para justificar o erro no registro do acesso.
Não está claro ainda se ele vai ser formalmente indiciado pela Polícia Federal sob acusação de falso testemunho.
Por que o MP não analisou a possibilidade de algum arquivo ter sido apagado do sistema de telefonia do condomínio?
No dia seguinte à veiculação da reportagem do Jornal Nacional sobre o porteiro do condomínio Vivendas da Barra, promotoras do Ministério Público do Rio de Janeiro concederam entrevista a diversos jornalistas para refutar a versão do porteiro.
A promotora Simone Sibilio, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MPRJ, afirmou na ocasião que o sistema de gravação da portaria desmente o depoimento da testemunha.
“A pessoa que está na cabine liga para casa 65, e isso está comprovado pelas gravações. E a pessoa que atende na casa 65 é Ronnie Lessa.”
A Promotoria declarou que teve acesso aos áudios no dia 15 de outubro, ou seja, cerca de duas semanas antes da reportagem do Jornal Nacional ir ao ar. Mas o jornal O Estado de S. Paulo afirma que a perícia da promotoria só foi solicitada oficialmente às 13h05 de 30 de outubro, ou seja, no dia seguinte à veiculação da reportagem da Globo.
Visão aérea do condomínio Vivendas da Barra.
Em nota, o Ministério Público nega que a “perícia foi realizada em apenas 2h30” e diz que o material começou a ser analisado no próprio dia 15, mas a conclusão foi priorizada a partir da veiculação da reportagem do Jornal Nacional.
Não está claro, também, se o sistema de interfones permite que o morador seja contatado por meio de seu telefone celular.
A condução do caso foi criticada por entidades de perícia. A Associação Brasileira de Criminalística disse ao jornal Folha de S.Paulo que, sem acesso à máquina em que os arquivos foram gravados, não é possível identificar se um arquivo foi apagado ou renomeado.
Em resposta ao veículo, as promotoras do grupo especial do MP disseram que não iriam se pronunciar porque as diligências em torno do caso estão sob sigilo.
O computador só seria apreendido no dia 7 de novembro para perícia.
Procurado pela BBC News Brasil, o Ministério Público do Rio de Janeiro não se pronunciou sobre as lacunas na investigação.
Por que Ronnie Lessa recebeu pelo celular uma foto da planilha de acessos da portaria?
Em 22 de janeiro de 2019, o Ministério Público e a Polícia Civil do Rio deflagraram a Operação Os Intocáveis, contra acusados de ligação com milícias.
Naquele mesmo dia, Ronnie Lessa recebeu de sua mulher uma foto da planilha de registro de visitantes do condomínio Vivendas da Barra com a frase “Liga para o Élcio (Queiroz)”. Lessa respondeu: “OK”.
Não está claro o motivo pelo qual ela teria enviado a imagem da planilha da portaria para o marido.
Uma das hipóteses aventadas pela polícia é de que essa imagem serviria de álibi para ambos negarem à polícia que tinham se encontrado no dia do assassinato.
Dias depois do envio do foto, Lessa e Queiroz prestaram depoimento e negaram envolvimento com o crime. Eles só seriam presos em março sob acusação formal de terem matado Marielle e Anderson. Por que a menção a Bolsonaro demorou tanto para ser investigada?
A Promotoria afirmou que a planilha de acessos ao condomínio só se tornou parte da sua investigação em outubro, quando os investigadores enfim conseguiram acessar o celular de Ronnie Lessa. O aparelho havia sido apreendido em março, mas estava bloqueado por senha desde então.
A mesma planilha já havia sido analisada pela polícia. Só que o MP diz que os policiais checaram apenas os registros ligados à casa 65/66 (de Lessa), ainda que o nome “Élcio” e a placa do carro que ele usava estivessem registrados ali para a casa 58 (de Bolsonaro).
Foi só quando a imagem no celular de Lessa veio à tona que o Ministério Público diz ter se dado conta da menção à casa do presidente. E assim, como o cargo de presidente tem foro privilegiado, a promotoria teve então de informar o Supremo Tribunal Federal sobre o caso.
Ao jornal Folha de S.Paulo, o procurador-geral da República, Augusto Aras, afirmou que o episódio é um “factoide” e descartou a mudança de foro.
Dois dias depois que o porteiro mudou sua versão, Moro afirmou que o envolvimento do nome do presidente na investigação é “um total disparate”.
O presidente Bolsonaro estava em Brasília no dia do assassinato de Marielle e Anderson. Os registros da Câmara dos Deputados provam isso. Sendo assim, ele argumenta que seria impossível que ele tivesse em casa para autorizar a entrada de Queiroz no condomínio.
Ouvido pela polícia, o acusado Élcio Queiroz também negou ter se dirigido à casa do presidente e atribuiu a informação a um erro de registro do porteiro.
A menção a Bolsonaro ainda faz parte das investigações?
Em sua defesa, Bolsonaro também passou a acusar o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, de manipular a investigação do assassinato de Marielle para tentar destruir sua reputação.
“Acabaram as eleições e ele botou na cabeça que quer ser presidente. Direito dele e de qualquer um de vocês. Mas ele também botou na cabeça destruir a reputação da família Bolsonaro. A minha vida virou um inferno depois da eleição do senhor Wilson Witzel, lamentavelmente”, afirmou.
Witzel negou as acusações e disse que vai processar Bolsonaro. “São acusações levianas. Ele está acusando um governador de Estado de manipulação. A polícia do Rio de Janeiro é independente. O senhor Bolsonaro passou dos limites”, disse o governador.
Bolsonaro também reagiu a citações na investigação ao nome de seu filho Carlos, que também mora no condomínio Vivendas da Barra.
Nas últimas semanas, a Polícia Civil fluminense ampliou as buscas por testemunhas de um bate-boca entre o filho do presidente, que é vereador do Rio de Janeiro, e um assessor de Marielle Franco em 2017. Os gabinetes eram vizinhos no nono andar da Câmara.
Presidente afirmou que há uma tentativa de implicar o filho Carlos (à dir.) na investigação do caso
O parlamentar se irritou quando ouviu um assessor da vereadora afirmar em conversa no corredor da Casa que o filho do presidente era fascista.
Carlos Bolsonaro já havia prestado depoimento à polícia sobre o episódio em abril de 2018 na condição de testemunha. Segundo ele, a própria Marielle, com quem disse ter um relacionamento “respeitoso e cordial”, interveio para acalmar os ânimos, encerrando a discussão.
Para Bolsonaro, o novo interesse da polícia na discussão mostra que agora “tentam envolver o Carlos” no assassinato e o filho seria um “imbecil” se tivesse recebido em sua casa um dos acusados do crime.
Segundo o presidente, “parte de alguns no Brasil quer jogar para cima de mim a possibilidade de eu ser um dos mandantes do crime da Marielle”.
O advogado Eduardo Goldenberg deu uma pista nesta sexta-feira (22) sobre uma “bomba” que promete sacudir Brasília em breve. O assunto tem sido comentado nos bastidores e compartilhado por figuras como o jornalista Ricardo Noblat, da Veja, e parece envolver a presença de uma terceira pessoa no carro usado para assassinar a vereadora Marielle Franco, em 14 de março de 2018.
Goldenberg, que ficou conhecido por revelar a ação do Ministério Público que condenava uma funcionária da Receita Federal por desaparecer com o processo contra a Globopar, tem usado o Twitter nos últimos dias para comentar sobre uma informação que estaria fazendo o “chão tremer” no Distrito Federal e, pela primeira vez, adiantou o furo.
“Vai ter gente achando que eu tô brincando. Mas atenção: quem era o 3º elemento dentro do carro de onde saíram os disparos que mataram Marielle Franco?! Preparem-se: 💣💣💣💣💣”, publicou. Ricardo Noblat, da Veja, deu retuíte na mensagem.
As investigações realizadas até agora apontam que estavam no carro Élcio Queiroz e Ronnie Lessa.
Hipótese nova é considerada nos bastidores da investigação
Nos bastidores das linhas de investigação sobre os assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, a Polícia Civil do Rio trabalha com uma hipótese nova, a de envolvimento do vereador Carlos Bolsonaro no caso.
Segundo essa linha de investigação, Carlos Bolsonaro teria relação próxima com Ronnie Lessa, conhecido assassino profissional do Rio acusado de ter disparado contra Marielle e Anderson.
Carlos Bolsonaro e Marielle Franco tiveram discussão pública na Câmara Municipal. Há relatos de que o vereador se recusava a entrar no elevador se a vereadora estivesse dentro. Existia um claro clima de hostilidade entre os dois. A polícia trata com cautela essa hipótese, mas ela faz parte das apurações de um caso que está há 616 dias sem solução.
Para quem não sabe ou nunca prestou atenção, um passo largo corresponde a um metro, o que significa que Bolsonaro não só morava no mesmo condomínio, como na mesma rua e a 50 metros de Ronnie Lessa, o assassino de Marielle. Ou seja, a 50 passos.
Como foi dito pela Folha, “da varanda da casa de Ronnie é possível ver o quarto da filha de Bolsonaro,”
O filho mais novo de Bolsonaro namorou a filha de Ronnie Lessa, mas ele jura de pés juntos que não tinha a menor ideia de quem é o miliciano, nunca tinha visto e nem ouvido falar.
Isso, para uma pessoa comum, já não seria verossímil, mas no caso de Bolsonaro é uma história que não desce pela goela de ninguém. E a coisa começa a assumir aspectos mais relevantes quando Bolsonaro encena o desconhecimento de um miliciano sendo ele, praticamente, um paraninfo da milícia carioca.
Ninguém chegaria de graça a uma conclusão de que ele está de alguma forma envolvido com o assassino de Marielle. Afinal, Queiroz, o seu faz tudo, que Bolsonaro fez o possível para que não fosse encontrado, é miliciano e amigo dele há 35 anos. Empregou nos gabinetes da família um número incontável de parentes de milicianos ou os próprios como laranjas.
É uma rachadinha? Sim, mas com contornos mais criminosos que o habitual. Afinal de contas, a teta que brindava a família Bolsonaro, não brindava laranjas comuns, mas milicianos. Sem falar que Bolsonaro, assim como seus filhos, nunca escondeu de ninguém que não só admirava como também defendia as práticas das milícias. Estão no youtube vários vídeos de Bolsonaro exaltando as milícias.
Não se sabe na história da política brasileira de alguém que tenha condecorado tantos milicianos como os Bolsonaro. Mas num engodo daqueles impossíveis de engolir, ele diz que justamente Ronnie Lessa, o assassino de Marielle, adversária política da família, do Psol, partido que sempre combateu as milícias, Bolsonaro diz não saber de quem se trata.
Pois bem, tente contar essa história para uma criança de 5 anos e vê se ela acredita numa barbaridade dessa.
O ex-policial Élcio Queiroz entrou 12 vezes no condomínio Vivendas da Barra e, em 11 das visitas, se dirigiu à casa de Ronnie Lessa – o outro suspeito de ter assassinado Marielle Franco. A única exceção é a entrada no dia do crime, 14 de março, quando a planilha manuscrita indica que a autorização de acesso na portaria foi dada por alguém da casa 58, onde vivia o atual presidente Jair Bolsonaro.
“O ex-policial militar Élcio Queiroz, acusado de participação no assassinato de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, entrou ao menos 12 vezes no condomínio Vivendas da Barra de janeiro a outubro do ano passado —a vereadora do PSOL foi morta em março. Apreendidas pela Polícia Civil e analisadas pela Folha, as planilhas de controle de acesso indicam que, em 11 dessas visitas, Élcio sempre teve como destino a casa 65, de Ronnie Lessa, policial militar aposentado também acusado e preso pelo crime”, aponta reportagem de ítalo Nogueira e Marina Lang, na Folha de S. Paulo.
“A única exceção é a entrada no dia do crime, 14 de março, quando a planilha manuscrita indica que a autorização de acesso na portaria foi dada por alguém da casa 58, onde vivia o atual presidente Jair Bolsonaro, então deputado federal. Essa menção ao imóvel do presidente passou a ser alvo de averiguação no mês passado, quando um dos porteiros declarou à polícia que o ex-PM Élcio entrou no condomínio naquele dia após autorização do “seu Jair”, da casa 58″, aponta o texto.
No caso Marielle o que mais intriga é a livre circulação de milicianos e traficantes de armas no condomínio do presidente da república sem o GSI desconfiar de nada. Justo a pasta comandada pelo General Heleno.
O castelo de cartas fica mais sombrio quando se lembra que Ronnie Lessa, o assassino de Marielle e vizinho de Bolsonaro, só foi preso em 12 de março de 2019, ou seja, um ano depois da morte de Marielle e Anderson.
Bolsonaro foi eleito em 28 de outubro de 2018 e não se tem notícia do GSI ter impedido o fluxo de milicianos no condomínio de residência do já Presidente da República Jair Bolsonaro.
Essa constatação fica ainda mais curiosa quando se lembra que o mesmo Bolsonaro havia sofrido em Juiz de Fora, segundo ele, um atentado, uma facada desferida por um suposto lobo solitário que mirou a faca em seu abdome por um motivo que até hoje ninguém sabe.
Ora, que essa horda de fanáticos que orbita o bolsonarismo fundamentalista não questione isso, é normal, mas convenhamos, esse capítulo da história que envolve a morte da Marielle, o condomínio de Bolsonaro e os milicianos é uma clássica fotografia de uma história sem pé nem cabeça. É daquelas histórias que faltam enormes pedaços e remendos e que os fatos por si só cobram uma explicação minimamente plausível que demonstre algo razoável para justificar a gigantesca lacuna que está aí se alimentando da falta de questionamentos.
Não me parece que o GSI deixe o Presidente da República ao relento de forma tão vulnerável a ponto de conviver, em seu próprio condomínio, com o entra e sai de milicianos assassinos frios e calculistas, traficante de armas pesadas, como também foi revelado pela Polícia Civil que apreendeu 117 fuzis e munições a balde de propriedade de Ronnie Lessa, vizinho de Bolsonaro.
Não é possível tanta negligência de um Gabinete de Segurança Institucional, comandado por um general que é o braço direito de Bolsonaro, o que cristaliza uma interrogação ainda maior. Ninguém pode se antecipar a fatos pitorescos como esse sem a conclusão de uma investigação. Um fato como esse não pode ficar perdido no mundo das lendas, refugiado numa cortina de fumaça.
Outra coisa curiosa, é um general tão tagarela quanto o Augusto Heleno, não se pronunciar sobre qualquer coisa que se refira ao caso Marielle, aos milicianos e às acusações que pesam cada vez mais sobre os ombros de Bolsonaro no possível envolvimento no caso.
A Associação Brasileira de Imprensa apresentou uma notícia-crime ao Supremo Tribunal Federal contra o presidente Jair Bolsonaro por suposta obstrução à Justiça nas investigações da morte da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.
A ação foi ajuizada depois que o presidente afirmou ter pego as gravações da portaria de seu condomínio no Rio de Janeiro para constatar que não autorizou a entrada de um dos suspeitos do crime.
A Associação Brasileira de Imprensa apresentou uma notícia-crime ao Supremo Tribunal Federal contra o presidente Jair Bolsonaro por suposta obstrução à Justiça nas investigações da morte da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.
A ação foi ajuizada depois que o presidente afirmou ter pego as gravações da portaria de seu condomínio no Rio de Janeiro para constatar que não autorizou a entrada de um dos suspeitos do crime.
Isso porque, a TV Globo divulgou o depoimento de um porteiro do condomínio, onde mora Bolsonaro e Ronnie Lessa, acusado de atirar contra Marielle e Anderson. No dia do crime, segundo o porteiro, o segundo suspeito, Élcio Queiroz, foi ao condomínio e pediu para ir à casa 58, que pertence ao presidente.
O porteiro disse que interfonou e o “seu Jair” autorizou a entrada. Élcio Queiroz, porém, acabou indo à casa 66, onde morava Ronnie Lessa. No dia dos fatos, Bolsonaro estava em Brasília participando de uma sessão na Câmara dos Deputados.
Após a divulgação da reportagem, o presidente afirmou que teve acesso às gravações de ligações do interfone do condomínio e que ninguém na casa 58 autorizou a entrada de Élcio Queiroz. O filho dele, Carlos Bolsonaro, também publicou no Twitter a relação de áudios da portaria no dia da morte de Marielle e Anderson.
Por isso, a ABI acionou o STF contra Bolsonaro e Carlos, alegando que eles “acessaram, em data ainda imprecisa, por meios impróprios, elementos probatórios de uma investigação criminal sigilosa e em andamento, os quais poderiam elucidar o iter criminis percorrido pelos principais suspeitos do assassinato”.
A associação diz que a conduta do presidente e seu filho “carece de investigação”. Segundo a ABI, “é imperioso verificar quando e de que modo ocorreu o acesso” às gravações da portaria, e também se a Polícia Civil já havia realizado a coleta e perícia dos áudios, “o que até o momento segue sem razoáveis esclarecimentos”.
A ABI é representada pela advogada Luisa Capanema Vieira, do escritório Luis Guilherme Vieira Advogados Associados. A petição foi distribuída por prevenção ao ministro Alexandre de Moraes, que também é o relator de uma queixa apresentada por parlamentares do PT envolvendo os mesmos fatos.
Moraes também é o relator de uma terceira petição que pedia a inclusão do porteiro no programa de proteção a testemunhas. O pedido foi feito pelo Instituto Anjos da Liberdade depois que o ministro da Justiça Sérgio Moro solicitou que a Procuradoria-Geral da República investigasse o porteiro por ter envolvido o nome do presidente nas investigações do caso Marielle Franco.
“O pedido é manifestamente incabível. Nos termos do restrito rol do artigo 102, inciso I, da Constituição Federal, não há previsão fixando a competência desta Corte para conhecer de medida cautelar nos moldes pretendidos pelo peticionário. Em verdade, esse tipo de pedido pretende transformar este Supremo Tribunal Federal em instância revisora de atos praticados dentro da competência legal atribuída ao Ministério da Justiça e da Segurança Pública, nos termos do artigo 37 da Lei 13.844/2019”, disse o ministro.
Hoje, deparei-me no twitter com hashtag #Carlostemrazao.
Curioso, fui ver o que era, afinal, também me chamo Carlos.
Entrando, vi que foi um pombo criado por Eduardo Bolsonaro com a seguinte mensagem:
“COMO SER ODIADO?
Absolutamente todos os vagabundos e traíras foram, antes de descobertos, apontados por Carlos como tais.
Seu faro para pilantra e vagabundo nunca pode ser desprezado. Dá para escrever um livro só com as trairagens. #CarlosTemRazao”
Fui no google para ver sinônimos de vagabundo e encontrei bandido e este me mostrou outros sinônimos como: malfeitor, assaltante, bandoleiro, cangaceiro, criminoso, delinquente, facínora, ladrão, marginal, pirata, pistoleiro, salteador, sequestrador.
Eu acho que o assassino de Marielle, Ronnie Lessa, que é vizinho de Carluxo no condomínio Vivendas da Barra, enquadra-se nesse leque de adjetivos.
Talvez pela proximidade quase umbilical da família Bolsonaro com milicianos tenha feito Carluxo olhar, mas não farejar perigo morando ao lado de um, que por acaso também é traficante de armas e foi apontado como o assassino de Marielle e Anderson.
Talvez seja também porque, no mundo da milícia, todos tenham o mesmo cheiro e como Carluxo, praticamente, cresceu convivendo com o miliciano Queiroz, o faz tudo de seu pai há 35 anos, fora as inúmeras condecorações que a família já deu a milicianos, assim como empregos laranjas nos gabinetes do quarteto Bolsonaro, Jair, Flávio, Eduardo e o próprio Carluxo, ele achou em seu faro fino que o cheiro de Ronnie Lessa era familiar e, então, deu de ombros.
Convenhamos, com um vizinho desses, que tudo indica é pai de uma menina que namorou o seu irmão mais novo, não dá para ignorar o faro, ele está debaixo do nariz. Além disso, o porteiro disse que, quando interfonou para o Seu Jair, perguntando se poderia permitir a entrada de Élcio Queiroz que participou do assassinato de Marielle, ele não foi para a casa 58 de Seu Jair, mas para a casa de Ronnie Lessa. O que chamou a atenção do porteiro pelas câmeras internas, ligando novamente para o Seu Jair que, por sua vez, disse a ele que sabia para onde Élcio estava indo.
Bom, se Carluxo não farejou o Ronnie Lessa, farejou o perigo que Bolsonaro corria com a memória da secretária eletrônica da portaria, correndo para pegá-la e não se sabe se adulterou, mas buliu em todo o arquivo.
Dito isso, fica a pergunta: Carluxo não farejou Ronnie Lessa, seu vizinho no condomínio porque não o considera bandido ou toda vez que entra no condomínio Vivendas da Barra, seu nariz entope e perde o seu faro demolidor?
São essas coisas que têm que ser esclarecidas, senão dá a entender que o faro de Carluxo para encontrar bandidos é seletivo.
Em 22 de janeiro de 2019, o celular do ex-policial militar Ronnie Lessa piscou: surgiu na tela uma foto do livro de visitas ao condomínio Vivendas da Barra, na Barra da Tijuca, no Rio, onde ele morava. Lessa estava em liberdade, mas já era suspeito de matar a vereadora carioca Marielle Franco, em 14 de março do ano anterior. A foto no celular, enviada pela mulher de Lessa, Elaine, mostra um registro manuscrito de que, na tarde do fatídico 14 de março, Élcio de Queiroz, também acusado pelo assassinato de Marielle, estivera no condomínio e pedira na portaria para ir à casa 58, onde morava o então deputado federal Jair Bolsonaro. A imagem poderia ser importante para a defesa da dupla Lessa/Queiroz, pois contradiz os termos da acusação do Ministério Público, segundo a qual quem recebeu a visita de Queiroz naquela tarde foi Ronnie Lessa. Ou seja, os promotores sustentam que o visitante foi à casa 65/66, a casa de Lessa. De lá, segundo a denúncia, os dois saíram para matar Marielle. O conteúdo da mensagem enviada por Elaine ao marido tumultuaria a já tumultuada investigação do caso Marielle.
Nesse meio tempo, porém, a foto com as informações do livro de visitas do condomínio ficou esquecida no telefone de Lessa – até os primeiros dias de outubro, quando as promotoras responsáveis pela investigação do assassinato tomaram conhecimento dela. Lessa e Queiroz sempre haviam negado ter se encontrado no condomínio no dia do crime. A foto reforçava essa versão: segundo a imagem do livro, Queiroz fora visitar Bolsonaro, não o comparsa.
Lessa e Queiroz foram presos em março deste ano, acusados pelas mortes de Marielle Franco e Anderson Gomes. Por que demorou tanto tempo para as promotoras tomarem conhecimento da foto? Porque os peritos da Polícia Civil levaram sete meses – entre março de 2019, quando o telefone foi apreendido, e outubro – para conseguirem quebrar a senha do celular de Lessa. No dia 1º de outubro, a TV Globo teve acesso ao livro de registro de entradas e saídas do condomínio Vivendas da Barra, dando início a uma investigação feita pelos repórteres da emissora, segundo nota do diretor-geral de jornalismo da Globo, Ali Kamel, divulgada esta semana. Ao ser levada ao ar pela emissora, 28 dias depois, a investigação dos repórteres sobre quem Élcio Queiroz fora visitar naquele 14 de março traria ainda mais dúvidas sobre um inquérito policial que já colecionava mais perguntas do que respostas.
No dia 4 de outubro, Lessa e Queiroz mudaram suas versões pela primeira vez desde que foram presos e acusados pelo crime, em março de 2019. Admitiram, em audiência judicial, que estiveram juntos no dia do assassinato de Marielle, no Vivendas da Barra, e que, de lá, saíram para assistir pela tevê ao jogo do Flamengo contra o Emelec do Equador, num bar próximo. Continuaram a negar, porém, a autoria do crime. A reportagem da piauí assistiu aos depoimentos de Lessa e Queiroz, concedidos por videoconferência do presídio federal de Porto Velho, ao juiz Gustavo Gomes Kalil. Mais magros, eles demonstraram segurança nas respostas ao juiz. Ao final, Lessa mandou um beijo para a advogada, que assistia ao depoimento no Rio.
Estimulado pela foto do livro de visitas do condomínio encontrada no telefone de Lessa, o Ministério Público obteve autorização judicial e apreendeu o livro original da portaria do Vivendas da Barra no dia 5 de outubro. Dois dias mais tarde, o síndico do condomínio entregou voluntariamente à polícia, em um CD-ROM, as gravações das conversas mantidas entre a portaria e as casas dos moradores entre janeiro e março de 2018. Naquele mesmo 7 de outubro, o porteiro responsável pela anotação do dia 14 de março de 2018 foi ouvido pela primeira vez pela Polícia Civil e repetiu o que anotou: Queiroz procurou por “seu Jair” na casa 58, e o “seu Jair” atendeu. Indagado novamente no dia 9, o porteiro reiterou o depoimento anterior. Naquele mesmo dia, o governador do Rio, Wilson Witzel, encontrou-se com Bolsonaro durante uma festa de aniversário em Brasília e, segundo o presidente, disse a ele que seu nome fora citado nas investigações do caso Marielle. Witzel nega.
No dia seguinte, 10, o procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, e a promotora do caso, Simone Sibilio do Nascimento, levaram o caso ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, onde tramitaria eventual investigação contra o presidente da República. Segundo nota encaminhada à piauí pela assessoria do Ministério Público, isso foi feito porque, “a partir do momento em que foi citada uma autoridade com foro de prerrogativa de função, nenhuma diligência que tangencie o depoimento do porteiro pode ser adotada até a manifestação do STF”.
A versão de que um porteiro do condomínio citara Bolsonaro, levando o caso ao Supremo, começou a se espalhar pelas redações. Segundo Kamel, no meio da apuração, “uma fonte absolutamente próxima da família do presidente Jair Bolsonaro procurou a emissora para dizer que ia estourar uma grande bomba”, porque a investigação esbarrara num personagem com foro privilegiado. “Por que uma fonte tão próxima ao presidente nos contava algo que era prejudicial ao presidente? Dias depois, a mesma fonte perguntava: A matéria não vai sair?”, questiona Kamel na nota.
Em 29 de outubro, o Jornal Nacional, da Rede Globo, tornou público o conteúdo do depoimento de um dos porteiros do condomínio à Polícia Civil e ao Ministério Público. A reportagem destacou que, naquele 14 de março, dia do assassinato de Marielle, Bolsonaro não estava no Rio, mas em Brasília.
Em 30 de outubro, Bolsonaro atingiu seu recorde diário de menções no Twitter durante o mandato presidencial, 1,6 milhão. Naquela manhã, como reação à reportagem do JN, o vereador Carlos Bolsonaro divulgou dois vídeos, o primeiro às 6h42 e o segundo às 9h26, ambos exibindo a tela do computador da administração do condomínio, com a relação de ligações telefônicas feitas da portaria do Vivendas da Barra. No primeiro vídeo, o áudio exibido confere com a duração em segundos que consta no nome do arquivo, conforme conclui perito aposentado da Polícia Civil do Distrito Federal ouvido pela piauí. Nele, Carlos toca o áudio da chamada entre a portaria e a casa de Ronnie Lessa, autorizando a entrada de Queiroz no dia 14 de março (https://twitter.com/CarlosBolsonaro/status/1189537947881746442).
Já o segundo vídeo, com áudios feitos naquela mesma tarde da portaria para a casa 58 (de Jair Bolsonaro) e a 36 (de Carlos), é inconclusivo, porque Carlos editou o trecho inicial dos áudios, que não conferem com a duração que consta no nome dos arquivos (https://twitter.com/CarlosBolsonaro/status/1189579300116279296).
O áudio com a chamada para a casa 58 tem 11 segundos, quando a planilha informa que demorou 29; e o áudio da ligação para a casa 36 tem 12 segundos, quando, segundo a planilha, deveria ter 27. Para o perito aposentado, há “incongruência” no vídeo. Mas ele ressalta que uma análise definitiva só é possível a partir da perícia do computador da portaria.
Procurado pela piauí, o Ministério Público não se pronunciou sobre os vídeos de Carlos Bolsonaro. Em nota, a assessoria do órgão informou apenas que “qualquer questão envolvendo o processo […] pode ser sanada em consulta aos autos junto ao Tribunal de Justiça”. O gerente do condomínio não foi localizado.
Os vídeos de Carlos Bolsonaro, o depoimento do porteiro, a demora em analisar os áudios das ligações da portaria e por que a foto do livro de visitas do condomínio foi parar no celular de Ronnie Lessa são alguns dos pontos obscuros que, nos últimos dias, complicaram a investigação sobre a morte de Marielle Franco e colocaram na berlinda a atuação do Ministério Público.
Somente depois que a Rede Globo divulgou o caso, no dia 29, é que o Ministério Público do Rio pediu perícia nas gravações que constam do CD-ROM entregues à polícia pelo condomínio – mas não no computador do Vivendas da Barra, onde constam as gravações originais. Com base no parecer da perícia, as promotoras do caso, Carmen Eliza Bastos de Carvalho, Simone Sibilio do Nascimento e Letícia Emile Alqueres Petriz, em entrevista coletiva, desqualificaram o depoimento do porteiro, dizendo que ele mentiu ao afirmar que Queiroz procurou por Jair Bolsonaro na portaria – segundo os peritos, os áudios mostram que foi Lessa quem atendeu à chamada do porteiro naquele dia.
No entanto, ao deixar de analisar os arquivos do computador do condomínio, a perícia do Ministério Público ignorou a hipótese de algum arquivo ter sido apagado ou renomeado antes de ser entregue à polícia. O presidente Jair Bolsonaro, por sua vez, tumultuou ainda mais o caso ao anunciar no sábado, 2 de novembro, que pegou os áudios da portaria antes que os arquivos fossem “adulterados”.
Para tornar o caso ainda mais complexo, o porteiro que anunciou a presença de Élcio Queiroz para Ronnie Lessa naquele 14 de março de 2018 não é o mesmo que deu depoimento implicando Bolsonaro. Revelada pelo jornalista Lauro Jardim em O Globo, a informação coincide com a dinâmica de funcionamento da portaria, segundo moradores: a cada turno de trabalho, o chefe do serviço é o encarregado de anotar as visitas no livro, enquanto um auxiliar interfona para as casas. Esse segundo porteiro deve ser ouvido pelo Ministério Público nos próximos dias.
Não está claro por que o chefe da portaria – que está de férias e mora na Zona Oeste do Rio, área de atuação da milícia – anotou no livro de visitas que Queiroz ia para a casa 58, se o visitante foi para outra residência. Várias hipóteses são consideradas: 1) o porteiro realmente ouviu isso de Queiroz, e portanto não mentiu; 2) o porteiro se atrapalhou no dia da visita e, para não admitir o erro, citou Bolsonaro no depoimento; 3) o porteiro foi pressionado por pessoas ligadas à milícia a citar Bolsonaro no livro e no depoimento com o objetivo de levar o caso ao Supremo Tribunal Federal, onde a tramitação é mais lenta do que na primeira instância.
Se o porteiro mentiu, ainda não se sabe o motivo. Mas há uma convergência de fatos nos primeiros dias de outubro, quando a foto do livro de visitas, guardada no celular de Lessa, caiu nas mãos da perícia. Foi aí que Lessa e Queiroz mudaram sua versão e admitiram ter se encontrado no Vivendas da Barra no dia do crime. É possível que já soubessem que a foto do livro do condomínio, mesmo com uma anotação questionável, indicaria o contrário e tumultuaria a investigação.
Para as promotoras, o porteiro mentiu. A atuação delas também tem sido criticada e foi contestada internamente no Supremo, já que o foro competente do inquérito que investiga a morte de Marielle é o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, e não o órgão máximo de Justiça do país. Toffoli alertou os membros do Ministério Público sobre isso. A promotoria cometeu ainda um segundo erro ao não informar o procurador-geral da República, Augusto Aras, do caso.
Essa interpretação foi confirmada pelo especialista em direito administrativo Adilson Dallari, professor na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. “Elas [promotoras] extravasaram a competência delas, agiram de maneira que não é permitida pelas leis que disciplinam a atuação do Ministério Público”, afirmou Dallari. Por ser, em seu entendimento, uma conduta funcional irregular, o Conselho Superior do Ministério Público poderá abrir um processo administrativo contra os integrantes envolvidos, o que poderia levar a absolvição, advertência, suspensão ou mesmo perda do cargo, a depender da gravidade atribuída aos servidores.
Para o professor, contudo, o mais grave é o vazamento de parte do inquérito sigiloso, que também deveria ser investigado, e os responsáveis, penalizados. Aras arquivou o caso quando este chegou à PGR e desmereceu o depoimento do porteiro que citava Bolsonaro. Nos bastidores do STF, porém, há cautela na interpretação de que o porteiro simplesmente mentiu.
O fato de Carmen Carvalho, uma das promotoras do caso, ter publicado fotos em apoio a Bolsonaro nas redes sociais, durante a última campanha eleitoral, conforme revelou o site The Intercept, trouxe ainda mais dúvidas sobre a conduta do Ministério Público. Carvalho acabou afastada do caso na sexta-feira, 1º de outubro. Para o professor Adilson Dallari, o afastamento “foi prudente, até para tirar o foco, e é medida cautelar recomendável nessas situações”.