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Emir Sader: A direita latino-americana apodrece

O retorno eufórico da direita a governos latino-americanos produziu a derrota espetacular, o estado de exceção de Lenin Moreno no Equador, para tentar conter a ira popular contra o seu pacote neoliberal, a projeção de Bolsonaro como o mais ridículo, caricato e grotesco chefe de Estado do mundo. Esses eram os personagens que iriam recolocar as economias dos nossos países na linha, sanear as finanças públicas, recuperar o prestígio internacional dos nossos países, terminar com a corrupção, superar os governos populistas e fazer nossos países chegarem à estabilidade, o desenvolvimento e o bem-estar social.

Passou pouco tempo, até que os personagens heroicos da restauração neoliberal sejam personagens grotescos, ridicularizados – Macri, Lenin Moreno, Bolsonaro. Quem dá algo por eles? Quem acredita que o Macri vai virar o resultado das eleições na Argentina? Quem acredita que o Lenin Moreno vai se safar da crise equatoriana atual? Quem acredita que o futuro do Brasil é o Bolsonaro?

A direita tomou o governo de países que tinham sido recuperados por governos populares, fazendo com que voltassem a crescer, que passassem a distribuir renda, a ter boas relações de cooperação com seus vizinhos, a conseguir estabilidade política, convivência pacifica e democrática entre as forcas políticas, sociais e culturais, a fazer respeitar o Estado por suas políticas de governar para todos e garantir os direitos de todos. Basta olhar qual é a situação de países como Argentina, Brasil, Equador, entregues à recessão, ao desemprego, à perda de apoio e de legitimidade dos seus governos, a poucos anos de que presidentes de direita voltaram, para nos darmos conta de para que a direita fez todos os esforços, legais e ilegais, para brecar os governos de esquerda e voltar à presidência desses países.

O que era o Equador de Rafael Correa e o que se tornou nas mãos de alguém eleito em base ao sucesso de Correa, para trair a tudo com o que tinha sido eleito, fazendo o que a direita queria e jogar o país na beira do abismo, com ocupação militar das ruas do país.

O que era o Brasil do Lula, país respeitado no mundo todo, com um presidente que terminou seu mandato com 80% de referências negativas na mídia, mas com 87% de apoio da população. O Brasil crescia e distribuía renda ao mesmo tempo. E o que é o pais nas mãos de um presidente a quem ninguém respeita, que tirou o país da miséria e da violência desenfreada.

Da mesma forma que Nestor e Cristina resgataram a Argentina da pior crise da sua história, fizeram o país voltar a se desenvolver e a gerar empregos. Como conseguira superar o endividamento com o FMI e a voltar a ser um país respeitado no mundo. Em comparação com o país que o Macri não tem vergonha de entregar de volta para as forças democráticas, um país que cumpre três anos de estagflação, com o povo entregue à miséria e à fome.

Mas há uma lógica, ainda que perversa, nessa loucura que a direita promove nesses países e quer fazer em outros. Seu objetivo é, antes de tudo, buscar tirar legitimidade e apoio popular das lideranças populares mais importantes que esses países tiveram. Esses líderes foram transformados nos principais inimigos das oligarquias locais e da política norte-americana, porque eles conquistaram a confiança dos seus povos e o prestigio internacional, com políticas que privilegiam processos de integração regional e não os tratados de livre comércio com os EUA.

Em segundo lugar, para substituir políticas econômicas que privilegiam o desenvolvimento do mercado interno de consumo de massa, pelo retorno das políticas de ajuste fiscal, que promovem os interesses do capital financeiro. Retomam o modelo neoliberal, vigente no capitalismo mundial, apesar de ter levado as grandes potências a uma profunda e prolongada recessão. Substituir o modelo antineoliberal é terminar com um exemplo de política econômica alternativa, que prova que não há um único caminho, como o consenso de Washington e o pensamento único tratam de impor.

A direita latino-americana retomou os governos de países como a Argentina, o Brasil, o Equador, e demonstrou que não aprenderam nada do seu fracasso anterior e do sucesso dos governos antineoliberais. Fracassam de novo, fracassam melhor, fracassam maus, são e serão derrotadas de novo, também no Brasil.

 

 

*Do 247

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Cartas a Lula: ”escritas por muitas mãos e lidas por muitas vozes”

Projeto coletivo apresentado na UMET, Argentina. “São cartas escritas por muitas mãos, lidas por muitas vozes e incorporadas em muitos corpos”.

A frase de Gabriela Diker é uma síntese perfeita de Cartas a Lula, o projeto coletivo da Universidade Nacional do General Sarmiento (UNGS) dentro da reivindicação pela libertação imediata do ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, apresentado na Aula Magna da Universidade Metropolitana de Educação e Trabalho (UMET), no bairro de Balvanera, em Buenos Aires.

O trabalho consiste em uma série de dez podcasts que ocupam, na voz de referentes de cultura, educação e política, algumas das mais de 15 mil cartas que o povo brasileiro escreveu a Lula após sua detenção injusta no dia 7. Abril 2018.

 

*Do Página 12, Argentina – via Carta Maior

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Bolsonaro repete os ditadores Melgarejo e Galtieri e ameaça enfrentar a França e o G7. É guerra?

Bolsonaro, o filho Eduardo e o general Villas Boas, ex-comandante do Exército, resolveram falar grosso com o presidente francês e com os líderes do G7 em nome da “soberania” brasileira. Parece um decalque dos ditadores Mariano Melgarejo, boliviano, e Leopoldo Galtieri, argentino – este o grande comandante da Guerra das Malvinas.

Quando li as fanfarronices de Bolsonaro, insultando o presidente da França, Emmanuel Macron, e desafiando o G7 – ou seja, peitando as sete nações mais poderosas do mundo – lembrei-me de um inesquecível, patético personagem da história boliviana.

Mariano Melgarejo

Refiro-me ao general Mariano Melgarejo, ditador da Bolívia em meados do século dezenove, que costumava decapitar pessoalmente seus adversários políticos. Com o país mergulhado em profunda crise econômica e social, Melgarejo decidiu distrair a atenção dos bolivianos declarando guerra à Inglaterra. Como primeiro – e único – ato do estado de guerra, Melgarejo expulsou o embaixador inglês, obrigando-o a deixar a Bolívia montado de costas sobre o lombo de um burro. Indignada com a ousadia, a rainha Vitória rompeu relações com a Bolívia e mandou apagar o país de todos os mapas-múndi impressos na Inglaterra – peças que se tornaram objeto da cobiça de colecionadores de raridades.

Ao contar a um amigo, historiador de mão cheia, a comparação entre Bolsonaro e Melgarejo, ele me corrigiu:

– Nada disso. Ao desafiar a França e o G7, Bolsonaro lembra mais o general argentino Leopoldo Galtieri, ditador que no começo doa anos 80 declarou guerra à mesma Inglaterra, desta vez para recuperar as Ilhas Malvinas.

Bingo! Em abril de 1982 o general Galtieri (que dera um golpe no general Eduardo Viola, que dera um golpe no general Jorge Videla, que dera um golpe em Isabelita Perón) governava uma Argentina quebrada e com as ruas tomadas por massas de trabalhadores famintos que destruíam ônibus, incendiavam veículos oficiais e saqueavam supermercados.

Acuado, Galtieri teve um verdadeiro estalo de padre Vieira. Decidiu dirigir o ódio popular para um sentimento muito caro aos argentinos: o nacionalismo. Foi então que em abril de 1982 Leopoldo Galtieri – que além de fascista era, como Melgarejo, dado a porres oceânicos – declarou guerra à Inglaterra, a pretexto de recuperar o arquipélago das Malvinas, território argentino ocupado pelo Reino Unido desde 1833.

Deu no que deu. Apoiada por Ronald Reagan, a premiê britânica Margareth Tatcher pulverizou as tropas argentinas que haviam ocupado as Malvinas (ou Falklands, para os ingleses). Em menos de dois meses as Malvinas foram retomadas pela Inglaterra, deixando para trás cerca de 700 soldados argentinos mortos e milhares de prisioneiros. Em junho a guerra acabou e o general Leopoldo Galtieri foi derrubado.

As últimas reações de Bolsonaro, de seus filhos e do general Villas Boas, ex-comandante do Exército, indicam que eles podem estar querendo atiçar o sentimento nacionalista dos brasileiros para esquecermos dos gravíssimos problemas que assaltam o Brasil.

Como declarou muito apropriadamente o ex-chanceler Celso Amorim, colunista do Nocaute, “a preservação da Amazônia é um objetivo global e uma responsabilidade nacional. Não há incompatibilidade entre a preservação do meio ambiente e a defesa da soberania.”

Espera-se que Bolsonaro e o general Villas Boas – nacionalistas de araque, que estão entregando as riquezas brasileiras ao capital privado – conheçam um pouco da história da Bolívia e da Argentina e não cometam a asneira de inventar uma guerra contra França. O destino deles será, fatalmente, o mesmo de Melgarejo e Galtieri.

 

*Com informações do Nocaute

 

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O mundo reage contra Bolsonaro, o monstro neofascista

A Finlândia apelou esta sexta-feira à União Europeia (UE) que considere a possibilidade de banir as importações de carne brasileira como resposta à devastação causada pelos fogos na floresta amazônica. O apelo foi feito no mesmo dia em que a Irlanda e a França ameaçaram bloquear o acordo entre a União Europeia e o Mercosul.

“A ministra das Finanças, Mika Lintila, condena a destruição da floresta tropical e sugere que a UE e a Finlândia deve rever urgentemente a possibilidade de banir importações de carne do Brasil”, disse a ministra das Finanças finlandesa num comunicado citado pela Reuters. A Finlândia assume neste momento a presidência rotativa da UE.

O Presidente francês, Emmanuel Macron, acusa Bolsonaro de “mentir” e de não respeitar os compromissos ambientais que tinha assumido anteriormente durante um encontro do G20. “Dada a atitude do Brasil nas últimas semanas, o Presidente da República nota que o Presidente Bolsonaro mentiu na cimeira (G20) em Osaka”, no Japão, sublinha o Eliseu em comunicado. Por isso, acrescenta o documento, “a França opõe-se ao acordo do Mercosul”.

Já o primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar, garantiu, por sua vez, que se o Brasil não tomar medidas para proteger a floresta tropical, Dublin vai votar contra o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul, alcançado em Junho após 20 anos de negociações.

Leo Varadkar mostrou-se, à semelhança de outros líderes políticos, preocupado com a destruição da Amazónia e assegurou que o Governo irlandês irá monitorizar de perto os esforços ambientais do Governo brasileiro até que o acordo com o Mercosul seja ratificado.

“A Irlanda não irá votar a favor do acordo de livre-comércio entre a União Europeia e o Mercosul se o Brasil não honrar os seus compromissos ambientais”, garantiu Varadkar. O primeiro-ministro irlandês classificou ainda de “orwelliana” a tentativa do Presidente brasileiro Jair Bolsonaro de culpar as organizações ambientais pelos incêndios.

Porém, para bloquear o tratado de livre comércio entre a UE e os quatro países que compõem o Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai), a Irlanda iria precisar do apoio de outros estados-membros da União Europeia. Ao mesmo tempo, o próprio Governo irlandês é pressionado para proteger os seus produtores de carne bovina, que podem sair prejudicados com o Brexit e uma possível inundação do mercado com carne bovina mais barata vinda de países do Mercosul.

 

*Do Público

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“A Argentina está em ponto de ebulição. Não aguentamos mais”; e o Brasil?

Os argentinos dizem, “não aguentamos mais!” E nós brasileiros, até quando aguentaremos?

Clima nas ruas da Argentina esquenta com a proximidade das eleições presidenciais e país tem manifestações diárias.

“Aqui na Argentina tem manifestação todos os dias.” A frase foi dita por um dos tantos manifestantes no exato dia dos dois anos do desaparecimento forçado do militante mapuche Gustavo Maldonado. Naquele mesmo dia, quinta, 1 de agosto, dois atos ocorriam no centro de Buenos Aires, na sua principal praça, a de Maio, bem defronte da Casa Rosada, o palácio presidencial. Naquele lugar há décadas as Madre da Praça de Maio promovem ato silencioso, sempre às quintas, dando voltas no seu entorno central, hoje algo encampado por parte considerável da população. Elas são escoltadas para um local reservado da agitação, mas participam ativamente dos protestos, hoje não tão silencioso. “A Argentina está em ponto de ebulição. Não aguentamos mais tudo o que fizeram conosco nesses quatro anos com Macri”, diz Augusto Rivera, assessor da marcha e das Madres. Ele aponta para o povo nas ruas e afirma: “Isso ocorre todos os dias, em lugares variados do país. A resposta será dada nas urnas, a esperança se apresenta com Alberto e Cristina. Hoje, neste mesmo lugar tem outro ato, nele clamamos justiça para o que fizeram com Gustavo Maldonado”.

Mal termina um, tem início outro. Um palanque é levantado em instantes, nele o irmão de Gustavo, Sérgio Maldonado, fala por dez minutos e a massa humana, vinda dos mais diferentes lugares, lota não só a praça, como todas as imediações. Os agrupamentos são constituídos de organizações populares variadas, numa convergência organizada, cada qual ocupando um espaço delimitado nas proximidades, até receberem o chamado para avançar e quando o fazem, com seus hinos e bandeiras, a praça fica completamente abarrotada. Das 17h até as 19h uma inebriante efervescência toma conta de parte significativa dos descontentes de uma Argentina cada vez mais fragilizada, com todos os desmandos, do recorde da fuga de capitais até o estrangulamento dos empregos e salários, principalmente dos aposentados.

A economia cotidiana está paralisada, demissões e empresas fechando ocorrem todos os dias. Um dos que acompanham de perto isso o desenrolar desse processo diária é Maurício Polti, jornalista da 750AM, destacado dentro do programa de Victor Hugo Morales, o La Mañana, das 9h às 12h para dar voz ao que acontece nas ruas. “Não existe um só dia sem que uma empresa se feche na grande Buenos Aires. Sou destacado para ouvir a esses e o faço com grande dor. Esses são os que mais sofrem neste país, pois perdem seus empregos e não existem novas colocações. Viram párias de uma hora para outra, todos manipulados por uma política econômica que os exclui, os joga diariamente para o meio da rua. Muitos sem outra saída, num curto espaço de tempo estarão vivendo nas ruas”.

As manifestações, em sua maioria, ocorrem como denúncia, um necessário grito contra os desmandos. Leonardo Duva, presidente da Gestara (Grupo de Empresas Sociales y Trabajadores Autogestionados de la República Argentina) administra esse caos urbano. “O aumento considerável de trabalhadores sem emprego e sem esperança redobra nossa missão, cada vez mais unidos em atos e conscientização coletiva. Ou revertemos tudo com a ampliação da revolta nas ruas ou através do voto. Essa esperança se apresenta agora, primeiro em agosto e depois em outubro. Ou expulsamos Macri e todos os seus em definitivo ou eles irão nos encurralar de uma forma a nos deixar sem ar para respirar, pois sem dinheiro para comer já nos encontramos.” Numa criativa atividade, Leonardo administra também o Restaurante e Bar Cooperativo Lo de Nestor, reunindo alguns dos que se opõem à invasão neoliberalista.

Iniciativas como essa estão proliferando pelo país, numa forma de união e resistência. No local, o jornalista Gustavo Campana faz uma das paradas na peregrinação do lançamento do seu novo livro, o “Culpables – proyecto de país vs. Modelo de colônia”, onde reúne todos os interessados em discutir o momento do país e seu futuro. “Pelo menos em quatro dias da semana estou em lugares distintos, falando e falando, demonstrando o quando estamos sendo massacrados por um sistema opressor, excludente e contra todos os interesses populares”.

 

 

*Com informações da Carta Capital

 

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PIB do 2º trimestre no Brasil oficializará a recessão e Bolsonaro entra em pânico

Todo esse furúnculo verbal que Bolsonaro gastou hoje contra a esquerda, xingando o provável novo presidente argentino e os governadores do nordeste não é outra coisa senão desespero porque a bolsa desabou -3,01% e o dólar na marca dos R$ 4,04.

A bandalha neoliberal que detonou Macri na Argentina de forma humilhante, promete o efeito Orloff aqui no Brasil do governo miliciano de Bolsonaro.

É a derrocada da política econômica do Posto Ipiranga pela língua de trapo do próprio Paulo Guedes que mostra o estrago: “Está indo todo mundo embora, o menino prefere lavar prato em Barcelona, entregar pizza em Boston do que ficar no Brasil porque não há emprego”

O “empreendedor” e o “investidor” fogem do Brasil bolsonarista.

Atos em todo o Brasil, distribuídos em 20 capitais e no DF, bem como em dezenas de cidades do interior, atestam o repúdio à regressão civilizatória embutida nas reformas neoliberais.

Comércio em queda livre, não há crédito para comprar imóveis, Caixa e Banco do Brasil não estão financiando mais nenhum imóvel.

Estadão em editorial sapeca o último prego no caixão: O primeiro semestre do governo Bolsonaro foi muito ruim para a economia, com indústria emperrada, consumo travado e péssimo mercado de emprego.

 

*Por Carlos Henrique Machado Freitas

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New York Times denuncia crescente o autoritarismo de Bolsonaro.

Com a economia aos cacos, rumo a uma tragédia como a Argentina de Macri, o Brasil de Bolsonaro é matéria do New York Times, que acusa a besta fera brasileira de tentar liquidar com direito à oposição e liberdade de expressão no país.

Vendo a crescente onda de críticas a sua fracassada política econômica, Bolsonaro insulta jornalistas, como denuncia o NYT: “para Bolsonaro o jornalismo é um ofício criminoso e os políticos e ativistas que o criticam são considerados inimigos do Estado”.

O jornal ainda denuncia o uso constante de “notícias falsas, a difamação dos adversários do presidente, os ataques a jornalistas, as declarações desde o Palácio do Planalto que incentivam o ódio e as reações dos seguidores mais radicalizados de Bolsonaro.

Na avaliação do NYT, a conduta de Bolsonaro frente à Presidência da República, “está provocando um clima de perseguição e violência insano para uma democracia“, e ainda reforça o risco, cada vez maior, que esta ditadura sutil passe a ser plena.

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Babando de ódio, Bolsonaro xinga candidato a presidente da Argentina de “bandido” e governadores nordestinos de “cocô”

Depois do Financial Times jogar a toalha na Argentina: “It is game over for Argentina’s President Mauricio Macri” (‘o jogo acabou p/ Maurício Macri…’) considerando a derrota não apenas irreversível, mas humilhante, no Brasil em ataque de ira santa, Bolsonaro voltou a quebrar o decoro da presidência da República ao insultar o povo argentino e os prováveis futuros governantes de um país que é o maior importador de produtos industriais do Brasil. “Bandidos de esquerda começaram a voltar ao poder”, disse ele, no Piauí, onde também chamou governadores nordestinos de “cocô”. Militares tentaram fazer com que ele se calasse, mas Bolsonaro se mostra insano e incontrolável.

Segundo a agencia (Reuters) Ensandecido, Bolsonaro disse nesta quarta-feira que “bandidos de esquerda” começam a voltar ao poder na Argentina, em referência ao resultado das primárias presidenciais no país vizinho, em que o presidente Mauricio Macri, aliado de Bolsonaro, foi derrotado por ampla margem por Alberto Fernández, que tem como candidata a vice a ex-presidente Cristina Kirchner.

Em evento na cidade de Parnaíba, no Piauí, Bolsonaro também disse que a “turma vermelha” será varrida do Brasil nas próximas eleições e que a Argentina começa a trilhar o caminho da Venezuela.

“Olha o que está acontecendo com a Argentina agora. A Argentina está mergulhando no caos. A Argentina começa a trilhar o rumo da Venezuela, porque, nas primárias, bandidos de esquerda começaram a voltar ao poder”, disse o presidente no discurso, transmitido ao vivo em uma rede social.

“Nas próximas eleições, nós vamos varrer essa turma vermelha do Brasil”, afirmou. “Nós juntos vamos varrer a corrupção e o comunismo do Brasil.”

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Com a Netflix a guerra híbrida é uma realidade

Uma entrevista com
Atilio Boron

Sociólogo esclarece o drama pré-eleitoral na Argentina e relata como as direitas latino-americanas atuam com as forças imperialistas para manter a divisão dos povos no século XXI.

sociólogo argentino Atilio Boron é um dos intelectuais marxistas mais ativos da América Latina hoje. Seus artigos e livros contribuem para o debate ideológico dos defensores de Nuestra América. Em conversa com Jacobin Brasil, se mostrou otimista com os rumos da política no continente, vê grandes chances do retorno do kirchnerismo na Argentina e uma pronta derrota de Bolsonaro no Brasil. Nesta entrevista, Boron trata de sua mais recente obra, O Feiticeiro da Tribo – Mario Vargas Llosa e o Liberalismo na América Latina (2019), que será publicada em breve no Brasil pela editora Autonomia Literária, onde desconstrói as referências liberais do autor peruano que jamais deveria ter abandonado a literatura para se tornar analista político. Guerras Híbridas, Chernobyl, Netflix, Unasul, realismo mágico, perspectivas políticas, nada passa despercebido aos olhos deste que nos garante: antes de qualquer coisa, é preciso vencer a batalha ideológica.

O kirchnerismo tem chances de voltar ao poder nas eleições presidenciais deste ano na Argentina?

AB – Definitivamente, há possibilidades reais de que o macrismo seja derrotado. De toda forma, é necessário ser cuidadoso porque noto em muitos companheiros, tanto na Argentina quanto no Brasil, um diagnóstico muito economicista da crise. Pensam que diante da clara intensificação da pobreza e do desemprego, com a bancarrota de muitas empresas pequenas e médias, a inflação, que com tudo isso as pessoas automaticamente votarão em uma alternativa ao macrismo. É provável, mas não é certo que as coisas aconteçam assim. Muita gente ainda pensa que, apesar desta crise econômica, as promessas de governo Macri podem ser cumpridas num próximo turno presidencial. Há muita gente neste país que foi conquistada pela “ideologia da festa”. Ou seja, a crença de que na houve uma festa populista na Argentina nos tempos dos Kirchners e chegou o momento de pagar a conta.

Esta é uma narrativa da grande mídia?

AB – É uma narrativa da mídia que tem tido muito êxito não só na Argentina, mas em grande parte da América Latina. No Brasil se escuta algo parecido. É uma coisa séria que pode ser um obstáculo ao triunfo do kirchnerismo. Minha segunda consideração é: o kirchnerismo 2.0 – para usar a linguagem da informática – não é o mesmo que o Kirchnerismo 1.0. Alberto Fernández não é Cristina Fernández Kirchner, é um homem muito mais moderado. Evidentemente terá o apoio de Cristina no Senado, se chegar a ganhar, mas este é um regime presidencialista onde por mais que haja uma grande líderança política como Cristina no Senado – salvo que ela saia a organizar o campo popular, coisa que ainda não tem feito – a pressão do parlamento sobre Alberto Fernández não vai ser suficiente para impulsionar políticas mais radicais.

Por exemplo, Alberto Fernández não está disposto a reinstalar a Lei de Meios que foi revogada por Macri. Alberto Fernández tem uma posição pelo menos ambígua em relação à Venezuela, não está a favor de Juán Guaidó, mas ao mesmo tempo não deixa de falar que há uma ditadura ou uma situação de violação dos Direitos Humanos por lá. Alberto Fernández acredita que a Argentina deve voltar aos seus alinhamentos internacionais tradicionais com os Estados Unidos. Tudo isso evidentemente não era a versão do kirchnerismo 1.0. Mas um setor importante da esquerda argentina está convencido de que não podemos apostar numa fórmula que vá perder para Macri. Se nossa opção for votar no demônio, primeiro elegemos o demônio, depois nos encarregamos de saber o que fazer com ele. O mais importante é acabar com o inimigo principal que está produzindo este verdadeiro holocausto social na Argentina.

No Brasil, onde a esquerda errou ao não apostar todas as fichas em uma só candidatura nas eleições presidenciais?

AB – Eu acredito que este é o erro tradicional das esquerdas em todo o mundo. A direita sabe muito bem o que defende e raramente se equivoca. Além disso, o imperialismo também raramente comete um erro ao identificar o adversário. Já nós, da esquerda, como não temos uma situação de privilégio para defender, e temos que debater planos alternativos para superar o capitalismo, é muito fácil que haja dispersão de votos. E ainda há setores da esquerda que subestimam o imperialismo de forma surpreendente. Aqui na Argentina os setores muito radicalizados não têm a menor noção do que significa o imperialismo e o que significa realmente a dominação capitalista. A partir de um diagnóstico muito abstrato, dizem que Macri e Fernández são dois políticos burgueses. Isso é óbvio. Mas Hitler também era um político burguês, bem como os sociais-democratas alemães, e se comprovou que havia diferenças. Um deles mandou 6 milhões de judeus ao holocausto e desencadeou a Segunda Guerra Mundial, enquanto o outro teria feito uma política muito modicamente reformista, mas não teria produzido esta tragédia. Então existe esta incapacidade de diferenciar as matizes entre um político burguês capaz de produzir um holocausto e um político burguês que vai fazer uma política moderada de reformas sociais. Acredito que no Brasil aconteceu exatamente o mesmo. Claro que Haddad não era Che Guevara e Manuela não era Rosa Luxemburgo.

Este é um tema que Fidel Castro falou muito: é a consciência possível. Ou seja, até que ponto o povo brasileiro está disposto a defender uma proposta revolucionária socialista radical? Com este monopólio dos meios de comunicação, esta enorme vitória ideológica da direita não somente na América Latina, mas em todo o mundo… Há uma população mobilizada disposta para receber esta mensagem e sair a lutar hoje pelo socialismo e pela revolução? Não há! Então se não há, estamos em um processo de construção, temos que ir fazendo aos poucos. Temos que fazer aquilo que Frei Betto chama de “alfabetização política do povo”. E este processo de alfabetização política não foi feito pelas forças progressistas na América Latina.

Com os sucessivos golpes que sofremos nos últimos anos, em Honduras, Paraguai e Brasil, o ciclo progressista está frágil, apesar de alguns países ainda resistirem, como a Venezuela e a Bolívia. Mais recentemente o México passou a integrar este quadro. Se Evo Morales for reeleito e o kirchnerismo voltar ao poder, pode começar uma nova fase da esquerda no continente?

AB –

O ciclo progressista está fraco, mas não morreu. Como você disse, o México se incorpora quase 20 anos depois porque López Obrador tem mais sintonia com Evo, Lula ou Cristina que com Macri ou Bolsonaro. Ou seja, houve retrocessos grandes em países importantes como Argentina e Brasil, mas vai ser possível recuperar de alguma forma a marcha. E nem a Argentina, nem o Brasil, demonstraram até agora ser capazes de estabilizar um processo de reorganização reacionária do capitalismo.

No caso argentino, Macri tem chances muito grandes de perder a eleição. No Brasil, a verdadeira comoção social, econômica e política, coloca o país quase como um ‘Estado canalha’ porque, depois das revelações do The Intercept, Lula teria que ter sido imediatamente posto em liberdade. O Supremo Tribunal do Brasil está discutindo algo que nos Estados Unidos, ou na França ou na Alemanha, teria provocado imediata liberação de Lula. O ciclo progressista tem problemas? Sim! Está morto? Não! O novo ciclo da direita surgiu com força? Não!

Assim como Lula, Cristina Kirchner e Rafael Correa também foram vítimas de lawfare. Os vazamentos do Intercept, ao trazer à tona as inconsistências deste processo brasileiro, podem colocar em xeque o “método Lava Jato” que foi usado em outros países para perseguir lideranças políticas?

AB – Os Estados Unidos decidiram substituir os velhos golpes militares por golpes chamados “brandos”, mas que na verdade são muito violentos. Estes golpes se apoiam em três dispositivos. Primeiro, o controle quase absoluto da imprensa que desempenha um papel fundamental. Segundo, os juízes e os procuradores são treinados durante muito tempo pelos Estados Unidos nos cursos de boas práticas e as consequências disso Sérgio Moro mostrou de forma clara ao condenar Lula não pelas evidências, mas por suas convicções – isso significa um salto para trás de mais de dois séculos na história do Direito moderno. E, em terceiro lugar, estão os legisladores corruptos que também são convidados periodicamente a fazer cursos de boas práticas nos EUA. Este é o tripé que acabou com Manuel Zelaya, Fernando Lugo e Dilma Rousseff.

Há um dado muito interessante: no caso de Lugo e Dilma houve a mesma diretora da orquestra que foi Liliana Ayalde [embaixadora norte-americana]. Liliana Ayalde esteve no Paraguai, montou a operação e foi embora, em seguida retornou como embaixadora no Brasil, em 2013, para fazer exatamente a mesma coisa. Ou seja, é uma pessoa especializada em produzir este tipo de golpe brando.

Os Estados Unidos hoje optam por este tipo de ação que tem um resultado muito mais conveniente porque não é mais necessário apelar à figura odiosa de um militar com a cara de Augusto Pinochet, ditador no Chile entre 1973 e 1990, ou Castelo Branco, ditador no Brasil entre 1964 e 1967.

Então sim, vão aplicar este modelo em toda a América Latina, não só onde esteve a Operação Lava Jato, mas vão aplicá-lo até mesmo em países onde a Odebrecht não esteve presente executando obras públicas. E não se esqueça de uma coisa, toda esta ofensiva não foi destinada apenas a acabar com líderes incômodos para os Estados Unidos, mas também para tirar do jogo a maior empresa latino-americana de construção de obras públicas que era a Odebretch, em favor de empresas americanas como a Halliburton Construction e outras. Não podemos pensar que isso é só um problema político, é também um interesse econômico em acabar com estes governos e abrir espaço para as empresas americanas que vão começar a fazer agora o que a Odebrecht fazia.

Na esteira dos desmontes, há um projeto em curso para desarticular a Unasul e o Brasil tem tido um papel importante neste processo.

AB – A Unasul, originalmente, foi um projeto de Fernando Henrique Cardoso, depois foi retomada e redefinida por Hugo Chávez que atraiu Lula e Néstor Kirchner e gerou uma proposta totalmente diferente. Mas a Unasul é um projeto fundamental para os nossos países, inclusive para o Brasil, e vem de muito longe. O cientista político brasileiro Hélio Jaguaribe tinha uma tese fundamental: segundo ele, ”o Brasil não consegue sozinho”. Quando todos nós pensávamos que o Brasil, poderia se destacar sozinho por suas dimensões, ele dizia que apesar disso, o atraso tecnológico e social do Brasil faz com que a união dos países da América Latina seja absolutamente necessária para potencializar a todos. O Brasil é um país que precisa da energia que sobra da Venezuela, precisa da alimentação que sobra da Argentina, dos minerais do Chile e do Peru, então ele tinha a tese de formar um polígono de resistência. A Unasul vem deste conceito, por isso Fernando Henrique propose Hugo Chávez redefiniu-a, em função da nova realidade do século 21.

Agora, uma das primeiras coisas que o governo Macri fez foi enfraquecer a Unasul. Ou seja, retirar-se, subestimar apoio. E por fim, o supremo traidor da política latino-americana, Lenín Moreno, presidente do Equador, colocou os últimos pregos no ataúde da Unasul. Isso evidentemente reflete o sucesso de um objetivo antigo da Política Externa dos Estados Unidos para o qual qualquer processo de integração sul-americano soa como uma ameaça à hegemonia imperialista.

Toda união dos países de baixo significa enfraquecer o poder imperialista na região. Então não é casualidade que governos absolutamente subordinados aos Estados Unidos, como Macri, Bolsonaro, Sebastián Piñera [Chile], Iván Duque [Colômbia], que são maus governos da América Latina, tenham atacado a Unasul. Obviamente a direita tem muito claro que é preciso manter a divisão dos povos da América Latina. Mas nós vamos ressuscitar a Unasul, e vamos fazê-la melhor, é uma questão de tempo apenas.

Para as gerações que já cresceram nestes países no período progressista e ingressaram na universidade através das políticas públicas, reverter o atual cenário soa como uma tarefa muito difícil. Mas falando contigo, me parece que está bastante otimista…

AB – O Brasil vai dar certo, não há dúvidas sobre isso! Mas é preciso se dar conta que os processos históricos não são lineares. Agora estamos num retrocesso, mas isso vai dar lugar a uma superação. O Brasil não está condenado a ter um governo vergonhoso como o de Bolsonaro. Precisamos nos preparar para a mudança, fazer um exercício de autocrítica, se perguntar por que o Brasil chegou até aqui, reconhecer que houve erros. Houve erros na questão do PT que explicam o desenlace de toda essa situação crítica até chegar em Bolsonaro. Mas o Brasil é um país com imensos recursos e se conseguir organizar a grande massa popular, ainda que parcialmente, poderá recuperar o rumo. Só não pode perder a esperança, a história é assim. O Brasil não está voltando para o ano de 1964, apesar das promessas de voltar à ditadura.

O lema “Lula Livre” é uma agregação social e política muito importante. Mas há novos líderes surgindo, muito capazes, que ainda não se lançaram com tudo para organizar um movimento social e político renovador e isso faz falta. Me preocupa não ver Fernando Haddad cumprindo um papel importante que deveria agora. É uma pessoa muito inteligente, com muita experiência, mas não o vejo agora no primeiro plano da luta política, o vejo fechado nas Universidades como professor. Eu creio que Haddad tem enorme potencial de ser um dos polos de aglutinação da sociedade brasileira. Manuela D’Ávila também é uma pessoa que tem um enorme potencial de liderança. E há outros líderes que não podem ser subestimados, Ciro Gomes não é um personagem qualquer, é um homem que tem um discurso e uma capacidade de interpretação importante; João Pedro Stédile é um fenomenal líder de massas, Guilherme Boulos também. Há toda uma camada de líderes que são uma promessa de que o Brasil pode dar um salto.

Eu entendo a situação de todos eles porque o fenômeno de Bolsonaro era algo totalmente imprevisível. Mas foi uma operação maestra do imperialismo e inclui a famosa facada que, cada vez levanta mais suspeitas de ter sido uma operação cinematográfica. Há suspeitas de que houve cumplicidade dos médicos – que precisam ser denunciados – pois afirmaram que Bolsonaro não poderia participar dos debates quando ele estava claramente em condições de participar. Foi uma conspiração entre os meios de comunicação, os médicos, os juízes e os procuradores que impediram Bolsonaro de ir aos debates porque se ele tivesse ido em apenas um debate com Haddad teria sido um papelão universal e ninguém teria votado nele. Então creio que devemos ter esperança que o Brasil vai encontrar rapidamente seu rumo e o tempo passa rápido. A deterioração de Bolsonaro está nítida, as pesquisas mostram que é o presidente mais impopular nos primeiros seis meses da história do país.

Em seu livro, que em breve será lançado no Brasil, você apresenta Vargas Llosa como um grande romancista que infelizmente usa sua impressionante capacidade com as palavras para manipular a opinião pública e defender o neoliberalismo. Quem é este “Feiticeiro da Tribo”?

AB – A meu ver, Vargas Llosa é hoje o principal propagador do neoliberalismo no mundo. Não só nos países de língua hispânica e portuguesa, mas também nos EUA, na Inglaterra em parte da Europa. Seus artigos publicados periodicamente no El País são reproduzidos em mais de 300 jornais somente na América Latina e no Caribe. É um homem muito hábil, tem um manejo extraordinário da linguagem, seu espanhol é límpido, muito claro, musical, agradável, mas ele o tem colocado a serviço dos piores interesses do imperialismo.

Originalmente Vargas Llosa veio da esquerda, como mostro em meu livro. Ele foi militante de uma célula clandestina do Partido Comunista do Peru e provocou toda esta transformação que passa de uma esquerda marxista dura, à qual ele foi fiel até o ano de 1971. A Revolução Cubana contou com o apoio dele desde 1959 até meados de 1971 e depois lentamente ele foi se afastando, não foi uma ruptura brusca. Mas tem tido um impacto imenso.

No livro “O Chamado da Tribo”, que eu critico, ele aborda os fundamentos teóricos onde está embasada sua concepção liberal. O que eu faço em minha obra, O Feiticeiro da Tribo, é examinar um a um os sete autores fundamentais sobre os quais ele se apoia – Adam Smith, José Ortega y Gasset, Raymond Aron, Friedrich Von Hayek, Karl Popper, Isaiah Berlin, e Jean-François Revel – e mostro as inconsistências.

Capítulo a capítulo mostro que não há nem boa análise empírica, nem argumentação teórica correta. E no último critico a ideia inicial de que liberalismo e democracia são duas caras da mesma moeda. Isso é absolutamente falso. O liberalismo é intrinsecamente inconciliável com a democracia porque como expressão ideológica do capitalismo significa fundamentalmente o individualismo e o princípio da ganância como condutor da organização da vida social. Já a democracia se organiza sobre a base de justiça e igualdade. Portanto são duas instituições que vivem em choque permanente: quanto mais liberalismo existir, menos democracia vamos ter.

Portanto, termino o livro com este capítulo de reflexão mais teórica questionando o que Varga Llosa defende. Claro que ele o diz num espanhol encantador, por isso o chamo de “feiticeiro”. Ele engana com seu jogo de palavras. E aí aproveito uma frase que ele mesmo usa para falar sobre sua tarefa como escritor, ele diz: ”um novelista é um senhor que diz mentiras que parecem verdades”. Isso é o que ele faz em sua obra de ensaios políticos, por isso há tantos ataques brutais contra López Obrador, contra Chávez, Correa, Evo, Cristina e Lula. Por que? Porque ele, como diz Noam Chomsky, é um “mandarim do império” e cumpre muito bem essa função.

A partir da perspectiva brasileira, tenho a sensação de que estamos de costas para a América Latina, apenas a literatura, em especial o boom do realismo mágico do qual Vargas Llosa é um dos precursores, conseguiu atravessar esta fronteira. Isso é um projeto? Seu livro pode contribuir para quebrar esta barreira?

AB – A classe dominante brasileira é uma das mais experimentadas e tem sido muito inteligente e muito perversa em blindar o Brasil e mantê-lo fora da América Latina. Um grande sociólogo e economista brasileiro, Ruy Mauro Marini, dizia que o projeto da direita brasileira é ser o subimpério. É justamente isso, mas este é um projeto mesquinho para um país como o Brasil. Impedir que sua população sequer saiba o que acontece com os vizinhos é uma forma de reforçar sua dominação interna e ao mesmo tempo apostar todas as fichas de que o Brasil será grande nas mãos dos Estados Unidos. Pobrezinho! Os Estados Unidos vão esmagar qualquer país que de alguma forma possa crescer tanto a ponto de ser uma ameaça a seus interesses. Nunca vão permitir que o Brasil seja a grande potência que está destinado a ser, sobretudo se o Brasil seguir se submetendo às regras do imperialismo.

O senhor fala em seu livro sobre como os intelectuais à direita “saem na frente” nesta batalha ideológica porque têm um aparato midiático a seu favor. Quais os caminhos devem trilhar aqueles que permanecem convictos às causas justas?

AB – Hoje temos as redes sociais como uma forma alternativa de se fazer conhecer, mas qualquer bobagem que Varga Llosa faz é reproduzida por pelo menos 300 jornais. Isso é algo absolutamente inalcançável. Porém as coisas estão mudando, e devemos manter viva a esperança. Estamos numa batalha muito desigual, mas como as coisas que estamos dizendo são verdade, ao fim e ao cabo a verdade aparece porque eles não podem tapar a sol com a peneira.

Nosso papel é dizer a verdade e denunciar a mentira, mesmo que não tenhamos um grande aparato midiático, mas cada vez mais temos meios alternativos. Por isso tenho confiança que vamos sair deste mal trecho em que se encontra a América Latina. Perdemos tempo, começamos tarde, Fidel recomendou que começássemos esta batalha na década de 90 e nós começamos 15, 20 anos depois. Burrice!

Temos que dar um empurrão nos intelectuais brasileiros para que parem de achar que Bolsonaro representa um retorno à ditadura de 64, tenho visto um pouco este temor e têm que parar já com isso e convocar as pessoas para que saiam às ruas. É interessante o que estão fazendo Caetano Veloso e Chico Buarque porque através das artes e da música estão avançando mais do que os que se dedicam a escrever. Talvez este seja um bom caminho.

Os tentáculos dos EUA para manipular a opinião pública são muitos e um deles são as produções culturais de massa. Atualmente, por exemplo, uma série sobre Chernobyl tem tido muita audiência. Como o senhor vê estas narrativas supostamente neutras difundidas nas plataformas de streaming?

AB – A guerra híbrida é uma realidade. A lawfare, a judicialização da política, o controle dos meios de comunicação, tudo isso passa a ser absolutamente fundamental. Eu vejo com muita preocupação. Chernobyl no Netflix é um caso perfeito para ilustrar. Eles mostram a degradação moral e política da União Soviética. O objetivo é deixar claro que a União Soviética hoje se chama Rússia. Mas esta série oculta um dado essencial: quando toda a Europa e os EUA lavavam as mãos com relação às vítimas de Chernobyl, houve um país pobre e subdesenvolvido chamado Cuba que atendeu mais de 24 mil crianças atingidas por este acidente nuclear em pleno período especial – fase mais crítica da economia cubana, no começo dos anos 90.

Eu sou o presidente honorário da Efac (Encontro Fraternal Argentino Cubano), através desta instituição estamos terminando um documentário chamado Tarará, que é o nome do hospital onde foram atendidas as crianças de Chernobyl. O objetivo é basicamente contrapor a história difundida pelo Netflix que não diz a verdade sobre o acidente e tampouco menciona o que ainda está acontecendo. Este reator 4 que explodiu ainda segue trabalhando e emitindo radioatividade e a cobertura que fizeram sobre isso é de que a União Europeia não tem dinheiro para reparar isso porque são pelo menos 100 milhões de euros para fazê-lo e os ”miseráveis governos europeus” não querem colocar um peso e querem que a Ucrânia, ou a Rússia, assumam isso sozinhos, e se esse reator chegar a romper vamos ter um Chernobyl novamente. Isso não se fala na série da Netflix e o perigo está aí.

Não podemos evitar que eles digam mentiras, o que nós temos que fazer é dizer a verdade. Uma coisa que me incomoda muito com o governo de Lula no Brasil é que não fez nenhum esforço sério para mexer na comunicação. O governo brasileiro tinha que ter uma rede de comunicação própria e não depender da Rede Globo como aconteceu com Dilma que toda vez que precisava fazer uma declaração ganhava uma migalha de dez minutos antes da novela das 8. Estamos muito mal nesta batalha, o imperialismo é muito criativo. Segundo Chomsky, é o maior projeto de dominação da história. Se nós não reagirmos a tempo teremos problemas graves. É imenso nosso desafio nesta guerra ideológica.

 

 

*Do Jacobin Brasil

 

 

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Argentinos dão aviso prévio para o amigo de Bolsonaro e o clima está mudando na América Latina

O cientista político Emir Sader escreve sobre a retumbante vitória de Alberto Fernandez e Cristina Kirchner contra Macri nas prévias da eleição presidencial argentina – 47% a 32%. Foi uma vitória histórica, “apesar da brutal campanha de mentiras contra a Cristina, com o Judiciário funcionando como agente contra ela” e pode marcar o início da virada progressista na América Latina.

A Argentina protagonizou a primeira tentativa de restauração do neoliberalismo, depois de governos antineoliberais. Uma experiência que se aproxima do fracasso e do fim com o resultado das eleições prévias.

O resultado dá uma vantagem muito cômoda para Alberto Fernandez e Cristina Kirchner, assim como para Axel Kicillof para governar a província de Buenos Aires. Quinze pontos é uma vantagem imensa. Uma diferença dessa ordem é quase impossível de ser superada no primeiro turno, em outubro, levando provavelmente a uma vitória da oposição no primeiro turno.

O resultado deu uma vantagem significativa para Alberto Fernandez e Cristina Kirchner sobre o atual presidente Mauricio Macri, que permite prever uma vitória segura no segundo turno em outubro. Essas prévias foram promovidas por Nestor Kirchner, para dirimir disputas internas nas chapas, mas desta vez não há nenhuma disputa interna, ficando a consulta como prévia das eleições de outubro. A votação é obrigatória, mas sempre votam menos do que em outubro.

O governo tratou de criar um clima de otimismo, com o movimento do mercado e o preço do dólar favorável, mostrando que o mercado votaria por Macri, e tentava mostrar um clima positivo e de eventual resultado favorável ao governo. Pesquisas fajutas na véspera também tentaram forjar favoritismo do governo. Mas a grande maioria das pesquisas dava vitória da oposição tanto a nível nacional, como da província de Buenos Aires, hoje também governada pela direita, o segundo cargo político mais importante da Argentina.

Os resultados desastrosos no plano econômico e social foram construindo uma maioria de rejeição do Macri praticamente em todo o pais. Depois do pacote demagógico do Macri, com congelamento de preços e outras medidas opostas à sua política econômica, justamente de que ele acusava o governo da Cristina, com prazo marcado até as eleições, se deu certa estabilidade econômica. Mas as consequências sociais, com o aumento do desemprego, continuaram, fortalecendo a oposição.

A opção da Cristina de se candidatar a vice, mais por questões pessoais do que políticas – sua filha está muito enferma, em tratamento em Cuba, entre outras razões -, não alterou as pesquisas, confirmando seu favoritismo.

A opção de ter um peronista conservador como vice, tampouco aumentou a preferência por Macri. As visitas de Bolsonaro tampouco ajudaram ao Macri. A imagem dele na Argentina é ainda mais negativa do que no Brasil. Ainda mais que se atreveu, nas duas viagens, a criticar a Cristina, a líder popular de maior prestígio por lá.

A provável derrota do Macri não apenas dá um mau presságio para o Bolsonaro, que começava a iludir-se com a possibilidade de reeleição, como também mostra como o retorno do modelo neoliberal conduz inevitavelmente à impopularidade do governo e à sua derrota. Além de que condenará o Bolsonaro a um isolamento político ainda maior.

O projeto de restauração neoliberal na região começou pela Argentina e pelo Brasil, países eixos dos governos antineoliberais e dos processos de integração latino-americana. Foi a partir da reversão política nesses dois países que a direita latino-americana se recuperou e voltou a impor economias recessivas, com altos níveis de desemprego e desmonte dos patrimônios públicos, com retomada de políticas de privatização.

Macri despencou rapidamente na sua popularidade, a economia argentina está há dezenas de meses em recessão, o dólar disparou, assim como a taxa de juros. Como resultado, foi se desenhando a vitória da oposição, apesar da brutal campanha de mentiras contra a Cristina, com o Judiciário funcionando como agente contra ela.

Um novo governo antineoliberal não representará simplesmente a retomada do governo antineoliberal da Cristina, de crescimento econômico com distribuição de renda. Porque foram grandes os estragos provocados pelo governo neoliberal na Argentina, incluída uma imensa dívida com o FMI.

Terá sido o primeiro fracasso da restauração neoliberal, que se deu em seguida no Brasil e no Equador. O clima favorece também as eleições, bastante disputadas, no Uruguai e na Bolívia. E estende sobre o Brasil o manto previsível de voo curto do governo Bolsonaro.

 

*Por Emir Sader – 247